A Natureza como Síntese

A Natureza existe e subsiste sem o Homem, mas, o Homem não existe nem subsiste sem a Natureza

Em dezembro de 2015 realizou-se em Paris a Conferência Internacional do Clima. Reunidos estavam os chefes dos governos das grandes potências, dos emergentes além de representações de países do terceiro mundo. O show foi comandado pelas estrelas dos primeiros. Nesse cenário não podiam deixar  de se fazer ouvir as vozes das organizações que pululam pelo mundo a fora, com o propósito sincero ou nem tanto de salvar o que sobrou da natureza, “a casa” da humanidade, o lar no qual surgiu a espécie humana,  se abriga e se sustenta. Desde o momento em que  o primeiro dos seus representantes começou a respirar o ar das suas florestas e savanas, servir-se de suas dádivas. essa casa foi seriamente maltratada com o andar dos séculos e milênios. O estrago causado é de tal ordem que, com razão, preocupa grandes e pequenos, pobres e ricos, poderosos e humildes, governantes e o povo em geral. Afinal essa “casa” abriga a todos e a todos sustenta. Sua degradação termina atingindo  indistintamente a todos. Primeiro e o mais cruelmente os menos favorecidos, mas é uma questão de tempo para que cobre seu preço também aos poderosos e aos magnatas. A prova está aí. A cúpula do poder político somada à cúpula do poder econômico, encontraram-se em Paris para ouvir o grito de socorro dessa “nossa mãe e pátria”, como a chamou o Pe. Balduino Rambo, maltratada até o irracional pelo homem “racional”.

Diante da gravidade  da situação e da obrigação de uma modesta contribuição para colaborar com esforço universal pelo bem estar da “nossa casa”, na definição do Papa Francisco” na sua Encíclica “Laudato Se”, ofereço aos frequentadores do meu Blog, 80 reflexões, nas quais pretendo que a Natureza é uma gigantesca unidade, finamente calibrada e de alta resolução. Interferir nessa Unidade ou Sistema, mesmo em seus mínimos detalhes, termina afetando o Todo, proporcionalmente à extensão e profundidade da agressão. 

Seguem postagens de dois em dois dias.

Chegou-se ao limite e se tornou urgente uma tomada de posição, definir políticas globais e partir para ações concretas sérias, isentas e desinteressadas. O momento é de tomar decisões para valer e firmar compromissos objetivos e sérios para enfrentar o problema. O debate não pode  estagnar e esgotar-se no nível de uma cortina de fumaça de belas e sonoras intenções; não se soluciona com critérios econômicos; não se avança na solução dos  problemas ambientais com iniciativas turbinadas  por toda a sorte de ideologias e ou interesses não confessados ou não confessáveis. Não há mais tempo a perder pois, a questão ambiental é urgente e complexa demais. 

No texto abaixo não se pretende refletir ou analisar políticas públicas, políticas de natureza geoeconômica, considerações de natureza ecológica, ou propostas concretas de ação. Deixamos esse lado da questão para os respectivos especialistas, peritos, ativistas e outros mais,.
O que de fato nos interessa é um pressuposto que deveria conferir uma bases sólida para essa preocupação que, se não for tomado em consideração, mais, se não for colocado como fundamento, qualquer  esforço carece de solidez. É preciso responder a pergunta aparentemente singela e óbvia: “O que é a Natureza, qual a sua essência?” Será que ela se resume num conjunto aleatório e fortuito de elementos químicos, estruturas minerais, variáveis climáticas, a micro e nano fauna, as plantas e animais superiores e no meio de tudo isso o homem?. Quem sabe é uma máquina finamente calibrada, funcionando à maneira de um robô? ou a natureza tem algo de tudo isso mas sua essência ultrapassa o nível da mecânica para situar-se  num patamar mais acima e mais além?

O avanço e o resultado das pesquisas científicas levou um número crescente de especialistas a conceber a natureza como o resultado de uma engenhosa síntese. O aprofundamento dos estudos de química, física, biologia, paleontologia, genética, fisiologia, botânica, zoologia, ecossistemas, astrofísica, os organismos vivos e os sistemas, está a convencer um número sempre maior cientistas e dos melhores, a conceber a natureza como uma harmoniosa síntese. Essa síntese não  se resume na soma dos elementos que a compõem, senão pela complementaridade funcional.

