O Projeto Educacional dos Jesuítas
Apesar das enormes dificuldades enfrentadas pelos padres Lipinski e Sedlac nos primeiros anos da sua atividade pastoral entre os imigrantes alemães do Brasil, o projeto da colonização começava a emitir sinais de consolidação.
Finalmente em 1858 aportaram os padres Michael Kellner e Bonifaz Klüber e o irmão leigo Franz Rutkamp. O reforço veio em boa hora. O campo da atividade pastoral entrara num ritmo de expansão fora do comum. Na direção oeste do Estado do Rio Grande do Sul, estavam sendo abertas novas fronteiras de colonização, nos vales do Rio Taquari, Pardo e Jacuí. Dezenas de novas comunidades foram sendo organizadas nas picadas abertas na mata virgem. No mesmo ritmo multiplicaram-se igrejas, capelas e escolas. Não demorou e novas paróquias surgiram: São Leopoldo em 1859, santa Cruz em 1865, Porto Alegre em 1867, Bom Jardim em 1867, Estrela em 1873, Montenegro em 187l, Bom Princípio em 1873, São Salvador em 1875, São Sebastião em 1881, Feliz em 1884, Novo Hamburgo em 1895, Taquara em 1898. Em termos espaciais essas paróquias cobriam uma área de aproximadamente 250 por 50 quilômetros. A maioria delas foi implantada pelos padres jesuítas e na primeira fase por eles administradas.
Paralelamente à expansão da infra-estrutura eclesiástica deu-se a multiplicação das escolas comunitárias. Entre 1824 e 1850 foram criadas 10 dessas escolas. Até 1875 acresceram mais 40, um aumento, portanto, de 400%. Ao termino do século dezenove o número subira a 150. O resultado deste esforço no plano educacional é facilmente imaginável. Alem de significar um poderoso e decisivo aliado no incentivo à religiosidade, evitou a instalação do analfabetismo entre os imigrantes alemães e seus descendentes.
Se os primeiros jesuítas alemães haviam sido convocados para socorrer espiritualmente os colonos alemães, sua missão na verdade não se restringiu à pastoral propriamente dita. Os padres espanhóis que em 1842 se fixaram em Porto Alegre, receberam do bispo do Rio de Janeiro a incumbência de renovar e dinamizar o catolicismo na Província do Rio Grande do Sul, de acordo com o que previa o Projeto da Restauração Católica em vias de implantação em toda a Igreja. Sua atividade pastoral pautou-se, desde o começo, de acordo com essa perspectiva. Depois que a Missão passou para a jurisdição da Província Alemã, a linha mestra desse objetivo não sofreu modificação. A implantação do espírito da Igreja da Restauração entre toda a população, independentemente da origem étnica, motivou os jesuítas que vinham chegando em número cada vez maior, a lançar mão de um dos instrumentos evangelizadores mais conhecidos e mais tradicionais da Ordem: A educação em todos os níveis. O que se passou no sul do Brasil nada mais foi do que colocar a serviço da evangelização esse instrumento infalível.
Ao assumirem a missão pastoral entre as comunidades de imigrantes alemães, encontraram essas organizadas em torno de suas capelas e, principalmente, em torno de suas escolas. A capela até que podia ser dispensada, a escola não. Os padres acharam assim postas as bases para, de imediato, porem em andamento uma promissora atividade pastoral e, ao mesmo tempo, cuidar da educação popular que, por sua vez, significava a garantia do êxito da primeira. Até aí as escolas haviam assegurado o ensino religioso paralelamente com a formação profana. As crianças aprendiam simultaneamente a tabuada, as quatro operações, o ler e o escrever, os rudimentos essenciais da religião e assimilavam os preceitos morais e disciplinares da Igreja. Essa realidade fez com que os padres intuíssem, desde logo, o grande alcance da escola. E não vacilaram. Fieis aos preceitos a Ordem fizeram da escola e da educação o grande aliado na atividade pastoral. Desde então trabalharam com convicção de que a compreensão das verdades da fé e a interiorização do espírito cristão, acontece via educação. A partir daí a escola e a educação passaram a ser uma das suas grandes prioridades.
