O associativismo solidário teuto-brasileiro

Antes de nos demorarmos sobre as diversas formas de associações que reuniram os imigrantes alemães e seus descendentes em busca de objetivos comuns, é preciso identificar a ideia força responsável pelo sucesso dos projetos de promoção humana promovidos pelas associações das quais nos ocuparemos nas postagens que seguem. A ideia força chama-se Solidarismo o que vem a ser na prática uma via alternativa ao Individualismo e ao Coletivismo ou, se preferirmos, uma Terceira Via entra as duas mencionadas. Começamos chamando a atenção de que não consiste na sua essência  da composição do que há de positivo, tanto no Individualismo quanto no Coletivismo. Falamos  de uma alternativa, uma via que parte de fundamentos ontológicos essencialmente diversos das duas outras. No Individualismo mais ou menos indivíduos comprometem-se, por meio de um pacto ou qualquer outro vínculo, a formar uma unidade que recebe o nome de sociedade. O compromisso não passa de um compromisso pactuado com a finalidade de produzir bens, garantir serviços, estabelecer regaras de conduta, montar os aparelhamentos de defesa externa e segurança interna e, acima de tudo, garantir, como valor maior, a liberdade individual e o seu livre exercício. Numa sociedade organizada sobre tais fundamentos, a produção e distribuição dos bens é confiada à livre iniciativa e estimulada pela livre concorrência. As constituições e as leis ordinárias dos estados que adotam o Individualismo liberal como modelo limitam-se em assegurar o efetivo exercício da liberdade em todos os sentidos. Nos modelos mais exacerbados, a prática da lei do mais forte transforma o convívio das pessoas num autêntico devoramento mútuo. Os antigos romanos falam em sociedade de lobos que se devoram mutuamente: “homo homini lúpus”.

O Coletivismo, nas suas mais diversas formas e modalidades, parte de uma concepção oposta   da pessoa e do indivíduo. Para ele o que vale é o coletivo. O indivíduo vale pelo que significa para a coletividade e é capaz de contribuir. Anula-se dessa forma ou, no mínimo ignora-se que o indivíduo é dotado por natureza de necessidades, desejos, aspirações materiais e espirituais que radicam na natureza íntima da individualidade  como pessoa. Também nesse caso, nos modelos mais extremos como é, por ex., o Marxismo-Leninismo comunista, o indivíduo vira peça de uma gigantesca máquina burocrática que o reduz a um ente sem direitos, só com deveres. O ateísmo materialista como “religião”  desvia a esperança das pessoas para o paraíso utópico de uma sociedade sem classes vivendo em harmonia perfeita. O caminho que deveria levar até esse ideal, porém, confiado a nomenclaturas tão ou mais cruéis do que o Individualismo liberal, empurra o horizonte utópico da harmonia final, a distanciar-se sempre mais.  E, de fato, vista com objetividade, a realização da promessa de uma harmonia final apresenta-se como uma linha que, à maneira do horizonte, afasta-se na medida em que se tenta alcançá-la.

O Solidarismo apresenta-se como alternativa, como uma terceira via entre os dois extremos de que acabamos de falar. Na obra “O Solidarismo”, de Aloysio Bohnen e Reinholdo Ullmann, de que nos valemos amplamente aqui o Solidarismo fundamenta-se nas seguintes bases. O jesuíta Heinrich Pesch, o filósofo e formulador das linhas mestras dessa terceira via, define que se trata de um “sistema que se idnterpõe – Vermitteldendes System” entre o coletivismo e o individualismo. Outro jesuíta, Gustav Gundlach, discípulo de Pesch, apontou para a mesma direção e explicitou ainda melhor as condições para que o Solidarismo poder ser considerado como uma terceira via, para poder considera-lo como meio termo  entre os “ismos” que lhe são opostos. Coforme Gundlach o Solidadrismo assume as características de uma via intermediária, um terceiro caminho – uma “Linie der Mitte”, capaz de superar as contradições implícitas nas duas outras vias. O cardeal Höffner concorda que se trata de uma terceira via e não de um arranjo, uma conciliação entre o Coletivismo e o Individualismo. Chamou a atenção de que o “princípio do Solidarismo” não deve ser entendido como um meio termo entre os “ismos” de que se costuma falar, porque o princípio da solidariedade tem, ao mesmo tempo, como ponto de partida a dignidade da pessoa e a natureza essencialmente social do homem. Assim entendido o Solidarismo constitui-se numa terceira via essencialmente diversa das outras. (cf. Bohnen-Ullmann, 1993, p. 125)

O cardeal Höffner  identificou claramente o fundamento que confere a solidez e originalidade da terceira via: a dignidade pessoal e individual da pessoa humana e sua dimensão social. A individualidade ontologicamente pessoal vem dotada de uma dignidade que não lhe pode ser contestada por argumentos de qualquer espécie. De outra parte, a natureza pessoa, individual é, ao mesmo tempo ontologicamente social. A conclusão lógica é inequívoca. A realização plena da pessoa está condicionada ao pertencimento a uma sociedade, a qual lhe garante a subsidiariedade indispensável para suprir as limitações pessoais. De acordo com essa concepção define-se, como ponto de partida, uma relação de todo diferente das pessoas com a sociedade na qual estão inseridas e participam ativamente. Começa por aí que a sociedade não se origina de um pacto acertado entre seus membros, estabelecendo as regaras, os ordenamentos e os dispositivos legais, para elaborar projetos de desenvolvimento, por exemplo. Tão pouco a sociedade é um ente inventado por alguma filosofia ou ideologia  na qual as individualidades pessoais são degradados a pelas  que movimentam a máquina social em direção a uma utopia radical impossível. Avaliado a partir dessa perspectiva, o Solidarismo cosntitui-se de fato numa via alternativa de caráter essencialmente humano. Aprofundando um pouco mais a natureza dessa “via do meio – Linie der Mitte” de Gundlach, é oporuno citar novamente os autores de “O Solidarismo”. Eles classificam didaticamente suas caractere do mútuo influxositicas em quatro níveis:

1.      Seu fundamento natural e real asseta na dependência recíproca do ser humano com relação ao outro; se bem-estar e estar bem dependem do bem-estar dos outros, por causa do mútuo influxo para o aperfeiçoamento da natural carência humana.
2.      Como princípio jurídico, o Solidarismo conduz à responsabilidade pelo bem comum. Envolve, pois, um dever ético, o qual defende e salvaguarda a autonomia dos indivíduos e as associações intra-estatais; subordina os interesses  particulares aos da comunidade; enquadra o direito privado no direito da sociedade, segundo o princípio da colisão dos direitos, sem abolir, nem limitar, arbitrariamente, nem reprimir a economia privada. A solidariedade representa a síntese de todas as forças individuais e sociais, para colimar os objetivos do Estado, ao qual cabe zelar pela parte mais fraca da sociedade.
3.      A solidariedade, como princípio formador  da sociedade propicia e dá origem, de acordo com as condições históricas e as necessidades dos diversos segmentos sociais (associações, agremiações, etc.)A solidariedade não favorece nem patrocina interesses unilaterais, porém, coo força cultural atuante, visa, exclusivamente ao bem comum e à união dos opostos, tendo por meta a construção da harmonia social, na busca do equilíbrio de interesses conflitantes.
4.      Finalmente não se pode silenciar que a solidariedade é, também, um princípio criativo, com fundamento no amor de Cristo, o qual vê no outro um irmão. (Bohnen – Ullmann, 1993, p. 126-127)


Parece que, com o que vínhamos expondo, ficaram suficientemente delimitadas as fronteiras, os marcos divisórios entre o Coletivismo, o Individualismo e o Solidarismo. São como água e azeite. Não se misturam. São três vias paralelas mutuamente excludentes. O Solidarismo exige que a justiça garanta os direitos de todos igualmente, sem privilegiar uma ou outra classe ou nomenclatura e deixa no abandono a outra como acontece no Individualismo ou aniquilada pelo aparelhamento burocrático como sucede no Coletivismo. No Solidarismo, todas as energias, tanto dos indivíduos quanto das agremiações, associações e das instituições públicas, são canalizadas em favor do corpo social como um todo. E o corpo social como um todo sadio, robusto,  bem aparelhado, mas cônscio de que cada pessoa é uma individualidade com direito à livre determinação e escolha dos seus atos, favorece na outra ponta, a realização, a satisfação e a harmonia entre as pessoas.

