Da Enxada à Cátedra [ 58 ]

Viagem pelo Rio Grande do Sul

Na segunda metade de janeiro e primeiros dias de fevereiro de 1963 aproveitei o convite do sr. Jorge Berensen, chefe do escritório da Ferrostahl em Porto Alegre, uma empresa alemã empenhada nas instalação da metalúrgica “Aços finos Piratiny”. Esse senhor embora protestante, cultivava uma grande amizade com meu colega Alcides Giehl, coordenador da Faculdade de Ciências Econômicas, na qual eu coordenava o Departamento de Economia. Em meio a essas circunstâncias, isto é, como amigo de longa data do Alcides, somado ao envolvimento funcional com o coordenador na condição de chefe do Departamento de Economia, somado à participação dos projetos acadêmicos e de desenvolvimento do vale do Rio dos Sinos, aproximei-me também do sr. Berensen. Mais abaixo volto aos projetos que estavam sendo incubados e delineados pela Direção da Faculdade de Ciências Econômicas e do importante suporte logístico a partir do representante da empresa alemã, na época também prestando serviços na implantação do porto de Tubarão no Espírito Santo e da metalúrgica Mannesmann em Minas Gerais. Acontece que convidou o Alcides e a mim para acompanhá-lo numa viagem de carro pelo centro sul do Rio Grande do Sul. O roteiro por ele traçado começou em Porto Alegre pela Br 116 passando por São Lourenço, Pelotas, Rio Grande, Palmares, Chui e de volta a Pelotas, Jaguarão, Herval, Piratini, Bagé, Livramento, Alegrete, Urugaiana, São Borja, Itaqui, São Luiz Gonzaga, São Miguel das Missões, Sto. Ângelo, Sobradinho, Santa Cruz do Sul, Tabaí, Montenegro, até em casa.

Toda a viagem foi feita numa “Wemagete” da DKW pertencente ao Berensen. Não me lembro exatamente quantos dias durou a viagem. Antes de entrar em recordações propriamente ditas é oportuno lembrar que na época o asfalto terminava em Guaiaba e em todo o restante da viagem enfrentamos estradas de chão batido. Como era verão nas centenas de quilômetros percorridos não nos surpreendeu nenhuma chuva significativa. No começo da manhã lá por 15 de janeiro partimos de Porto Alegre. A primeira parada aconteceu em São Lourenço. Além de uma circulada pela cidade fomos recebidos pelo prefeito do município Oscar Westendorf, mais tarde um político influente como deputado estadual. A visita teve o objetivo de tomar contato com as características sócio econômicas, étnicas e culturais daquela região pois um boa parte dela fora colonizada por imigrantes alemães. O encontro com o prefeito não durou mais do que uma hora. Seguimos depois viagem até Pelotas. O Berensen providenciou o pernoite num hotel e o Alcides e eu na residência dos jesuítas. Na manhã seguinte, depois de rezar missa e tomado café, o Berensen veio nos buscar para darmos uma circulada por aquela cidade emblemática pela importância histórica na formação das bases econômicas, culturais e estratégicas do extremo sul do País, envolvendo as constantes escaramuças com o espanhóis na fixação definitiva das fronteiras. Além disso o padrão arquitetónico da cidade, principalmente da área central, testemunha da época em que Pelotas dominava, por assim dizer, o abate de gado, comercialização da carne e couros. Os imigrantes alemães que se fixaram em Pelotas não tardaram em estimular o comércio, artesanatos, além de ocuparem espaço como profissionais liberais: médicos, arquitetos, engenheiros. Merece destaque o fato de os grandes frigoríficos e abatedores costumarem descartar ossos, chifres, cebo, vísceras, etc. Artesãos vindos da Alemanha deram origem a toda uma rede de pequenas indústrias utilizando esses descarte como matéria prima para fabricar sabão, farinha de osso, pentes e outras utilidades tendo os chifres e ossos como matéria prima. Para mim como jesuíta e professor Pelotas vinha com significado histórico que marcou de forma significativa a elite social no final do século XIX e primeira quinzena do século XX. Por ocasião do nosso pernoite na residência dos jesuítas em 1963 eles cuidavam de capelanias e, principalmente, da capelania da Santa Casa. Os jesuítas não se esqueceram de Pelotas, no final do século XIX a segunda cidade mais importante do Rio Grande do Sul. Em 1895 fundaram o Colégio Gonzaga oriundo de uma escola que os jesuítas mantinham na cidade. Em 1907 o número de alunos subira para 319. Em 1905 o Gonzaga foi equiparado ao D. Pedro II. Encerrou suas atividades como consequência da Lei Rivadavia de 5 de abril de 1911, que privou os colégios da equiparação com o D. Pedro II.

Depois de um segundo pernoite em Pelotas, seguimos viagem até Rio Grande. A visita foi rápida, menos de um dia. Os poucos quilômetros que separam Rio Grande de Pelotas foram na época a única estrada pavimentada que percorremos no restante da viagem. Para aqueles que têm um mínimo de conhecimento da história do Rio Grande do Sul conhecem Rio Grande com seu porto que recua até período colonial e exerceu um papel decisivo na consolidação das fronteiras com as colônias sob o domínio espanhol, mais tarde, com as repúblicas do Uruguai e Argentina. Não é aqui o lugar para entrar em detalhes do conhecimento das pessoas minimamente informadas sobre essa fase da história da região do Prata. Não vou me demorar também com considerações sobre a importância do Rio Grande e, de modo especial seu porto com sua localização estratégica. Estava em andamento a ampliação e modernização do porto para atender a estratégia do desenvolvimento do País no momento como embarque de exportação da produção agropecuária e importação de mercadorias que contribuem com um importante reforço do PIB do País como um todo.

