Bicentenário da Imigração - 69

Com a eleição para a Constituinte Estadual encerrou-se a efêmera existência do Partido Católico do Centro. Como herança mais viva para os católicos do Rio Grande do Sul, permaneceu a Typographia do Centro. Essa casa editora não tardaria  em passar para as mãos de Hugo Metzler que fez dela porta-voz dos interesses dos teuto-católicos e isso até a sua morte em 1929. Sucederam-no na mesma missão seus filhos Franz, Rudolf e Wolfram. Em 1956 um incêndio não totalmente esclarecido destruiu a Typographia do Centro com todas as  instalações, coleções de jornais, periódicos, almanaques, etc. nela arquivados. Por ocasião do incêndio Nestor Pereira era seu diretor. 

Além da Typographia do Centro o Partido do Centro lançara a semente para futuras organizações que congregariam os católicos de origem alemã, em torno de projetos sociais, políticos, econômicos educacionais, culturais, assistenciais e  religiosos mais abrangentes. O malogro de um partido político fora o primeiro e importante passo no sentido de os alemães católicos se organizarem e, dessa maneira, encontrar um “modus vivendi” civilizado, favorável e produtivo com as autoridades constituídas e com os demais segmentos da sociedade riograndense. Vai neste sentido o comentário do Pe. jesuíta Georg Lutterbeck: 

Como já vimos o Partido do Centro só existiu por alguns anos, mas deixou nas paróquias  coloniais, como precioso legado, a consciência da necessidade de se organizarem para a consecução de seus fins: humanos, religiosos e culturais. Pode-se dizer que com o ano de 1890, começou em todas as paróquias dos jesuítas um nova vida, por meio das mais variadas organizações associativas.  (Lutterbeck, 1977, p.)

Generalizou-se a convicção de que um partido confessional como fora o Partido Católico do Centro, contaria com chances quase nulas para se impor no cenário político regional e com muito mais  dificuldade ainda no nacional. Essa realidade tinha ficado muito clara  com as duas eleições em que o partido participou. As lideranças católicas defrontaram-se então com um desafio muito sério e, ao mesmo tempo, fascinante: encontrar caminhos  e  estratégias capazes de marcar a sua presença no contexto do Estado e com isso fazer valer seus direitos como cidadãos e participar, pelo menos de forma indireta, nas decisões políticas. 

As lideranças católicas convenceram-se que a fórmula  mágica estava na sólida organização das comunidades rurais e urbanas. E, para concretizar esse objetivo, era preciso conscientizar essas comunidades e arregimenta-las  em torno de propósitos comuns, em torno de projetos comuns. Já não se trataria mais de agremiação política formal. Partiu-se então para a formulação e a concretização de projetos abrangentes de promoção humana que contemplavam todos os aspectos da vida humana: a educação, a economia, o lazer, a política, a assistência social, a  cultura, a arte e a religião. Objetivou-se-se, portanto, uma sociedade composta de homens e mulheres comprometidos com o bem estar coletivo. Procurou-se promover o desenvolvimento humano em todas as suas dimensões, uma participação política em que os direitos e deveres dos cidadãos, o bem comum e os valores éticos cristãos, ocupariam o primeiro lugar. Essa era, sem dúvida, uma autêntica tomada de posição política, criando condições para o pleno exercício da cidadania. E as três décadas que se seguiram demonstraram à saciedade, o acerto dessa opção. Lutterbeck concorda com essa conclusão quando escreve: “Como já vimos, o Partido do Centro só existiu por alguns anos mas deixou nas paróquias coloniais, como precioso legado, a consciência  da necessidade de se organizarem para consecução dos seus fins: humanos, sociais, religiosos e culturais”. (Lutterbeck, 1977, p. 120)

Superada a experiência do Partido do Centro com sua efêmera duração e seus resultados insignificantes, as lideranças católicas partiram para iniciativas mais abrangentes. Os cabeças do Partido do Centro, como é óbvio foram lideres católicos leigos. As grandes organizações  das décadas posteriores encontraram no clero, de modo especial entre os padres jesuítas, seus condutores mais ousados e mais entusiastas. A razão é por todos conhecida. Foram os religiosos dessa Ordem que mantinham sob sua responsabilidade a fatia mais importante da pastoral nas comunidades e orientavam a educação nas escolas comunitárias nos colégios e ginásios dos centros urbanos mais importantes. 

A filosofia que orientava as organizações de que trataremos a seguir, e as estratégias que as conduziram na prática, não foram inventadas aqui. Não foram originais. Inspiraram-se nos “Katholikentage”, nos “Katholikenversammlungen”, “os Congressos dos Católicos “ ou Assembleias Católicas”, muito em voga na época entre os católicos da Alemanha, Áustria e Suíça. 

Três foram os padres  que se tornaram credores dos maiores méritos no desencadear das organizações teutas: Peter Gasper, Eugen Steinhart e Carl Schlitz. Sob sua liderança realizou-se em 1897 em Bom Jardim (Ivoti) o primeiro encontro geral dos católicos. Não foi propriamente um Congresso Católico, um Katholikentag, mas uma espécie de ensaio, uma experiência para verificar a viabilidade desse tipo de assembleia. A experiência foi bem sucedida. Animou os organizadores a programar o primeiro Congresso Católico para valer, para fins de março de 1898. O local escolhido foi Harmonia, então distrito do município de Montenegro. Foi um sucesso total. Nos  três dias que durou debateram-se os assuntos mais variados do interesse das comunidades teuto católicas. A iniciativa mais importante veio a ser  a fundação da Associação dos Professores e Educadores Católicos do Rio Grande do Sul. (Deusch-Katholischer Lehrer- und Erziehungsverein von Rio Grande do Sul), conhecido simplesmente pelo nome “Lehrerverein”, Associação dos Professores. Dessa forma foi atendida uma das necessidades mais prementes das comunidades teuto católicas, isto é, garantir para a rede escolar comunitária, em crescente ritmo de expansão, unidade de objetivos, unidade didático-pedagógica, período escolar igual para todos, sob o comando único da orientação da Associação dos Professores. 