Pois, foram os princípios do Solidarismo adotados como fundamentos para o associativismo teuto-brasileiro a partir da década de 1890, que explicam os êxito em todos os seus empreendimentos.

As primeiras tentativas foram feitas já na década de 1890. Tratava-se ainda de iniciativas  com aspectos específicos. Sob o impacto da proclamação da República e suas consequências, partiu-se para a fundação de um partido político católico. Inspirado no “Zentrumspartei” – Partido do Centro, da Alemanha, deveria definir e garantir o lugar da Igreja Católica no cenário político republicano. Foi denominado de “Partido Católico do Centro”. Não chegou nem perto da força e influência do seu irmão maior na Alemanha, que se tornara a grande força de oposição a Bismarck e do seu projeto, o “Kulturkampf”. Sua atuação efetiva limitou-se à participação na eleição da assembleia constituinte federal e estadual. No primeiro caso, não logrou eleger um único deputado. Para a constituinte estadual elegeu três deputados, mas recorrendo a uma composição com outras legendas. Essa estratégia rendeu ao partido uma cisão interna insuperável. Essas duas experiências eleitorais provaram a inviabilidade do partido. Com isso a ideia de militância política direta foi abandonada.

Uma segunda tentativa de arregimentação também tópica, aconteceu com a “Associação de Proteção às Florestas”. Duas lideranças destacaram-se nessa iniciativa: o Pe. Pedro Gasper, apelidado de “apóstolo da floresta” e o sr. Alfred Grohmann, o “pai da floresta”. A ideia resultou prematura e, por isso mesmo, não obteve a adesão, a não ser de alguns colonos isoladamente.

De tentativa em tentative,  terminou-se finalmente em 1897 por recorrer a uma outra forma coletiva para enfrentar as questões de interesse comum, adotada na Alemanha, na Suíça e na Áustria desde a década de 1860: “Os Congressos Gerais dos Católicos”. os “Katholikentage”. Nesses eventos reuniam-se as lideranças leigas e eclesiásticas, urbanas e rurais e o povo em geral, com a finalidade de identificar e avaliar questões de interesse comum, procurar soluções e traçar estratégias de ação. Serviram de  fórum no qual se discutiam os rumos a serem tomados na condução das grandes questões relacionadas com a economia, a assistência social, a educação, a cultura e a religião. Como se pode ver pela sua natureza, esses “Congressos” dispunham de legitimidade e de competência, mais do que suficiente, para enfrentar cenários mais abrangentes e mais complexos.

A primeira experiência nesse sentido aconteceu em 1897 em Bom Jardim (Ivoti). Serviu de prévia e de teste de viabilidade daquele instrumento entre os católicos alemães no Rio Grande do Sul. Os resultados foram suficientemente animadores, para que os congressistas decidissem convocar o primeiro Congresso Geral oficial do Rio Grande do Sul, para fins de março de 1898, a ser realizado em Harmonia,  então  distrito do município de Montenegro. A escola e a educação deram o tom ao congresso. Um grupo de professores, liderados pelo Pe. Pedro Gasper, apresentou o diagnóstico  sobre a situação da rede escolar comunitária. A proposta da fundação de uma associação de professores ocupou boa parte das discussões e debates, resultando na “Associação dos Professores e Educadores Católicos do Rio Grande do Sul.” Naquela ocasião,  não se avaliou ainda a possibilidade de propor um projeto global de desenvolvimento econômico e promoção humana. Em todo o caso a fundação de uma associação de professores que, daí para frente,  encarregar-se-ia da área vital da educação, conferindo unidade e consistência a uma proposta pedagógica afinada com a necessidade da época, depunha em favor da seriedade do Congresso. O entusiasmo dos congressistas reunidos em Harmonia foi tal que decidiram marcar um segundo Congresso Geral dos Católicos já para o ano seguinte, 1899, em Santa Catarina da Feliz.

Na programação daquele Congresso, entre outros temas de grande relevância, fora prevista uma conferência a cargo do Pe. Theodor Amstad, versando sobre a situação econômica da colônia. Com o Pe. Asmtad entrou em cena o personagem-chave na formulação de propostas  para os quarenta anos que se seguiriam. Suas peregrinações, principalmente pelo vale do rio Caí, haviam-lhe dado uma percepção nítida do que estava acontecendo. Nas longas cavalgadas solitárias, concebeu, aos poucos, o grande e audacioso projeto que proporia no Congresso em Santa Catarina da Feliz. O discurso que proferiu e que será reproduzido na íntegra mais abaixo, constitui-se numa peça extraordinária. Num linguajar que até o mais modesto dos colonos foi capaz de entender, pintou a situação real em que se encontrava a colônia. As coisas não poderiam continuar como estavam. Era preciso envolver num projeto todos os aspectos da vida, apoiado no pressuposto de uma união geral das forças e das potencialidades disponíveis. Ao concluir a sua fala tirou da manga  o esboço de uma proposta na qual se previam objetivos múltiplos. Colheu aplausos entusiásticos e a adesão unânime para a fundação da Associação Riograndense de Agricultores. No Congresso de 1900, realizado em São José do Hortêncio aconteceu a instalação oficial da Associação.
No decorrer da última década do século XIX e no início do século vinte, os colonos individualmente, as comunidades coloniais, os comerciantes das picadas e das médias e grandes cidades, começaram a sentir, com insistência cada vez maior, uma nova problemática. O sucesso relativo da colonização tornara a economia cada mais dinâmica, mais rentável e mais volumosa. A produção de excedentes em ritmo crescente relegara ao passado a produção destinada unicamente para a subsistência. Excedentes eram produzidos, exigindo para serem colocados no mercado local, regional e nacional. Ao mesmo tempo, tornara-se rotina a importação de produtos de toda a ordem a custos e preços elevados. Com a indústria nativa ensaiando os primeiros passos tímidos, quase todos os produtos manufaturados dependiam obrigatoriamente da importação. O resultado não deixa dúvidas: uma dependência cada vez mais acentuada dos países industrializados da Europa e uma manipulação crescente da economia e dos preços por parte dos grandes comerciantes.
A tomada de consciência dessa realidade despertou entre as lideranças leigas e religiosas dos imigrantes a convicção  de que era preciso fazer alguma coisa e com muita urgência. O papel de porta-voz foi assumido por padres jesuítas, por  lideranças leigas, entre as quais se destacaram professores das escolas comunitárias, e por personalidades portadores de um grau de formação mais apurado, na sua maioria residentes em Porto Alegre.
Personalidades como o P. Theodor Amstad, o P. João E. Rick, Max von Lassberg e o Sr. Hugo Metzler tornaram-se referências quando se tratava de discutir os problemas da colônia. O P. Amstad era filho de um suíço comerciante de produtos coloniais. Como tal, trouxera da casa paterna um rico acervo de conhecimentos e principalmente um arguto espírito de percepção da problemática que envolvia a colônia na época. Desembarcara em Porto Alegre em setembro de 1885, e foi designado para atuar pastoralmente entre os colonos na região do vale do rio Caí. O contato diuturno e prolongado com os problemas que afetavam as comunidades coloniais fizeram dele em pouco tempo o grande condutor dos imigrantes. A par do bem-estar  espiritual e religioso preocupavam-no também a saúde social e o sucesso econômico das  ovelhas do rebanho que lhe fora confiado. Levava muito a sério tudo que pudesse contribuir para a promoção  humana individual e coletiva. O mesmo espírito animava os demais líderes tanto religiosos quanto leigos. E as ações concretas nesse sentido não se fizeram esperar.