Rio Grande com suas características geomorfológicas permitiu o acesso, como porto de entrada para o Rio Grande do Sul. Somava-se a isso a sua localização estratégica, junto com a ilha de Santa Catarina, na rota dos navios que desciam pela costa vindos do norte com destino ao Prata. O que, porém, merece destaque especial foi o papel que coube ao porto de Rio Grande como ponto de desembarque dos imigrantes alemães a partir de 1824. Na primeira etapa os veleiros e mais tarde os vapores que transportavam os imigrantes faziam a travessia do Atlântico até o Rio de Janeiro. De lá navios costeiros os levavam até o porto de Rio Grande. Subiam depois pela Lagoa dos Patos até o Guaíba e Porto Alegre para seguirem viajem pelo rio Dos Sinos até São Leopoldo, polo a partir do qual foram colonizando o vale desse rio, avançando sempre mais sobre as florestas virgens para o interior do Estado. Caminhando pelas ruas da cidade 140 anos depois do desembarque dos primeiros imigrantes alemães naquele porto, passou-me pela imaginação a extensão do significado daquele fato histórico. Procurei imaginar-me o ânimo daqueles homens e mulheres obrigados a deixarem suas querências seculares por absoluta falta de perspetivas de um futuro para seus filhos e netos. Com a certeza de nunca mais retornarem reuniam no cais do porto os poucos pertences que conseguiram trazer, junto com os filhos, geralmente pequenos, devem ter olhado com um misto de surpresa, apreensão e esperança aquele cenário em que prosperariam ou sucumbiriam os filhos e netos. Sabiam muito bem que os esperava um duro começo, que não os esperava um paraíso mas, em compensação um futuro que já não vislumbravam na pátria de origem. Imaginei o que deve ter passado pela mente e apertado o coração do meu trisavô Mathias e minha trisavó Susana com dois filhos pequenos tomando pé em fins de março de 1830, no chão em que nasceriam seus numerosos descendentes, hoje já na décima geração e encontráveis em praticamente todo o Brasil, com destaque para região sul. Como aconteceu em Pelotas estabeleceram-se em Rio Grande comerciantes, profissionais liberais, empresários imigrados com os colonos, influindo sensivelmente no perfil da sociedade da cidade portuária. A justiça manda destacar um outro elemento presente em qualquer centro urbano onde jesuítas alemães se encarregavam do atendimento religioso. Falamos da educação como ferramenta pastoral direta ou indireta. Mais acima destacamos o empenho na formação profana e religiosa no Colégio Gonzaga. Pois, em Rio Grande os jesuítas instalaram uma residência e a partir dela atendiam capelanias e hospitais. Puseram a funcionar o Colégio Stella Maris, mais tarde sob a direção do Pe. Reus passou a chamar-se Colégio Sagrado Coração de Jesus. Para concluir nossa visita a Rio Grande não posso deixar de mencionar deixar a fundação da Liga dos Operários Católicos por iniciativa do Pe. Reus que se informara ainda na Alemanha sobre esse tipo de organizações em pleno vigor e florescimento naquele país, Suíça e Áustria. Pode-se afirmar que foi a primeira organização de operários, embora confessional, criada no Brasil. Inspirado nessa organização o Pe. Leopoldo Brentano fundou, em 1932, os “Círculos Operários” que tiveram um desempenho marcante na organização dos operários no Brasil inteiro, ao ponto de coordenarem as organizações filiadas a partir da central sediada na capital do País. Quem estiver interessado sobre os detalhes dessa história protagonizada pelo Pe. Reus, recomendo a Biografia da minha autoria sobre ele, ainda não publicada de forma convencional mas, no formato de Eboock.

Da Enxada à Cátedra [ 57 ]

Depois do Natal foi a vez de rever depois de longos anos a minha querência, a minha Heimat lá no alto do Morro da Manteiga em Tupandi. Viajei os em torno de 10 quilômetros de Harmonia até a então vila de Tupandi de ônibus. Pedi emprestado um cavalo a um parente próximo e subi pela estrada de chão com suas curvas emblemáticas, o córrego saindo da mata virgem onde costumávamos descansar ao voltarmos da missa nos domingos, um paredão de rocha com fama de lugar misterioso durante a noite. Uma trilha na faixa de floresta virgem na encosta do morro transitável apenas a pé ou a cavalo terminava na moradia do meu tio Antônio, irmão do meu pai, passava perto do grande potreiro com uma monumental araucária solitária e a bela casa do Pedro Hensel e pouco adiante a moradia do Frederico Sehnem. Mais ou menos duzentos metros além uma porteira franqueava a entrada no curral de porcos. Grandes ameixeiras (nêsperas), uma enorme touceira de Três Marias à esquerda e, um pouco além a casa de madeira bruta na qual nasci, rodeada de camélias, o enorme plátano nos fundos e um majestoso guabiju poupado por meu avô quando abriu a primeira clareira na mata virgem para construir aquela casa. Hoje a casa já não faz parte da paisagem assim como o plátano, o guabiju, as laranjeiras, as camélias, os marmeleiros e tantas outras árvores que fizeram parte do cenário da minha infância. Chegando mais perto levei um choque. A cozinha construída separada como mandava o costume da época, ligada à casa propriamente dita por uma passagem com telhado, fora demolida. Muitos outros detalhes emblemáticos para a minha infância já não estavam lá. Dei-me conta então que uma parcela importante do chão onde minha existência deitara raízes já não existia mais. Não consegui, por mais que esforçasse, sentir-me em casa. Sentia-me um estranho, um forasteiro, um transeunte naquele cenário onde nem tanto tempo passado encontrava-me em casa – “Zuhause”. Meu sobrinho e família conversamos na cozinha instalada na peça que fora meu quarto de dormir. Faltou-me ânimo para percorrer as demais dependências, muito menos o velho sótão com um enorme baú de carvalho trazido ainda da Europa por meu bisavô materno. Temia surpresas que seguramente não deixariam de machucar.

Da “minha casa”, irreconhecível, da qual praticamente tudo que pretendia reencontrar só sobraram vestígios, fui pernoitar na casa da minha cunhada viúva, 100 metros adiante. No dia seguinte esperava um compromisso muito importante, pelo menos na época, isto é, dar uma instrução preparatória para o matrimônio de duas sobrinhas, a Helena e a Marta com os respetivos noivos,conhecida como a “instrução para noivos”. Como marinheiro de primeira água nessa função dei o que achei de melhor. De acordo com a prática usual da época a “instrução “ terminou com a confissão dos noivos. Os noivos seguiram seu caminho e eu voltei para pernoitar na casa da minha cunhada Apolônia viúva do meu irmão Raimundo. Na manhã seguinte foi a vez de subirmos a cavalo até a Linha Babilônia onde me cabia presidir o matrimônio das duas sobrinhas. Obedecendo ao costume da época a cerimônia foi integrado na liturgia da missa. Para mim foi um acontecimento muito gratificante presidir o duplo matrimônio de duas sobrinhas filhas do meu irmão Raimundo, meu inseparável parceiro e modelo, como irmão maior, na infância. Naquela data, faziam 8 anos que ele “passara para o outro lado do caminho” como diria Santo Agostinho e com certeza abençoou lá da outra dimensão suas filhas e futuras famílias, junto com meu pai, minha irmã Ana e o Pe. Balduino.

Seguiu um almoço melhorado, porém, simples como costumavam ser os almoços dos casamentos da época em que, no interior colonial, o compromisso familiar e comunitário, os costumes frugais, e autenticidade do relacionamento das pessoas, ditava o ritmo do quotidiano. Hoje as duas sobrinhas, a Marta e a Helena são viúvas e os filhos bem sucedidos porque lhes souberam dar a educação que herdaram dos pais e avós. Em novembro de 2012 voltei para a Linha Babilônia para dar um abraço de solidariedade por ocasião do velório do marido da Helena, faltando dois meses para celebrarem as bodas de ouro.

Depois de pernoitar de novo na casa da cunhada Apolônia desci na tarde do dia seguinte o Morro da Manteiga para me hospedar na casa paroquial e no dia seguinte, domingo, celebrar a missa para a comunidade na igreja matriz de Tupandi. Por minha surpresa encontrei no caminho, na entrada da vila, meu antigo professor José Brandt, da escolinha do Morro da Manteiga. Tive um choque. Visivelmente envelhecido sua reação foi de um encontro com um desconhecido. Esse homem que fora o líder da comunidade, o regente do coral, respeitado pela integridade de caráter, o responsável por meu entusiasmo pelo saber e grande incentivador para entrar no seminário, entrar na Companhia de Jesus em busca de sempre mais conhecimento, parecia a sombra do que fora. Na manhã seguinte celebrei a missa na igreja matriz e fiz uma homilia em alemão para os presentes do alto do emblemático púlpito mandado esculpir pelo Pe. Mathias Pfluger, fundador da paróquia e seu pároco por mais de 30 anos, e no qual pregaram Johannes Rick, Johannes Hann, Stephan Gotzmann e outros mais, responsáveis pelo perfil da religiosidade daquela comunidade, um modelo do autêntico catolicismo de 60 anos passados. Quando, depois daquela missa caminhei a pé até Harmonia, cerca de 8 quilômetros, acometeu-me a desagradável sensação de ter passado uma semana como forasteiro nos espaços, lugares e caminhos que foram o palco da minha infância.