Nos anos seguintes os Congressos repetiram-se a cada ano em locais diferentes. Para 1899 a sede escolhida foi Santa Clara, no interior de lajeado, em 1900 Santo Inácio da Feliz, em 1901 São José do Hortêncio. Depois a frequência foi espaçada para dois anos até 1940, o último Congresso durante a  Segunda Guerra Mundial. 

A respeito das  temáticas debatidas nesses Congressos observou Lutterbeck: 

O fim principal de tais Congressos era evidentemente a intensificação da vida e ação religiosa cristã, bem como a união dos católicos teutos a fim de solucionarem seus problemas mais candentes. As conferências  proferidas por leigos e padres, versavam quase sempre sobre assuntos  da atualidade, mas ocupavam-se também das questões sociais, econômicas e da imprensa. Não é de se admirar que desses Congressos surgissem novas organizações associativas concretas pois, não se pretendia ficar no mero debate verbal e sim proceder à ação. (Lutterbeck, 1977, 123-124)

Dede o começo o “Deutsches Volksblatt”, fundado em 1871, contribuiu para o êxito dos Congressos Católicos e as iniciativas neles deflagradas. Os registros, os comentários e as análises  constantes em suas páginas, guardaram para a posteridade as provas do extraordinário vigor que animava as comunidades teuto católicas, no final do século XIX e nas três primeiras décadas de 1900. Impõe-se por isso mesmo como fonte obrigatória para qualquer pesquisador que se ocupa com essa temática.

Voltando agora para os Congressos Católicos, para as organizações e para os meios utilizados para incentivar o teuto-catolicismo, iremos constatar uma grande capacidade criativa e uma não menor versatilidade na prática. 

Já o terceiro Congresso Católico em Feliz em 1900, tornou-se palco do surgimento de uma nova associação. Dessa vez não se tratou de reunir formalmente pessoas dedicadas a uma tarefa específica como foi a Associação dos Professores, mas arregimentar a população em geral em torno de um estatuto que se propunha  a promoção, o desenvolvimento e o bem estar material, social e espiritual de todos. Depois de um discurso inflamado do Pe. Amstad, nasceu a “Associação Riograndense de Agricultores”, o “Riograndenser Bauernverein”. A ata de fundação foi assinada  por aproximadamente 400 sócios fundadores, um número, sem dúvida, considerável para a época. É legítimo concluir daí que uma Associação numericamente tão expressiva e regionalmente  considerável, dispusesse de um potencial de pressão e barganha, também política, nada desprezível.

Enquanto o “Deutsches Volksblatt” desempenhava o papel de veiculo de formação e informação geral, tanto a Associação dos Professores como a Associação Riograndense de Agricultores contavam com um veículo de comunicação específico: “Leherzeitung – Jornal do Professor” e “Bauernfreund – Amigo do Agricultor”, respectivamente. Essas folhas circulavam em edições mensais ou em edições de dois em dois meses. O primeiro teve início em janeiro de 1900 e foi fechado pela Campanha de Nacionalização em setembro de 1938. O Bauernfreund começou a circular também em 1900 e fechou em 1914 com o encerramento definitivo da Associação Riograndense de Agricultores.

Aqui é preciso chamar a atenção para um detalhe. A associação Riograndense de Agricultores foi criada pelos teuto-católicos. Desde a sua origem, porém, e pelos estatutos, ela franqueava as portas também aos protestantes e aos elementos de outras etnias como italianos, lusos e todos os demais. A pretensão, portanto, foi colocar em andamento uma organização suficientemente abrangente para arregimentar uma parcela significativa do Rio Grande do Sul, em torno de um objetivo comum: a promoção humana e a defesa dos interesses legítimos  de todos. Em termos meramente políticos uma organização desse gênero, continha em potencial, uma força inegável com a vantagem de contornar os problemas que costuma acompanhar o sectarismo político partidário . 

Durante a sua existência efêmera, 1900-1910, a Associação Riograndense de Agricultores  promoveu uma série de iniciativas que visavam enfrentar e resolver os problemas que surgiam no meio teuto-brasileiro. Algumas resultaram em empreendimentos cujos efeitos perduram até hoje. Outras não passaram dos passos iniciais. Outras ainda não ultrapassaram o recinto dos debates das assembleias gerais. 

Entre os projetos mais importantes e também mais duradouros enumera-se a colonização na região das Missões, começando por Cerro Largo e áreas contíguas, a criação da primeira cooperativa de crédito do tipo Raiffeisen em Nova Petrópolis e as primeiras cooperativas de produtores de leite. Seguiram-se depois dezenas dessas cooperativas e a elas somaram-se cooperativas de produção de tudo que é tipo, cooperativas de consumo e cooperativas de comercialização. Essas cooperativas serviram de modelo para o cooperativismo como uma via alternativa ao capitalismo liberal e ao capitalismo estatal.  Entre as iniciativas que permaneceram ou até morreram nas primeiras tentativas, contam-se principalmente três: A proposta de um reflorestamento sistemático a partir de essências nativas, o uso racional e recuperação dos solos por meio de métodos naturais; a tentativa de fazer da Associação dos Agricultores uma agremiação interétnica e interconfessional: a introdução de culturas alternativas com  finalidade de abrir  o leque de opções de produção para os colonos como o soja, algodão, lúpulo, cevada e outras. Entre as  propostas que não puderam ser postas em prática, ou por falta de tempo, ou por falta de interesse, figuram instituições de amparo mútuo, seguro privado, hospitais, asilos e orfanatos. 