O Associativismo teuto-brasileiro - O Associativismo no sul do Brasil

O cenário histórico
A década de 1850 marcou o período em que a imigração alemã começou a emitir sinais inequívocos de consolidação. Um quarto de século havia passado desde o desembarque dos primeiros 39 imigrantes em São Leopoldo. A primeira geração de brasileiros natos, filhos de imigrantes alemães, chegava à idade adulta. As provas de fogo a que foram submetidos naquele período os haviam submetido a um duro aprendizado. Em linhas gerais saíram-se muito bem e, ao mesmo tempo, demonstraram estar à altura das tarefas que o futuro lhes reservara. Aprenderam a lidar com a mata virgem que, no início, para muitos, parecia invencível. De hostil e assustadora converteu-se em  parceira e aliada. Os solos que há séculos dormitavam  na penumbra dos gigantes seculares e da vegetação impenetrável, não decepcionaram. Depois de expostos pelos golpes do machado e da foice e tornados aráveis, retribuíram com fartura. O milho, o feijão, a batata inglesa e a batata doce, a mandioca e mais de uma dúzia de outras culturas reduziram a penúria e a escassez dos primeiros anos a um pesadelo de noite uma mal dormida. Das entranhas da mata virgem os colonizadores retiravam as madeiras para a construção dos seus primeiros abrigos e, mais tarde, para as moradias mais confortáveis. Para suprir as necessidades cotidianas havia lenha em abundância e de primeira qualidade.
Uma outra questão não pode ser esquecida. Para as gerações daqui nascidas somadas às levas de novos imigrantes que chegavam em número crescente, havia terras  cobertas de mata virgem à vontade. Estendiam-se a perder de vista para o oeste e para o norte. As primeiras clareiras abertas na mata denunciavam a presença de frentes pioneiras no vale do Caí, do Taquari, do Pardo e do Jacuí. Essa grande bacia  hidrográfica formadora e alimentadora  do Guaíba, sinalizava para a formação a curto prazo de uma região geoeconômica de significado extraordinário. Nela    consolidava-se uma economia alternativa para o Rio Grande do Sul ao lado da criação de gado no campo. Em questão de poucos anos, os trechos navegáveis dos rios transformaram-se em hidrovias movimentadas. Barcos de passageiros navegavam regularmente  entre Porto Alegre e os portos fluviais de São Leopoldo no rio dos Sinos, São Sebastião e Montenegro no rio Caí, Mariante, Taquari, Lajeado e Estrela no Taquari, Rio Pardo no rio Pardo e Cachoeira do Sul no Jacuí. Pelas mesmas vias, seguiam os barcos carregados com mercadorias para abastecer o interior colonial. Os portos fluviais recebiam os produtos coloniais, feijão, banha, farinha de mandioca principalmente, das casas de comércio, das “vendas” localizadas nas picadas e, ao mesmo tempo, que as abasteciam com tecidos, ferramentas, utensílios de cozinha, sal,  açúcar e uma infinidade de outras mercadorias. Na década de 1870, a estrada de ferro começou a cruzar a região de leste a oeste, oferecendo mais uma alternativa para a movimentação de cargas e passageiros.
Foi também nessa época em que os caixeiros viajantes consolidaram uma relação de notável eficiência entre a capital do estado e o interior colonial. Representando as casas de importação e exportação  de Porto Alegre, percorriam sistematicamente toda a região. Foram, em parte, os grandes responsáveis pela consolidação de elos permanentes entre o meio urbano e colonial. Não faziam fluir apenas mercadorias e dinheiro, como também cultura, ideias e conhecimentos. Portadores de uma formação mais apurada, geralmente de cunho liberal, atuavam também como “fermento cultural”, eram um visitante nem sempre bem-vindo nas comunidades coloniais, tradicionalmente muito religiosas e pela própria natureza mais fechadas.
Esse cenário serviu como pano de fundo sobre o qual se consolidou, entre 1850 e 1900, o projeto da colonização com imigrantes alemães. Os mercados do centro do País, ávidos  pelos produtos do Rio Grande do Sul sem concorrência, transferiram somas vultosas para o Estado. O dinheiro vivo que circulava na região colonial estimulou o comércio. O período ficou conhecido na história como “o período das onças de ouro”. Toda essa euforia fez subir, diversificar e sofisticar as expectativas de consumo. Com dinheiro sonante no bolso, o colono voltou-se para mercadorias industrializadas e importadas, em detrimento  dos produtos do seus artesanatos. Importava-se de tudo: tecidos, ferramentas, utensílios de cozinha, móveis, bebidas, cimento, manteiga, ferragens e outros mais.
Essa situação de euforia, porém, não duraria indefinidamente. Embutidos nessa dinâmica havia três senões que preocupavam. Em primeiro lugar a economia colonial apoiava-se  na exportação para os mercados do centro do País, sobre apenas três produtos: feijão, banha de porco e farinha de mandioca. Acontece que, principalmente São Paulo e Minas Gerais tinham condições tão boas, senão melhores do que o Rio Grande do Sul, para desenvolver essas culturas. Os solos e o clima eram no mínimo tão favoráveis como no sul. Faltavam apenas iniciativas tanto públicas quanto privadas para explorar esse potencial. E a ocasião  apresentou-se no final do século XIX. Os dois estados mencionados, mais do que outros, intensificaram e expandiram as culturas de milho, feijão e mandioca. O resultado foi previsível. Desencadeou-se uma concorrência cada vez mais  acirrada entre os produtos paulistas e mineiros e os mesmos que vinham do Rio Grande do Sul. O custo do transporte, desde o interior colonial, passando por Porto Alegre, Rio Grande e, finalmente, via capotagem, para o centro do País, inviabilizava qualquer tentativa de competição. Como resultado aviltaram-se os preços e diminuiu a circulação de dinheiro entre os colonos. Não demorou e o comércio de importação e exportação entrou em ritmo de desaceleração preocupante.
Os colonos acostumados durante  décadas a concentrar todo o empenho nas culturas de feijão, milho, mandioca e a criação de suínos, assistiam com  apreensão, a desvalorização desses produtos no mercado. A situação reclamava medidas rápidas e de longo alcance. Uma parte da solução, com certeza, deveria  ser procurada na diversificação das culturas e, quem sabe, na procura de mercados alternativos. Era preciso encontrar urgentemente tais culturas para permitir a ampliação do leque de ofertas ao mercado, tanto regional quanto nacional e, porque não, internacional.
Paralelamente ao problema originado pela concorrência  dos produtos do centro do País e a falta de  culturas novas, uma outra questão veio a preocupar os colonos. No final do século XIX tornaram-se evidentes os primeiros sinais de exaustão dos solos nas áreas mais antigas da colônia. A responsabilidade desse problema tinha tudo a ver com a estrutura  e a legislação fundiária e os métodos usados no manejo da terra. No que se refere à estrutura e legislação, convém destacar o tamanho relativamente pequeno dos lotes, em torno de cinquenta  hectares na época. Ao mesmo tempo não havia uma legislação que disciplinasse o uso da terra. O título de propriedade permitia ao proprietário dispor, sem restrições, do seu lote. Se achasse por bem, podia desmatá-lo inteiramente, sem se preocupar com a preservação de uma parcela da mata original. As encostas  dos morros com mais de vinte e cinco por cento de declive eram despidas da cobertura vegetal  e, em poucos anos, a erosão carregava a camada fértil do solo. A limpeza do terreno pelo método da coivara, já de saída subtraía ao solo boa parte da sua fertilidade. No preparo da terra para o plantio, usava-se amontoar galhos, palha de milho e outros materiais orgânicos, queimá-los, apressando assim a limpeza do terreno. Além de privar a terra de uma massa orgânica apreciável e preciosa, não se cultivava o hábito de adicionar ao solo nutrientes de qualquer espécie. No momento em que a terra dava sinais de esgotamento, derrubava-se mais um eito de mato. Em casos adiantados, a parte exausta era entregue à capoeira. O feijão e o milho, principalmente, exigem terras férteis para renderem uma produtividade compensadora. Entende-se assim que as colônias mais antigas mostrassem sinais inequívocos de baixa fertilidade. Um alerta nesse sentido foi dado já no final da década de 1880 pelo Pe. Ambros Schupp, publicado na revista “Alte und neue Weld:”
Despedimo-nos, montamos a cavalo e partimos para São Salvador. São mais ou menos duas horas da tarde e o calor é quase insuportável. Agora, graças a Deus, subimos a encosta do morro. Uma porção de mato fechado cobre o seu dorso, um último e solitário resto de mata virgem. Poderíamos dizer, uma ilha tranqüila que restou para testemunhar um mundo desaparecido”.
“Na verdade, há menos de trinta anos balançavam, como as ondas do mar, até perder de vista, as copas das árvores, sem interrupção, uma encostando na outra. O olhar topava em toda parte com a terra plantada. Só aqui e acolá conservavam-se algumas áreas de mato. O colono, como parece evidente, quer extrair do seu chão, o mais rápido possível, o maior proveito que puder. Só calcula com o presente e suas vantagens. Não pensa  no futuro e no bem da coletividade. (Schupp, Ambros, Alte und neue Welt, 1889, p. 313)
A preocupação manifestada pelo Pe. Schupp já fazia parte da apreensão de não poucas mentes mais lúcidas. No texto, destaca-se que a situação apontada referia-se ao vale do rio Caí e Sinos. Nessas duas bacias o desmatamento havia avançado  até o ponto que começava a inspirar cuidados. Na hipótese de não se tomarem providências, pessoas mais atentas previam o desaparecimento, em médio prazo, da cobertura vegetal natural, além do aceitável. O Pe. Schupp creditou à mentalidade imediatista e individualista dos colonos a responsabilidade pela situação, até certo ponto explicável. Havia urgência em conquistar o chão arável à mata e, dele, extrair os meios de sobrevivência. A preocupação com o futuro e a coletividade podia esperar.
Uma terceira preocupação veio somar-se às duas anteriores. Ao findar  a década de 1880, a disponibilidade de terras nas bacias fluviais formadoras do Guaíba, estavam praticamente esgotadas. Cá e lá ainda se podiam encontrar algumas colônias, geralmente na periferia dos morros, acidentadas e difíceis de serem trabalhadas. A alta taxa de natalidade e a baixa mortalidade infantil, somada à inviabilidade de divisões indefinidas dos lotes coloniais por natureza pequenos, fez com que a pressão populacional  assumisse proporções preocupantes. Os trezentos excedentes na média gerados ao ano por cada  mil  famílias, reclamavam por terras. No início do século XX  tornara-se inadiável encontrar uma solução rápida, abrangente e de médio e longo prazo. Não havia mais lugar para soluções tópicas de curto prazo. A situação exigia a abertura de novas fronteiras agrícolas de longo alcance, medindo em torno de 35.000 quilômetros quadrados.

