Lançamento do livro: “Campos múltiplos”

Numa das máximas que ele chama também de mínimas, Alexandro Serrano Caldera escreveu: Recordar é um pouco percorrer novamente velhos caminhos, mas é também imaginar o ocorrido e construir sobre ele uma nova realidade” ,  e numa outra passagem chama a atenção: Não nos esqueçamos que o passado já foi futuro e o futuro um dia será passado.

Parece-me que este é um bom ponto de partida para  algumas reflexões que gostaria de fazer junto com os senhores e senhoras nesta ocasião. Os organizadores do livro “Campos Múltiplos”, o fizeram para homenagear a minha  contribuição recordando fragmentos do caminho percorrido pelos nossos antepassados especialmente no Sul do Brasil, com o objetivo de, a partir do momento presente, valendo-nos das lições do passado, preparar o caminho para o futuro.  Sinto-me  deveras recompensado por este gesto. Fui pego de total surpresa quando, naquele sábado chuvoso de 25 de outubro próximo passado, os integrantes da excursão anual do Instituto Histórico de São Leopoldo, reunidos para o almoço na “Casa da Ovelha”, nos “Caminhos da Casa de Pedra, em Bento Gonçalves,  anunciaram a homenagem pela boca do vice-presidente do Instituto Marcos Witt., do prof. Antônio Sidekum e da profa. Isabel Arendt.  A surpresa do momento deixou-me,  sem ação e, por isso, a fala da ocasião expressou apenas o que o turbilhão de sentimentos do momento me sugeriu. Passado pouco mais de um mês houve tempo suficiente para decantar as impressões e partir para algumas reflexões mais tranqüilas e mais bem pensadas.

“Recordar é um pouco percorrer velhos caminhos”. A tarefa do historiador e dos seus parceiros mais próximos, do filósofo, do antropólogo e do geógrafo,  consiste exatamente em percorrer  velhos caminhos. As pegadas deixadas pelas gerações do passado nas trilhas da história que construíram e viveram, falam da alternância das luzes e trevas que as iluminaram ou obscureceram, falam das utopias que mantiveram acesas as  esperanças, falam do choque da dura realidade com os  sonhos não realizados  e as expectativas frustradas. E no confronto constante entre o sonho e a realidade, os nossos maiores deixaram para a geração atual uma jornada percorrida e as lições de como vencer, apesar de tudo, e ao mesmo tempo como lançar a ponte entre o passado e o futuro.

Compete a  nós historiadores, antropólogos, filósofos,  e geógrafos, num esforço interdisciplinar solidário a oito mãos, zelar para que a trajetória percorrida  não se apague com o andar dos anos e da sucessão das gerações. Três realidades inerentes à própria condição humana marcam o compasso e determinam a extensão e a profundidade do embate:  o sonho, a  realidade e a utopia  A utopia e seu irmão gêmeo o sonho fazem parte da História. São a fonte que alimenta o que há de mais humano na história: a busca da realização plena, do aperfeiçoamento, da perfeição, manifestação suprema da capacidade do homem de refletir sobre si mesmo e sobre o  sentido da sua existência.

Se observarmos com atenção as motivações que no fundo e em última análise,  movimentam as engrenagens da História, deparamo-nos sempre com o binômio Utopia-Sonho pois, na origem de toda e qualquer realidade há sempre um sonho e na luta de qualquer natureza há sempre uma utopia. Em outras palavras: A realidade é  a realização de um sonho e a luta a busca da concretização de uma utopia que pela própria natureza é irrealizável porque, como diz a própria palavra, “u topos” é o lugar que não existe e, contudo, é de uma força de atração tão avassaladora que, desde os tempos primigênios, imemoriais não dá tréguas ao homem na busca da perfeição. A utopia assemelha-se por assim dizer ao horizonte que se afasta na medida em que o viajante, o peregrino, o forasteiro,  procura aproximar-se dele, uma realidade pela sua natureza inatingível.

Fazer história nestes parâmetros e filosofar nestes horizontes permite que se forme uma compreensão antropológica cujo perfil começou a moldar-se no momento em que, em algum ponto da terra, a primeira criatura dotada de inteligência reflexa, movida por utopias e sonhos,  numa parceria simbiótica com o entorno geográfico, deu partida à fantástica jornada do homem através dos séculos e  milênios. Na parceria  do homem com meio geográfico aconteceu, acontece e acontecerá no futuro a realização dos sonhos e a perseguição das utopias. Neste processo o homem é o autor e o ator em meio aos  cenários naturais mais diversos, valendo-se  de formas alternativas de vivências, que nada mais são do que as culturas diferentes, em busca da sua realização existencial.

Acontece que o filósofo, o historiador, o antropólogo, o geógrafo e todos os representantes dos ramos do saber que de alguma forma lidam com a realidade humana, enfrentam, na visão do mundo pós-moderno,  uma série de dificuldades que exigem deles um esforço monumental. A realidade do mundo pós-moderno consiste na dissociação, na dispersão, na fragmentação, na desconstrução dos paradigmas,  na negação de princípios e valores sociais, morais e religiosos permanentes. Perderam-se as referências seguras, as balizas que orientam a vida individual e coletiva. Não é nenhuma surpresa que, em respirando essa atmosfera e debatendo-se nas contradições que a caracterizam, ao escrever história, cabe ao historiador a missão ousada de chamar a atenção de como a jornada da humanidade através dos tempos, está pontilhada por desvios,  aberrações e por uma sucessão de períodos de tranqüilidade e turbulências, por anos dourados e décadas de  chumbo. Mas no fundo encontra-se sempre o mesmo personagem, o mesmo autor, o mesmo ator, o mesmo espectador, o homem à procura da realização, em busca da perfeição. E a História não passa de uma sucessão de tentativas, de ensaios e erros, em busca desse objetivo. Sendo assim entender o passado histórico ou, voltando à nossa metáfora, o conhecimento da jornada do homem através dos tempos, assume um sentido todo especial. Em primeiro lugar nos leva a aprender  dos antepassados de como lidar com as vicissitudes da vida, aperfeiçoando as soluções e não  repetindo os mesmos erros. Em segundo lugar ensina-nos como municiar a atual geração com subsídios e, desta maneira, prepará-la para construir  o futuro em que os nossos herdeiros irão viver.

Com isso voltamos ao ponto do qual partimos: Escrever História é percorrer velhos caminhos, imaginar o ocorrido e sobre ele construir a nossa realidade que, por sua vez,  servirá de subsídio para a projeção do futuro. E volto a insistir que essa empreitada envolve um esforço interdisciplinar sério, honesto e desinteressado. Cabe ao filósofo identificar, analisar e interpretar os paradigmas, a visão do mundo, a concepção do homem e da sua razão de ser; cabe ao antropólogo interpretar a obra do homem nas suas ambições, limitações e grandezas; cabe ao geógrafo fornecer os dados necessários para entender os milhares de perfis de culturas e civilizações que se sucederam e alternaram durante  História nos contextos ambientais mais desencontrados; cabe, enfim, ao historiador a tarefa de, considerando o pano de fundo oferecido pelo filósofo, a realidade humana pintada pelo antropólogo e a paisagem natural desenhada pelo geógrafo,  ordenar e escrever a história tanto na sua dimensão sincrônica quanto diacrônica.

