Bicentenário da Imigração - 4

Personalidades fortes

Personalidades dotadas de um físico robusto e sobretudo dotadas de um caráter sólido, retilíneo, coerente, acompanharam sempre os grandes lideres, os grandes chefes, os reis e imperadores, os comandantes nos campos de batalha, os príncipes na condução dos seus domínios, os bispos à testa das suas dioceses, os missionários na pregação do evangelho. Entre eles não havia lugar para fracos, para pusilânimes e, menos ainda, para medrosos e covardes. Tanto os povos germânicos conhecidos por Tácito, como seus herdeiros mais de dois mil anos depois, se renderam como se rendem ainda ao fascínio e à mística das personalidades fortes. É neste contexto que é preciso entender a afirmação de Anton Stonner, ao mostrar como, na cristianização da Europa Central e do Norte, a personalidade forte dos missionários foi decisiva. 

Avaliando-se (os missionários, religiosos e bispos) e empregando os mesmos conceitos da nossa terminologia atual, somos obrigados a dizer: os homens que protagonizaram a conversão ao cristianismo, conquistaram o reconhecimento por meio da sua coragem, do seu arrojo e da solidez do espírito. Tornaram-se guias espirituais devido às suas qualidades de liderança, como se conta do abade de Corbie: Era um homem que falava pouco, realizava muito e dominava a pessoas com os eu olhar de fogo. (Stonner, 1934, p. 20)

O “olhar de fogo” que impressionou tanto o cronista do abade de Corbie, reaparece em relatos cronologicamente muito próximos a nós, caracterizando missionários vindos da Europa para o Sul do Brasil. Num dos seus famosos contos em dialeto, o Pe. Balduino Rambo, conta como foi a primeira visita do padre Johannes Rick, originário do Tirol do norte na Áustria, aos colonos pioneiros na fronteira de colonização no oeste de Santa Catarina, na década de 1930. 

O padre chegou a cavalo. Era um homem enorme, de ombros largos, braços compridos, punhos imensos, cabelos negros e o rosto cheio de sulcos e rugas, como que esculpido num tronco de louro. Quando apertou as mãos dos pioneiros e os encarou com seus olhos castanhos, todos se convenceram: este é o padre certo para nós. Não é de “frescuras” e, com seus olhos, nos penetra a nós colonos, até os ossos”. (Rambo Balduino, 2002, Vol. I. p. 288)

No mesmo contexto o autor põe na boca de um líder do grupo de pioneiros, o espírito que os animava ao enfrentarem a mata virgem. Depois de contar as peripécias próprias dum começo como aquele: seca, praga de gafanhotos, peste suína, ataque de bandos de revolucionários, perseguição política etc., concluiu:

Olha, padre, e tudo isso não nos abateu a nós moradores emigrados da Picada do Pote do Leite. Somos como aquela canafístula no alto do morro. Nenhuma tormenta conseguiu abate-la. Floresce todos os verões e não se importa se sobre seus galhos andam os macacos e os coatís e sobre eles pousam os urubus.
 (Rambo Baluino, 2002,Vol. I, p. 294

Ilustrativo é também o depoimento de um antigo aluno do Ginásio Conceição, em São Leopoldo, no início do século XX, Aparício Torelli, o Barão de Itararé. Na despedida, após concluir os estudos, descreveu assim um dos seus mestres, o mesmo  jesuíta tirolês citado há pouco, descendente, portanto, dos alamanos que se fixaram na região dos Alpes, no século quarto e quinto da nossa era. 

Como último na portaria, topei com o Pe. Rick. Pousou suas mãos incrivelmente grandes sobre os meus ombros, cravou seus olhos castanhos puxando para o amarelo, nos meus, perguntou-me com uma voz que retumbava como o canto de guerra dos germanos: “Então, meu filho, o que pretendes ser?” Respondi, tremendo que pretendia estudar direito. “Tu e jurisprudência! Vai meu filho. De ti nunca sairá algo que preste!” Lembrando-me do total fracasso na matemática, anotei a terrível profecia. Desisti da jurisprudência e entrei no círculo dos literatos. Com que sucesso? Deixo que meus leitores decidam. (Rick, 2004, p.19)

Os depoimentos que acabamos de registrar soam, na verdade, como o eco dos antigos escritores que foram os grandes admiradores da natureza humana em seu estágio primigênio: um misto de rudeza e autenticidade, que marcavam os povos germânicos. César relatou.

Consta, conforme nos informam os nossos, o que nos relatam os gauleses e os comerciantes, quando destacam nos germanos a enorme estatura, a incrível valentia e destreza nas armas. Contam que, ao se encontrarem com eles, não foram capazes de suportar o seu olhar e os seus olhos penetrantes. Isto atemorizou de tal forma o exército como um todo que a coragem deu lugar a uma perplexidade generalizada. (cf. Tácito, p. 87)

E Sêneca em “De Ira”, 11.