Uma quarta área crítica veio a ter a necessidade urgente de criar e implantar um sistema de poupança e empréstimo. Entre os colonos, circulava um volume respeitável de dinheiro. Era preciso tirar esse dinheiro de baixo do colchão, fazê-lo render juros para o dono e, ao mesmo tempo, acumular fundos que, emprestados aos colonos, permitiam a aquisição de terras, ferramentas, máquinas etc. Esses mesmos fundos poderiam servir como capital de giro para iniciativas particulares ou financiar projetos de  colonização, construção de asilos e hospitais. Além de financiar as iniciativas e necessidades dos colonos e garantir o suporte financeiro para novas colonizações, outras iniciativas encontrariam recursos na poupança acumulada nas caixas de poupança e empréstimo. Entre essas demandas, merecem destaque a saúde, a educação, a religião e outras mais. Cabia-lhes, portanto, o papel de combustível para movimentar todo o espectro da economia em particular e da vida da colônia em geral.

Nos primeiros 75 anos da imigração alemã e nos primeiros vinte e cinco da italiana, a economia colonial, dependeu inteiramente do desempenho individual de cada colono. Cada qual cultivava o que lhe parecia mais conveniente. Supridas as necessidades da família, entregava-se o excedente no comércio local. Os comerciantes das picadas ofereciam os preços que oscilavam de acordo com as regras da oferta e da procura, e forneciam as mercadorias destinadas a cobrir as demandas dos fregueses. A lógica  desse sistema fazia do colono um dependente da maior ou menor boa vontade de exploração dos comerciantes. De qualquer forma, aos fregueses restava uma margem de manobra e uma autonomia muito limitada. Não dispunham de nenhum poder de barganha frente aos comerciantes, e, por isso mesmo, a economia colonial como um todo sofria muito com os altos e baixos de mercado, não raro artificialmente manipulado pela cadeia de comércio que envolvia o “vendeiro” nas linhas e picadas, passando pelos intermediários nos portos dos rios e terminando nas casas de importação e exportação em Porto Alegre.

Urgia encontrar um caminho alternativo eficiente para conferir aos colonos a força coletiva necessária para defender os seus interesses comuns e fazer valer as suas reinvindicações.

A todas essas questões veio somar-se mais uma. Até a Segunda Guerra Mundial não havia nenhum tipo de assistência social para suprir as necessidades dos colonos. As despesas com médicos, hospitais e remédios ficavam por conta dos doentes ou dos responsáveis por eles. Os atendimentos gratuitos oferecidos pela Santa Casa de Misericórdia em Porto Alegre, eram insuficientes e fora do alcance da grande maioria. Numa situação parecida, encontravam-se os idosos. Sem aposentadoria para os agricultores, eles, ao chegarem à velhice, ficavam na dependência dos filhos ou de instituições destinadas para o seu atendimento.