Sem grandes novidades demorei-me mais alguns dias em Harmonia com minha mãe, o irmão e família. Voltei de ônibus a São Leopoldo para apresentar-me a meu superior. O reencontro não foi nada agradável pois, em tom de reprimenda lembrou-me que me tinha demorado por perto de uma semana além do que na época previa a regulamentação relativa a permanência com a família e na terra natal por ocasião da primeira missa solene.

Da Enxada à Cátedra [ 56 ]

Ano de 1962

O ano de 1962 veio a significar um marco que, apesar da correção radical da rota 10 anos mais tarde, foi de uma importância existencial difícil de avaliar. A docência na universidade não trouxe grandes novidades durante todo esse ano. Nas terças feiras à tarde meus alunos vinham do curso de Geografia, por sinal não passavam de uma dezena; nas quartas-feiras de manhã vinham do Curso de História; nas quartas-feiras à tarde do Curso de Ciências Sociais. Foi um ano tranquilo sob o aspeto acadêmico. Como estudante do terceiro ano de Teologia a lógica da formação do jesuíta previa a ordenação sacerdotal para o dia 7 de dezembro. Ainda no primeiro semestre, não me lembro exatamente da data, fui ordenado subdiácono. Em fins de novembro prestei o exame de Teologia com um ótimo resultado o que valeu continuar na “Teologia Maior” no quarto e último ano. Em começos de dezembro sobreveio a ordenação como diácono. E, no dia 7 de dezembro, o coroamento de 12 anos de vida religiosa como jesuíta, fui ordenado sacerdote junto com meus colegas na capela do Colégio Cristo Rei. O arcebispo de Porto Alegre, D. Vicente Scherer, presidiu a cerimônia. Minha mãe, o irmão Bertoldo e o Pe. Roberto prestigiaram o acontecimento. Meus sobrinhos do Morro da Manteiga compareceram num ônibus alugado. Concluída a cerimônia litúrgica seguiram os cumprimentos do arcebispo, dos professores de Filosofia e Teologia, dos irmãos leigos, dos colegas de curso, amigos, para, por fim, reunir-me com minha mãe, meus dois irmãos e demais parentes e vizinhos presentes. Ao meio dia encontramo-nos no refeitório para o almoço festivo oferecido aos novos sacerdotes e seus familiares. Pela meia tarde minha mãe e o Bertoldo voltaram para casa na Harmonia e demais parentes no ônibus para Tupandi e o Morro da Manteiga. Quanto me recordo não apareceu nenhum dos meus colegas professores da universidade, nem uma manifestação de simpatia da parte dos meus superiores daquela instituição. Na manhã seguinte, 8 de dezembro, dia da Imaculada Conceição, celebrei a primeira missa no altar mor da capela do Cristo Rei, tendo como assistente meu irmão, o Pe. Roberto.

Não me lembro ao certo do dia, se foi 22 ou 23 de dezembro, celebrei a primeira missa solene na matriz de Harmonia. Meu primo, o Pe. Germano, pároco da Glória em Porto Alegre, levou-me até lá. Esperavam-me minha mãe, o Bertoldo, o Pe. Roberto, o tio Roberto, irmão da mãe, sobrinhos e outros parentes. A cerimônia de recepção pela comunidade aconteceu às 15 h. na frente da igreja paroquial. Foi singela e sem o aparato que descrevi mais acima quando da primeira missa solene dos meus dois irmãos mais velhos, na terra natal de Tupandi. Como mandava o costume da época, minha mãe colocou uma grinalda de flores na minha cabeça. Entramos na igreja e depois da bênção Santíssimo, estava concluída a programação para aquela tarde de sábado. No final da tarde a mãe e familiares reunimo-nos na sombra das árvores no pátio da casa do Bertoldo para um chimarrão e uma conversa entre os familiares mais próximos. Uma visível atmosfera de melancolia, para não dizer tristeza fez com que aquele encontro, que deveria ser de festa, se gravou na minha memória como um momento de frustração. Sonhara a vida toda com aquele dia tendo como pano de fundo as primeiras missas solenes dos meus dois irmãos mais velhos. Começou pelo fato de o acontecimento não ter acontecido na terra natal, Tupandi mas em Harmonia, uma comunidade para quem eu não passava de um estranho e ela estranha para mim. Por não ter morado lá não conhecia quase ninguém. Meus conhecidos e amigos de infância residiam em Tupandi. Mas o fator mais determinante desse clima foi a ausência do meu pai, falecido em 1947, meu irmão Raimundo e minha irmã e confidente Ana, ambos falecidos em 1954, o Pe. Balduino falecido em setembro do ano anterior, o Fridolino morando lá longe em São João do Oeste, sem condições de estar presente devido à distância e à precariedade das estradas e meios de comunicação. Na manhã seguinte às 9 h. celebrei a primeira missa solene cantada em latim e gregoriano pois, ainda estamos no período pré conciliar. O Pe. Roberto esmerou-se num sermão simples, porém, carregado de significado por duas razões: pela reflexão que apresentou e por substituir o Pe. Balduino que tanto minha mãe, meus irmãos e familiares e não em último lugar a comunidade estava esperando e eu tinha escolhido para pregar naquela solenidade. Minha madrinha de batismo, Bárbara Both, presenteara-me com os paramentos vestidos na solenidade. A atmosfera que ofuscou e em parte frustrou a minha espectativa contou com mais um agravante. O pároco de Harmonia há muitos anos naquele posto muito pouco se empenhou para preparar os paroquianos para um acontecimento tão significativo para a vida religiosa comunitária, pelo menos naquela época. Tive a impressão que eu não passava de uma espécie de intruso pois, não era filho de Harmonia. Também o coral deixou muito a desejar. Soube mais tarde do Bertoldo que, por um nada o regente com o coral se negara a colaborar porque não tinham sido convidados para o almoço festivo. Acontece que nem minha mãe, nem o Bertoldo tinham condições de bancar um almoço para pessoas que não fossem parentes próximos. Conhecendo essa situação deixei para minha mãe a soma em dinheiro que parentes de mais posse me deram como presente e assim ajudar a cobrir a despesa com o almoço no salão dos Fink. Para a noite, no mesmo salão do Fink, meus sobrinhos tinham preparado um encontro aberto ao público com poesias, cantos, um teatrinho como encerramento. Em poucas linhas é nesses termos que me recordo do momento mais esperado e mais ainda, sonhado desde os anos da remota infância lá no Morro da Manteiga, quase um pesadelo depois uma noite mal dormida.