Quem é mais corajoso do que os germanos? Quem mais agressivo no combate? Quem mais dado às armas? Neste clima, nascem e são educados. Nisto depositam todas as suas preocupações, enquanto não dão valor nenhum às outras coisas. Quem é mais forte e mais temperado para suportar tudo? Na maioria dos casos, não dispõem de vestimenta para o corpo, nenhuma proteção contra o clima eternamente frio. Ensinai-lhes a ponderação, ensinai-lhes a disciplinar seus corpos e seus corações valentes, que não conhecem prazeres, que não conhecem vida tranquila, e estaremos de volta por assim dizer, aos autênticos costumes romanos. (Sêneca, p. 87)

Na  tradição germânica, o matrimônio monogâmico e vitalício, formava a base da família e ela, por sua vez, representava o fundamento último do edifício social. O papel da mulher não pode ser ignorado. Numa sociedade em que o arrojo, a valentia, a força física e moral ocupava o primeiro lugar entre as virtudes de um homem, a parceria com uma mulher igualmente  ousada e destemida, conferia a qualquer empreendimento uma dinâmica e um ritmo todo peculiar pois, como observou Stonner,

Também nesta parceria, isto é, na construção da cultura, da etnicidade como um todo, homem e mulher atuavam juntos como camaradas. E neste sentido é significativo como se avaliam mutuamente, e qual a atitude externa e interna que cultivam um em relação ao outro. (Stonner, 1934, p. 37)

Bicentenário da Imigração - 3

Amor à natureza e ao torrão natal

Não há necessidade de encarecer que os povos da antiga Germânia, vivendo a sua história em contato  diuturno com a natureza, cultivassem com ela uma relação íntima e existencial. As decisões importantes e de interesse comum, costumavam ser  tomadas em assembleias da comunidade, da tribo ou da parentela, na sombra dos bosques, nas proximidades de fontes, de arroios ou sob a copa de carvalhos sagrados. Nesses ambientes, aconteciam também os cultos em que se veneravam as divindades personificadas em fenômenos ou entes naturais, como o sol, a lua, a mãe terra. A religião dos antigos germanos foi uma religião profundamente enraizada na natureza. Nela se venerava a terra, a água, o fogo, o sol, a lua, o dia, as estações do ano, a tempestade, a tormenta, a germinação, a fertilidade, o explodir da brotação e o fenecer da vegetação. Numa invocação anglo-saxônica, a terra é saudada como a mãe dos homens. “Glória a ti, mãe dos homens”. Tácito ao falar sobre as crenças germânicas, destacou que  a terra gerou originalmente o deus Tuisto, do qual descende Manus, o que significa homem, e este novamente gerou três filhos, que foram os ancestrais dos germanos. O culto ao sol, à lua e às estrelas foi imortalizado em imagens de ouro e, ainda hoje é lembrado, quando, no alemão, o domingo é o dia do sol –“Sontag”, a segunda-feira é o dia da lua -“Montag”, Donnerstag-dia do Trovão. Muitos outros exemplos poderiam ser enumerados.

Quando, dois mil anos mais tarde, os descendentes remotos desses povos se fixaram no sul do Brasil, trouxeram consigo, como herança preciosa, mais esta faceta dos seus ancestrais. Uma compacta floresta subtropical cobria as áreas destinadas pelo Império do Brasil, para serem povoadas  pelos imigrantes procedentes da Europa do Norte e Central. Comparadas com as florestas europeias, notava-se uma diferença flagrante. As espécies dominantes  naquelas, nessas foram substituídas por outras desconhecidas na Europa. Em vez de carvalhos, faias, abetos, tílias, plátanos, castanheiras, bordos, bétulase outras mais, as responsáveis pelo perfil da mata virgem brasileira, eram louros, cedros, cabriúvas, angicos, cangeranas, canafístulas, grápias, araucárias e outras tantas. Além das araucárias em altitudes maiores, inexistiam coníferas de importância  numa floresta em que, espécies de folhas em parte perenes se alternavam com espécies de folhas caducas. Sob as copas dos gigantes vicejava uma vegetação arbustiva  e rasteira, em muitos casos, impenetrável pela densidade, pelo emaranhado e pelos espinhos. Agarrando-se e subindo até as copas mais altas, dezenas de espécies de cipós, tornavam a penetração e o  trânsito pela floresta ainda mais desafiador. Com essas características, a primeira visão da floresta brasileira não deixou de assustar, de impressionar, ao mesmo tempo, de despertar um profundo fascínio nos filhos das florestas germânicas. Sentimentos deste tipo encontram-se registrados em relatos de viajantes e em depoimentos dos próprios colonizadores. Avé-Lallemant assim pintou a impressão que teve ao avistar a Walachei e  o Jammertal:

A visão da Walachei e do Jammertal é grandiosa. Será difícil encontrar sequências tão selvagens de mata como aquelas. É difícil localizar as áreas cultivadas no fundo escuro das gargantas. É preciso coragem para embrenhar-se no vale, antigo refúgio de índios, onças e tapires. (Cem anos de germanidade, 1924, p. 103-104)

Um outro componente que conferia àquelas matas um toque adicional de mistério foram as montanhas da região, elevando-se a altitudes de até 800 a 900 metros, inteiramente cobertas  de mata fechada. Nas encostas, formando escarpas, gargantas e peraus, cavernas, refúgios e abrigos naturais serviam, desde tempos imemoriais, de esconderijo para onças, pumas, jaguartiricas e porcos do mato. Nos galhos e nas copas das árvores, reinavam soberanos, os bugios, os micos, os coatís e uma infinidade de espécies de pássaros de todos os tamanhos e coloridos, enchendo a penumbra da mata com a  sinfonia dos seus gritos, pios, assobios e cantos.

Não demorou e os colonizadores se depararam com um inesperado fator de temor e constante sobressalto. Nos matos de toda a região, vagavam seminômades as tribos dos indígenas espoliados de suas terras. Pensando bem, pelo princípio do “ius primi possidentis”, eram eles os legítimos donos daquelas terras. Do seu ponto de vista  os imigrantes não passavam de usurpadores dos seus  domínios. De outra parte, porém, os colonos não alimentavam a mínima dúvida de que as terras que estavam ocupando, lhes foram legitimamente entregues pelas autoridades imperiais, cuja competência ninguém discutia, ou doadas, adquiridas por ocupação ou, mais tarde, por compra.

O que interessa não é a discussão em torno da legitimidade ou não-legitimidade em relação à posse daquelas terras, nem pelos imigrantes, nem pelos nativos. O importante é mostrar como a floresta que os imigrantes foram obrigados a enfrentar, oferecia  mais este complicador. Encontros diretos com os índios, com os “bugres”, como eram chamados no quotidiano da colônia, contam-se em poucas dezenas. Limitam-se a alguns raptos de crianças e mulheres, alguns assassinatos e assaltos a propriedades, seguidos de roubos de animais e produtos das roças. 

Em poucas palavras, foi esta a floresta oferecida aos imigrantes com a finalidade de transformá-la em terra arável e produtiva: uma floresta exuberante, imensa, densa, quase impenetrável, exercendo uma atração carregada de temor ao desconhecido e, ao mesmo tempo, alimentado pelo imaginário  de uma terra de promissão. A literatura regional em língua alemã, tanto na erudita, quanto na dialetal, dão conta do fato em inúmeras referências. Como amostra alguns exemplos.

Sempre que um grupo de pioneiros dava início à abertura de uma nova picada e principalmente a uma nova fronteira de colonização maior, fazia proceder o começo da obra, com um ato religioso, de preferência uma missa ou um culto quando se contava com a presença de um padre ou um pastor. O ato era realizado na sombra dos gigantes da mata, no clima místico inspirado pela penumbra e aos sons melodiosos das criaturas da floresta. O P. Ambros Schupp relata que a implantação da Colônia de Santa Cruz do Sul teve como ato inicial uma missa rezada sob uma vigorosa figueira do mato. Fato similar foi registrado  para o início da colonização de Cerro Largo e mais  tarde, Porto Novo, no oeste de Santa Catarina.

O fascínio pela mata virgem foi de tal ordem que o termo “mata virgem” – “Urwald” vinha acompanhado por um apelo irresistível. Do quotidiano dos imigrantes faziam parte  termos como “colono da mata virgem”, “pioneiro da mata virgem”. “gigantes da mata virgem”, (Urwaldbauer, Urwaldpionier, Urwaldboden, Urwaldriese ...). Nos relatos históricos sobre a imigração e colonização alemã no Sul do Brasil,  fala-se até numa relação quase doentia com a mata virgem, que fazia com que não poucos fossem incapazes de viver longe dela. Encontravam-se em constante migração para novas fronteiras de colonização. Falava-se nesses casos da “doença da mata virgem” – “Urwaldkrankheit”. 
 
Numa conversa sobre os novos assentamentos no rio Uruguai, Josefine Wirsch  confirma esse espírito da boca de um colono de meia idade: “Se minha mulher e meus filhos estivessem de acordo”, afirmou com emoção, “como gostaria de novamente participar na derrubada da floresta virgem e recomeçar tudo do começo”.

“Como pode fazer essa afirmação”, ousei interromper, “Como é possível  o senhor desejar tal coisa”! O senhor com a sua rica propriedade, na qual tudo está organizado; com sua bela criação de animais e a bela terra, tudo resultado do seu trabalho”.

“Aí está e exatamente a questão” e pôs-se em pé e cruzou os braços. “Aqui tudo está feito, tudo arável. Isso já não se chama mais um trabalho de verdade. A senhora não se pode imaginar que disposição resulta do enfrentamento com a floresta virgem, arrancar dele pedaço por pedaço – Força contra força”!