Da mesma forma como havia urgência para pôr em andamento mecanismos coletivos para melhorar a situação econômica, formas e estratégias comuns tornaram-se inadiáveis para suprir outras demandas. Somente dessa maneira, seria possível enfrentar a construção, a instalação, a manutenção e o funcionamento de hospitais, asilos, orfanatos, instituições especializadas no acolhimento de tuberculosos, leprosos e doentes mentais.

Toda a questão da educação compunha um conjunto complexo de  desafios. Até o final do século XIX a escola e a educação estava entregue às comunidades individualmente. As diretorias das escolas, eleitas pelos membros das comunidades, estabeleciam os parâmetros, as expectativas e as demandas relacionadas com a educação. A seu cargo estava a infraestrutura material,  decidiam sobre o conteúdo curricular e sobre a duração do período escolar, além de contratar, fiscalizar e estipular os honorários do mestre-escola. A rápida expansão colonial e a consequente multiplicação numérica e a dispersão geográfica das escolas reclamavam a adoção de uma filosofia comum para orientar a educação como um todo e, como consequência, a formulação de um proposta pedagógica comum, além da implantação de um currículo comum e, finalmente, a fixação de um período escolar de duração igual para todas as escolas.

Havia mais uma área de vital importância a ser atendida. A implantação do projeto da Restauração Católica achava-se em pleno andamento. Como projeto de Igreja, exigia  o comprometimento e o engajamento coletivo. Seu êxito dependia de uma apurada organização do povo católico nas  suas dioceses  e comunidades paroquiais. Além dissso as mais diversas formas de piedade popular e de militância religiosa assumiam uma importância cada vez maior. Como é fácil de perceber, não havia como confiar a iniciativas isoladas e desarticuladas a responsabilidade pelo suporte ao  projeto da Restauração Católica. O empenho conjugado do clero, das lideranças católicas leigas e do povo em geral, era fundamental.

E no plano religioso e eclesiástico a implantação da República em 1889 adicionou mais um ingrediente. A separação do Estado e da Igreja, a laicização dos cemitérios e do casamento, livraram de um lado a Igreja da tutela do Estado, do outro entregaram à sua exclusiva responsabilidade e competência a condução dos seus negócios. Garantir um lugar ao sol no novo cenário político nacional tornara-se inadiável. O estado laico contando, no início pelo menos, com fortes correntes anticlericais e hostis à Igreja, exigia da parte dela uma ampla e forte coesão. Até um projeto visando à expulsão dos jesuítas estava sendo articulado. Era forçoso pois,  encontrar uma fórmula de convivência no mínimo civilizada com as autoridades do novo regime. No Rio Grande do Sul, essa questão assumiu características próprias. O governo do Estado encontrava-se nas mãos dos positivistas e por eles seria controlado até 1930. Nesse caso, é possível destacar um lado positivo. Embora em nível filosófico e doutrinário não houvesse condições para um entendimento mútuo, no campo prático, as coisas se passavam bem mais tranquilas. Tanto os positivistas no governo com Júlio de Castilhos e, mais tarde, com Carlos Barbosa e Borges de Medeiros, quanto os jesuítas, os pastores protestantes,  as lideranças coloniais e os colonos em geral prestigiavam valores éticos comuns: a honestidade no trato com a coisa pública e privada, o respeito à hierarquia, a operosidade, a ampla autonomia de iniciativa e outros.

Em grandes linhas, era esse o cenário em que se encontravam os imigrantes e seus descendentes ao término do século XIX. Nesse quadro, situavam-se também os imigrantes italianos, poloneses e outros grupos minoritários e, até certo ponto também, os luso-brasileiros.

Uma avaliação atenta da situação deixa claro que o projeto de colonização no sul do País deitara raízes profundas, e caminhava para uma consolidação definitiva que, entretanto, avançara até um ponto em que circunstâncias as mais diversas, inspiravam sérios cuidados  e convenceram as lideranças  de que alguma coisa tinha de ser feita com urgência; que não havia lugar para iniciativas pontuais e isoladas; que era preciso enfrentar  o tamanho e a complexidade da situação por meio de um projeto amplo, abrangente e conduzido de forma global, pensado para médio e longo prazo.



O associativismo teuto-brasileiro Origem na Alemanha

A gênese do associativismo católico na Alemanha
Gigantesco era desafio que a Igreja foi obrigada a enfrentar. Em última análise, resumia-se no seguinte: como administrar a situação sem que os danos se tornassem irreversíveis; encontrar os instrumentos capazes de superar os problemas; escolher as estratégias capazes de devolver à Igreja o lugar e o brilho perdidos.

Mais acima ficou claro que o caminho da concordata era inviável. O apelo ao imperador da Áustria para intermediar a negociação resultou inútil. Mais frustrante  deve ter sido a resposta pessimista do papa  aos bispos alemães, afirmando que, naquela situação, só Deus poderia ajudar.

Diante dessa situação próxima ao desespero forçoso, era encontrar uma saída no âmbito mesmo da Igreja da Alemanha e dos católicos alemães. A convicção expressa pelo alto dignitário eclesiástico   prognosticava que as circunstâncias negras levariam ou um colapso irreversível da Igreja ou que nas entranhas da borrasca estava a gestar-se uma nova ordem, uma nova Igreja, uma Igreja restaurada na sua doutrina, na sua disciplina, uma Igreja em condições de enfrentar o século XIX com todos os seus avanços tanto no  campo da Filosofia, como da Teologia, da Sociologia, da Economia e em todos os campos da Ciência e Tecnologia.

Finalmente, na década de 1840, a situação na Alemanha atingira um nível de desorganização próximo ao caos. O ingrediente mais perturbador nessas circunstâncias deve creditar-se aos movimentos revolucionários, que atingiram o ponto mais crítico em 1848. Em meio a esse furacão, a Igreja viu-se entregue  a si mesma. Não tinha como contar com os governos fragilizados, com o prestígio abalado e a autoridade minada nos seus fundamentos. Da mesma forma, a perplexidade e  falta de  referenciais seguros, deixaram a sociedade civil num estado beirando a anarquia.

Com o estado falido, com a ausência ou a falta de outras lideranças para sinalizar um rumo seguro foi necessário procurar  uma saída no seio mesmo das massas populares em geral e nos segmentos setoriais, perseguindo interesses específicos. A organização dessas massas e dos segmentos setoriais oferecia-se como uma saída, talvez a única, em meio ao caos generalizado. Para as autoridades eclesiásticas  e para as lideranças católicas leigas, não restava dúvida que a restauração do prestígio e da revitalização da Igreja na Alemanha passava pelo povo católico.

A resposta do povo católico veio em 1848 em Mainz. A explicação dada para o  porque dessa cidade ter servido de berço das organizações católicas alemãs, deve ser procurada na sua localização geográfica além do seu significado histórico para a nação alemã. A cidade fica a poucos quilômetros  da fronteira com a França e situada no centro de umas regiões mais conturbadas . A constante passagem das tropas durante  décadas, a indefinição, o avanço e recuo constante das linhas de fronteira e o vazio perigoso de uma identidade nacional, acentuaram ainda mais a desestruturação e o caos social. Na condição de  região de fronteira com a França, as idéias inovadoras e revolucionárias emanadas de Paris encontravam não pouco ressonância na sua população, antes do que qualquer outra da Alemanha.