Os primeiros contatos com os assentamentos dos colonos alemães convenceram os jesuítas de um fato inegável. Os núcleos de colonização consolidavam-se no mesmo ritmo em que se multiplicavam. A evolução de um bom número deles em centros urbanos com um comércio crescente, uma industrialização incipiente, dotada de grande potencial de crescimento, somada a uma sociedade em processo de urbanização, ocupariam, em questão de uma ou duas gerações, o espaço de não poucas comunidades de colonos. Em segundo lugar não havia dúvida de que no Rio Grande do Sul o poder político e a hegemonia econômica, concentrava-se exclusivamente nas mãos dos estancieiros de origem luso-açoriana. Frente a essa realidade não restava dúvida de que os imigrantes alemães e seus descendentes permaneceriam à mercê à margem da dinâmica política e econômica por mais algumas décadas, na hipótese de não se partir para iniciativas capazes de franquear aos filhos dos colonos os caminhos da ascensão social e conseqüentemente o acesso às decisões políticas e econômicas. Confinar as comunidades alemãs em suas picadas e linhas equivalia a condená-las à estagnação, à decadência e ao insucesso. O bom senso e a lógica mandavam que fossem construídas, o mais depressa possível, pontes em condições de superar a justaposição, no mesmo espaço geográfico e reunidos sob o mesmo regime jurídico e legal, de lusos, açorianos, alemães e, mais tarde italianos, poloneses e demais vertentes étnicas. Somente assim seria possível assegurar para o futuro a consciência de uma cidadania comum, a serviço da mesma nação. Perguntar a um jesuíta pelo caminho a ser escolhido, significava perguntar o óbvio: a escola, a educação, a formação em sintonia com as exigências concretas do tempo.
De um lado era inadiável criar e fazer funcionar uma instituição de ensino capaz de formar lideranças econômicas, sociais, educacionais, políticas e religiosas, acessível a todas as procedências étnicas. De outro lado não há necessidade de insistir que, pela sua própria natureza, as escolas comunitárias não estavam em condições de assumir essa tarefa. Impunha-se, portanto, a criação de escolas de nível mais elevado, preparadas para receber os filhos das oligarquias estancieiras e oferecer-lhes a formação e a educação exigida para cumprirem as funções que no futuro lhes caberia exercer na sociedade local, regional, nacional e até internacional. A escola deveria formar ao mesmo tempo as primeiras gerações de lideres religiosos e leigos surgidos entre os imigrantes.
O ensino elementar já não bastava para responder às exigências de formação que se vinham manifestando também no seio das comunidades coloniais. A consolidação e o êxito da colonização haviam alcançado um nível tal que para os filhos dos colonos, dos artesãos, dos comerciantes, etc., a formação elementar já não bastava. Exigiam-se conhecimentos técnicos mais apurados para tocar uma casa de comércio de maior porte, desenvolver empreendimentos artesanais em indústrias nascentes e sobretudo o manejo da língua do Pais. De outra parte tornava-se cada vez mais visível entre os filhos dos imigrantes aspiração de, por meio de uma formação mais elaborada, abrir caminho para os postos de maior relevância na sociedade, como o magistério, o sacerdócio, a medicina, a jurisprudência e, por que não, a vida pública na condição de funcionários, políticos, magistrados, militares, diplomatas, etc.
Essa situação fez com que o Pe. Feldhaus, recém nomeado pároco de São Leopoldo, começasse com tratativas concretas para a instalação e uma escola que ultrapassasse o nível do ensino elementar. Como primeira evidência impunha-se a aquisição de instalações apropriadas para acomodar a escola e os alunos.
Os prédios desativados de um antigo moinho de tanino, de um curtume e de uma casa de moradia, localizados próximos ao rio ao lado da igreja, terminaram sendo o local escolhido para abrigar a futura escola. A aquisição da propriedade foi autorizada pelo Pe. Ponza, visitador da Missão, então subordinada à Província Romana e, em 22 de junho de 1869, aconteceu a assinatura dos documentos de transferência da propriedade.
O Colégio que abriu as portas para os 12 primeiros alunos, e foi solenemente inaugurado por D. Sebastião Dias Laranjeira, bispo da diocese do Rio Grande do Sul, na festa do Rosário de 1869, com o nome de Colégio Nossa Senhora da Conceição de São Leopoldo. Naquele momento, com certeza, ninguém teria sido capaz de prognosticar a importância que o “Conceição”, como seria carinhosamente chamado por alunos, ex-alunos e a sociedade em geral, desempenharia nos 40 anos que se seguiram, formando uma influente elite intelectual para o Estado e o Pais. O respeito e o reconhecimento que conquistou pode ser avaliado pela manifestação de um ex-aluno, o médico e botânico João Dutra, feita no final da década de 1930: “Eu doaria aos jesuítas todos os meus bens se fizessem funcionar novamente uma instituição de ensino como foi o Colégio Conceição”.