Tive que admirar esse homem na sua postura – um homem robusto, os músculos temperados no enfrentamento com a natureza – num embate do qual saíra vitorioso e comecei a entender como é possível que, num trabalho sobre humano desses se esconda um fascínio que não deixa de cativar as pessoas.

A mesma opinião ouvi também de um dos sacerdotes pioneiros da florestas virgens. Num encontro do idoso senhor, referi-me à conversa com o referido colono. O idoso padre jesuíta, um figura veneranda com um comprida barba branca, falou: “Veja senhora, é o que costumo dizer, a floresta não nos larga. Como tenho saudades das minhas picadas na floresta virgem, dos meus pioneiros na floresta virgem, das minhas cavalgadas pela floresta virgem”! Falou essas palavras num tom de nostalgia. Durante décadas exercera a pastoral na região das florestas no Rio Grande do Sul e agora goza do merecido descanso numa simpática e bela povoação.

Parece que não há necessidade de insistir no fato de que os imigrantes procedentes da Europa Central e do Norte, apesar da distância geográfica e cronológica de muitos séculos que os separava das raízes, continuaram sendo, na sua essência, uma estirpe humana intimamente vinculada à floresta e alimentando-se de suas dádivas e valendo-se dos seus estímulos e símbolos. Sob a inspiração do entorno natural em que a floresta representava a realidade mais marcante, construíram, também em terras brasileiras,  todo um  imaginário e o transformaram num rico referencial simbólico de metáforas profundas, envolvendo o homem, a floresta e seus habitantes. 

A literatura histórica está repleta de exemplos que comprovam o que acabamos de afirmar. Enumera-las, mesmo em parte, extrapola os objetivos deste trabalho. 

Ainda hoje, é comum escutarem-se afirmações  como esta, entre os descendentes dos imigrantes europeus no sul do Brasil: “resistentes às intempéries” – “Wetterfest”; “incorruptível como o cerne da cabriúva”; “sólido como a canafístula”; “personalidade de um pinheiro”... Embora o entorno geográfico seja outro, assim como os referenciais simbólicos, o significado permanece o mesmo, apesar do tempo e do espaço que separam os ancestrais da Europa Central dos seus descendentes remotos no sul do Brasil. A história foi passando, mas não esquecida.

Bicentenário da Imigração - 2

A Gênese da Germanidade

Na sombra do carvalho

O Pe. Balduino Rambo definiu numa só frase a relação existencial  do homem com o chão em que vive e seu pertencimento ontológico a ele: “O homem filho desta terra, que lhe fornece o pão de cada dia e os símbolos da sua vida espiritual, sente um respeito inato perante a fisionomia desta sua mãe e pátria” (Rambo, 1942, p. 337). Sem tomar em consideração as circunstâncias físicas e geográficas, é impossível entender as histórias dos povos e a gênese das suas identidades étnicas. Na reflexão a que damos o sub título “Na sombra do Carvalho”, tentamos mostrar como essa afirmação encontra a sua confirmação na tradição cultural vivida pelos imigrantes alemães e seus descendentes no sul do Brasil. Desde a remota pré-História os povos germânicos dos quais descendem os “alemães” vindos para o Brasil, viveram e consolidaram suas tradições em meio às florestas que cobriam a Europa central e do norte. Pela sua imponência, seus troncos milenares, suas raízes sólidas encravadas no chão, o carvalho tornou-se o símbolo da história e da solidez do caráter étnico dos povos daquelas paragens, tão admirados por Tácito. Na sombra de carvalhos celebravam-se armistícios, decidiam-se guerras, celebravam-se as efemérides importantes das comunidades. A derrubada do carvalho sagrado por São Bonifácio convenceu os germanos de que o Deus dos cristãos era mais poderoso do que Thor, e em massa, converteram-se ao cristianismo. 

A “Sombra do Carvalho” como metáfora cobrindo  vastas regiões da Europa e, pela emigração avançou sobre países em outros continentes, também sobre o Brasil, a partir do sul. Onde quer que a “sombra do Carvalho” convida para a reflexão, estão presentes também as características do “rebento do carvalho”, transplantado para o Brasil: O amor à natureza e à querência natal – a Heimat; a paixão pela floresta virgem como cenário de múltiplos simbolismos; a família como núcleo da comunidade e esta como base da sociedade mais ampla; o papel da mulher na sociedade germânica; a lealdade aos chefes; o fascínio pelas personalidades fortes; a retidão de caráter; a religiosidade.

Floresta e germanidade
Depois desse panorama introdutório passamos a concentrar a atenção no cenário no qual,  nos últimos dez mil anos, consolidou-se a gênese de uma estirpe humana, de uma civilização que terminou por projetar a sombra da sua influência sobre vastas áreas, também fora da Europa.