Como se pode concluir a  missão das ciências que lidam diretamente com o homem, não é fácil porque  não poucas vezes é considerada dispensável, inútil, incômoda e perda de tempo pois o que vale é o aqui e agora, o passado nada tem  oferecer, o futuro é uma ilusão ao ponto de se anunciar o fim da história. Mas, de outra parte, faz com que as tendências mais profundas do homem clamem pela reversão do quadro de fragmentação, dissocição, desconstrução  de paradigmas e abolição referências;  e clamem pela volta de uma síntese, de um ponto de convergência que  reintegre o ser humano, o homem a mulher, o sujeito histórico,  na sua realidade e o reconcilie com sua história.

Concluindo quero repetir os meus agradecimentos mais calorosos ao Antônio, à Imgart, à Isabel, organizadores da Festschrift, ao Marcos Witt e ao dr. Eggers por ter acolhido  o Lançamento oficial do livro no Museu Histórico de São Leopoldo, ao Erni Mugge pelo esmero na confecção gráfica da publicação, aos colegas de academia que contribuíram com as matérias que compõem o livro; Luiz Osvaldo Leite, Antônio Sidekum, Luiz Fernando Medeiros Rodrigues, Beatriz Vasconcelos Franzen, Martin N. Dreher, René Gertz, Marcos Witt, Rosane Neumann, Paulo Afonso Zarth, Lúcio Kreutz, Isabel Cristina Arendt, Gisela Lermen, Erneldo Schallenberger,  Regina Weber, Roswithia Weber, Imgart Grützmann, Giovani Meinhardt e Raul Fornet Betancourt. Sou grato também aos  ex-bolsistas, alunos e orientandos que confiaram na minha participação na sua formação e, muitos deles, hoje empenhados em continuar a batalha pela valorização da história, nas suas mais diversas ramificações. Não posso deixar de citar a presença solidária da Inez pelo apoio irrestrito que vem de mais de trinta e seis anos de convivência e compromisso mútuo e da Ingrid, do Victor  e do Ernani que não faltaram com a sua presença  mais importante do que talvez imaginem.


Quero que estejam certos de que esta demonstração me dá a certeza de que tenho bons motivos para continuar em pé e seguir sonhando com a concretização da síntese que reconstrua a unidade despedaçada e que reúna novamente  os fragmentos dispersos da existência. E se não é possível alcançar o horizonte longínquo dessa utopia, ao menos é possível caminhar em sua direção construindo a história em busca do horizonte comum no qual se encontrem, na reflexão de Alexandro Caldera,  a experiência e a esperança, a ideologia e a utopia, o passado e o futuro. Construir pontes e apontar caminhos que tornem possível uma passagem tranqüila de um para o outro, esta é a tarefa que cabe à geração do momento.

Reflexões Avulsas - Reflexão sobre Identidade

“Toda a cultura é síntse”,  ensina Alexandro Serrano Caldera. Por analogia, é lícito afirmar que toda “identidade é síntese”, pois, os elementos que compõem a síntese da cultura são os mesmos que  definem o perfil da identidade étnica. Desta forma, cultura e identidade são as duas faces da mesma realidade. A cultura vem a ser o cenário sobre o qual, no qual e a partir do qual, se esboçam os traços que definem as identidades individuais e coletivas. Evidentemente, esta afirmação implica num universo de desdobramentos que assumem características próprias e peculiares em cada caso particular. Uma observação superficial dificilmene perceberá parentescos mais significaivos entre a cultura dos patagônios da Argentina e os tiroleses da Áustria; entre os esquimós do Alaska ou da Groenlândia e os pigmeus de Angola; entre os escoceses e os nativos da Austrália. Há, porém, evidências inegáveis que apontam para uma unidade da espécie humana. O homem compõe uma espécie zoológica com as características comuns de natureza bológica inerentes a esse conceito. Existe como existiu uma única espécie humana como provam, tanto a paleoantropologia, quanto os  criérios usuais de classificação zoológica das raças humanas historicamente conhecidas, quanto o mapeamento do genoma humano, concluído há dez anos. Uma identidade radical a nível taxonômico e a nível biogenético reune, portanto,  todas as raças humanas muma espécie, sendo, portano, interférteis e interfecundos, isto é, passíveis de  miscigenação natural,  gerando uma descendênia híbrida fecunda.

A constatação que se acaba de fazer leva a uma conclusão importante quando se pretende delimitar a extensão e as fronteiras na formação da identidade étnica e cultural. O homem como espécie biológica insere-se existencialmente no entorno natural, e isto de várias formas. Em primeiro lugar, o corpo humano é constituído pelos mesmos elementos químicos que entram na formação da natureza mineral, orgânica e viva, em todos os seus níveis. Em segundo lugar, os mesmos proccessos e as mesmas leis químico-fisiológicas básicas que mantém em funcionamento qualquer ser vivo, garantem também as funções vitais do organismo humano. Em terceiro lugar, como qualquer ser vivo, o homem vive numa relação existencial  permanente com o meio geográfico que o abriga. O conjunto das atividades fisiológicas necessárias à vida, buscam no ambiente natural a reposição das matérais primas pocessadas pela atividade vital. Da mesma forma a sobrevivência da espécie humana  depende das condições climáticas, das matérais primas e dos recursos naturais que lhe oferecem abrigo e proteção contra as intempéries  e as ameaças oriundas da parte dos inimigos humanos e animais predadores. Essa realidade põe-nos frente ao primeiro dos grandes conjuntos de elementos que determinam a gênese de uma identidade étnico-cultural: o entorno geográfico em que as identidades étnicas se consoslidam. Infelizmente a convicção de que a compreensão da História, sem tomar em consideração o meio gográfico em que ela acontece, priva-a de um dos seus componentes qualitativos, de um significado muito além do que muitos historiadores aceitam ou gostariam de aceitar. Em outras palavras uma história  sem tomar em consideração o chão em que ela foi moldada, termina  numa sequência  de fatos e acontecimentos, interpretados ao sabor de esterótipos metodológicos em moda no momento ou ideologias  politicamente corretas, num determinado momento. Desconhece as  raízes mais profundas, a seiva que vem alimentando sua energia vital desde que o homem se fez homem. Acontece que o homem, como alertam os antigos gregos, existe como os minerais, existe e vegeta como as plantas, existe, vegeta e sente como os animais, mas supera essas esferas pelo fato de ser capaz de raciocinar, de observar, de comparar, de avaliar, de rejeitar, de preferir, de optar por alternativas de solução. Em outras palavras o  homem está sujeito a todos os condicionamentos como os demais seres vivos, supera-os, entretanto, pela inteligência reflexa. Se o animal sabe das coisas, o homem é capaz de saber o porque do seu saber. Esta é a gande diferença. Serviu de ponte permitindo a travessia do Rubicão, que separa a biosfera da noosfera, com diria Teilhard de Chardin, diferencia o lago parado da história do animal, do caudal impetuoso da história do homem.