O colégio fora inicialmente pensado pelos fundadores como seminário para a formação do clero e seminário ou escola normal para a formação de professores. Uma seqüência de percalços, porém, chegaram a comprometer seriamente a consolidação da obra. Ora foi a concorrência de escolas protestantes, ora a enchente devastadora de 1873, forçando a interrupção temporária das atividades, ora o clima hostil ao clero, principalmente aos jesuítas, durante o gabinete Rio Branco, ora o episódio Mucker, ora o susto causado pela varíola, etc. Não faltaram também momentos de grande estímulo como foi a visita por parte do Presidente do Estado acompanhado pelo bispo, aproveitando o lançamento da pedra fundamental para a estrada de ferro Porto Alegre – São Leopoldo. Um outro fator decisivo para a continuidade do Colégio, foi a chegada a São Leopoldo de um número considerável de reforços de jesuítas de ótima formação, expulsos da Alemanha pelo Kulturkampf.
Aos alunos das primeiras levas exclusivamente de origem alemã, foram-se somando, em número crescente até se tornarem maioria, filhos de luso-brasileiros. A instituição na condição de seminário tanto para a formação de sacerdotes como de professores provara, em pouco tempo, ser ilusória. Uma decisão tomada em 1877 imprimiria então ao Conceição o rumo definitivo até o encerramento das suas atividades em São Leopoldo em 1912. O Colégio apostou na preparação dos seus alunos para os chamados “Exames Parcelados”, realizados em Porto Alegre. O resultou superou todas as expectativas. Entre os seis candidatos conceituados como excelentes, figuravam três do Colégio Conceição, todos filhos de imigrantes: Nicolau Knob, Heinrich Konzen e Lucas Hansel. O fato obteve tamanha repercussão que o jornal “Deutsche Zeitung”, notório pela hostilidade aos jesuítas registrou:
Fomos informados que os alunos Nicolau Knob, Heinrich Konzen e Lucas Hansel de fato se distinguiram. De maneira alguma concordamos com a orientação do ensino e da educação dos jesuítas. Não nos é licito, entretanto, deixar de cumprir o dever de justiça, reconhecendo os resultados exitosos da instituição tornados públicos. (Deutsche Zeitung)
Com esse resultado o gelo estava quebrado e o Colégio Conceição enveredou por um ritmo de crescimento acelerado. O número de alunos foi crescendo de ano para ano. Só para se ter uma idéia desse crescimento: em 1880 os alunos somavam 65 e dez anos depois, em 1890 eram 223.
A década de 1880 marcou a consolidação tanto física como acadêmica do Colégio Conceição. Foram erguidos os prédios definitivos que abrigavam todos os setores da instituição: alojamentos para os alunos, salas de aula, um amplo salão de atos e teatro, museu, laboratórios, capela, moradia dos padres, oficinas, etc. No plano acadêmico uma estrutura, um currículo e um regime disciplinar severo, inspirado no famoso Colégio Stella Matutina, que os jesuítas mantinham em Feldkirch na Áustria, conferiu consistência e profundidade à formação dos alunos. O estudo de línguas, a formação clássica, complementada por disciplinas de cunho mais prático e profissional, fez com que os egressos do Conceição não tivessem dificuldades maiores em competir em qualquer nível. Nos seus apontamentos pessoais o Pe. Johannes Rick, por algum tempo professor da instituição anotou:
No tempo em que lecionei Matemática e História Natural no Ginásio Nossa Senhora da Conceição a instituição estava equiparada aos ginásios do Estado, significa que os egressos podiam freqüentar universidades. O currículo durava seis anos e estava abarrotado com um monstruoso conteúdo didático. Só para as línguas: português, latim, grego, francês, inglês e alemão, exigia-se mais conteúdo do que nos ginásios alemães de oito anos. A atividade como um todo era insalubre, corporal e espiritualmente em todos os sentidos. Encontrei os alunos no seu conjunto aplicados e também inteligentes, alguns até prematuros. Obviamente não era possível profundidade. Excetuando as revoluções que faziam parte da vida sulamericana e que repercutiam intermitentemente no internato, o comportamento dos alunos era tão bom quanto nos ginásios alemães. A disciplina germânica agradava aos pais, mas com certeza nem sempre aos alunos! (Rick, 2.004, p. 18)
A fama do Conceição como instituição de ensino de alto nível, espalhara-se no início dos aos noventa, por todo o Sul do Pais e até despertara as atenções das autoridades educacionais federais. De todo o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e até do Paraná afluíam os alunos, filhos de fazendeiros, comerciantes, profissionais liberais, funcionários graduados, etc., para na condição de internos, assimilar uma sólida formação acadêmica e plasmar suas personalidades em meio a uma atmosfera de cultura, religiosidade de alto nível e de uma disciplina quase prussiana.