Em linhas gerais essa paisagem de florestas estendia-se entre o Reno, os Alpes, o Mar do Norte, o Báltico e no leste até as imensas estepes da Rússia. Uma poderosa floresta mista na qual se alternavam os gigantes de folhas caducas com outros gigantes de agulhas perenes. Abetos, álamos, pinheiros, bordos, tílias, castanheiras, plátanos e o soberano de todos, o carvalho com suas variedades, reinavam nessas florestas. 

Pois foi nas entranhas das florestas da Germânia que nos últimos dez mil anos dezenas de estirpes, tribos e povos, consolidaram as bases de uma civilização rica, vigorosa e em extremo dinâmica. E nesta história o carvalho, a mais vigorosa, a mais frondosa, a mais duradoura e a mais longeva das espécies daquelas florestas, transformou-se no símbolo das culturas em formação. 

Na antiga mitologia germânica, o deus da guerra está associado ao carvalho. Quando no século XIX, as ondas nacionalistas e restauracionistas que seguiram à derrocada do império napoleônico, buscavam voltar aos tempos ideais anteriores à Revolução Francesa, o carvalho e Thor retornaram. Neles se viam as raízes do antigo, da fidelidade, do duradouro. Nas pinturas de Caspar Friedrich (1774-1840), o maior expoente do romantismo alemão na pintura, o carvalho, sempre de novo, vai aparecer ao lados dos túmulos de heróis ou junto a mosteiros. Nos heróis e nos mosteiros, os carvalhos, cujos troncos estão repletos de  nós e nódulos, que não se vergam e cujas raízes remontam à longa ancestralidade, são testemunhos da fidelidade. A durabilidade de suas raízes, aliás, é metáfora para todo aquele que não nega as suas origens e que lhes é fiel. (Dreher, in o Rebento do Carvalho, 2002, p. 3)

Fica mais do que claro nesta citação de Martin Dreher como nas entranhas das florestas da Germânia, uma única espécie de árvore, o carvalho, reuniu em si, como que  numa síntese, o significado, a essência, os valores de uma história cultural. Na sombra dos carvalhos reuniam-se os guerreiros germânicos para reafirmarem perante si mesmos, perante os companheiros, perante o seu povo e, principalmente, perante Thor, o compromisso, o juramento de fidelidade às divindades, ao povo, à tradição, às raízes, com todos os seus valores. No decurso de séculos e milênios consolidou-se  na sombra dos carvalhos da Germânia a linha mestra que até hoje marca  o perfil das instituições que, de alguma maneira, são suas herdeiras: as famílias reunidas em comunidades, em estirpes e em parentelas. Nesta organização de base resolviam-se  todas as questões de interesse comum. Os conselhos tribais julgavam os desvios de comportamento e os crimes que afetavam a harmonia interna ou abalavam as estruturas comunais, ou simplesmente as afrontava. Aplicavam-se penas aos infratores inclusive a pena de morte nos casos mais graves. Não importava se era o todo da  assembleia comunal que decidia ou se a decisão era confiada aos anciãos, aos conselhos escolhidos pelos membros da comunidade, da tribo ou da estirpe. Todas essas modalidades de organização tinham na sua base, na sua essência, a mesma concepção organizacional da sociedade: a família monogâmica congregada em torno de um conjunto de valores sociais, éticos e religiosos, aceitos e defendidos como pressupostos para o bem estar do indivíduo e da coletividade. Ao grupo local cabia zelar pela observância das regras, dos dispositivos e instrumentos que a tradição e a longa prática haviam consagrado. 

Vale a pena examinar mais a fundo alguns dos componentes mais significativos que moldaram o caráter histórico e cultural dos povos da antiga Germânia. Muitos deles entraram como traços constitutivos da cultura ocidental amalgamados com a herança grega, romana e cristã. É notável como, em momentos históricos decisivos, em que os herdeiros  remotos dos antepassados germânicos participaram ou foram os protagonistas principais, muitos desses traços marcantes afloram, ou irrompem com todo o seu vigor primigênio. Momentos como a invasão dos bárbaros no Império Romano, as expedições dos Normandos e Vickings, a conquista das Américas não deixam dúvidas. A colonização por povoamento das mesmas Américas e parcelas de outros continentes, no decorrer dos últimos 200 anos, o arrojo e a ousadia dos navegadores e exploradores, o espírito com que os missionários se entregaram de corpo e alma às missões  em todos os continentes, permitem ler nas linhas e perceber nas entrelinhas, os mesmos elementos dinâmicos. Tentamos apontar os mais significativos.