A compreensão da natureza posta nessa perspectiva, uma conclusão entre muitas assume um significado todo especial.  O esforço das Ciências Naturais centra-se na compreensão do “como” a natureza foi e está estruturada. Falando em síntese, essa é apenas uma face dessa questão tão complexa. Falta explicar e responder a outra que pergunta pelo “donde”, o “para que” e o “para onde”. Qualquer esforço em busca de uma síntese, terminará em frustração, no caso de se ignorar, pior, desqualificar ou até negar uma dessas duas dimensões da síntese. Para responder ao “como”, as Ciências Naturais dispõem de métodos, ferramentas e competência. Quanto à reposta pelo “onde”, o “para que”, e o para “onde”, os métodos, as ferramentas e a competência são das Ciências do Espírito, das Ciências Humanas, inclusive das Letras e Artes. Sendo assim a construção de uma síntese da natureza digna desse nome, só então terá chances de sucesso, quando em seu edifício contribuírem proporcionalmente todas as áreas do conhecimento. É indispensável que as Ciências todas, as naturais, as espirituais e todas as demais, se encontrem e se comprometam e, num esforço  interdisciplinar honesto e isento,  realizar a tarefa. Para tanto pressupõe-se uma linguagem que ambos os lado entendem e a partir de questionamentos que em princípio interessam a todos, como: “como começou tudo?”; “ o destino final?”; “uma teleologia comanda ou não  os processos?”; enfim, “a razão ou não razão de ser da natureza como “a casa”, “a querência, “a mãe e pátria da humanidade?”. 

Nas reflexões que seguem, depois de um capítulo introdutório que se ocupa com a inserção existencial do homem na natureza, dedicamos o restante do texto à compreensão da natureza de sete cientistas mundialmente respeitados nas respectivas especialidades. Três deles, Erich Wassmann estudioso das colônias de formigas e térmites e sua relação simbiótica com fungos, Teilhard  de Chardin paleontólogo, paleoantropólogo e filósofo, Balduino Rambo botânico e ambientalista, foram jesuítas. Sua compreensão da natureza evidentemente leva as marcas dessa filiação. Hans Driesch foi biólogo e filósofo e como o também biólogo Ludwig von Bertalanffy  cientista secular. Francis Collins e Theodosius Dobzhansky, contam entre os mais respeitados geneticistas, o primeiro em genética médica e o segundo como um dos sistematizadores  da genética como ciência. Não os limita nenhum compromisso confessional. O último é Edward Wilson entomólogo dos mais respeitados e autoridade maior em ecossistemas naturais e humanizados. Auto define-se como “humanista secular”. 

Os cientistas citados partiram de uma base de formação bastante diversificada e dedicaram-se a objetos e áreas de investigação distintos. Às conclusões  que os levaram aos  resultados de seus projetos, porém, apontam para a mesma direção. A natureza é uma síntese de alta complexidade. As funções dos elementos que entram na sua composição são complementares em vista do todo. Formam um intrincado sistema, melhor uma síntese, na qual não se subtrai ou se degrada nenhum componente, por insignificante que possa parecer, sem de alguma forma danificar o todo, a totalidade. Sendo assim, no fundo no fundo, a questão ambiental reveste-se de um significado e de uma importância que extrapola as fronteiras do político, do econômico, do cultural, do técnico, inclusive do científico. Vai assumindo as características de uma questão de ética natural. A lógica é simples e retilínea. Se o homem, pelos menos quanto ao organismo biológico, é mais um rebento da evolução da natureza, se passa a sua existência nela vivendo dos seus recursos, a natureza é um bem comum. Como tal qualquer pessoa, independente da sua condição social, tem o direito de usufruir dos recursos necessários a uma existência digna e, consequentemente o direito de viver num ambiente natural sadio e favorável à sua saúde material e espiritual. Sendo assim a motivação radical de qualquer ação ou intervenção não pode ignorar esse direito natural e, consequentemente, ignorar o princípio ético nele implícito. 

This entry was posted on sábado, 16 de outubro de 2021. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Responses are currently closed.