Véspera do Natal 24 de dezembro. Naquele remoto ano de 1962 ainda vigorava o costume de as pessoas se confessarem em peso em duas ocasiões: na véspera do Natal e na Quinta-Feira da Semana Santa. O pároco convocou-me para estar a postos no confessionário às 7 horas da manhã. Apresentei-me pontualmente e me deparei com uma fila de duas dezenas de penitentes esperando. Acomodei-me no confessionário munido de um contador de confissões, um aparelhinho acionado com o dedo depois de cada confissão. A soma tinha que ser anotada no livro de registros da paróquia. Tirando duas ou três interrupções de cinco minutos fiquei trancado naquele móvel abafado até a hora do meio dia, ouvindo os “pecados”, no mínimo 95% sem importância maior. Às 13 horas estava de volta para mais uma jornada até pelas 18. Ao sair da igreja para um rápido lanche, esperava uma viatura para levar-me até o “Gauereck”, hoje São José do Sul. Passei literalmente a noite inteira trancado no confessionário. Pelas 4 h. da madrugada o sono me derrubou e dei uma breve cochilada. O penitente esperou pacientemente e quando percebeu que me recompusera, educadamente perguntou: “padre, posso continuar?”. Às 8 h. celebrei missa na capela do Gauereck. Ao sair da capela uma viatura me esperava para às 10 h. celebrar outra missa na capela do Despique. Perto de meio dia me deixaram na casa do Bertoldo, desejei um feliz Natal para a minha mãe e ao Bertoldo e família. Depois do almoço minha mãe ofereceu-me a sua cama para dormir. Foi o meu batismo de fogo como sacerdote. Com meus 32 anos 4 horas bem dormidas na cama da mãe, estava pronto para outra. Nas entrelinhas percebe- se facilmente que o pároco se recolheu para sua casa canônica tranquila largando nas costas de um novato de primeira viagem a parte ingrata dos compromissos pastorais do Natal. De qualquer maneira sempre considerei esse episódio como mais uma parcela importante no delineamento da minha trajetória. Mesmo há mais de 50 anos afastado da condição clerical, lembro-me com carinho daquele tempo pois, tenho certeza, que contribuiu significativamente na minha postura perante as eventualidades da vida que iria enfrentar nas mais diversas situações posteriores.

Da Enxada à Cátedra [ 55 ]

Falecimento do Pe. Balduino Rambo – 12/09/1961

Para o segundo semestre esperava-me um autêntico temporal que repercutiria por muitos anos na minha jornada, tanto como docente na universidade, quanto como estudante de Teologia e não menos sobre a condição de jesuíta. No dia 11 de setembro pelo fim da tarde fui surpreendido com um telefonema do Colégio Anchieta informando que o Pe. Balduino fora encontrado sentado na sua mesa de trabalho, cabeça apoiada na mesa semi consciente. Foram-lhe administrados os sacramentos dos enfermos graves e internado no pavilhão Eliseu Paglioli junto à Santa Casa de Misericórdia, especializado no atendimento a pacientes acometidos de acidente vascular e outros problemas cerebrais e neurológicos. Uma combi do Cristo Rei levou-me até o hospital em Porto Alegre. Ao entrar no quarto deparei-me com um cenário que se fixou na minha memória com uma nitidez como poucas mais tarde. Lá jazia sobre a cama do hospital aquele homem dinâmico e indomável, cientista de renome internacional, professor catedrático da Universidade Federal do Rio Grande do sul, respeitado pelos alunos e colegas, amante da natureza e idealizador do Parque dos Aparados da Serra e da Fundação Zoo-botânica, diretor do Museu de História Natural do Estado, fervoroso defensor do seu amado povo colonial e sua cultura cujo futuro lhe rendia sérias preocupações e, sobretudo, meu irmão maior que me franqueara as portas para uma bela e frutuosa carreira como professor universitário. Demorei-me por uma boa meia hora junto a ele no quarto. Pelo que pude avaliar não me reconheceu. Passei a noite no Colégio Anchieta na rua Duque de Caxias e na manhã do dia 12 de setembro desci até a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, na época ainda situada na Paulo Gama. No caminho aproveitei para passar no hospital. O médico assegurou-me que durante a noite foram percebidas sensíveis sinais de melhora e a pressão voltara ao normal. Informei o diretor da Faculdade, prof. Luiz Pilla sobre a situação para, em seguida retornar ao Anchieta e aguardar o desenrolar dos acontecimentos. Na portaria do Colégio encontrei o Reitor, Pe. José H. Nunes que, sem outro comentário, apenas disse: ele acaba de falecer. Soube depois que, logo após a minha visita, sobreviera um novo derrame, dessa vez fatal. Começaram então os preparativos para o velório na capela do Anchieta. Minha mãe e meus irmãos foram informados por telefone e lá pelo meio dia o corpo chegou à capela. Começou então o desfile dos professores da Universidade, alunos e ex-alunos, amigos e colaboradores na atividade científica, do Museu do Estado, da fundação do Parque dos Aparados da Serra da Fundação Zoo-botânica, da Sociedade União Popular, da SEF (Socorro à Europa Faminta), além de muitos outros. Pela meia tarde meu irmão Bertoldo trouxe a mãe. O velório ficou aberto a noite toda e a procissão de pessoas continuou ininterrupta até a manhã seguinte. Acompanhei a mãe até o Orfanato da Piedade nos fundos do Colégio Sevingué, onde as irmãs franciscanas providenciaram o pernoite. Na manhã do dia 13 o bispo auxiliar, D. Edmundo Kunz, o arcebispo não apareceu, celebrou a missa de corpo presente na catedral. Em seguida o cortejo fúnebre se movimentou até o cemitério dos jesuítas em São Leopoldo. Ao subirmos a meia dúzia de degraus para o cemitério o superior provincial dos jesuítas conversava em meio a gargalhadas sentado num dos degraus. Fiquei chocado, ainda mais que nem no velório no Anchieta aparecera, nem participara da missa de corpo presente na catedral. Outra surpresa desagradável estava por vir. Pedira ao regente do coral do Cristo Rei, por sinal um colega meu de Teologia, para cantar em alemão um canto tradicional para essa ocasião, em consideração à minha mãe que não entendia, muito menos falava português. O pedido foi ignorado e com isso privaram essa mulher viúva, mãe de três jesuítas e uma filha religiosa franciscana, de uma manifestação de valorização e carinho tão importante num momento como aquele. Sem querer veio-me à memória a inveja, o ciúme, a maldita invidia clericalis” que amargurou o relacionamento do Balduino com não poucos dos seus irmãos de ordem e terminou por um envelhecimento precoce. Nos registros do seu diário referências a essa situação tornam-se cada vez mais frequentes no decorrer da última década da sua vida. O mesmo pude notar nas conversas informais como irmão de sangue e de ordem religiosa. A negação de um canto em alemão para minha mãe fez-me relembrar a “suástica” acompanhando a minha foto no painel de boas-vindas aos novos teólogos no ano anterior. Guardo comigo uma foto tirada junto ao túmulo coberto de flores, depois de concluído o cerimonial litúrgico. Nessa fotografia aparecem os amigos e colaboradores do Pe. Balduino_ Alexander Gecke, Antônio Campani, Fritz Rotermund, Albano Volkmer, meu irmão Bertoldo, o Pe Roberto, minha mãe e eu.