Desgaçadamente, a sequência de refomas do ensino e, principalmente, do ensino superior, abandonaram o conceito da Faculdlade de Filosofia, Ciências e Letras, à qual, por assim dizer,  cabia o papel de “alma mater” das universidades, isto é, o centro, por excelência da produção do conhecimento. Em volta dela agrupavam-se as escolas e faculdades que cuidavam da formação profissional e o desenvolvimento de tecnologias novas. A Geografia, de área humanística, formando um único departamente com a História, passou a ser tratada como uma área técnica. Até o começo da década de 1960, com a implantação da primeira grande reforma do ensino, formavam-se bacharéis ou licenciados, doutores ou livre-docentes em História e Geografia. O Pe. Schmitz, po ex., orgulha-se de ser portador de um desses diplomas. Com isso para o historiador e o geógrafo começou distanciamento, ao ponto de  se ignorarem mutuamente e julgarem  não existir nada em comum entre eles. O fato é que ambos perderam e continuam perdendo muito da sua consistência e ignoram, como que perdidos nas brumas do tempo, elementos fundamentais para entender a gênese das identidades étnicas. Na síntese em que vai resultar a identidade étnica  concretiza-se basicamente em duas dimensões: a síntese com o meio geográfico e a síntese entre as mais diversas identidades étnicas, quando por uma razão ou outra se encontram e se aculturam mutuamente. Hoje quero deter-me  na primeira, isto é, na dimensão físico-geográfica.


A natureza existe e subsiste sem o homem, mas o homem não existe nem subsiste sem a natureza. O ponto de partida da parceria do homem com seu meio geográfico,  na construção da história,  deu-se, repetindo  de novo Teilhard de Chardin, no momento em que em alguma savana da África, lampejou pela primeira vez,  a centelha da inteligência reflexa no cérebro do primeiro ser humano. Não importam as centenas de milhares, ou até milhões de anos que se passaram desde então; não importa também se foi numa savana da África, numa estepe de Euro-Ásia ou numa floresta tropical; não importa, tão pouco, se aquele primeiro ser humano apresentava uma fisionomia mais ou menos teromorfa ou antropomorfa. As regras, as leis e as dinâmicas que até hoje regem a construção da identidade étnico-cultural, começaram a tomar forma naquele momento em que o homem, com olhar curioso e atento, embrenhava-se nas florestas, percorria as estepes e savanas, adentrava os desertos, escalava montanhas, percorria planicies e pescava nos rios. Observando, experimentando, comparando, distinguindo, refletindo, foi aprendendo a identificar e a selecionar o que a natureza lhe oferecia em alimentos, vestuário, abrigo e proteção. Sem demora as observações  e as reflexões levaram esses seres humanos que, injustamente rotulamos de “primitivos”, a equipar as mãos com artefatos e instrumentos que tornaram o acesso e o manuseio dos alimentos menos trabalhoso, mais rendosa a caça, mais segura a defesa contra os animais ferozes, mais eficiente a proteção contras intempéries.

E assim estavam postas as premissas para começar lentamente, numa dinâmica auto alimentada, num ritmo cada vez mais acelerado, a simbiose entre o homem e suas florestas, rios e montanhas, entre o homem e as estepes, os desertos, os gelos polares, os trópicos e os climas temperados. Ao mesmo tempo  em que foi aperfeiçoando e diversificando as tecnologias da fabricação das ferramentas para garantir a sua sobrevivência física, cresceu o interesse pela compreensão dos fenômenos, das incógnitas e mistérios com que se deparava no seu cotidiano. O nascer, o viver e morrer dos homens e anmais, os ciclos da natureza, a alternância das estações do ano, o curso diário do sol, as fases da lua, o germinar, o crescer, o florescer, o amadurecer dos frutos das plantas, tudo desafiava a curiosidade primigênia. E, na procura de respostas tomou forma todo um corpo de crenças, mitologias, simbologias que terminaram em formar as cosmovisões peculiares a cada situação histórica concreta.

Levado pelo instinto de sobrevivência, o homem foi buscar no seu entorno geográfico os alimentos de que necessitava. E, desde cedo, o próprio ato de alimentar-se, ultrapassou o ato elementar instintivo e compulsório, para revestir-se de procedimentos de natureza cultural, como hábitos, costumes, etiquetas, proibições e tabus. O ato de alimentar-se assumiu, de alguma forma, em todos povos, as características de um ritual. Mais. Os próprios alimentos passaram a fazer parte inegrante das respectivas culturas, ou tratadas como algo sagrado, dotado de poderes mágicos, milagrosos, ou proibidos como maléficos, impuros ou simplesmente nocivos à saúde.

O convívio do homem com a natureza ensinou-lhe caminhos e formas de como melhor consolidar uma paraceria com ela, de como sobreviver nela, de como torná-la uma aliada sempre presente na moldagem de sua identidade. E, neste esforço, três tipos de desafios estimularam a sua criatividade. Em primeiro lugar, encontrar na natureza os alimentos e abrigos para garantir a sobrevivência física. Em segundo lugar, descobrir e desenvolver tecnologias cada vez mais variadas e eficientes, para facilitar a obtenção dos alimentos, confecção do vestuário, a instalação de abrigos e aperfeiçoar os meios de defesa contra os animais e o próprio homem. Em terceiro lugar, penetrar nos mistérios da natureza, tentar compreendê-los e, espelhando-se neles, compreender-se a si mesmo e decifrar os mistérios da própria existência.

Cada uma das tradições culturais identificáveis na história, brotou e desenvolveu-se numa ambiente geográrfico de características próprias. Para a finalidade da análise aqui em questão, merecem destaque aqueles elementos que satisfazem, em primeiro lugar, as necessidades da sobrevivência biológica do homem: a alimentação, o vestuário, a habitação e a defesa. Num segundo momento, vêm as tecnologias que permitiram que tornaram cada vez mais eficiente e racional, o aproveitamento das matérias primas, desde o primitivo e tosco “machado de punho”, passando por milhares de modalidades de ferramentas, instrumentos, artefatos e implementos. Paralelamento evoluiu toda uma linha de tecnologias desenvolvendo euipamentos de caça e pesca e armas de defesa e ataque. O universo da “cultura material”, parte fundamental da identidade étnica, realizou-se neste plano. O fogo ocupou um lugar todo peculiar nessa síntese. Na sua visita ao museu de Chicago o Pe. Balduino Rambo, deixou a seguinte reflexão ao visitar o setor de artefatos pré-históricos.