Por isso urgia arregimentar aí, mais do que em qualquer outra região, os católicos numa associação. O ponto de partida veio com a reunião de um grupo relativamente pequeno de homens, que, no início, ao menos parece, não ter alimentado ambições maiores do que a cidade e os arredores de Mainz. Os fundadores da associação inspiraram-se em agremiações semelhantes, perseguindo os mesmos objetivos daquelas que já atuavam com êxito na Inglaterra, na Irlanda e na França. O objetivo central resumia-se na conquista e na defesa da Igreja e da liberdade religiosa. Estatutos muito simples deram foram e personalidade jurídica para a associação.

De início, alguns obstáculos tiveram que ser removidos. Em primeiro lugar, foram os tempos tumultuados do final da década de 1840. A população vivia confusa, sem rumo, sem referências confiáveis nem civis, nem eclesiásticas, nem religiosas. Em segundo lugar, faltava a tradição  de qualquer tipo de associativismo entre a população. Não estava acostumada a  enfrentar desafios organizada em grupos mutuamente comprometidos. Uma terceira dificuldade provinha das próprias lideranças católicas. Pessoas bem intencionadas desse meio desaconselhavam a fundação de uma associação. Julgavam-na inoportuna, prematura e, por isso mesmo, condenada ao fracasso.

As três dificuldades mencionadas e mais outras tantas terminaram sendo superadas. Na data combinada, vinte e quatro homens reuniram-se para uma sessão preparatória. A fundação da associação ficou decidida, os estatutos examinados e aprovados. No final, uma nova reunião foi acertada e os participantes convidados fazerem-se acompanhar por tantas pessoas quantos fossem capazes de arregimentar. O resultado surpreendeu pela numerosa assistência que se fez presente. Os estatutos tiveram a aprovação ratificada e a Associação oficializada por meio de um documento assinado por trezentos a quatrocentos  sócios fundadores. Um dos associados propôs o nome de “Associação de São Pio”, aceito por unanimidade pelos presentes. O nome  devia simbolizar o espírito de liberdade que animava a Associação. Estava criada a Associação de São Pio de Mainz. Em pouco tempo ela transformou-se no paradigma para dezenas de outras “Associações de São Pio”, surgidas por toda a Alemanha. Unia-as todas o mesmo espírito e integravam-nas homens comprometidos com o mesmo objetivo de defender a liberdade  da Fé e da Igreja.

Essas associações com seus associados alimentaram  o desejo de reunir-se numa grande federação alemã de associações católicas. Entre todas elas circulou, desde o início, uma ativa correspondência, veiculando  a troca de experiências, comunicando resultados e, principalmente, reavivando a autoestima entre os católicos, o respeito à Religião e a veneração pela Igreja.

O seguinte passo decisivo para a história do associativismo católico da Alemanha foi dado por ocasião da inauguração da catedral de Colônia. Na ocasião fez-se presente um grande número de associados de Associações de São Pio de toda a Alemanha. No encontro, decidiram reunir todas as associações numa única federação e, assim, unir  as forças numa só, pela conquista e a garantia de liberdade para a Igreja e a Religião. A premência da situação exigia uma ação rápida, e um encontro de representantes de toda a Alemanha foi acertado para os dias três a seis de  outubro de 1848 na cidade Mainz. A abertura aconteceu no dia três de outubro de manhã, precedida por uma solene missa pontifical na catedral. A assembléia de trabalho que seguiu ao ato religioso foi assim registrada nos anais do evento:

Logo após a solenidade religiosa aconteceu no castelo da cidade a primeira reunião da assembleia geral. Desde logo ficou claro o caráter e o significado do encontro. A profundidade das reflexões feitas durante a sessão, sinalizaram claramente que o momento era do  prelúdio de um grandioso drama que arrebataria os espíritos no decorrer das sessões que se seguiriam. Ficou evidente também que a assembléia significava algo mais e algo maior do que se podia imaginar.[1]  

A Federação das Associações Católicas elegeu como objetivo maior a conquista e a reconquista da liberdade da Igreja, da Religião e da Educação. A grande pergunta que os congressistas se fizeram foi esta: Mas para que serve a liberdade da Igreja  em nível institucional, se não for para fazer valer seus princípios no dia a dia dos católicos? A doutrina católica e seus valores morais perpassam a vida e orientam o quotidiano  das pessoas. Sem esse pressuposto não há como esperar que o povo católico tenha condições para enfrentar com êxito as investidas contra a liberdade da Igreja e da Religião.

Dois obstáculos principais foram apontados. Em primeiro lugar, de há muito as massas populares  são contaminadas pela atmosfera hostil à Igreja e à Religião. Os espíritos estão sendo minados pelo vendaval de idéias revolucionárias que varrem a Europa inteira, encontrando eco entre as pessoas comuns, abalando sua fé e minando os costumes e os valores tradicionais. Em segundo lugar, e, como consequência da anterior respira-se uma autêntica atmosfera de paganismo no dia a dia das pessoas, comprovada pela deterioração dos costumes e ausência de qualquer tipo de motivação religiosa. Diretamente relacionada com a ignorância, a confusão e o desinteresse religioso, aparece a desestruturação  da sociedade e a grande miséria do povo.

Eis o quadro que motivou as lideranças católicas da época a dar uma resposta eficaz a tamanhos desafios. A lógica que  alimentou a organização, em primeiro lugar das Associações de São Pio e, em seguida, da Federação das Associações Católicas, fundamentava-se no seguinte raciocínio: O objetivo último da Associação é a liberdade da Igreja, da Religião e da Educação. Ora num ambiente de  ignorância e desorientação religiosa, num ambiente em que a Igreja como instituição tem o seu prestígio abalado; num ambiente em que a educação serve mais como instrumento de subversão dos valores e dos costumes;  num ambiente em que a antiga ordem está desmoronando; num momento histórico em que o estado e a sociedade civil e religiosa estão entregues ao sabor dos movimentos revolucionários, alimentados pelo ideário iluminista, liberal, socialista, anarquista, materialista, evolucionista etc.; no momento em que as massas populares vivem uma crise de desorientação do espírito sem precedentes; no momento em que a sociedade dos limites do colapso institucional; no momento em que a miséria material atingiu o nível insuportável, diante deste  quadro, o recurso a iniciativas individuais e tópicas nada resolveriam.  Foi preciso atacar o problema coletivamente, unindo e comprometendo o maior número de pessoas e o maior número de grupos organizados.

Nas decisões tomadas e nas linhas de ação traçadas naquele remoto ano de 1848 em Mainz, estão formuladas as razões de ser e os procedimentos que orientaram  e deram força ao associativismo católico na Alemanha, na Suíça e na Áustria e, mais adiante inspiraram as grandes organizações associativas de tanta repercussão no Sul do Brasil na primeira metade do século vinte.

A liberdade da Igreja, da Religião e da Educação pressupõe como condição um povo dotado de um nível de formação profana e religiosa tal que lhe dê condições de um discernimento seguro e de tomada de decisões conscientes e responsáveis.