Em 1909 a Associação Riograndense de Agricultores foi transformada em sindicato. Com essa decisão as lideranças mais expressivas, tanto católicas como evangélicas retiraram.se  e partiram para organizações independentes. Foi assim que no Congresso Geral dos Católicos realizado em Venâncio Aires em 1912, foi fundado o “Volksverein”, conhecida como Sociedade União Popular,  destinada exclusivamente para os católicos.

A Sociedade União Popular pode ser considerada como herdeira e continuadora da filosofia e dos ideais da Associação Riogandense de Agricultores. Também ela tinha como objetivo a promoção integral do homem. Essa intenção fica clara quando se examina o esboço dos estatutos apresentados por ocasião da sua fundação: “A finalidade da Sociedade consiste em promover o bem estar tanto material como espiritual dos católicos de descendência alemã no Rio Grande do Sul”. (Paulusblatt, 1912, nr.1 , p. 8)

A concretização  desse objetivo deveria acontecer na prática:

1. Pondo em prática as resoluções das Assembleias Gerais; 2. Preocupando-se com novas fronteiras de colonização para católicos; 3. Desenvolvendo iniciativas católicas de beneficência e assistência, concretizadas  na medida em que as necessidades o aconselharem: 4. Tendo uma constante e geral preocupação em promover as escolas paroquiais católicas; 5. difundindo a boa imprensa e a boa leitura assim como a edição e distribuição gratuita aos associados de uma publicação periódica; cuidando da instrução popular mediante palestras e conversações; 7. intermediando empregos e informações; 8. Garantindo assistência jurídica aos associados. (Rambo, Arthur, 1993, p. 41).

Verificando agora até que ponto a Sociedade União Popular alcançou de fato seus objetivos nas cinco décadas que se seguiram à sua fundação pois, é esse o período que interessa mais de perto aqui. Podem-se destacar entre as realizações duradouras  a preocupação com os colonos, geralmente casais jovens, que partiam para novas fronteiras de colonização. Para acompanha-los e ampara-los mais eficaz e mais permanentemente, a Sociedade patrocinou, a partir de meados da década 1920 a colonização de Porto Novo (Itapiranga, São João do Oeste e Tunápolis), no extremo oeste de Santa Catarina. No terreno da assistência social concretizou duas instituições de inestimável valor e significado: o asilo e hospital de São Sebastião do Caí, a Colônia de Leprosos e o Amparo Santa Cruz em Itapuã, destinado a abrigar os filhos sãos das mães leprosas internadas. 

Mas foi em primeiro lugar durante as décadas de 1920 e 1930 que a Sociedade União Popular dedicou atenção toda especial à escola e educação, à consolidação das comunidades, à vida religiosa, à melhoria e aprimoramento das técnicas de manejo do solo e das lavouras, à difusão do cooperativismo de crédito, de produção, de consumo e de comercialização, à multiplicação e ao aprimoramento da imprensa. De tudo isso pode-se concluir que os teut-católicos ostentavam na época uma organização de grande solidez, coesa e dinâmica e de não pouco peso político. Centenas e milhares de comunidades rurais e urbanas participavam da viabilidade do projeto. 

Bicentenário da Imigração - 68

Religião e Participação política.

Jean Roche na sua obra “A Colonização Alemã no Rio Grande do Sul”, tornada clássica e obrigatória para todo aquele que pretende compreender o significado da presença alemã no Estado, introduziu suas considerações  sobre a participação política dos imigrantes  e seus descendentes  com essas palavras: “Durante todo o século dezenove e quase toda a primeira parte do século vinte, o papel político dos teuto-riograndenses foi quase nulo” (Roche, 1969, p. 227)

Roche baseou essa sua afirmação numa série de fontes, de testemunhos e de declarações de alemães ou dos seus descendentes, durante a segunda metade do século dezenove. Entre os mais conhecidos citou Handelmann, Koseritz, Tschudi e Kohen. 

Vários foram os fatores que contribuíram para essa situação. Entre eles merecem destaque os seguintes:

Primeiro. Os grandes latifundiários, os estancieiros criadores de gado, controlavam de fato toda a política local, regional e por vezes também  a nacional. Esse fator apontado por Jean Roche, foi certamente de um significado inegável, já que as estâncias  se transformaram em autênticos feudos dos quais emanava todo o poder político e a partir deles eram ditadas as diretrizes e as regras da ação política. Ao colono alemão e aos outros  não restava outra saída senão entrar no jogo das oligarquias estancieiras ou permanecer à margem do processo político. Esse pelo menos parece ter sido o quadro dominante em toda a segunda parte do século XIX. 