O homem que como caçador e coletor, há muitos milhares de anos, vagava pela florestas e estepes, de forma alguma era meio ou três quartas partes animal. Tratava-se de um verdadeiro homem, até certo ponto alltamente dotado, muito astuto e piedoso à sua maneira, como são os selvagens de hoje. Foi ele o inventor de todos o instrumentos que servem para cortar, furar, desbastar, serrar, aplainar. O homem primitivo confeccionava de madeira, conchas, ossos, chifres e silex, tudo que hoje se fabrica de aço e ferro. Inventou a técnica de assar, fritar, refogar, cozinhar e, com isto, as artes básicas usadas na cozinha. A tarefa  que hoje confiamos tranquilamente às cozinheiras e cozinheiros, o homem primitivo teve que tentar, experimentar  e excogitar penosamente. Ele foi o descobridor do fogo, a energia benfazeja, sem a qual nenhuma tecnologia humana é possível. Se hoje acendemos o fogo debaixo das panelas, atrelamos às máquinas a vapor, ao motor, aos nossos carros, às máquinas voadoras, devemo-lo, em última análise, ao homem antigo, que entrou em contato com o fogo quando da queda um raio, na eupção de um vulcão ou aprendeu a produzi-lo friccionando dois pedaços de madeira ou batende uma fragmento de silex contra o outro. Ele foi também o inventor das armas: do arco e da flecha, do macahdo de guerra, da massa, dos punhais e das lanças arremessadas com as mãos. Foi o inventor da arte de costurar, comprovada, pelas numerosas agulhas de chifre e osso, com o mesmo feitio e quase tão finas quanto as nossas de aço. Confeccionava vestes com peles de animais e não vagava nú por aí, como querem aqueles que gostam de venerar animais como seus avós. Foi o inventor da morada humana, primeiro em cavernas, depois em buracos subterrâneos e cabanas e, finalmente, em casas de verdade, mesmo que fossem menos  confortáveis que os nossos arranha-céus ou palácios. Certamente tinham melhor ventilação e reuniam  a família em volta da chama amiga, como diz a canção: “E se o fogo arde num lugar hospitaleiro, estamos protegidos e, à luz das chamas, comemos até saciar”.

Continua depois as reflexões diante dos objetos expostos e que testemunham o universo artístico e mágico religioso do homem do paleolítico.

O homem primitivo, portanto, não era apenas um grande inventor – o maior de toda a história humana, como também um autêntico homem, bom no seu ser mais íntimo. Demonstram-no seus mortos, sepultados com todo o cuidado, fazendo-os acompanhar na sepulltura com suas armas prediletas e adornos. Somente desta formma chegaram até nós alguns crâneos e esqueletos. Os restos de uma criança na Riviera francesa sugerem uma imortal canção de amor de mãe. Mais de mil pequenas conchas, todas perfuradas e dispostas em fileiras, cobrem o esqueleto. Pode-se conclluir que algum dia estiveram unidas com um barbante e presas numa roupinha. Aqui uma mãe fez acompanhar o seu tesouro para a sepultura com que de melhor tinha. ( ... ) Onde se manifestam semelhantes sentimentos aí esstá viva a crença numa divindade e numa vida depois da morte. ( ... ) Nossso amigo e antepassado, homem primitivo, foii um poderoso artista, antes de mais nada um acabado pintor em preto e branco.

Mas é a reflexão diante dos objetos expostos, escavados pelo  arqueólogo Leonnard Wooley da universidade da Filadélfia, em 1922 e comentados em seu livro: “Ur e o Dilúvio”, que comprovam uma sociedade de agricultores existencialmente enraizada no seu chão.

Parou-me a respiração quando, subitamente, me deparei no museu de Filadelfia, com os objetos que me eram conhecidos apenas em fotografias. O ricamente ornamentado carro fúnebre da rainha Schubad vem do cemitério real dos velhos Sumérios  - ancestrais dos Assírios e Babilônios, inventores da escrita cuneiforme. No timnão estão os dois jumentos, em volta os três peões encarregados dos animais e seus carrregadores, com lanças de ouro, sacrificados junto com a rainha, seus pentes, agulhas de cabelo, brincos, anéis com pedras preciosas embutidas; todo o seu tesouro de recipientes, saboneteiras, caixinha de pó de arroz feitas de ouro, prata, cobre e pérolas. ( ... ) Outras coisas ainda haviam sido colocadas na sepulltura com a rainha Schubad. Havia em abundância punhais e cálices de ouro, caixinhas de prata, lacres de pedras preciosas e metal. Um desses objetos é a grande lira de ouro de lápis-lásuli na forma humana de animais; um asno tocando harpa, uma orelha deitada para trás e a outra para frente, acompanhado de um urso que dançava ao rítmo da música; uma grande cabeça de boi também de ouro e lápis-lásuli encimava a lira. ( ... ) Outra peça de luxo é um cabrito, ereto atrás de um arbusto, tudo moldado em ouro e prata, Só as grandes flores do arbusto são conchas brilhantes sãode madrepérola.

De um lado completou e ampliou em muito as possibilidades de sobrevivência física do homem, do outro, constituiu-se, pela própria natueza, numa fonte inesgotável de inspiração e de simbolismos. Agora já no plano da “cultura imaterial”, o meio oferece, de acordo com suas peculiaridades, inspirações, referências simbólicas, estímulos à imaginação, fontes de crenças de natureza mágica ou religiosa, inspirações para a prática de rituais, etc., etc. Resumindo. É legítimo afirmar que a identidade étnica resultou originalmente da simbiose, da síntese entre o atendimento às necessidades materiais e espirituais e os recursos materiais e as fontes de estímulos espirituais, presentes no entorno geográfico específico em meio ao qual as identidades étnicas foram consolidadas.

Até o século XIX  adentro as civilizações de alguma importância no cenário mundial, foram civilizações agrárias ou pastoris. Dois paradigmas culturais, portanto, existencialmente enraizados  no entorno geográfico. O meio entrou com os condicionamentos circunstanciais: os recursos e matérias primas indispensáveis para a sobrevivência física e os estímulos para desenvolver a cultura imaterial. Do encontro do homem com o seu chão rsultou, passo por passo, a simbiose entre a paisagem e a alma humana, fazendo com  que nessa relação, durante os milênios, se consolidassem as culturas com as respectivas identidades. O rumo e o ritmo dos incontáveis perfís de culturas, foi traçado pelas peculiaridades climáticas, topogeográficas, fitogeográficas, zoogográficas e edafológicas das diversas regiões. Esses condicionamentos são muito mais decisivos para a compreensão de uma identidade cultural, do que se imagina ou se gostaria de admitir. As diferenças étnico-culturais são flagrantes quando se comparam aquelas que se consolidaram aos longo dos rios, em áreas de florestas, em encostas de montanhas, em altiplanos, em estepes, em savanas, em campos naturais, em desertos ou nas regiões polares.

O convívio imediato, diuturno, íntimo, existencial com a natureza despertou no homem a percepção inequívoca de fazer parte integrante dela. Além de depender dela para a vida e a morte, sua vida desenrolava-se na mesma cadência, nos mesmos ciclos. Em neste conviver simbiótico, o homem foi construindo a sua cultura, a sua história, o seu imaginário, a sua simbologia, alimentando suas crenças, sua religiosidade, seus rituais, seus sistemas éticos, enfim, sua cosmovisão. Tudo que o rodeava, por assim dizer, animava-se e personalizava-se de accordo com o significado material, imaterial e relgioso de que vinha revestido. As realidades naturais e os fenômenos que as acompanhavam, assumiam vida e importância pelo que representavam no cotidiano e pelo que sugeriam à imaginação. Aconteceu assim uma espelhar-se recíproco entrre o homem e as realidades e fenòmenos naturais. E, em meio a esse processo de interação, de amálgama ou de síntese, as culturas e as identidades étnicas foram desenhando seus perfis e a História defindo o seu rumo.