O falecimento inesperado do Pe. Balduino resultou num impasse de não pequenas proporções na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras com a vacância da cátedra de Etnografia e Etnologia da qual ele fora o titular fundador. A congregação da faculdade composta pelos catedráticos, entendeu que o Pe. Pe. Ignácio Schmitz, docente desde 1959 e eu desde 1960, como assistentes carecíamos de experiência para assumir a cátedra. Nesse jogo entraram, sem dúvida também interesses pessoais de titulares de outras cátedras. Tinham em mãos uma bela oportunidade para acomodar um candidato de sua preferência. Não poucos nomes circularam nas altas rodas da faculdade, inclusive de docentes de outras universidades federais, como a do Paraná. No frigir dos ovos os senhores do Conselho da faculdade chegaram ao um acordo e propuseram o nome do Pe. I. Schmitz o mais antigo dos assistentes, para a promoção a catedrático. Opção foi aceita pelos altos escalões da universidade e o impasse resolvido. Acontece que tanto o Pe. Schmitz quanto eu trabalhávamos no regime de 12 horas e as demandas da disciplina pediam um reforço. De acordo com o ritual burocrático da contratação de novos docentes, o Pe. Schmitz convidou o prof. Sérgio Teixeira para preencher a vaga. Depois de dois semestres de experiência com Instrutor de Ensino Superior submeteu-se ao concurso prescrito e foi efetivado como assistente.

O segundo semestre de Teologia não trouxe grandes novidades. Fui aprovado com folga no exame final e, para 1962 continuei no nível da Teologia Maior. Como no verão anterior acompanhei meus colegas de teologia para uma temporada de duas semanas de férias no Morro das Pedras em Florianópolis. No dia 8 de dezembro o Ignácio Schmitz foi ordenado sacerdote. Convidou-me para as solenidades da primeira missa solene em Bom Princípio no domingo antes do Natal. Para o sermão festivo ele escolhera o Pe. Balduino, famoso pelas suas prédicas nessas ocasiões. A sua morte inesperada levou-o a optar pelo Pe. Emílio Hartmann coordenador pedagógico do Colégio Anchieta. Naquela ocasião hospedei-me na casa de um prima moradora de Bom Princípio.

O cenário político nacional foi sacudido no segundo semestre por um autêntico vendaval provocado pela espalhafatosa renúncia do Presidente da República, Jânio Quadros. Acontece que o vice-presidente João Goulart, o Jango, encontrava-se em viagem na China. O presidente da Câmara Rainieri Masilli, assumiu a interinidade como mandava a constituição. Lideranças políticas importantes, apoiadas por segmentos militares não menos decididos tentaram impedir a posse de Jango na sua volta da China. Sob a liderança de Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, apoiado pelo comandante do Sul, general José Machado Lopes, desencadeou o movimento da “Legalidade” que se estendeu de 25 de agosto até 7 de setembro de 1961. Os quartéis do terceiro exército, com destaque para o Rio Grande do Sul, entraram em prontidão e mobilizados para enfrentar as tropas do segundo exército favoráveis ao impedimento do vice-presidente. O então décimo nono regimento de infantaria de São Leopoldo recebeu ordem de marchar em direção ao centro do País, para enfrentar as tropas que avançavam para o sul. Um ou dois colegas meus de teologia acompanharam a tropa na condição de capelães militares. Nesse meio tempo o Congresso Nacional em sintonia com o Alto Comando das forças armadas negociaram uma solução intermediária. Implantaram o Parlamentarismo e Jango assumiu na condição de Presidente e Francisco Brochado da Rocha como primeiro ministro. Um pouco mais de um ano depois, um plebiscito restaurou o regime presidencialista e Jango governou nessa condição até 31 de março de 1964, quando, em companhia de Leonel Brisola fugiu para Porto Alegre para organizar a resistência. Percebendo a inutilidade dessa empreitada em função da pressão militar, refugiou-se no Uruguai. O Congresso Nacional declarou vaga a Presidência da República e o presidente da Câmara, Reinieri Masilli assumiu provisoriamente como Presidente interino. No dia 15 de abril o Congresso elegeu o marechal Castelo Branco como Presidente. Computando as datas observa-se que o falecimento do Pe. Balduino ocorreu poucos dias após o episódio da Legalidade. Não é aqui o lugar para me demorar numa abordagem mais detalhada desse episódio. Inúmeros historiadores já se debruçaram sobre o assunto e, de mais a mais, impactou muito pouco, para não dizer quase nada, na minha rotina de estudante de teologia e docente na universidade.

Um detalhe que não posso deixar de lembrar foi a troca da batina clerical pelo clargyman há muito adotado pelos jesuítas norte-americanos. Em poucas palavras resumia-se num terno comum da moda, com um colete munido dum colarinho clerical que distinguia os religiosos católicos dos de outras confissões cristãs. O chapéu clerical jocosamente apelidado de “torrador de café” foi banido definitivamente entre os religiosos comuns. Continuou sendo emblemático para as categorias mais elevadas na hierarquia eclesiástica como bispos e cardeias. Meu primo Roberto, alfaiate em Porto Alegre, confecionou-me um terno de tergal cinza e o colete com colarinho clerical, o “Clergyman”. Lembro-me como se tivesse sido ontem que numa terça-feira depois do meio dia desci até o ponto de ônibus, atravessando a horta do Cristo Rei, onde hoje se localiza o Bairro Cristo Rei, até a altura do Centro Clínico Estadual, então “Alumínio Ecnômico de Augusto Meyer. Ao me apresentar aos alunos com essa metamorfose fui saudado com uma sonora salva de palmas. Tempos novos com seus prós e contras alinhavam-se na linha do horizonte da história, no meu caso, tanto na história da academia quanto na condição de religioso jesuíta. Remeto para mais abaixo a análise aprofundada dessa guinada com seus lances de maior significado.

Da Enxada à Cátedra [ 54 ]

Compreendo que após 6 décadas a Antropologia como disciplina acadêmica, como campo de pesquisa, como atividade profissional, tenha evoluído ao irreconhecível, tomando-se como referência o programa acima detalhado. Não me sinto em condições e nem me interessa emitir um juízo crítico sobre os rumos que a Antropologia seguiu, sua proposta acadêmica, o espaço que revindica no contesto das Ciências Humanas e sua postura político ideológica nas circunstâncias do começo da terceira década do terceiro milênio. Faço meu o princípio que me parece adequado em situações do gênero: “Louvar não posso, criticar não devo, por isso calo-me”.

Para o segundo semestre de 1960 ocorreu uma alteração na distribuição das tarefas docentes. O Pe. Balduino catedrático da cadeira de Etnografia e Etnologia recebera um convite do governo da RFA (República Federal da Alemanha) e do Instituto Ibero-Americano de Berlim, para passar 4 meses na Alemanha e outros países da Europa Central e do Norte: França, Inglaterra, Suécia, Holanda, Áustria e Suíça. Como soubera do convite em fevereiro ele adiantara em parte suas obrigações docentes na universidade. O Pe. Ignácio Schmitz, também seu assistente e eu repartimos o que tinha ficado para trás. Além disso segundo semestre letivo de 1960 transcorreu sem mais novidades. Em fins de outubro o Pe. Balduino voltou da sua viagem à Europa.