Segundo. Além desse, um outro fator foi de grande relevância. Na região colonial que, na época estava confinada grosso modo nos vales do Sinos, Caí, Taquari, Pardo e Jacuí, assim como nas comunidades urbanas das cidades maiores, os alemães preservavam a sua feição germânica. O contato e intercâmbio com o mundo luso-brasileiro não passava de episódico e superficial. Para os detentores do poder político essa população praticava uma economia de baixo potencial de competição comparada com a criação de gado das estâncias. Essa população que falava alemão e não oferecia ameaça política alguma, embora pudessem contribuir  com um precioso reforço eleitoral, quando seus interesses estivessem em jogo. Essa situação foi assim descrita pelo Pe, Schupp:

Nos primeiros tempos certamente nenhum alemão da colônia teria alimentado a veleidade de participar ativamente na vida oficial do Estado, pela simples razão de dificilmente encontrar-se alguém que compreendia português. Só era possível encontrar candidatos para determinadas funções  que pela sua natureza podiam ser exercidas no âmbito da própria colônia. De outra parte não faltavam os padres que por razões muito ponderáveis que defendiam esse isolamento. Tal situação foi superada com o correr do tempo. Generalizou-se a convicção de que o colono, caso quisesse fazer valer seus direitos teria que apropriar-se  da língua a um nível suficiente. (Schupp, 2.004, p. 184)

Terceiro. Esse elemento reforça os anteriores. Até o final do Império os alemães  não se haviam congregado em organizações  mais abrangentes. Na capital e no interior do estado pululavam centenas de sociedades, associações, clubes e outros tipos de agremiações. Entre elas, porém, não se estabelecera, até então, uma unidade ao ponto de serem capazes de empreender e perseguir objetivos comuns, também no terreno da participação política.

Quarto. Mais um fator pode se destacado. É conhecido e notório que um dos propósitos  de maior peso ao promover-se a colonização com imigrantes europeus não lusos, consistiu em povoar as regiões devolutas e estimular uma agricultura alternativa aos latifúndios monocultores. A intenção dos governos fora  convidar os alemães para serem colonos e não para servirem de fermento visando uma futura transformação do modelo político. 

Entretanto a multiplicação das comunidades dos imigrantes e de seus descendentes, a abertura constante de novas fronteiras de colonização e consequente dispersão geográfica nas duas últimas décadas do século XIX, deixaram claro que era preciso partir para organizações mais abrangentes. Esse fato ficou de modo especial evidente naquilo que representava a essência das comunidades teuto-brasileiras: a religião, a educação, a economia agrícola, o lazer e a cultura. A interrogação que se colocava nesse contexto perguntava pelas pretensões políticas dessa população tatno rural como urbana. Se até o final do Império o interesse nesse sentido não fora muito visível com a proclamação da República começou a fazer parte  cada vez maior das preocupações. Contribuíram para tanto dois outros fatores. 

O primeiro já foi mencionado há pouco. O território ocupado, o nível de desenvolvimento e o volume da produção agrícola, o comércio, os artesanatos e as indústrias incipientes, somados à organização comunal, educacional e eclesiástica, fizeram com que os alemães católicos não se contentassem mais em fazer o papel de meros espectadores do processo político. Aspiravam  por uma participação  ativa e, dessa forma, influir nas decisões governamentais e administrativas. 

O segundo foi consequência direta da mudança do regime monárquico para o republicano. A nova situação teve reflexos profundos sobre as comunidades teuto-católicas. Da Monarquia, um regime em que vigorava a união do Estado com a Igreja, passou-se  para a República e a consequente implantação do Estado laico, sob muitos aspectos desfavorável e não raro hostil à Igreja Católica. A nova situação estava a exigir dos católicos  a tomada de uma posição política mais definida e mais combativa. Caso contrario pouco ou nada conseguiriam das autoridades responsáveis pela nova ordem. O tempo em que o governo civil e o governo eclesiástico conviviam numa parceria compulsória por imposição constitucional,  ficara definitivamente parra trás. Foi preciso empenhar-se com muita seriedade e ir em busca de uma fórmula adequada para conviver com a nova realidade. 

Não tardou e uma solução veio oferecer-se. No terreno da participação e da militância política, os católicos alemães no Rio Grande do Sul, encontraram uma fonte de inspiração no Partido do Centro Católico da Alemanha. Essa agremiação política constituiu-se de fato no protótipo para o Partido Católico do Centro, fundado em 1890. O Partido do Centro foi uma tentativa de reação e uma resposta ao governo republicano, por causa de uma série de medidas que incomodavam os católicos. Entre elas sobressaíam a obrigatoriedade do casamento civil antes do religioso, a legislação dos cemitérios, a inelegibilidade do clero, a proibição do ensino religioso nas escolas públicas  e outras mais. 

Uma observação prévia se faz necessária. Embora o Partido do Centro aqui no Rio Grande do Sul tivesse a sua inspiração no Partido do Centro Alemão, não significou que tenha sido pensado como um partido católico exclusivamente para alemães. Registraram-se nele também católicos de outras etnias. Participaram dele de modo especial elementos da tentativa mal sucedida de um Partido Católico na década de 1870. Dessa forma assinaram  a ata de fundação do Partido Alfredo Clemente Pinto, Francisco de Paula Lacerda de Almeida, Clemente Wallau e João Mayer Junior. Ao constituir-se o diretório  acresceu um nome luso, o do Pe. José Marcelino Bittencourt. Mais tarde numa proclamação e aí sim os novos nomes foram todos de alemães: Mathias José Sehl, Anton Klein, Pe. Carlos Becker, Prudêncio Matte, Wilhelm Bernd, Anton Wolfenbütel e Franz Raht.