Bicentenário da Imigração - 1

Introdução

No dia 25 de julho de 2024 comemora-se a data do bicentenário da imigração alemã no Brasil. Entre as muitas modalidades para lembrar a efeméride, constam publicações referentes à essa história. Como  nos últimos 30 anos dediquei grande parte do meu tempo, das minhas pesquisas e publicações, com foco nos diversos aspectos da inserção dos imigrantes alemães e seus descendentes no todo da nacionalidade brasileira, decidi-me  oferecer aspectos significativos dessa trajetória ao público interessado. A grande maioria das matérias da série que segue, foi publicada em revistas especializadas de dentro e fora do País. Pelas suas características cabe à  série o título: Flagrantes dos 200 anos da Imigração Alemã no Brasil. Começa com uma reflexão sobre a “Gênese da Germanidade e a comparação da presença alemã na América Latina, com ênfase para a Argentina, o Chile e o Brasil, desde o período em que esses países ainda eram colônias da Espanha e Portugal e depois de se tornarem independentes. O objetivo central, porém, é a imigração alemã no Brasil, com destaque para lances de maior significado nesta história que completa  dois séculos.

A presença alemã nos diversos países da América Latina seguiu em todos eles um modelo muito parecido. No período colonial dos primeiros três séculos, os encontramos integrando a tripulação dos navios espanhóis e portugueses como peritos em navegação, como canhoneiros, como escrivães de bordo, integrantes dos batalhões de conquista, etc. Logo depois da consolidação das primeiras  praças de comércio entram em cena comerciantes alemães, muitos deles a serviço de importantes casas como os Welser e Fugger, da Companhia das Índias, e outras. Nestes casos combinava-se, não raro, um misto de espírito comercial com o aventureiro que fez com que os personagens mais conhecidos tenham sido representantes paradigmáticos da mentalidade da época, na prática comercial, na implantação e consolidação dos empreendimentos mais diversos e na colocação das bases que posteriormente orientaram  a gênese, a dinâmica e a evolução da história da América Latina. 

A conquista da América Latina pelos portugueses e principalmente pelos espanhóis não pode ser entendida sem que se incorpore nela a conquista espiritual. O espírito que animava a conquista pelas armas, a conquista pelo controle das riquezas do continente, a conquista pela efetiva e definitiva presença ibérica, a conquista pelo povoamento, teve como alma, como justificativa, como uma das formas de legitimação, a conquista espiritual. Foi nessa ação que entraram os missionários das mais diversas ordens religiosas: franciscanos, dominicanos, mercedários e principalmente jesuítas. O geral da ordem dos jesuítas criara em 1607 a província do Paraguai, encarregando-a da “Conquista Espiritual”, como o Pe. Ruiz de Montoya classificou a missão da ordem na América Latina. Com a revogação da proibição imperial que impdedia a entrada de estrangeiros nas colônias espanholas, elevou-se consideravelmente o número de jesuítas de língua alemã  entre os missionários em atividade nas colônias do Prata e demais regiões do continente. Aos jesuítas alemães coube de modo especial a transferência de tecnologias e de conhecimentos artísticos de toda espécie trazidos da Europa. Otto Quelle, citado em “Die  Deutschen in Lateinamerika – Schicksal und Leistung, p. 46, resumiu numa frase a contribuição dos jesuítas alemães: “Fazendo-se um balanço da atividade desses missionários alemães em tantos lugares na América Latina no período que vai de 1660 – 1770, estamos diante da maior obra cultural realizada por alemães na América Latina, nos séculos XVII e XVIII”. (Fröschle, 1984,  p. 46)


Os alemães, além de participarem na exploração dos caminhos marítimos e terrestres de acesso a América Latina  e no interior de seus territórios, além de integrarem as equipes de missionários, principalmente jesuítas; além de contribuírem ativamente na implantação e na consolidação e ampliação do comércio; além de desempenharem um papel fundamental na pesquisa pioneira dos recursos naturais minerais, vegetais e animais; além de contribuírem decisivamente na transferência de todo o tipo de tecnologias trazidas da Europa para as colônias espanholas e portuguesas; além de tudo isso, os alemães  tiveram um papel de fundamental importância na história da vida pública das colônias e mais tarde dos países da América Latina. A sua presença e a participação foi determinante e em muitos casos decisiva na condução político-administrativa de vários dos mais importantes países do continente. Os casos mais exemplares encontramos no Brasil, na Argentina e no Chile.  Há, porém, um setor da história pública dos países latino-americanos, e, novamente com destaque para o Chile, a Argentina e o Brasil, em que a contribuição alemã não pode ser ignorada. Referimo-nos aos  alemães incorporados como soldados e principalmente como oficiais com patentes superiores nas tropas destes países. A organização, as táticas militares e principalmente o princípio da disciplina teve uma forte inspiração no modelo prussiano. Figuras proeminentes da história militar dos três países acima mencionados, foram oficiais alemães contratados para executarem  tarefas específicas ou foram oficiais que fizeram carreira nos vários exércitos, conquistando os postos mais altos na hierarquia. Exemplos concretos serão mencionados quando nos ocuparmos com cada um dos países onde a presença militar alemã foi mais visível e mais permanente. 