Durante o Mesolítico, período de transição entre o Paleoítico e o Neolitico, coletores e caçadores deram um passo revolucionário na busca do controle no suprimento de suas necessidades básicas se  sobrevivência. O convívio com os animais, a observação dos seus hábitos, deixaram claro que havia uma grande dferença entre as muitas espécies que conviviam nos mesmos territórios com o homem. Uns agrediam e outros evitavam a presença dos humanos.  Havia-os também que se acostumaram com os acampamentos  de caçadores. E  nesse convívio, de observação em observação, de tentativa em tentativa, algumas espécias úteis, sob diversos aspectos, passaram a fazer parte do quotidiano e da rotina diária. Deve ter sido assim que, o acúmulo de experiências e a soma de resultados, levou à domesticação de espécies fornecedoras de alimentos e abrigos como ovinos, bovinos, caprinos, suinos; espécies auxiliares nas atividades diárias, como o cão de guarda; espécies empregadas no transporte de carga, tração e montaria. Esta transição obviamente não aconteceu de um dia para o outro. Foram necessários séculos e milênios, para que aos caçadores nômades de animais selvagens, sucedessem os pastores e criadores de animais. Essa passagem representou um passo gigantesco em direção à libertação do homem da imposição do meio geográfico e assumir gradativamente o controle sobre os recursos indispensáveis à sobrevivência.

Tanto a domesticação de animais quanto a domesticação de plantas, resultou numa completa revolução na relaçao do homem com o seu ambiente natural. Darci Ribeiro fala em Revolução dos Alimentos. É dificil saber exatamente quais foram as espécies de animais que foram domesticadas por primeiro. As evidências indicam que vestígios de ovelhas, cabras, jumentos, bovinos, além de cães, aparecem como dos mais antigos. Mas não são as espécies domesticadas em si que fizeram a diferença. O importante foi o fato que os pastores foram buscar pastagens naturais onde seus rebanhos pudessem  multiplicar-se e gantir um suprimento abundante de carne, peles, lã, ossos e chifres. Começaram a viver em acampamentos semi-nômades e deslocavam-se por territórios por vezes sem limites definidos. O quotidiano desses pastores consumia-se em função dos rebanhos que, po sua vez, retribuíam com carne, leite, peles, lã, ossos e chifres. Uma cuultura toda ela voltada para o pastoreio humanizou a fisionomia das savanas da África, as estepes semi-áridas na periferia dos desertos do Oriente Médio e Próximo, as estepes da Euro-Ásia. Não há necessidade de insistir que a cultura desses povos nômades ou seminômades assumisse contornos com marcas diferenciais inconfundíveis. Sem falar na cultura material, generalizou-se um pardigma de organização social, com flagrante predominância do patriarcado. O imaginário, as crenças e cultos buscaram a inspiração na dinâmica dos rebanhos, na dinâmica da vida dos acampamentos, e não em último lugar, nos fenômenos naturais sempre presentes. Fatos do quotidiano como nascer, crescer, viver, reproduzir-se e morrer, inspiraram os poetas, cantores e músicos. Os astros tiveram um significado todo especial na vida desses povos. O ir e voltar do sol comandando a dinâmica e a rotina do quotidiano, as fases da lua, a alternância das estações do ano, transformaram, por assim dizer, o sol e a lua em pesonalidades mitológicas, reverenciadas como entidades sobrenaturais ou verdadeiras divindades. A vida em tendas e acampamentos moveis, as vigílias noturnas junto aos rebanhos, induziram  uma relação toda particular entre os pastores e o firmamento estrelado. Os pastores de ovelhas e cabras passavam noites e mais noites em vigílias solitárias junto aos rebanhos. Dispunham de todo o tempo do mundo para cantar, fazer versos, dar asas à imaginação, refletir, filosofar, e porque não, rezar. E, como fonte de inspiração par tudo isso, contavam em sua volta com a escuridão e o silêncio da noite, quebrado aqui e acolá, pelo balido de uma ovelha, o grito de uma coruja, o uivo de um lobo, o canto de um grilo. E o firmamento misterioso, fonte das fontes de reflexão e inspiração, estendia-se sobre suas cabeças como uma gigantesca tenda. Sobre ela luziam milhões de estrelas, brilhavam planetas, passavam cometas errantes e a lua navegava no alto completando religiosamente seus ciclos de vinte em vinte oito dias. Não tardou que os observadores mais atentos notassem que esse universo nada tinha de estático. Os astros movimentavam-se numa coreografia disciplinada, percorrendo caminhos e roteiros em meio a movimentos que obedeciam a leis imutáveis. De tempos em tempos essa dança celeste sofria a intromissão de fenômenos estranhos. O sol ou a lua passavam por eclipses, clarões estranhos iluminavam a noite escura ou algum astro peregrino emergia do desconhecido, cruzava o firmamento para, em seguida, submergir de novo no desconhecido. O inusitado e o mistério que acompanhavam a passagem de cometas, a queda de meteoros e meteoritos, devem ter impressionado os pastores em noites de vigíla e mexido com seu imaginário, como se conta de Cadmon, antigo poeta inglês, pastor de ovelhas, que escutou nas entranhas da noite uma voz que lhe pedia: Cadmon, canta-me a canção do começo das coisas!” E observando as galáxias em noites sem nuvens os conjuntos de estrelas, as constelações, foram assumindo contornos de figuras humanas e animais familiares como a virgem,  o cão, o capricórnio, a ursa, a balança, os peixes o touro, o leão.  Desta forma o firmamento acima das suas cabeças, povoou-se de criaturas imaginárias, réplicas daquelas com as quais convivia no dia a dia.

Não é de se admirar que as raízes da astrologia e os mais antigos conhecimentos de astronomia, devem ser procuradas entre os criadores de gado e os pastores de ovelhas e cabras do Neolítico. A relação real ou imaginária que se estabeleceu a partir dai, entre o curso e a posição dos astros e a sorte e o destino do homem, não parou de se aprofundar e consolidar. Mesmo hoje quando o progresso cinetífico desvendou em grande parte os mistérios da natureza, as consultas ao horóscopo não perderam nem público nem popularidade, contando com um número de representantes nada desprezível entre as camadas que se consideram cultas e ilustradas. Se levássemos essas reflexões nesta linha avante, terminaríamos, com certeza, em considerações  filosóficas, como aquelas que levaram Nicolau de Cusa a formular o princípio de que “o todo reflete-se nas partes”, Espinosa a formular sua visão panteista do mundo, Teilhard de Chardin apresentar sua grandiosa unidade universal, Ludwig von Bertalanffy a propor que o universo forma um giganesco sistema, construído sobre inúmeros subsistemas, Balduino Rambo observando os precipícios dos Aparados da Serra, observar que alguém mora naqueles abismos  e alguém vigia naquelas torres de observação. E arrisco-me a concluir que as raízes da Teologia da Imanência de Deus de Karl Rahner, podem ser identificadas no pedido daquela voz misteriosa saindo dos arcanos da noite silenciosa, pedindo a Cadmon: “Canta-me a canção do começo das coisas.” Mas, não é aqui nem o momente nem a ocasião para aprofundar essa reflexão.

A posição dos astros foi assumindo importância crescente na medida em que as civilizações foram-se desenvolvendo e tornando mais organizadas. Serviam de orientação para as carvanas de camelos que transportavam as mercadorias por centenas e milhares de quilômetros de rotas comerciais entre a Ásia Central, o Oriente Médio e Próximo e por todo o norte da África. Os Reis Magos que foram adorar o Messias recém-nascido foram guiados por uma estrela. Da mesma forma, quando os navios perdiam de vista as referênias da terra firme e das ilhas, os astros indicavam o rumo a seguir.