Constava das intenções do Partido um projeto de jornal em língua portuguesa. Para viabiliza-lo foi adquirida a gráfica “Século”, em seguida fundida com a gráfica de Franz Rath. Na verdade a casa editora assim constituída, deveria dar suporte a um projeto publicitário bem mais ambicioso. Incorporou o jornal “A Época”, “Il Corrieri Cattolico” e o “Deutsches Volksblatt”. Este último estava sendo publicado desde 1871 pelos padres jesuítas em São Leopoldo. Publicar-se-iam assim três jornais nas três línguas mais importantes da época no Rio Grande do Sul. 

Não demorou e a editora transformou-se numa sociedade anônima tendo como diretor o sr. Clemente Wallau. Responsabilizou-se  pela continuidade, pela impressão e  circulação do “Deutsches Volksblatt” e, a partir de maio de 1890, pelas edições semanais da “Época” e, a partir de meados de 1891 do “Il Corriere Cattolico”. 

Os pontos programáticos do Partido do Centro foram assim resumidos por René Gertz em seu artigo intitulado: “Catolicismo Social no Rio Grande do Sul: A União Popular”. 

1. Liberdade religiosa para o catolicismo, sem intromissão do Estado; 2. Isenção do serviço militar para clérigos e seminaristas, inclusive; 3. Intangibilidade e garantia para as  propriedades eclesiásticas, inclusive as das comunidades locais; 4. Fim das escolas ateias mantidas pelo Estado (pois isso contribui para a malversação de impostos e atenta contra a liberdade de ensinar e fundar escolas; 5. Fim da obrigatoriedade do casamento civil (um incentivo à vida desregrada. (Gertz, 1992, p. 555)

O novo partido não perdeu tempo. Participou das primeiras eleições republicanas em que foram eleitos em 15 de setembro os constituintes. O resultado, como não podia deixar de ser, foi insignificante. D. José Cláudio Ponce de Leão, recém nomeado bispo de Porto Alegre, fora indicado como candidato a senador. Além de mineiro só chegou ao Rio Grande do Sul depois de realizadas as eleições. Mesmo que tivesse sido eleito não poderia ter assumido por duas razões. Em primeiro lugar as obrigações como bispo não o teriam permitido e em segundo lugar sua eventual eleição teria sido nula porque a legislação previa a inelegibilidade do clero.

Na mesma ocasião haviam sido indicados como candidatos a deputados os senhores Luis Englert, Carlos  Wallau, Alfredo Clemente Pinto, Francisco de Paula Lacerda e outros. No decorrer da campanha aconteceu uma  séria divisão interna do partido. De um lado alinhavam-se os católicos ortodoxos extremados. Condenavam simplesmente qualquer regime republicano e pregando o catolicismo extremo. René Gertz registrou um exemplo típico dessa posição.

Um exemplo temos em Santa Clara (Lajeado), onde o Pe. Maierhofer disse algum tempo depois das eleições: No juízo final Deus não perguntará apenas  pelas boas obras e pela vida correta de cada um, mas ele  perguntará também se vocês votaram no Partido Católico ou na República. Poucos meses depois o Pe. Haltmeier instigava os fieis do mesmo lugar contra os republicanos a ponto de ocorrerem agressões físicas. (Gertz, 1992, p. 555)

Diante dos fatos e dos resultados eleitorais a grande maioria dos filiados ao Partido do Centro e os simpatizantes assumiram um posição mais objetiva e mais pragmática. Certos de que as potencialidades eleitorais, ao menos no momento, eram muito limitadas, optaram por transformar a agremiação num grupo de pressão sobre o partido governista e dessa maneira conseguir uma fórmula de convivência com os donos do poder, garantindo assim os interesses dos católicos do Rio Grande do Sul. Essa decisão foi registrada na “Deutsche Zeitung” de 22 de agosto de 1890, citada por Gertz:

Nos princípios claros do Partido Católico está o fato básico para que o Partido vote a favor do governo, na firme convicção de que o governo não incomodará e muito menos proibirá nossos curas em seu trabalho, que até agora trouxe  o bem e o útil. Sabemos muito bem que a felicidade e a salvação do nosso Brasil estão no fortalecimento de um vigoroso partido governamental  e estamos longe de querer representar um entrave ao desenvolvimento abençoado de um pais que anseia pelo progresso. Deixem-se em paz os nossos curas e protejam-se os educadores de nossa juventude, e não se encontrarão republicanos menos exigentes e mais fieis do que nós do Partido Católico. (Gertz, 1992, p. 555-556)

O “modus vivendi” entre a ala moderada que representava a maioria do Partido do Centro e os republicanos, transpareceu claramente  quando se tratou de montar a nominata  dos candidatos para a eleição dos constituintes em setembro de 1890. No conhecido episódio da não inclusão de Barros Cassal na lista dos candidatos do Partido Republicano, achava-se na lista de assinaturas dos dissidentes do partido e de Carlos Wallau que era candidato católico. A própria direção do partido republicano sugeriu mais tarde que os eleitores de origem alemã que se sentissem prejudicados pela não inclusão de um nome alemão na nominata, incluíssem Luis Englert e Carlos Wallau. De outra parte estando incompleta a nominata da chapa católica, foram vários nomes, até de positivistas como o de Júlio de Castilhos, Barros Cassal e Antão de Farias, entre outros.

A política de abertura, de quase conluio da ala mais liberal do Partido do Centro com o Partido Republicano, resultou numa séria crise interna, seguida da demissão de vários membros importantes do diretório. O resultado foi óbvio. Enfraqueceu-se em muito o Partido do Centro. O governo aproveitou a situação e mandou seus agentes manipular descaradamente as eleições nas colônias alemãs católicas como Bom Princípio, São José do Hortêncio, Santa Cruz do Sul e outras. 