O evento decisivo para o meu futuro como docente na Universidade Federal do Rio Grande do Sul aconteceu na primeira metade de dezembro daquele ano. Mais acima já lembrei que, na época, a carreira do docente universitário público começava com o convite do catedrático da respetiva disciplina e, nos primeiros dois semestres cumpria a sua tarefa na condição de “instrutor de ensino superior”, isto é, um estágio para avaliar o seu desempenho. O contrato que o vinculava à universidade tinha caráter temporário. A entrada no funcionalismo público federal e ser enquadrado no estatuto que o regia, pressupunha um ritual previsto no estatuto da universidade, frente a uma comissão examinadora, no meu caso, indicada pela Congregação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. O presidente costumava ser o catedrático da disciplina, no caso o Pe. Balduino. Os outros dois foram professores de história. O concurso consistiu numa prova escrita, numa prova oral cujas questões foram formuladas pela comissão e, por fim, uma aula prática. Não me lembro exatamente das questões das duas primeiras. Para a aula prática o tema escolhido foia “Dinâmica da ocupação da Ásia Oriental”. O resultado foi de todo em todo compensador. Fui aprovado com a média de 9,50. O Balduino, como ele mesmo me confidenciou mais tarde, foi o responsável por não ter alcançado a nota máxima. Compreendi perfeitamente a sua posição. Como catedrático, somado ao fato de ser meu irmão, não quis ser acusado de me ter protegido.

De qualquer forma estava plenamente habilitado para que meu nome fosse chancelado pelo ministério da educação e minha efetivação com professor universitário federal assinada pelo presidente da República, fato que se efetivou na segunda metade de janeiro de 1961. Com a efetivação passei à categoria de assistente e funcionalmente estável de acordo com o estatuto do funcionalismo público federal. De volta ao Colégio Cristo Rei, o reitor Pe. Arthur Bohnen, comunicou o bom resultado do concurso a toda a comunidade dos jesuítas reunida para o almoço no refeitório. Guardo esse reconhecimento público do meu superior religioso como uma grata recordação desse meu xará que não só sempre me apoiou como me defendeu contra os que estranhavam a minha condição de aluno de Teologia e, ao mesmo tempo, docente na universidade pública.

No sábado depois do concurso o Pe. Balduino buscou-me com o seu jeep” para fazermos uma visita à nossa mãe em Harmonia, naquela altura com 76 anos morando com meu irmão Bertoldo e família. Daquela visita consta a última fotografia com o Balduino de que me lembro e guardo entre as minhas relíquias. Em meados de dezembro acompanhei meus colegas teólogos para duas semanas de férias na Casa de Retiro do Morro das Pedras no sul da ilha de Florianópolis. O ritual das férias naquele local, as caminhadas pela floresta que cobre a encosta do outro lado da lagoa do Pery, os morros da Armação, as praias adjacentes, já descrevi mais acima numa outra temporada de férias naquele local, na época com a paisagem praticamente intocada. Registro contudo três programações que merecem destaque. A primeira foi um passeio de barco de um dia à ilha do Campeche. Ao desembarcarmos na pequena praia tranquila do lado oposto do mar grosso, fomos recebidos por um bando de quatis que viviam na pequena floresta cobrindo a encosta da ilha do lado protegido do vento do oceano. O dia foi curto para observar e apreciar em detalhe a geomorfologia toda moldada em granito, a vegetação, a fauna e flora. Lembro com destaque especial a face da ilha que dá para o lado do alto mar com seus blocos de granito e sobre eles os vestígios entalhados deixados pelos índios dos tempos passados. Aquele cenário moldado por incontáveis milhões de anos fez-me sentar num bloco de granito voltado para o oceano que lá longe se confundia com a linha do horizonte e deixar correr livre a imaginação em busca de uma resposta como tudo aquilo começou, como evoluiu até receber os homens que deixaram as marcas da sua presença nas rochas, confiando aos arqueólogos a tarefa de tentar decifrar o xadrez da sua identidade. Em momentos de reflexão do gênero costuma aflorar na memória o que a lenda atribui ao monge inglês Cadmon, poeta e pastor de ovelhas, que numa noite solitária de vigília junto ao rebanho escutou uma voz vinda do fundo da noite: “Cadmon, canta-me a canção do começo de todas as coisas”. Nesse micro ecossistema que vem a ser a ilha do Campeche, assim com dezenas de outras ao longo da costa e Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e mais para o norte, poderiam muito bem servir de espaço para uma aula de ecologia ao ar livre para todos os níveis de ensino. Sem jaleco, sem quadro, negro, sem power point, sem qualquer outro equipamento além da capacidade de admirar, de ouvir, de sentir, de degustar e cheirar a natureza, de fareja-la na sua forma original e sem as inevitáveis distorções quando descrita nos livros, cantada pelos poetas, desenhada pelos artistas ou retratada em qualquer outra modalidade de representação.

Numa segunda saída, também de um dia, foi para a colônia de pescadores do Pantano do Sul. Na época aquela enseada paradisíaca emoldurada pelos morros cobertos de mata virgem, uma ilha a poucos quilômetros para dentro do oceano, ainda não fora profanada pela invasão do turismo. Lá vivia uma pacífica e laboriosa comunidade de pescadores. Chegamos de manhã na hora em que eles arrastavam as redes para a praia. O resultado daquela manhã não foi extraordinário, porém, recompensou o esforço dos valentes pescadores. Enchovas, alguns tubarões de porte relativamente modesto, garoupas, tainhas e outros mais. Para mim como antropólogo interessou naquela visita, antes de mais nada o tipo humano, homens mulheres e crianças, que compunham aquela comunidade, seus trajes, a organização das modestas moradias, os barcos de pesca e, sobretudo o ritual e as técnicas de manuseio dos barcos, das redes e, principalmente, a preparação dos peixes para serem comercializados e uma parte para o consumo diário das famílias dos pescadores. Para o almoço fomos brindados com um saboroso ensopado de enchova temperado com conversa amena, além de preciosas informações sobre a vida dos pescadores, úteis para ilustrar as preleções na universidade.

