Jean
Roche, na sua obra “A colonização alemã no Rio Grande do Sul”, tornada clássica
e obrigatória para todo aquele que pretende compreender o significado da
presença alemã no Estado, resumiu suas considerações sobre a participação política dos imigrantes
e seus descendentes, na constatação: “Durante todo o século XIX e quase toda a primeira parte do
século XX, o papel político dos
teuto-riograndense foi quase nulo”.
Vários
foram os fatores que contribuíram para essa situação. Ente eles merecem atenção
os seguintes. Primeiro, os grandes latifundiários, os estancieiros criadores de
gado, controlavam, de fato, toda a política local, regional e por vezes também
nacional. As estâncias haviam-se
transformado em autênticos feudos dos
quais emanava todo o poder político e a
partir delas, eram ditadas as regras e diretrizes da ação política. Ao colono
alemão e aos demais imigrantes não restava outra saída a não ser entrar no jogo
das oligarquias estancieiras ou permanecer à margem do jogo político. Segundo,
na região colonial que na época estava confinada, grosso modo, nos vales do
Sinos, Caí, Taquari, Pardo e Jacuí, assim como nas comunidades urbanas das
cidades menores, os alemães preservavam a sua feição germânica. O contato e
intercâmbio com o mundo luso-brasileiro não passava de episódico e superficial.
Para os detentores do poder político, essa população praticava uma economia de
baixo potencial de competição, comparada com a criação de gado nas estâncias.
Falava alemão e não oferecia ameaça política embora pudesse contribuir com um
precioso reforço eleitoral, quando seus interesses estivessem em jogo. O Pe. Schupp
descreveu assim a situação:
“Nos
primeiros tempos certamente nenhum alemão da colônia teria alimentado a
veleidade de participar ativamente na vida oficial do Estado, pela simples
razão de dificilmente encontrar-se alguém que compreendia português. Só era
possível encontrar candidatos para determinadas funções que, pela sua natureza,
podiam ser exercidas na própria colônia. De outra parte não faltavam os padres
que por razões muito ponderáveis
defendiam esse isolamento. Tal situação foi superada com o correr do tempo.
Generalizou-se a convicção de que o colono, caso quisesse fazer valer seus
direitos, teria que apropriar-se da língua em nível suficiente”.
Um
terceiro fator merece destaque. É conhecido que um dos propósitos para promover
a colonização por imigrantes europeus
não lusos, consistiu em povoar as
regiões devolutas e estimular uma agricultura alternativa aos latifúndios
monocultores. A intenção do governo foi convidar alemães para serem colonos e
não servirem de fermento, com vistas a uma transformação do modelo político.
Mas o nível de desenvolvimento e o volume da produção agrícola, o comércio, os
artesanato e as indústrias incipientes, somados à organização comunal,
educacional e eclesiástica, fizeram com que os alemães católicos não se
contentassem mais em fazer o papel de meros espectadores do processo político.
Aspiravam por uma participação política mais ativa e, desta forma, influir nas
decisões do governo e da administração pública. A este terceiro fato somou-se
um quarto, de importância decisiva para os católicos. A Monarquia, regime em
que vigorava a união da Igreja e do Estado foi substituída pela República e a
consequente implantação do Estado laico, sob muitos aspectos desfavorável e não
raro hostil à Igreja Católica. A nova situação exigia dos católicos uma posição
política mais definida e mais combativa. Foi preciso partir em busca de um
caminho adequado para conviver com a nova realidade nacional.
No
terreno da participação política, os católicos alemães do Rio Grande do Sul,
buscaram inspiração no Partido Católico do Centro da Alemanha. Assim, em 1890
foi fundaram o Partido Católico do Centro, como agremiação política, da qual
participariam também os católicos das outras etnias presentes no Estado, para fazer frente a uma série de medidas
republicanas que incomodavam os católicos: a obrigatoriedade do casamento civil
antes do religioso, a legislação dos cemitérios, a inelegibilidade do clero, a proibição
do ensino religioso nas escolas públicas e outras tantas. O Partido Católico do
Centro participou da eleição dos integrantes da Constituinte Federal e Estadual.
Na primeira não elegeu nenhum representante e na segunda três, mas em coligação
com o Partido Republicano, aliança que lhe valeu a descaraterização e decretou
seu fim prematuro. Constava das intenções do Partido do Centro um projeto de jornal
no qual seriam publicados jornais nas três línguas mais importantes do Rio
Grande do Sul: “A Época”, “Il Corrieri Cattolico” e “Deutsches Volksblaltt”.
Este último estava sendo publicado pelos padres jesuítas em São Leopoldo desde
1871. Para dar maior solidez ao empreendimento editorial foi criada uma
sociedade anônima que deu continuidade ao “Deutsches Volksblatt” e, a partir de
maio de 1890 as edições semanais de “A Época” e a partir de meados de 1891 do
“Il Corrieri Cattolico”. Os jornais defendiam como pontos programáticos (cf. Gertz):
1. Liberdade religiosa para o catolicismo, sem a intromissão do estado; 2.
Isenção do serviço militar para clérigos e seminaristas; 3. Intangibilidade e garantia para as propriedades
eclesiásticas, inclusive as das comunidades locais; 4. Fim das escolas ateias
mantidas pelo Estado; 5. Fim da obrigatoriedade do casamento civil.
Diante
da evidência de que um Partido Católico não era um bom caminho para os católicos fazerem valer seus direitos e
suas reivindicações, suas lideranças partiram para outras iniciativas de
arregimentação. Testaram o modelo dos “Katholikentage” – “Congressos
Católicos”, muito populares na Alemanha, Suíça e Áustria. A primeira
experiência realizada em
Bom Jardim (Ivoti) mostrou-se promissora e o programado 1898
para Harmonia, foi um sucesso. De ano em ano e mais tarde de dois em dois anos,
esses Congressos repetiram-se até 1940, quando foram vítima da Campanha de
Nacionalização e da Segunda Guerra Mundial. Foi em meio aos debates e às análises das questões importantes que
afetavam as comunidades rurais e urbanas,
que resultaram políticas comuns para solucionar os desafios que diziam
respeito a todos, como Educação, Saúde, Abertura de novas fronteiras
agrícolas, modernização da produção agrícola, Incentivo à cultura e não em
último lugar o aprofundamento da religiosidade, com ênfase à vida sacramental e
à instrução religiosa. No Congresso dos Católicos em 1900 em Santa Catarina da
Feliz foi criada a Associação Rio-grandense de Agricultores, “O Riograndenser
Bauernverein” e depois que esta foi transformada em Sindicato em 1909, foi
substituída em 1912, no Congresso dos Católicos em Venâncio Aires ,
pela Sociedade União Popular, “O Volksverein”. Essas duas organizações
cumpriram a dupla tarefa de concretizar os grandes projetos de desenvolvimento
social e econômico propostos pelos Congressos e, ao mesmo tempo, atuar como uma
poderosa força política informal que não podia ser ignorada pelos partidos
convencionais, na primeira metade do século XX.