Aconteceu então o previsível. Nenhum dos candidatos católicos foi eleito. O mais votado foi Carlos Wallau com 2271 votos, quando o menos votado do Partido Republicano obteve 30635 votos. 

A segunda e derradeira tentativa de participação do Partido do Centro se deu em maio de 1891, quando da eleição estadual. Foram apresentados três candidatos: Luis Englert, Alfredo Clemente Pinto e Francisco de Paula Lacerda de Almeida. Após uma negociação esses nomes constaram  também na nominata do Partido Republicano. Desta vez o resultado foi melhor e os três se elegeram. Ficou, porém, evidente que a essa altura ficava difícil saber se os três deputados haviam sido eleitos pelo Partido do Centro, representando-o na Constituinte Estadual ou se integravam a representação do Partido Republicano. Tendo sido eleitos pelos votos tanto dos católicos do Partido do Centro como pelos votos  dos republicanos, sacrificaram, na verdade, a identidade do seu partido. 

Bicentenário da Imigração - 67

Nacionalização e ação policial em Santa Catarina

Os anos de 1942, 1943, 1944 e 1945 foram especialmente difíceis para os imigrantes alemães e seus descendentes no Brasil, de modo especial  nos estados do Sul. A Campanha de Nacionalização, desencadeada em 1938, assumira características de uma perseguição sistemática e implacável  contra tudo e todos que, de alguma forma sugerissem  alguma relação com o que era alemão, ou assim  pudesse ser interpretado. A situação agravou-se em muito depois da entrada  do Brasil na Guerra, em agosto de 1942. Falar alemão, ler alemão, manter relações de amizade com algum alemão, ou simplesmente  ter cabelos louros, colocava a pessoa sob suspeita  de traição. A ação policial tornou-se cada vez mais ostensiva  e mais draconiana. As prisões se sucediam. O confinamento  em cadeias comuns ou em colônias penais, tornou-se  um fato rotineiro. Não se respeitavam nem os princípios mais elementares  da inviolabilidade dos lares, do livre ir e vir e a integridade física ou moral. Instalou-se um clima generalizado de  suspeitas, de vinganças, de temores. Em não poucos casos, as pessoas acuadas pela ação policial, viviam com que em prisão domiciliar.

O documento aqui publicado é bem uma amostra dos extremos a que se pode chegar em circunstâncias como as que predominaram nos estados do Sul durante a Segunda Guerra Mundial. Foi redigido pela Sra. Maria Rhode, alemã de nascimento, mas portadora de cidadania norte americana e esposa de Carlos Rhode, diretor da Colônia de Porto Novo (Itapiranga), no extremo oeste de Santa Catarina A Colônia contava na época com apenas dezoito anos. Fundada em 1926, compreende hoje os municípios de Itapiranga, São João do Oeste e Tunápolis. As terras haviam sido adquiridas pela Sociedade União Popular, organização dos teuto-brasileiros católicos, com sede em Porto Alegre e os lotes estavam sendo vendidos aos associados, dentro de um projeto étnica e confessionalmente identificado. Entendem-se perfeitamente as preocupações das autoridades frente a uma população exclusivamente de alemães  e descendentes de alemães, assentada numa área de fronteira desprotegida com a Argentina, manifestamente simpática à Alemanha, e o Brasil, em estado de guerra declarada àquele país. O fato de uma  porcentagem significativa  dos moradores da Colônia terem sido alemães natos, imigrados para Brasil depois da Primeira Guerra Mundial, foi um motivo a mais para suspeitas. Acontece, porém, que entre eles não havia ninguém filiado  ao partido nazista, como acontecia com freqüência em outros lugares no sul do Brasil. Pelo contrário. Uma porcentagem significativa deles tinha emigrado da Romênia. Eram descendentes  dos antigos   alemães imigrados para a Rússia, expulsos pelo regime daquele país. Portavam certidões de nascimento russos. Refugiados na Romênia, obtiveram passaportes alemães e haviam imigrado legalmente para o Brasil. Um segundo grupo era formado por profissionais liberais, inclusive de nível superior, que haviam abandonado a Alemanha devido à sua posição  contrária ao regime nacional-socialista. Foram tentar a vida como colonos naquela fronteira de colonização. Os demais tinham o perfil do imigrante convencional que migra a procura de melhores oportunidades em outro país.

Fica mais do que evidente que os alemães estabelecidos na Colônia de Porto Novo, não tinham nenhum envolvimento, muito menos compromisso com a ideologia  nacional-socialista. Pelo contrário. Um bom número deles podia ser considerado banido pelo sistema nazista. Um segundo grupo era composto por cidadãos russos expulsos pelo regime comunista. Pessoas comuns, para as quais o nazismo não oferecia nada que as pudesse aliciar, formavam o terceiro grupo.

Pois bem. Foi exatamente naquela fronteira de colonização, no extremo oeste de Santa Catarina, que a Campanha de Nacionalização produziu um dos episódios policiais mais negros, mais lamentáveis e mais constrangedores e por isso mesmo, quem sabe, pouco conhecido. Os alemães romenos expulsos da Rússia, os alemães que haviam abandonado o país por causa do nazismo, os alemães emigrados em busca de melhores oportunidades de vida, descendentes de imigrantes alemães de até a quarta geração, foram todos nivelados pela acusação de terem sido nazistas ou no mínimo simpatizando com o nacional-socialismo. A distância, o isolamento e as dificuldades de comunicação, facilitaram uma ação   policial que, objetivamente falando, avançou para além dos limites do aceitáveis, mesmo em tempo de guerra.