Aqui há um destaque da maior importância a ser feito. A referência à “miséria social como conseqüência da situação”, demonstra que o catolicismo em vias de organização, começava a preocupar-se seriamente com os problemas sociais. O momento histórico obrigava os católicos a uma reflexão objetiva e responsável sobre o próprio sentido da miséria social. Já não foi mais possível escamotear a realidade e procurar consolar o homem sofrido, espoliado e sem esperança, com o aceno de que a resignação, lhe franquearia as portas do paraíso. A assembléia reunida era formada por homens com os pés no chão, dispostos a refletir seriamente sobre o drama da sociedade presente e real e encontrar  saídas partindo de dentro dela mesma. Afinal, estamos em pleno ano da publicação do “Manifesto Comunista”.

E não pode deixar de ser notado que Marx nasceu e cresceu  naquela região fronteiriça com a França, socialmente tão problemática  na primeira metade do século dezenove. Por isso mesmo, ele pode ser visto como o intérprete e a expressão das angústias e das perplexidades daquele povo e daquela época. Marx fez a sua leitura da situação e as lideranças católicas reunidas em Mainz fizeram a deles. E cada  qual formulou  respostas, e apontou saídas de acordo com a compreensão que tivera da realidade. O velho princípio “mens sana in corpore sano” voltou a nortear os princípios de ação. Ou parafraseando. O homem  carente dos meios mais elementares para prover o bem-estar, não tem condições  de se interessar-se e, muito menos, a  comprometer-se com esforços para a melhoria social, do aperfeiçoamento político, do progresso econômico, da defesa da Igreja e da Religião e da Educação do povo. A assembléia de Mainz e a consequente mobilização do mundo católico por  meio de uma federação nacional de associações confessionais, constituiu-se, sem a menor dúvida, num  marco histórico que garantiu  um lugar ao sol para a Igreja nas regiões de cultura alemã e, por extensão, para o Sul do Brasil.

A formulação, o aperfeiçoamento e a consolidação desse ideário no plano teórico e na implantação na forma de projetos de ação concreta, terminou por resultar na via católica para resolver os problemas humanos de toda a ordem. Entre os estudiosos da questão no Sul do Brasil esse caminho está sendo chamado de “Catolicismo Social”.

O ponto alto do encontro de Mainz aconteceu na assembléia geral de 4 de outubro. Na condição de observadores convidados, participaram 23 integrantes do parlamento alemão. Os discursos sucederam-se ininterruptamente  durante seis horas. O cronista da ocasião registrou o acontecimento nos seguintes termos:

Esta assembleia, como foi observado com toda a precisão, pode ser comparada a um verdadeiro Pentecostes, um grandioso encontro de línguas, no qual se manifestou o vigor do catolicismo e o amor por ele. Todos falaram de improviso, movidos pela inspiração do Espírito Santo. De improviso no sentido corrente do termo. Num sentido mais elevado, porém, todos estavam mais do que preparados. Sem exceção os oradores todos eram homens possuídos das mais profundas convicções e conhecimentos católicos. Pois o tema sobre o qual discorriam fazia parte do seu pensamento, do seu querer e das suas expectativas, das suas preocupações e das suas esperanças. Como lhes faltaria a palavra nesta sua preocupação maior e mais sagrada? E em que tipo de assembléia falavam? Numa assembléia da qual participavam representantes de todos os rincões da pátria alemã, possuídos pela mesma convicção sagrada. Os espíritos não podiam deixar de inflamar-se mutuamente e os corações incendiar-se. Cercava-os o povo católico que os entendia, um povo que os apoiava e lhes dava segurança. Há quanto tempo nós católicos esperamos por este dia? Foi o primeiro grande encontro dos católicos alemães. Mais. A Alemanha católica em peso encontrava-se física e espiritualmente presente. Até este momento os católicos estavam dispersos,  isolados, cada qual só e entregue a si mesmo no seu canto, enredado nas próprias contradições, ignorado, hostilizado, acuado. Aqui, pelo contrário, estávamos unidos e nos entendendo mutuamente. Livres e alegres como jamais havia acontecido. Refletimos sobre a nossa própria causa, num clima  de parlamento católico. Perguntamos. Neste caso a explosão do entusiasmo seria, por acaso, um milagre?[2]   

Um pouco mais adiante continua o cronista:

E em que momento da história aconteceu a assembléia? Num momento que costuma repetir-se apenas em séculos de intervalo; num momento crucial da história,  no qual a velha ordem naufraga em ruínas e uma nova tenta nascer; num momento de tomada de decisões, de sobressaltos, de esperanças; num momento em que se questiona  tudo quanto não é eterno; um tempo em que como em nenhum outro nos sentimos nas mãos de Deus.[3] 

Depois de relatar como, nos discursos que se sucederam, os oradores analisaram a edificação da nação alemã sobre os princípios pregados por São Bonifácio; como essa nação desmoronou e tornou-se vítima da anarquia civil e religiosa; como as propostas visam simplesmente a implantar uma nova ordem sobre o direito, a liberdade e o amor, fruto não da luta por segurança, mas do sacrifício, da benemerência e da conciliação; como todo esse quadro levou, por fim, ao colapso da sociedade como um todo. Na conclusão o cronista insistiu que o problema social e a sua solução tem que ser assumida como uma obrigação pelos católicos.

( ... ) nenhuma lei é capaz de resolver a questão social, mas o cristianismo, a Igreja desprezada irá resolvê-la. É obrigação nossa resolvê-la e queremos resolvê-la, antes de mais nada por meio de um amor operoso e diuturno. Esta é uma obrigação nossa que saldemos a dívida  de amor que por tanto tempo não exercitamos, a fé que negamos pelas obras. Cabe-nos expiar essa culpa agora.[4]  

E para dar conta dessa dupla tarefa, é indispensável  a renovação interna do cristianismo e a solução da questão social.

( ... ) cabe a nós, cabe ao povo católico renovar-se no espírito e no vigor da fé. Tudo isto deverá acontecer por meio de uma grande associação católica destinada para ao Alemanha toda, destinada à preservação da liberdade da Igreja, da salvação e do restabelecimento do espírito e da moralidade e os costumes do povo, a fim de, pelo exercício da sabedoria e da operosidade cristã,  superar a pobreza e a miséria, fruto dos males sociais.[5]  

A semente da renovação lançada na assembleia dos católicos em 4 de outubro de 1848 em Mainz estava destinada a orientar  no futuro o esforço empenhado na restauração do verdadeiro espírito católico na Igreja como instituição e na comunidade dos fiéis. No primeiro sermão  sobre “os grandes problemas sociais da atualidade” proferidos na catedral de Mainz, o futuro bispo Wilhelm von Ketteler, parafraseou, por assim dizer, a decisão da assembléia geral dos católicos do ano anterior. Depois de mostrar a situação deplorável em que a Igreja e o povo foram jogados pelas circunstâncias das últimas décadas, pronunciou-se nestes termos:

Novamente nos encontramos numa encruzilhada da história. Mais numerosos e mais poderosos os inimigos  cercam a Igreja  e a cruz na qual a pregaram. A zombaria, o desprezo, a mentira e a injustiça são as cordas e os pregos que a prendem firmemente, para que não se livre jamais do seu poder. Inclusive o povo e os pobres alinharam-se em grande parte nas fileiras dos inimigos da Igreja e entre seus próprios filhos enumeram-se os seus inimigos mais ácidos. Será que nesta situação a Igreja tem condições de reerguer-se, despertará também desta vez da morte aparente? Frente ao avanço da descrença terá condições de manter  em pé a antiga fé em Deus e no cristianismo dos antepassados?, estará em condições de restabelecer a pureza dos costumes cristãos em meio à avalanche da sua deterioração?, estará em condições de, em meio à penúria e impotência, oferecer conselhos, socorros e consolos? Respondemos sem receios. Sim estamos em condições e estamos dispostos para dar testemunho desta fé, empenhando cada gota de  sangue que flui em nossas veias e conosco muitos milhões de católicos dispersos pelo vasto mundo, reafirmam o mesmo. Eis a razão da tranqüilidade e da certeza dos católicos possuídos de uma fé sólida nestes dias tempestuosos. Enquanto  ondas gigantescas ameaçam engolir tudo, o católico fiel apóia-se firmemente na rocha que as portas do inferno não logra destruir.
A fé piedosa, entretanto, não é o suficiente nestas circunstâncias. É preciso que a verdade seja  testemunhada por atos.[6]  

Duas coisas merecem destaque nessa citação. A primeira diz respeito às decisões tomadas nas assembleias dos católicos. Não só não ultrapassaram os recintos em que foram discutidas e acertadas, como logo depois foram levados aos púlpitos das igrejas e catedrais e aí apresentadas ao povo. A fermentação das massas que necessariamente tinha de preceder a recristianização foi leveda muito a sério. A segunda diz respeito ao fato de o sermão do qual extraímos  a citação acima, ter sidoroferido por Wilhelm Ketteler futuro bispo de Mainz. Notabilizou-se como principal formulador  da visão social do catolicismo na Alemanha e um dos responsáveis pela resposta oficial dada pela Igreja referente à questão social, consubstanciada na encíclica “Rerum Novarum” de Leão XIII.

Examinando um pouco mais de  perto os diversos passos  da história do associativismo  católico na Alemanha, outras evidências  aparecem, talvez mais nas entrelinhas do que formalmente expressas nos relatos. Uma delas tem muito a ver  com o fato de as referidas  iniciativas  que levaram à fundação daquelas associações, partiram do laicato católico. Percebe-se, é claro,  que esse movimento leigo contava com o respaldo e a participação do clero e das autoridades eclesiásticas. Na sua origem e essência, portanto, essas organizações foram fruto de um despertar da consciência católica, num momento de crise generalizada que levara a sociedade civil e religiosa à beira do colapso. O Estado, a Igreja, a ordem política, social, econômica e religiosa encontravam-se numa encruzilhada. Nessa conjuntura histórica, contrariamente aos tempos da Idade Média, uma multiplicidade de idéias conflitantes e cosmovisões opostas, digladiavam-se para ver quem arrebatava o maior número de adeptos. Estava mais do claro que a Igreja já não dispunha dos meios e instrumentos eficazes o bastante para uma saída única. Sua autoridade fora minada, sua doutrina e suas normas de conduta hostilizada e posta em questão, inclusive por um número assustador de católicos. O recurso ao princípio da autoridade, o argumento da santidade dos valores católicos, já não surtia um efeito seguro e generalizado no confronto com as idéias inovadoras que impregnavam a atmosfera civil e religiosa da Europa. A superação do impasse  começou a ser vislumbrado na organização dos católicos e, por meio delas, pôr em andamento um movimento para a restaurar a liberdade da igreja e a liberdade religiosa. Como a  raiz dos problemas localizava-se na esfera das idéias e dos princípios, a saída tinha que acontecer necessariamente nesse nível. E, pelo que nos permite uma leitura nas entrelinhas dos relatos, quem percebeu com muita clareza o fato foi a elite intelectual católica. A interpretação correta dos sinais dos tempos garantiu a essa “inteligentia” católica a consciência nítida  de que a reconquista da verdadeira catolicidade dar-se-ia em várias instâncias. Em primeiro lugar, o confronto seria no plano das ideias, das filosofias e das cosmovisões. Urgia demonstrar perante a sociedade culta que os princípios doutrinários da Igreja significavam algo a mais do que uma mistificação sem consistência; que as regras de conduta e a moralidade pregada pela Igreja não se resumiam num instrumento do coerção ou submissão; que a doutrina e a ordem moral estavam a serviço da defesa de um universo de valores que fazem paste integrante da cultura ocidental. Em segundo lugar, ninguém podia negar de que o ideário iluminista, racionalista, socialista, materialista etc. tivesse contaminado perigosamente  as massas populares. A aceitação por elas de muitas ideias, e de modo especial, socialistas e anarquistas, encontrou o seu maior facilitador nas circunstâncias da época.

Esse panorama compôs o pano de fundo sobre o qual as elites do laicato católico alicerçaram o seu projeto de redenção. Movidos por ele,  apontaram também o caminho por onde andar, os meios e as estratégias de ação. De saída, ficou claro que não havia espaço para soluções tópicas ou para iniciativas isoladas. A situação reclamava soluções de grande abrangência, conduzidas por meio da mobilização do maior número possível de pessoas, comprometidas em organizações ou associações bem estruturadas.

Num primeiro momento, surgiu em Mainz a “Associação de São Pio”. Ela serviu de protótipo a muitas outras similares que se multiplicaram com rapidez pela Alemanha, Suíça e Áustria. No encontro dos representantes de muitas dessas associações por ocasião da inauguração da catedral de Colônia, foi acertado um encontro em Mainz em outubro de 1848. Com a participação dos representantes da maioria   das Associações de São Pio nessa assembleia, resultou a fundação da “Federação das Associações católicas da Alemanha”. Estavam assim postas as bases para dar início à ação.

As décadas que se seguiram  iriam demonstrar o potencial quase ilimitado oferecido pela “Federação”. Inspiradas nela e, por assim dizer, à sua sombra,  multiplicaram-se dezenas de associação católicas com propostas e finalidades específicas.

Entre todas elas, e revestida da maior importância e visibilidade, foi, sem dúvida o “Partido do Centro Católico”. A hostilidade crescente contra a Igreja nos anos da unificação da Alemanha, culminando no confronto durante o “Kulturkampf”, obrigou os católicos a  arregimentar-se num partido político. A sua postura foi firme e combative, e assegurou para a Igreja e para o catolicismo um espaço definido e uma posição de respeito no cenário do império alemão unificado.

Muitos jesuítas alemães, austríacos e suíços que foram trabalhar entre os imigrantes alemães no Sul do Brasil, tinham colaborado nessas associações. Um grupo considerável deles, por sinal dos melhores quadros da ordem, haviam sido expulsos  da Alemanha por Bismarck. É compreensível que lançassem mão do associativismo católico inspirado no da Alemanha, para enfrentar os problemas de toda a ordem que vinham encontrando no novo campo de trabalho. Não tiveram que inventar nada. Bastou transplantar  o modelo e o espírito do associativismo que tão bem conheciam, direcionando-o para a realidade do sul do Brasil no final do século XIX e os início do século XX.




[1] Verhandlungen der ersten Versammlung des Katholischen Vereins Deutschlands am 3, 4, 5, 6 Oktober zu Mainz. Amtlicher Bericht, Mainz, Verlag von Kirchenheim und Schott, p. VI.
[2] Verhandlungen. op. cit. p. X.
[3] Verhandlungen. op. cit. p. X.
[4] Verhandlungen. op. cit. p. XII.
[5] Verhandlungen. op. cit. p. XIII
[6] KETTELER, Wilhelm. Die gorssen socialen Fragen – sechs Predigten gehalten im hohem Dohm zu Mainz. Mainz Verlag Kirecheim und Schott. 1849. p. 4.