Se para os pastores e criadores de animais a noite, iluminada pelos astros e povoada de mistérios, serviu de inspiração maior, para os agricultores as lides à luz do dia, ofereciam os motivos predominantes, que definiram as linhas da síntese que resultou na identidade desses povos. O semear, o brotar, o crescer, o frutificar, o amadurecer e o colher, atividades reitoras da rotina do agricultor, obedecem a ciclos e fenômenos naturais.  A translação da terra ao redor do sol, é a responsável pelo eterno e implacável ir e vir dos anos e, ao mesmo tempo, pela alternância das estações. A rotação com a duração de 24 horas, tornou-se a referência para delimitar a fração de tempo, dentro da qual foram sendo organizadas as rotinas da atividade dos homens. Por isso mesmo, termos como “o quotidiano”, “o diário”, “diuturno”, expressam muito mais do que uma simples rotina de ocupações, altrernando com intervalos de repouso. O homem organizou essse espaço de tempo de tal forma que fosse possível atender a todas as suas necessidades, tanto materiais, quanto espirituais. Não é de se admdirar, portanto, que o dia, pela sua natureza um fenômeno que resulta do funcionamento da mecânica que comanda o sistema solar, tenha contribuido com tamanha carga de simbolismos em todas tradições culturais. E ao sol como “personagem” central e, por assim dizer, “regente” da coreografia do quotidiano, cabe o papel de eixo em torno do qual se movimenta tudo, pois, a energia que brota de suas entranhas, é a fonte da vida. A combinação das observações  astronômicas, com as estações do ano, com o ciclo de 24 hoas do dia e os 28 dias das fases da lua, com a localização relativa nas latitudes,  longitudes e altitudes, plaanícies, planaltos, montanhas ou florestas, compôs o cenário em que o homem construiu e continua construindo a sua história e sua identidade. Desde tempos imemoriais o homem buscou “nesta sua mãe e pátria, o pão de cada dia e os símbolos da sua vida espiritual”, como escreveu o Pe. B. Rambo na Fisionomia do Rio Grande do Sul. Quanto mais se analisa e se reflete sobre a extensão e profundidade da relação da identidade étnica e cultural com o entorno circunstancial, tanto mais flagante se torna o fato de que, “se a natureza existe e pode continuar existindo sem o homem, o homem não existe nem subsiste sem a natureza”. E com essa  constatação abrem-se perspectivas sem limites para novas reflexões. O tempo disponível não o permite.


Reflexões Avulsas - Sobre o curso de História Natural da Unisinos

Recebi com prazer e aceitei com satisfação o convite da organização dos cinqüenta anos do Curso de História Natural na Universidade do Vale do Rio dos sinos, para dar o meu depoimento sobre os começos desta caminhada. Optei por não me deter na história formal da implantação do curso. Outros já o devem ter feito consultando arquivos, atas, correspondências e outros documentos de natureza oficial ou oficiosa. Como qualquer outro dos cursos da Universidade também este tem as suas raízes não formais que explicam muitos das suas características, seus propósitos e sucessos.

A primeira coisa que me parece merecer destaque é o entorno histórico em que o Curso de História Natural nasceu. Não se pode esquecer que os cursos que serviram de ponto de partida para a futura Universidade do Vale do Rio dos Sinos, foram o fruto de um projeto educacional e de uma tradição de produção de conhecimento e realização de pesquisas dos padres jesuítas no Sul do Brasil. Foi assim com a Filosofia, foi assim com as Letras, foi assim com a História e a Geografia. Deixando de lado as demais áreas fiquemos apenas com a História Natural. Suas raízes recuam para o final do século dezenove. Já nos anos e 1880 o Pe. Ambros Schupp, professor no Colégio Conceição em São Leopoldo, mandava seus artigos sobre lagartos, aves, florestas, desmatamento e outros, para serem publicados em revistas alemãs. Em 1904 desembarcou em Porto Alegre o Pe. Johannes Rick, carregando em sua bagagem um microscópio de última geração e uma biblioteca com obras selecionadas sobre fungos. Os superiores o tinham destinado para o Brasil para lecionar no Colégio Conceição, desenvolver pesquisas sobre fungos.  Teve o nome internacionalmente respeitado pelos fungos que coletou e mandou para os centros mais importantes na época, nos Estados Unidos e Europa. Uma parte da sua coleção ainda hoje está à disposição de pesquisadores e alunos na Unisinos. O Pe. Ferdinand Theisen parceiro do Pe. Rick, faleceu caindo dos Alpes numa excursão de coleta pouco antes de retornar em definitivo para o Brasil.

Entre os citados foi principalmente o Pe. Rick, pela sua longa permanência no Sul do Brasil, de 1904 até a sua morte em 1946, que consolidou a tradição de naturalistas entre os jesuítas e seus alunos.

Os padres Rick, Schupp, Theisen e outros não tardaram em despertar vocações para os estudos da História Natural entre os jovens jesuítas nascidos no Brasil. Foi de tal ordem que, a partir da década de 1930, formou-se uma considerável equipe disposta a concentrar seus esforços no estudo especialmente da botânica e zoologia. Sobressaíram-se neste esforço os padres Balduino Rambo, Aloísio Sehnem, Canísio Orth, Eduino Friederichs, Ernesto Mauermann, Pio Buck, Ernesto Haeser, Clemente Steffen e outros. Foi assim que se consolidou uma tradição de pesquisa científica entre os jesuítas no Sul do Brasil. Mostraram-se fiéis a uma tradição na Ordem que já vinha de longe e que tanta notoriedade lhe conquistara. Lembramos aqui apenas os nomes de Matteo Ricci e Adam Schall na China, Roberto de Nobile na Índia, Anton Sepp nas Missões do Paraguai, Theillard de Chardin, e Erich Wassmann, Johannes Rick, Ferdinand Theissen, Balduino Rambo, Luiz Sehnem.

Implantação do Curso de História Natural na sua versão  original em 1958, como um dos primeiros da futura Universidade do Vale do Rio dos Sinos, não foi uma decisão aleatória. Significou, de um lado, a concretização formal e o reconhecimento oficial de um esforço científico que até aquele momento estava confinado a laboratórios individuais nos colégios. De outro lado significou a abertura das portas da instituição de pesquisa em formação, a estudantes e cientistas leigos sem discriminação.

Pe. Hauser artífice do Curso
De História Natural.

Não há dúvida que o mérito da oficialização dos primeiros cursos visando a implantação de uma futura universidade, foi do Pe. Urbano Thiesen. Na criação do curso de História Natural em particular, entra um outro personagem não menos importante: o Pe. Josef Hauser. Coube a ele a responsabilidade de definir a estrutura acadêmica e o clima de rigor científico que vem norteando até hoje as pesquisas desenvolvidas no curso.