Durante o período colonial os alemães não chegaram a constituir grupos maiores estáveis muito menos comunidades étnicas. Muitos deles permaneceram definitivamente no continente, tiveram filhos com portuguesas, espanholas, crioulas, mestiças e com frequência com índias. Seus nomes sofreram corruptelas nos registros ou foram definitivamente substituídos por nomes espanhóis ou portugueses. Desta forma suas obras, seus feitos e suas contribuições relacionam-se mais com os indivíduos que as desenvolveram a convite de governos coloniais ou por conta própria, do que com as organizações ou centros de pesquisa que por acaso fundaram. 

Na maioria das vezes viviam com uma ou mais índias. Assim, conquistadores e conquistados amalgamaram-se num único povo. Também os descendentes dos alemães diluíram-se nessa raça mestiça europeia-índia. Na maioria dos casos seus nomes sofreram corruptelas pelos escrivães espanhóis ou hispanizados pelos próprios portadores”.  Depois da renúncia de Carlos V somente alemães esparsos chegaram até a América Espanhola. Desta forma o elemento alemão representa apenas uma gota na mistura de sangue da qual procedeu o “crioulo”. (Fröschle, 1984, p. 45.)

Nas páginas que seguem  tentaremos caracterizar a presença alemã no Chile na Argentina e no Brasil  durante o período colonial desses países. Mas como pano de fundo é preciso traçar o perfil desses imigrantes e em que circunstâncias históricas ele foi moldado.

Crônica de Bom Jardim ( Ivoti )

Zero Hora - Ed. 18 de março de 2022

Editora Oikos  Erny Mugge
Deitando Raízes 
Tradução e Organização Arthur Blasio Rambo 



Bicentenário da Imigração

Em 2024 comemoramos o bicentenário da Imigração Alemã no sul do Brasil. As postagens que seguem pretendem destacar aspecto importantes desse acontecimento.

Sumário
Apresentação
Introdução
A gênese da germanidade – Na sombra do Carvalho
Alemães na América Latina no período colonial
A imigração alemã nos século XIX e XX para a Argentina e Chile  
Imigração alemã para o Brasil no século XIX e XX.
A imigração para o Brasil  -  Propaganda e Realidade
Contribuições dos imigrantes alemães
Modelos de colonização
A dinâmica da expansão colonial
O Sul muda de fisionomia
O Caixeiro Viajante
A Igreja dos imigrantes
A religiosidade no quotidiano dos imigrantes
A Restauração Católica no sul do Brasil
A Missão dos jesuítas no sul do Brasil
A Escola comunitária e o Professor comunitário
O Projeto social dos jesuítas no sul do Brasil
Nacionalização e ação policial no Estado Novo
Religião e participação política
Práticas de Medicina
A educação do corpo – “Turnen”.
A imigração alemã e meio ambiente
A imprensa teuto-brasileira
A Trajetória da Integração
Bibliografia


Prefácio

“A história da humanidade é a história das migrações e suas consequências”. É com essa sentença que Karl Fouquet introduz a sua obra comemorativa dos 150 anos da imigração alemã no Brasil. Desde que a espécie humana surgiu, provavelmente, em algum lugar na África, começou a sua peregrinação, melhor, sua migração, pelo mundo afora. Antes de nos ocuparmos com um povo ou  povos concretos, frutos  próximos ou remotos de alguma migração, é oportuna a pergunta, à primeira vista singela, mas carregada de significados: porque os homens migram e como tal  a “história da espécie humana é o resultado de migrações e suas consequências”. Muito se tem escrito e falado com a finalidade de formular uma teoria consistente capaz de definir a essência da questão e avaliar os  resultados. Até teses de doutorado com títulos como “Teoria geral das migrações”, podem ser encontradas nas bibliotecas. Todos os caminhos explorados para entender o conceito “migrar, migrações” e porque os homens migram, a lendária sabedoria romana resumiu em quatro palavras: “ubi bene ibi pátria”, isto é., “onde as pessoas se sentem bem aí é a sua pátria”. Ninguém migra, ou abandona o local em que se sente feliz e lhe oferece as condições necessárias para realizar seus sonhos. Esta compreensão do conceito de migrar exclui evidentemente os viajantes em busca de aventuras em terras inexploradas, aventureiros, comerciantes, cientistas, legionários e outros mais que percorrem o mundo sem intenção de fixar-se definitivamente em algum lugar remoto e aí construir uma nova morada e dar início a uma nova história para si próprios e seus descendentes. O conceito aplica-se aos  migrantes que em qualquer época histórica partiram de suas terras de origem para se fixarem em outras e começar uma vida nova. Incluem-se nessa categoria os povos que desde a remota pré-história  foram ocupando os espaços habitáveis nos continentes e ilhas; incluem-se, principalmente,  as migrações intercontinentais ocorridas  nos últimos cinco séculos; incluem-se igualmente as migrações regionais e locais, a transferência das pessoas do meio rural para o urbano, que resultam num perpétuo recomeçar a vida. Os motivos podem ser os mais diversos: políticos, econômicos, religiosos, superpovoamento, oportunidades mais promissoras, e por aí vai. Resumindo, porém, tudo numa razão básica chega-se à conclusão que as pessoas migram para melhorar suas perspectivas de vida: “ubi bene ibi pátria”