Um terceiro programa levou-nos até a ilha do Anhatomerim (Pequena Ilha do Diabo em Tupi) na entrada da baía norte da ilha de Florianópolis, bem próxima ao continente. A ilha toda não passa de uma fortaleza com uma área total de 4 hectares, sentinela e vigia da entrada da baía do norte das embarcações procedentes do “mar grosso”. Essa ilha entrou na história do Brasil a partir do século XVII como um ponto estratégico, junto a ilha de Santa Catarina, Ratones e outras, na rota de navegação para a região do Prata. Foi por essa razão que a coroa portuguesa decidiu implantar três fortificações nelas para evitar que os espanhóis se antecipassem. Foram três as fortificações mais importantes: São José da Ponta Grossa na ilha de Santa Catarina, Santo Antônio na ilha de Ratones e Santa Cruz na ilha de Anhatomerim. O forte de Santa Cruz mostrou-se totalmente inútil com bastião protetor da entrada de navios na baía do norte. Seus canhões tinham um alcance máximo de dois quilômetros e com isso navios espanhóis navegaram em grande número passando pela baia norte e sul deixando a ilha de Santa Catarina entregue à ocupação estrangeira. Posteriormente Anhatomerim passou por dois períodos pouco mencionados pelos historiadores. O primeiro deles aconteceu em 1894 sob a presidência de Floriano Peixoto. A ilha com suas instalações foi transformada em presídio político. Nela foram recolhidos 185 opositores ao regime e sumariamente fuzilados sem direito à defesa. No subsolo da sede do comando observei na parede inúmeros pontos de impacto das balas dos fuzilamentos. Durante a Revolução Constitucionalista de Vargas em 1930 Anhatomerim voltou a condição de presídio político. Para mim a visita àquela ilha serviu como uma imersão num passado que faz parte do fascinante lançamento das raízes e consolidação do Brasil como também dos países do Prata. Começa pela consolidação da soberania da Coroa de Portugal sobre aquele território no sul da Colônia Portuguesa, bem a meio caminho da rota dos navios que demandavam as colônias espanholas do Prata. Em resumo. Um importante ponto de apoio e abastecimento para os navegantes. Tanto assim que a ilha de Santa Catarina e ilhas menores como Anhatomerim e Ratones ficaram sob a possessão espanhola até o Tratado de Santo Ildefonso em 1777, quando do novo acerto de fronteiras, Portugal abriu mão da Província Cisplatina em troca de territórios mais ao sul, entre eles a ilha de Santa Catarina e as demais na sua adjacência. Percebe-se pois, que, para mim pelo menos não foi um simples piquenique num lugar muito peculiar, mas novamente um aprendizado fora da parafernália e do ritual asséptico de uma sala de aula ou de um auditório com os salamaleques rituais. Só sei que embarcamos no cais de Florianópolis num barco da Marinha e, costeando a ilha dos Ratones, desembarcamos na praia rasa da ilha do Inhatomerim. Fomos recebidos por cardumes de papa-terra antes de subir os poucos metros do topo da pequena ilha. Visitamos a casa do administrador, os alojamentos da guarnição, o recinto dos fuzilamentos do tempo de Peixoto, os canhões inúteis, dos quais afirma-se que nunca dispararam um tiro. Sempre gostei do formato de excursões em que o lazer vinha acompanhado de uma dose mais ou menos concentrada de aprendizagem longe de uma ambiente formal com seus rituais prescritos por regulamentos convencionados pelas respetivas instituições. Em outras palavras: combinar o agradável, o lazer, ao enriquecimento do conhecimento. Pela meia tarde o barco da Marinha nos deixou no ancoradouro de Florianópolis e de ônibus retornamos à casa de retiros do Morro das Pedras.

Seguiram-se mais alguns dias tranquilos para depois voltarmos ao nosso QG no Cristo Rei em São Leopoldo. Na segunda metade do janeiro o Pe. Gesa Kovecses, húngaro expulso do país pela ocupação comunista russa, nos pregou um inesquecível retiro de 8 dias. Num português pitoresco, porém, de um conteúdo doutrinário e humano profundo, sem apelar a conceitos ascéticos e místicos, muito menos a práticas discutíveis, que repercutiram e repercutem ainda hoje na minha postura perante a fé e a moral. Ocupei o restante do tempo disponível até começos de março com a preparação das preleções na universidade aperfeiçoando a “sebenta”, aprofundando os temas a serem abordados nas aulas, mapas ilustrativos da migração dos povos, etc. Passava dias inteiros ou no matinho na encosta à direita da subida da Avenida da Unisinos, no taquaral onde fica hoje a rodoviária da universidade ou na casinha da apicultura, todas já descritos mais acima.

No primeiro semestre as preleções correram dentro do normal e sem maiores contratempos. As terças feiras de tarde foram reservadas para o curso de Geografia com somente seis alunos; nas quartas feiras de manhã para os alunos de História; nas quartas feiras de tarde preleção para os alunos do curso de Ciências Sociais. Também na programação das preleções de Teologia não me lembro de algum evento que mereça destaque.

Da Enxada à Cátedra [ 53 ]

Passo agora a registrar como foi a minha estreia como docente na UFRGS. Na Unisinos comecei a lecionar já em 1959 a disciplina de Geologia no Curso de História Natural. Só para lembrar. Em 1960 na estrutura acadêmica das universidades vigorava ainda o regime de “cátedra” regida pelos catedráticos ocupando o topo da carreira docente. A eles cabia a responsabilidade e a autoridade para propor e impor o currículo da disciplina pela qual respondia. A eles cabia também o privilégio de indicar os assistentes. Foi nesse formato da constituição do corpo docente que o catedrático de Etnografia e Etnologia, por sinal meu irmão Pe. Balduino, me convidou para ser seu assistente. A primeira impressão que se pode ter é que se tratava de um decisão próxima ao nepotismo. Não o foi por uma razão, melhor por várias razões. A etnografia e a etnologia demandavam como ponto de partida, como fundamento uma “introdução ao estudo e conhecimento do homem”. No programa da disciplinam constavam a dimensão do homem como espécie biológica como as demais espécies vivas; a morfologia e a fisiologia humana; a inserção simbiótica do homem no seu meio ambiente geográfico; as raças humanas e sua dispersão pelos continentes e ilhas do planeta, enfim os conhecimentos sobre a espécie humana então reunidos sob o conceito de Antropologia Física. Já que para dar conta desse perfil de programação exigiam-se conhecimentos de biologia, zoologia, botânica, geologia, geografia, genética, em resumo de Ciências Naturais e eu conquistara o bacharelado nessa área em 1959, fui convidado para assumir a Antropologia Física a partir de março de 1960.

Na liturgia do ingresso e progressão como docente nas universidades federais da época constava uma ano de experiência que conferia o título de “instrutor de ensino superior”. Ao término desse período o “instrutor” era submetido ao um exame, melhor concurso e, se aprovado, efetivado como professor instrutor, depois assistente, com a sanção do ministério da educação e da chancela do Presidente da República e enquadrado como funcionário federal nos termos do estatuto do servidor público. Mais adiante irei detalhar esse ritual.

Acontece que há sessenta anos passados a literatura cobrindo as diversas dimensões contempladas pelo conceito de Antropologia Física era quase exclusivamente de procedência alemã, francesa ou inglesa. Foi essa a preocupação que me levou a elaborar um texto básico, em outras palavras, uma “Introdução ao Estudo do Homem”, como subsídio para os alunos. Guardo como uma relíquia um exemplar do original desse manual, na época carinhosamente conhecido como “sebenta” no jargão da universidade pois, passava de mão em mão por gerações. Nos meus planos está uma revisão daquele texto, atualizá-lo e publicá-lo no formato de um livro.