O perfil do Curso de História Natural implantado em 1958 tem tudo a ver com  a personalidade e a formação acadêmica do Pe. Hauser. De nacionalidade húngara foi veterano da Segunda Guerra Mundial. Os inevitáveis traumas resultantes dessa fase da sua vida não deixaram de acompanhar a sua maneira de ser durante toda a vida. Fez-se jesuíta e nesta situação sofreu com seus irmãos de Ordem a perseguição da parte do regime comunista instalado na Hungria depois da guerra. A Ordem foi proscrita e seus membros dispersos por diversas partes do mundo. A Província do Brasil Meridional recebeu vários deles, entre eles o Pe. Hauser.

Lembro-me como se tivesse sido ontem. Eu era estudante de Filosofia no Colégio Cristo Rei, quando num determinado dia de maio de 1954, entrou no refeitório na hora do almoço aquela figura de estatura baixa, com uma calvície precoce e passos apressados. Soube em seguida tratar-se do estudante de Teologia Josef Hauser, que viera para terminar seus estudos eclesiásticos e depois ordenar-se sacerdote. Soube em seguida que o Pe. Frantz,  encarregado de reunir quadros para formar o corpo docente dos cursos superiores que estavam sendo implantados, convidara Hauser para colaborar no projeto. Também eu constava na lista para me formar em Biologia depois de terminada a Filosofia com a mesma finalidade. Passados alguns dias encontrei-me com Hauser e, como ele tinha dificuldade em comunicar-se em português com os colegas, passei conversar seguido com ele em alemão. Nasceu daí uma amizade que se prolongaria por muitos anos. E com ela consolidou-se também uma pareceria em que ele teve o papel de introduzir-me no mundo da pesquisa científica e, mais tarde a montagem do Curso de História Natural.

Já no segundo semestre de 1954 Hauser ministrou um seminário de Questões Seletas de Biologia para os estudantes de Filosofia, num linguajar pitoresco de uma mistura de espanhol com português. Aliás o Pe. Hauser nunca chegou a dominar o português apesar dos esforços que fazia. Num quarto cedido no Colégio Cristo Rei ajudei-o a instalar um laboratório em que a base era um microscópio binocular, um micrótomo e os reagentes básicos para preparar o material de tecidos animais e vegetais para a observação. Além dos instrumentos citados a precariedade era total. Para a obtenção de água destilada foi adaptada uma panela de ferro, improvisados tubos de ensaio. Este laboratório improvisado foi a semente que, aos poucos deu origem ao promissor núcleo de pesquisas  que acolheu os primeiros alunos do Curso de História Natural em 1958, instalado no centro de São Leopoldo.

Durante um bom número de anos as instalações e os laboratórios deixaram muito a desejar. A lacuna foi amplamente compensada pela excelência e a seriedade teórica com que os conteúdos das disciplinas eram tratados, aliado a uma dedicação total dos professores fundadores do curso. O  clima acadêmico era de uma família em que o Pe. Hauser se encarregava de contribuir com o que tinha e o que não tinha, sempre auxiliado pelo Pe. Aloísio Sehnem, Paulo Lacerda, Ely Denhardt, Eugênio Gruman.

Em 1957, concluído o curso de Filosofia na primeira turma oficializada no Colégio Cristo Rei, fiz vestibular para a História Natural na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. De 1957 a 1959 lecionei Ciências no Colégio Anchieta em Porto Alegre, ainda nos antigos prédios na rua Duque de Caxias, ao mesmo tempo que freqüentava as aulas na UFRGS. A criação do Curso de História Natural em São Leopoldo em 1958 coincidiu, portanto, com a minha formação na área. O Pe. Urbano Thiesen, empenhado na montagem da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras em São Leopoldo, encarregou o Pe. Hauser da estruturação do Curso de História Natural. Tive a felicidade de auxilia-lo nesta tarefa. O projeto incluiu desde a instalação das salas de aula e dos laboratórios num dos prédios desocupados pelo Seminário Central que fora transferido no ano anterior para Viamão, até a montagem do currículo acadêmico e o recrutamento de professores.

Os primeiros laboratórios dão bem uma idéia do despojamento para não dizer penúria com que começou a funcionar o Curso de História Natural. Os equipamentos não passavam em muito do microscópio, da lupa e do micrótomo tarzidos pelo Pe. Hauser, do microscópio e da lupa do Pe. Sehnem, de tubos de ensaio improvisados, pinças e algo a mais. Aliás falando nisso o Pe, Hauser mostrou-se de uma versatilidade sem limite para superar essa situação de precariedade com o seu espírito inventivo de encontrar saídas e soluções pouco convencionais. Percorria oficinas mecânicas, fábricas, ferragens, etc. e reunia peças, ferramentas, utensílios de todo o tipo para adaptá-los para fins  de laboratório. Lembro-me do dia em que me convidou para  acompanhá-lo numa Kombi  de terceira mão, até as oficinas do Departamento Aeroviário do Estado, nos fundos das oficinas da VARIG. Enchemos a Kombi com tudo que nos foi liberado pelos responsáveis pelas oficinas: tubos de vidro, mangueiras, válvula de rádio, canos, o que se podia imaginar. Voltamos felizes para São Leopoldo com o espólio e, nas semanas seguintes, os laboratórios foram sendo equipados com o mais indispensável para receber os primeiros três alunos: o Rolf Gehlen  e  Clésia Marques. Poderíamos multiplicar ao indefinido os lances tipicamente de um pioneirismo que foi obrigado apostar na criatividade, na ousadia, na temeridade e, principalmente, numa versatilidade que foi capaz de transformar obstáculos em aliados e sucata em equipamentos de laboratório. E justiça seja feita. Essas virtudes o Pe. Hauser as possuía como poucos e as fazia valer com uma obstinação que não admitia recuos. Por essa razão a justiça manda que o Pe. Hauser seja recordado,  por ocasião do cinqüentenário do Curso de História Natural, como o artífice número um desta magnífica obra.


O perfil do Curso
de História Natural

O modelo de universidade que inspirou  a criação dos cursos que deveriam servir de base para a futura universidade do Vale do Rio dos Sinos, têm tudo a ver com a formação acadêmica do Pe. Thiesen e do Pe. Hauser e dos seus colaboradores. Valiam-se de alguma forma da universidade alemã como  paradigma. Ora neste tipo de instituição a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras ocupava o lugar da alma da universidade ao ponto de ser tratada como “alma mater”.  E não convém esquecer que estamos na década de 1950. As reformas universitárias que nos 40 anos que se seguiram tumultuaram o cenário universitário no Brasil começariam no início dos anos sessenta. Até naquele momento as instituições de ensino superior gozavam de uma autonomia bem maior do que hoje. Além disso as poucas universidades existentes  no Brasil, tinham adotado um modelo inspirado na nova universidade alemã, evidentemente  com as devidas adaptações às peculiaridades próprias das circunstâncias brasileiras. A Universidade Federal do Rio de Janeiro, A Universidade de São Paulo, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, contavam  com suas Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras. Aliás nos quadros dos catedráticos fundadores dessas universidades constavam os nomes de um número considerável de professores e pesquisadores vindos da Europa. As demais de formação acadêmica superior tinham como centro polarizador e irradiador a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Em torno dela agrupavam-se faculdades de medicina, escolas de engenharia, escolas politécnicas, centros tecnológicos, faculdades de economia, institutos de pesquisa, museus, centros de documentação, etc., de acordo com as demandas específicas de cada caso.

À Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras na condição de “referencia”, de “alma mater” do todo universitário cabia produzir conhecimento enquanto nas faculdades, nas escolas, nos institutos tecnológicos, nos museus, nas estações experimentais ..., se desenvolviam os instrumentos e se formavam os especialistas que atuariam nas frentes profissionais mais diversas.

Deixando de lado a Filosofia propriamente dita e as Letras, parece pertinente deixar algumas considerações sobre o que se entendia sob a natureza do conceito de Ciências utilizado pelos fundadores do Curso de História Natural da Unisinos, há 50 anos atrás. E, para se ter uma idéia mais exata do que significava falar em Ciências e mais especificamente em História Natural, basta dar uma examinada no currículo implantado na sua criação. A resposta não está nas disciplinas individuais, mas nos grandes eixos sobre os quais o Curso de História Natural estava montado. A mesma estrutura formava a base desses cursos também nas outras universidades, como a PUCRS e a UFRGS. Figuravam como linhas mestras que perpassavam o currículo de alto a baixo como fios condutores a Biologia com ênfase nas diversas tendências teóricas, a Zoologia e seus desdobramentos, a Botânica e suas diferentes especialidades, a Geologia e Paleontologia. Como se pode perceber tratava-se de um currículo montado em bases de molde a oferecer aos estudantes condições de apropriar-se de um cabedal de conhecimentos que cobriam o vasto campos das Ciências Naturais. E não era por acaso que o curso se chamava de História Natural. O objetivo imediato não consistia em definir especialidades e encaminhar especialistas já a partir dos primeiros semestres. O que importava era que os alunos interiorizassem uma compreensão sincrônica, diacrônica, temporal e espacial, das realidades naturais, das leis e processos que comandam a Natureza em todas as suas dimensões. Arriscando uma metáfora diríamos que o curso de História Natural levava os estudantes para a floresta para começar conhecendo-a no seu todo: as árvores, os arbustos, as ervas, os musgos, os líquenes, os fungos e os microorganismos; os animais dos diversos tamanhos e variedades; as rochas, os solos, a temperatura, o umidade, a distribuição e a intensidade da iluminação, as fontes os riachos e os rios. Dessa forma o estudante se apercebia que a Natureza como um todo, assim como a floresta como um todo, é um sistema, um organismo. A Natureza como um todo forma uma grande unidade. Não é o resultado da soma de todas as árvores, animais e cursos de água, mas uma realidade superior formada pela interação, interdependência e inter-relação de todos os seus componentes. Aliás essa concepção de totalidade, de unidade, de organismo, de sistema, ou outros termos que se queiram utilizar ou já foram utilizados, subjaz à percepção da Natureza de Nicolau de Cusa, Espinosa, Teilhard de Chardin, Ludwig von Bertalanffy, Balduino Rambo e, mais recentemente, Francis Collins.

A verdadeira ciência não consiste em dissecar as partes da natureza até os detalhes moleculares e procura por este caminho a sua natureza. Ela procura a essência e razão de ser das partes na totalidade. Já no século quinze Nicolau de Cusa formulou a questão nos segu”intes termos: “ex partibus pluribus elucet totum” – pela multiplicidade das partes manifesta-se o todo”.

História Natural
O curso de História Natural da Unisinos implantado em 1958 como área de conhecimento integrante da então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, não foi uma opção aleatória dos fundadores da Universidade. Em primeiro lugar  não se pode esquecer que desde muito cedo os jesuítas valeram-se do conhecimento científico como um instrumento privilegiado de apostolado. No século dezessete Adam Schall e J. Roh reformaram o calendário chinês. Schall foi nomeado astrônomo da corte chinesa e diretor do Instituto de Matemática. Mattteo Ricci, jesuíta italiano, contemporâneo aos dois anteriores,  gozou de  livre trânsito na corte chinesa por seus conhecimentos científicos, ao ponto de seus livros em chinês terem sido considerados obras clássicas. Já no século vinte foi Erich Wassmann  que conquistou fama no mundo científico com seus estudos sobre formigas e térmites. Johannes Rick, seu contemporâneo, tornou-se conhecido com seus estudos sobre fungos coletados no Sul do Brasil. E o mais conhecido dos jesuítas cientistas foi Teilhard de Chardin. Na década de 1930 formou-se um grupo de jovens cientistas jesuítas no  Sul do Brasil dedicados a diversas especialidades. Sobressaíram entre eles Balduino Rambo e Luiz Sehnem. O curso de História Natural da Unisinos nada mais significou do que a continuação dessa tradição em bases organizacionais  sólidas.

O curso de História Natural foi criado também num momento em que nas universidades brasileiras  a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, ocupava o lugar de “alma da universidade” a “alma mater” como se costumava dizer. Era no seu âmbito que acontecia a academia, produzia-se o conhecimento numa perspectiva teórico-metodológica interdisciplinar. O objetivo primeiro consistia em avançar na  busca do conhecimento e da compreensão das questões básicas que envolvem o homem e o entorno em que vive. Para tanto a História Natural, somando os resultados das  suas investigações aos esforços da Filosofia, lições da Historia e as outras áreas afins, assumia os contornos de uma área científica, a serviço da compreensão do todo. Com as sucessivas reformas universitárias, acrescidas das reformas de cada universidade em particular, a História Natural perdeu essa identidade, reformulou seus métodos e objetivos e redefiniu as suas funções no todo universitário, se para o melhor ou pior não é aqui o lugar para ser discutido.

Uma grande idéia nasce sempre de uma grande cabeça e sua concretização leva as marcas do autor da idéia e da obra. No Caso da História Natural o personagem, ou se quisermos recorrer a uma categoria antropológica, o herói fundador foi o Pe. Josef Hauser, um jesuíta húngaro, veterano da segunda guerra mundial, expulso da sua pátria pelos regime comunista, com doutorado em biologia pela Universidade de Innsbruck, na Áustria. Em segundo lugar não se pode deixar de mencionar o Pe. Urbano Thiesen, encarregado de colocar as bases da futura universidade, com doutorado feito em Roma e mais tarde um segundo em Munique. Um microscópio, uma lupa, um micrótomo e alguns acessórios, trazidos pelo Pe. Hauser, foram os únicos equipamentos mais elaborados para montar o primeiro laboratório. O restante foi preciso improvisar a partir de doações até de sucata das oficinas do Departamento Aeroviário do Estado. Uma panela de cozinha adaptada a uma serpentina  moldada com um tubo de vidro, fornecia a água destilada, pinças e bisturis de segunda mão, reagentes conseguidos por doação, compunham as ferramentas científicas que permitiram o começo do Curso de História Natural. Mas foi sobre esta base que a versatilidade, a criatividade e, principalmente,  dedicação e determinação  do Pe. Hauser e da sua equipe fundadora, o Pe. Luiz Sehnem, os professores Ely Denhardt, Paulo Lacerda, Eugênio Grumann, apoiaram o curso de História Natural.

Com poucos recursos financeiros mas idéias claras na cabeça, um objetivo a perseguir e uma persistência inquebrantável, fizeram brotar do quase nada um curso de História Natural que, em poucos anos, se impôs pela seriedade acadêmica e pelos resultados na pesquisa.