Depois dessa reflexão introdutória faz-se oportuno destacar as “consequências” mais importantes que acompanharam as migrações transoceânicas, principalmente da Europa central e do norte  para as três Américas, à Austrália, sul da África, Nova Zelândia, com destaque para o sul do Brasil, objeto dos capítulos deste livro. 

A primeira consequência, diz respeito ao “desenraizamento” compulsório dos emigrantes que partiam para além do oceano sem nunca mais retornarem. Deixaram para trás, e para sempre, as terras que os abrigaram durante séculos e milênios e nas quais haviam deitado raízes profundas e sólidas. Nelas moldaram uma tradição robusta  sustentada  por valores individuais, familiares, sociais, éticos e religiosos que os acompanharam para o além dos oceanos. Enfim sacrificaram uma “Querência”, uma “Heimat” multissecular para construir uma nova em terras e circunstâncias completamente estranhas. 

Ao desenraizamento compulsório seguiu-se um novo enraizamento, também compulsório, nas terras desconhecidas que haviam escolhido para começar uma nova vida, uma nova história, uma nova “pátria”. Já que os “Flagrantes” que seguem tem como palco a imigração alemã para o sul do Brasil, centramos a nossa atenção em aspectos que determinaram e ainda continuam determinando os desafios que tiveram que ser enfrentados no  deitar raízes nessas terras. 

Em primeiro lugar os imigrantes foram encaminhados para se estabeleceram em florestas quase impenetráveis dominadas por espécies de árvores e vegetação secundária que assustavam e ao mesmo tempo mexiam com a imaginação dessa gente que cultivava na sua tradição toda uma simbologia inspirada nas florestas com seus carvalhos, faias, bétulas, castanheiras, coníferas e muitas outras, que dominaram originariamente toda Europa central e do norte,  e nas quais fora moldada a história e a personalidade desses imigrantes. Nas florestas do sul Brasil predominavam louros, cabriúvas, grápias, canjeranas, canelas, batingas, mata-olhos, angicos e no planalto florestas de majestosas araucárias. Foi preciso transferir a simbologia inspirada nas espécies europeias para as do sul do Brasil. Detalhes sobre esse processo seguem mais adiante nos respectivos capítulos. Da mesma forma os animais e as aves  nenhuma semelhança tinham com as espécies da Europa. Esparsos nessas florestas sobreviviam tribos de índios semi nômades valendo-se da  caça, pesca e agricultura primitiva. Nas áreas dos campos naturais dominavam os estancieiros com seus peões e na transição uma população fruto do encontro e caldeamento  luso-açoriano-indígina. Os Estancieiros criadores de gado na Campanha e de Cima da Serra ditavam as normas na política e tinham em mãos o poder econômico. 

O deitar novas raízes começou com o lidar com a floresta ao adotarem o modelo indígena da coivara para conquistar o solo  arável. Ao mesmo tempo aprenderam dos índios e lusos a cultivar milho, mandioca,  arroz, feijão, batata doce, cana de açúcar. Desde os primeiros anos da imigração os colonos alemães foram indireta e diretamente envolvidos nas turbulências  políticas, de modo especial na Guerra dos Farrapos. E assim de geração em geração, em contato com as novas circunstâncias geográficas e sócio-político e étnico-culturais, foi sendo moldado o perfil de um cidadão brasileiro  marcante, fruto do enraizamento do “rebento do carvalho  na terra das palmeiras” no entender do Pe. Balduino Rambo. Mas apesar dos 200 anos do desembarque dos primeiros imigrantes alemães no sul do Brasil e nascendo a nona geração dos seus descendentes as terras e tradições  de origem, deixadas para trás há dois séculos, embora profundamente modificadas, resistem ao tempo. A prova está no esforço de não deixar morrer a língua e os dialetos, as comemorações como os “Oktoberfest”, os encontros de famílias, a valorização da família e da convivência e compromisso comunal, o trabalho, o compromisso com princípios éticos fundamentais, a religiosidade e outros. E para  fechar essa apresentação sugiro para a reflexão do leitor a sugestão do filósofo Nicaraguense Alexandro Serrano Caldera:  “Recordar é um pouco percorrer novamente velhos caminhos, mas é também imaginar o ocorrido e construir sobre isso uma nova realidade pois, as coisas não são como as vemos mas como as recordamos”. (Caldera, 2004, p. 14).