A primeira terça-feira de tarde de março de 1960 marcou o momento da ocasião inesquecível de retornar à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, não como aluno, mas como professor. Submeti-me naquela tarde ao exame médico e acertei na secretaria da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras, comandada com competência, eficiência e visível orgulho do cargo pelo qual respondia, a Sra. Mafalda, os detalhes da rotina burocrática. Ela entregou-me o caderno contendo os conteúdos a serem ministrados e o registro dos tópicos ministrados em cada semana. Tudo acertado minha primeira preleção aconteceria na manhã seguinte. Pernoitei no Colégio Anchieta, na época ainda na rua Duque de Caxias. Lá recebi as últimas instruções e recomendações do Pe. Balduino, meu catedrático na universidade. Na manhã seguinte caminhei até o prédio da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras na rua Paulo Gama com a esquina Osvaldo Aranha. É bom lembrar que estamos no ano de 1960, portanto, antes de começar o Concílio Vaticano II. Apresentei-me para dar a primeira aula na universidade no traje clerical da época: batina preta e calçados combinando. Hoje, 60 anos passados, alguém circulando nas ruas de Porto Alegre e, mais ainda, nas dependências da universidade assustaria a qualquer um como um personagem saído dum baú guardado em algum museu. Na época ninguém estranhava pois, todos os religiosos circulavam nos mais diversos ambientes, também públicos, trajando os hábitos das respetivas ordens e congregações. Os jesuítas, ordem a quem pertencia naquele momento, vestiam uma batina preta, sapatos pretos. Não costumava usar o chapéu clerical que fazia parte da indumentária. Com esse traje apresentei-me na manhã da primeira quarta-feira de março de 1960 na sala de aula para a estreia de uma jornada acadêmica que se estenderia por 30 anos ininterruptos. Deparei-me com uma turma de cerca de 20 alunos, a maioria alunas. Fui recebido sem estranheza pois, para os alunos procedentes das confissões religiosas diversas, inclusive ateus e marxistas, sabiam que eu era jesuíta e, por isso, era óbvio que me apresentaria com a indumentária clerical usual e obrigatória e familiar a todos. Pelo que me lembro não percebi nenhuma estranheza, menos ainda manifestações de hostilidade da parte dos alunos. Na minha frente, na primeira fila sentavam três alunos, o Deodoro Martins, o Werner Altmann e Arno Kern que, anos depois, seriam meus colegas de docência na UFRGS e na Unisinos. No final daquela primeira aula entreguei aos alunos uma cópia datilografada do texto, a “sebenta” de 113 páginas que elaborara para que eles fizessem as cópias que fossem necessárias para subsidiar as preleções. Guardo até hoje o original todo a amarelecido como uma relíquia sempre bem à vista na minha modesta biblioteca, lembrando-me cada vez que entre no meu escritório, daquela memorável primeira quarta-feira de março de 1960. Como já lembrei pretendo dar uma revisada na ortografia e na estrutura técnica daquele texto, sem tirar nem acrescentar nada e, quem sabe publicá-lo para que os interessados pela Antropologia do terceiro milênio, possam fazer uma ideia dos conteúdos oferecidos aos estudantes na disciplina sob minha responsabilidade que, torno a repetir, pelo conteúdo programático, merece o título de “Uma Introdução ao Estudo do Homem”.Resumo em grandes linhas o conteúdo apresentado aos alunos sob o guarda-chuva desse conceito. Depois de uma contextualização introdutória com destaque para a conceituação histórica, sua evolução acompanhando a compreensão do homem, da humanidade sugerido pelo o avanço das Ciências Naturais, das Ciências Humanas, das Letras e Artes, da Filosofia, inclusive da Teologia. O primeiro capítulo foi reservado para a “Biologia Humana”, isto é, o homem ontologicamente ou existencialmente inserido na natureza, dela fazendo parte e sujeito às suas leis como qualquer outra espécie de seres vivos. Num segundo momento entram os fundamentos da genética: a base biológica da hereditariedade, a estrutura do DNA e sua dinâmica, sua importância na evolução dos seres vivos, as leis de Mendel, as mutações e suas repercussões negativas ou positivas sobre todas espécies vivas incluindo o homem, os grupos sanguíneos, caracteres físicos normais e patológicos de natureza hereditária e, por fim, a discussão sobre um tema sempre atual: a Eugenia pela manipulação genética com seu potencial positivo e negativo como instrumento de melhoria ou manipulação irresponsável do homem. O capítulo II, por assim dizer complementa e amplia o anterior, mas agora tendo com objeto exclusivamente o homem, com o título: “A Miscigenação Humana”. A temática foi subdividida nos seguintes subcapítulos: Primeiro. Os contatos humanos e seus mecanismos como: a migração dos campos para as cidades - a substituição por diferença e natalidade - áreas cultas – pontos de dispersão – colonialismo – migrações – vizinhança geográfica – povos nômades – povos de alta natalidade; Segundo. Comportamento quanto à miscigenação; Terceiro. Miscigenação e humanidade de hoje; Quarto. Exemplos de miscigenação; Quinto. Resultados da miscigenação. O capítulo terceiro: Adaptação e aclimatação do homem: A seleção natural – Teoria da evolução – o clima – umidade do ar – pressão atmosférica – composição química do ar – a irradiação do sol – altitude e latitude – os ventos – a carga elétrica – doenças equatoriais ou de regiões frias – a natureza do solo – mecanismos de adaptação. Capítulo quarto. As raças humanas. Alguns conceitos – Como surge uma raça – quando surgiram as raças humanas – características raciais - Classificações raciais: Lineu, Blumenbach, Deniker, Fritsch, Stratz, Montandon, Weinert, Fischer, Eikstedt, Bernatzik. Nas preleções adotei a classificação de Eickstedt, inclusive valendo-me de slides de personagens típicos de cada grupo maior.

A segunda parte da programação do semestre foi dedicada à história, características físicas, culturais e localização geográfica das raças humanas historicamente conhecidas. Adotando a terminologia de Eickstedt, comecei com os Európidos: a) O ambiente geográfico – b) Os európidos primitivos – c). Características gerais dos európidos; os Mongólidos: características gerais – as raças mongólidas – o ambiente geográfico – características gerais dos mongólidos; Os Négridos: a Pré-história – a Situação atual dos négridos africanos: os Etíopes e o Sahara – b) contatos e reação no Sudão – c) a fuga dos Coisânidos e a conquista da floresta – d) populações da floresta do Congo; os Sibíridos – a) os Sibíridos originais – b) os Sibíridos Túngidos; os Esquímidos: a) características – b). Cultura; Os Túngidas: a). Localização geográfica – b) Centro dinâmico – c) Expansão racial – d) migrações históricas – e) características; Os Sínidos_ a) localização geográfica – b) divisão – c) expansão – características – d) cultura – e) sociedade – d) organização política; O reino de Anam_ a) posição geográfica – b) habitantes – c) conquista - características – sociedade – cultura. A Coreia: a) país de transição – b) geografia – c) habitantes – d) características – e) história – f) língua – g) cultura; Japão: a) geografia – b) origem e divisão dos habitantes – c) características – d) vestuário, habitação, alimentação, agricultura, pesca – e) cultura, sociedade, religião; Paleomomgólidos: a) localização geográfica – b) expansão – c) características; Indiândidos: a) origem – b) divisão – c) localização geográfica – d) cultura.

Naquele remoto ano de 1960 os recursos didáticos não passavam do quadro negro, de mapas convencionais, mapas desenhados por mim para ilustrar tópicos específicos, como por ex., a dispersão histórica dos povos africanos, a dinâmica da ocupação do oriente remoto, etc., projetor de slides, um crânio humano com os instrumentos de medição para determinar as características cefálicas, fundamentais para identificar e diferenciar as raças. Para não perder o fio condutor das preleções organizei o esquema datilografado em cartões 15x28 e na medida em que a preleção progredia escrevia o esquema no quadro negro. Guardo até hoje parte desses cartões como relíquia junto com o manuscrito original da “sebenta”.