O documento não deixa claro até que ponto as autoridades locais e regionais agiram por conta própria e até que ponto estavam obedecendo orientações superiores. De qualquer maneira fica difícil imaginar  que delegados de polícia locais e comandantes subalternos da policia assumissem, por sua conta e responsabilidade o confisco  de bens e propriedades,  a deportação de centenas de homens, mulheres e crianças, com o objetivo de concentrá-los num campo de confinamento, sem assistência, sem infraestrutura, abandonados à própria sorte.

Da época da Segunda Guerra Mundial tem-se notícia de mais três campos de confinamento de alemãs no Brasil, porém, com características diferentes daquele de Porto Novo e até certo ponto compreensíveis nas circunstâncias. Dois deles foram instalados no vale do Paraíba para confinar  as tripulações de navios mercantes alemães fundeados no porto de Santos, por ocasião  da declaração de guerra do Brasil à Alemanha. Um terceiro, noticiado ultimamente pela revista Veja, edição de nº 1338, de 18 de março de 1998, encontrava-se em Pernambuco, com a finalidade específica de confinar os funcionários alemães das Lojas Lundgreen. Suspeita-se neste caso que o confinamento tivesse, na verdade a finalidade de proteger os funcionários da Lundgreen, para não serem molestados pelo fato de serem alemães.

O caso de Porto Novo assumiu conotações muito mais dramáticas do que os demais. Colonos com suas famílias, homens, mulheres e crianças, depois de espoliados dos seus bens e sequestradas as economias, de um dia para o outro, foram simplesmente expulsos da Colônia e obrigados, sem um mínimo de apoio logístico, a empreender uma peregrinação até Xanxerê. Essa localidade ficava a 200 quilômetros  para o norte no estado de Santa Catarina, na região do campo. O relato que segue é de Maria Rohde, esposa da diretor da Colonização Carlos Rohde. Ela era alemã de nascimento, viveu por alguns anos nos Estados Unidos,  obteve a cidadania americana para depois imigrar com toda a  família para o Brasil, fixando-se em Estrela onde conheceu o marido e com ele partiu para a nova fronteira de colonização de Porto Novo. Acompanhou desde os primeiros começos a evolução daquela colônia. Ela escreveu a história de Porto novo num livro com o título no original: “Wie eine Frau eine Urwaldsiedlung wachsen sah” (“Como uma mulher acompanhou a evolução de uma colônia na mata virgem”), no qual detalha as arbitrariedades, para não dizer crimes que os agentes se permitrem cometer contra a população de Porto Novo naquele começo de 1943.

Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul – 1824-1924




Com a aproximação do bicentenário da imigração alemã no sul do Brasil continuo apresentando obras referentes ao tema. Depois de oferecer obras da minha autoria exclusiva, sigo com outras também de referência traduzidas e editadas por mim, munidas com as notas necessárias para a compreensão do leitor de hoje. Começo com “Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul-1824-1924”, no original “Hundert Jahre Deutschtum in Rio Grande do Sul-1824-1924”. Essa obra vem a ser o resultado do esforço de um número não determinado de colaboradores, organizada por Theodor Amstad, SJ. Permito-me reproduzir o resumo do significado dessa obra da autoria do prof. Martin Dreher, para a edição em português. 

Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do sul (1824-1924), obra publicada pela “Federação de Associações Alemãs e impressa pela Typographia do Centro, em 1924 é, na realidade o fruto do esforço de Theodor Amstad, SJ. Amstad teve inúmeros colaboradores, cujos nomes não são conhecidos. O material coligido em 1924, no entanto, é de impressionante qualidade. Clássico indispensável para o estudo da imigração, o livro é novamente posto à disposição dos pesquisadores e estudiosos graças ao esforço do Prof. Arthur Blasio Rambo e da Editora Unisinos.

A produção do texto coligido por Amstad teve dois contextos. Num primeiro instante  e a partir do seu título, somos lembrados do centenário da imigração alemã no rio grande do Sul, iniciada em 1824. Depois, contudo, não podemos esquecer o ano de 1922, ano do centenário da Independência do Brasil e da realização da “Semana de Arte Moderna”.