O Pe. Balduino Rambo, referido-se ao período do apogeu do Colégio Conceição, escrevendo, em 1958, a biografia do Pe. Rick na revista Montfort da Áustria, assim se manifestou:
O Ginásio Conceição em São Leopoldo, então no auge de sua atuação, fora pensado originalmente como Seminário para formar professores para as colônias. Depois de pouco tempo abriu as portas também para a juventude de língua portuguesa. Conquistou rapidamente tamanha fama que, ainda hoje, ecoa como uma longínqua saga no ouvido dos alunos ainda vivos. Cavalgando durante semanas acorriam os filhos dos fazendeiros ricos por 600 quilômetros de distância, vindos de todos os recantos do Estado e até do Estado de Santa Catarina. Em Porto Alegre e nas cidades vizinhas, era de bom tom que os rapazes estudassem em São Leopoldo. (Rambo, Balduino, 1958, p.9)
A esta altura faltava ao Conceição conquistar mais um titulo: o de “equiparado ao Colégio D. Pedro II”. O Pe. Schupp resumiu a façanha assim:
Desta vez foi o Pe. Konrad Menz, prefeito geral, que se empenhou pessoalmente na questão com extraordinário entusiasmo e extrema energia, junto ao Ministro da Educação e junto a outras personalidades com poder de decisão. Tudo se encaminhou para uma solução favorável e finalmente no dia três de fevereiro de 1890, o Ministro assinou o decreto de nº 3580, conferindo à instituição o caráter de um “Gymnasio equiparado”. Este ato teve como conseqüência que a instituição, embora sob a fiscalização de um funcionário do governo, um “fiscal delegado”, detinha as credenciais legais para realizar não apenas os exames de madureza, como também conferir o grau de bacharel. Desta maneira alcançara-se tudo, tanto na organização material quanto na consolidação interna do Colégio. Em relação ao primeiro o Pe. Luiz Sarazin, como excelente ecônomo, soube salvaguardar os interesses da obra e em relação ao segundo o grande mérito cabe ao Pe. Mereg. Este último levou o Colégio ao apogeu como instituição de ensino. (Schupp, 2.004, p. 18)
O episódio da equiparação do Colégio Conceição levanta uma questão digna de reflexão. O Colégio dos Padres é contemplado com uma demonstração suprema de reconhecimento por parte das autoridades da República recém instalada. Pelo fato de consagrar o regime de separação do Estado e da Igreja, era de se esperar no mínimo uma protelação da equiparação duma instituição sob a condução e orientação de jesuítas, a maioria deles vítimas do Kulturkampf na Alemanha. Um segundo ponto, até certo modo complementar, tem relação com o fato de persoalidades muito influentes na República, como Rui Barbosa, articulavam um projeto de lei visando expulsar os jesuítas do Pais. Se, apesar de tudo, a equiparação foi concedida, é sinal que o Colégio Conceição gozava de um conceito inquestionável e contava com o apoio e a provação de personalidades não menos influentes.
Embora o Colégio Nossa Senhora da Conceição se tivesse desviado significativamente da sua proposta original como Seminário de formação de sacerdotes e Escola Normal para a formação de professores contribuiu contudo decisivamente, de forma indireta, para com a renovação espiritual e cultual. Desde a sua fundação até o seu encerramento passaram pelas suas salas de aula, mais de 2000 alunos internos. Entre os egressos do Conceição contam-se comerciantes, industriais, magistrados, médicos, dentistas, advogados, militares, professores, políticos, administradores públicos, sacerdotes. Outros ainda ocuparam postos na hierarquia eclesiástica incluindo um arcebispo.
Formando elites atuando em todas as esferas da vida civil, militar e eclesiástica, o Ginásio Nossa Senhora da Conceição foi o grande responsável direto e indireto por uma série de benefícios para o clero e a Igreja. Entre eles merecem citação: o nível do ensino e o contato pessoal com os padres devolveu a eles, em grande parte o respeito, desfez preconceitos de modo especial em relação aos jesuítas, a religião voltou a fazer parte da vida de uma parcela crescente da sociedade. O Pe. Schupp resumiu a questão:
É óbvio que entre os alunos houvesse sempre aqueles nos quais qualquer arte de educar resultava estéril. Isso, entretanto, não impediu que lentamente uma nova percepção tomasse conta de camadas sempre mais amplas da sociedade, levando aos poucos a uma total reviravolta da opinião pública em favor da religião e do estado religioso. Evidentemente isso não significa que o povo começasse logo a praticar a religião. Até chegar a esse ponto era necessário ainda um bom tempo. Não se pode ignorar também o fato de que os alunos que no tempo do Colégio freqüentavam os sacramentos, apos o seu egresso, afastavam-se, na sua grande maioria da religião. Mas o terreno para um futuro melhor estava preparado e isso se deve em última análise ao Colégio de São Leopoldo e com isso o Colégio cumpriu a sua missão. (Schupp, 2.004, p. 20)
Infelizmente e, 1912 a lei Rivadavia privou o Colégio Senhora da Conceição do status de equiparado ao D. Pedro II.
Além da perda da equiparação do Conceição com o D. Pedro II, um segundo fator de peso não menor, levou à decisão do encerramento das atividades da instituição como colégio interno para leigos. A evolução de Porto Alegre para centro econômico, financeiro e cultural, além de administrativo de que gozava como capital do Estado, rendeu-lhe um desenvolvimento extraordinário em todos os sentidos. Tornou-se o mais importante pólo de atração para comerciantes, industrialistas, profissionais liberais, artistas, artesãos, intelectuais, militares, funcionários, magistrados, etc. etc. Esse processo colocou São Leopoldo cada vez mais na posição de cidade periférica de segunda grandeza.
Face à nova realidade gerada com a perda da equiparação e a crescente hegemonia de Porto Alegre, foram decisivos para o encerramento das atividades do Colégio Conceição como internato para leigos e a concentração do esforço na formação de lideranças no Ginásio Anchieta na capital, com a opção paralela pelo regime preferencial de externato. É do Pe. Schupp a observação:
Impuseram-se as nítidas vantagens do externato sobre o internato: a maior liberdade, tão importante para a formação do caráter e a livre decisão dos alunos em aceitar a prática da religião, somados à maior facilidade para estabelecer uma sintonia da parte da instituição e os pais. (Schupp, 2.004, p. 20)
Além desses motivos mais visíveis um outro contribuiu para a decisão. Em 1903 o Ginásio Anchieta conseguira também a equiparação ao D. Pedro II, na condição de externato do Conceição de São Leopoldo. Essa conquista imprimiu-lhe um crescimento fora do comum. Tanto assim que em pouco tempo o número de alunos subiu para 300 e logo depois para 400, com pedidos de vagas em contínuo aumento.
A evolução dos acontecimentos e a interdependência dos dois ginásios, um como externato do outro, não tardou em revelar uma serie de inconvenientes. A administração comum de ambos, somada à complicação oriunda do planejamento e execução dos programas de ensino, aconselhavam a desvinculação entre si das duas instituições. Sem perda de tempo o Pe. Johannes Lütgen, reitor em São Leopoldo, muniu-se de uma carta de recomendação do Dr. Borges de Medeiros, Presidente do Estado e, com ela na mão, viajou para o Rio de Janeiro. Escudado pela intermediação de personagens importantes, logrou a separação dos dois ginásios, mediante um decreto do Ministério da Educação datado em 23 de junho de 1809. A partir daí o número de alunos do Anchieta não parou de crescer. Num único ano foi preciso recusar mais de 100 candidatos. Consolidaram-se assim os pressupostos para que o Ginásio Anchieta enveredasse pelo caminho da formação sólida que fez dos egressos de suas salas de aula candidatos competitivos, para as vagas oferecidas pelas faculdades e cursos superiores então existentes. Convém ainda chamar a atenção que o Anchieta, embora disputando hoje o espaço com dezenas de escolas públicas e privadas, de alguma forma, continua cumprindo a sua missão original, isto é, oferecendo um ensino de qualidade e uma sólida formação do caráter aos alunos que o freqüentam.
Acontece que para os jesuítas a finalidade dos colégios, universidades e demais instituições de ensino que mantém, perseguem um objetivo que ultrapassa em muito a simples formação acadêmica ou profissional. Esses não passam de instrumentos limitados que exigem a complementação por outros