Quando do final da primeira guerra mundial e da derrocada do Império alemão, no ano de1918, parecia que a imagem da Alemanha que  produzira entre os descendentes de alemães no Brasil estava destruída. Parecia, também, que se acentuava a perda da identidade. Logo após o final da guerra, porém, as autoridades brasileiras revogaram a proibição do uso da língua alemã, as escolas teuto-brasileiras puderam reabrir suas portas, os jornais teutos voltaram a ser publicados e, pouco a pouco, os valores da germanidade ressurgiram. Alijados da participação política desde os primórdios da República, quando se dera o afastamento e a eliminação do grupo liderado por Karl von Koseritz do cenário público, em sua grande maioria os teutos voltaram a se concentrar nos valores da sua etnia. Tal situação evidenciou-se especialmente nos de 1922 e 1924. Em 1922 comemorou-se a independência do Brasil e dois anos mais tarde o centenário da imigração alemã. As comemorações do ano de 1922 proporcionaram aos teuto-brasileiros a oportunidade de refletir sobre a participação dos imigrantes alemães e seus descendentes  no desenvolvimento do Brasil desde a chegada de Cabral à Terra de Santa Cruz. As comemorações relativas ao centenário à imigração alemã contribuiriam para “aumentar eficazmente a consciência étnica dos brasileiros de descendência alemã, atiçar o amor à índole tradicional, alimentar o orgulho em relação à origem e despertar e aguçar o sentimento de compromisso em manter a herança dos pais. O livro que ora está sendo reeditado em língua portuguesa é uma das principais testemunhas para as proporções e o eco das manifestações. Ao lado devem ser mencionados os monumentos à imigração em São Leopoldo e em Novo Hamburgo, bem como o estabelecimento do “dia do Colono”. Essas consciência de germanidade enfaticamente proclamada colidiria, em pouco temo, com o “Modernismo” que desde 1917 estava  iniciando sua caminhada, influenciando as artes e, posteriormente a política. Nele se faziam presentes traços nitidamente nacionalistas que rompiam  com o romantismo, o parnasianismo e o realismo. Negando ideias e ideais europeus, buscava a independência intelectual do Brasil. Acentuava a política de defesa do “espírito nacional”, cultivando as tradições do país e sublinhando o português como língua nacional. Todo esse movimento queria “abrasileirar o Brasil”. O termo chave para a época passa ser “Brasilidade”. A “Semana de Arte Moderna” de 1922, em São Paulo, foi a primeira grande expressão desse novo movimento.

Assim, “Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul” pretendeu trabalhar a uto-estima dos descendentes de teutos do Rio Grande do Sul, mostrar a contribuição teuta na formação da nação brasileira e evidenciar aos alemães no além-mar europeu as conquistas de alemães e descendentes no Brasil.

Se foi este o contexto histórico do surgimento do livro comemorativo do centenário da imigração alemã no Rio Grande do Sul, nele não se esgota o valor da obra ora traduzida. Se considerarmos a ampla  destruição de fontes para o estudo da imigração, ocorrida nas décadas de 1930 e 1940, devemos ser gratos ao coletivo de autores da obra pela memória fixada em “Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul. Esta memória nos conta da imigração, da expansão das áreas de colonização, do desenvolvimento dos imigrantes e descendentes nos principais acontecimentos políticos da região platina, de sua economia e de sua produção cultural e intelectual até o ano de 1924.

NB. Obra traduzida por Arthur Bl. Rambo e editada pela Editora Unisinos em 1999, seguida de duas reimpressões.



Bicentenário da Imigração - 66

Nas pgs. 425-467 do Relatório II, consta o registro de correspondências  apreendidas pela polícia. Trata-se quase que exclusivamente de cartas escritas por Erwin Becker, entre 1935 e o primeiro semestre de 1939. Apresentam uma boa radiografia sobre a natureza das atividades da Juventude Teuto-Brasileira, já que o missivista foi um integrante ativo da organização. Reforçam  o fato de que a Juventude Teuto-Brasileira gozava, até o advento do Estado Novo, ampla franquia legal para funcionar. É significativo o fato de a Rede Ferroviária ter colocado à disposição dos jovens uma composição a fim de leva-los a um acampamento em Neu Würtenberg (Panambi). Implantado o Estado Novo, a Juventude Teuto-Brasileira teve o mesmo tratamento que tiveram os partidos políticos. Foi extinta. Como qualquer outra agremiação, teve suas programações, reuniões, assembléias e acampamentos proibidos.

A correspondência confirma o conteúdo dos depoimentos de que acima se falou. A Juventude Teuto-Brasileira estava desarticulada. A tentativa de legalizar um sucedâneo no Ministério da Justiça sob a sigla UJTB, União da Juventude Teuto-Brasileira não logrou êxito. 

De toda a correspondência apresentada pelo Relatório II, não se consegue, a rigor, deduzir uma prova com peso suficiente para transformá-la num dos vilões responsáveis pela difusão  do quinta-colunismo nazista no Estado. Antes da sua interdição legal agiu abertamente como qualquer outra organização do gênero. Depois de proibida, deixou de representar  um perigo real por uma razão muito simples. A policia lacrou-lhe as portas, confiscou-lhe os arquivos e submeteu seus dirigentes e seus associados  a uma severa vigilância. Essas precauções  teriam sido mais do que suficientes para resolver a questão.

A sétima parte do Relatório II é dedicada à “Liga União Colonial do Reich” (Reichskolonialbund). A questão é apreciada  em apenas meia dúzia de páginas. Tudo o que a Policia achou de relevante para registrar, foram os estatutos da organização e a fotocópia  de uma carteira de sócio, pertencente a Adolf Reinhard Brandon, domiciliado em Cruz Alta. Pelos estatutos  a Liga Colonial do  Reich, propunha-se como finalidades: 

( ... ) vivificar e reformar a questão colonial entre o povo germânico na base da ideologia nacional-socialista. 

Neste empreendimento era parte da convicção, que a a Alemanha não pode abster-se  de uma atividade colonial, de acordo com as suas necessidades vitais e com sua capacidade industrial, e por isso necessita de colônias.

A devolução das colônias alemãs é encarada como uma questão de honra e direito germânico. A Liga quer converter a compreensão da política  nacional-socialista numa causa popular para todo o povo germânico, principalmente para as mulheres e a juventude alemã a ser o centro espiritual nessa tarefa. (Relatório II, 1942, p. 467).

Sob o aspecto organizacional apresenta-se  a Liga Colonial do Reich como um complemento importante do NSDAP ou do Partido Operário Nacional-socialista Alemão. Em princípio as sedes regionais e sua organização  localizavam-se no mesmo  local da sede do partido.

Os estatutos reproduzidos no Relatório, datam de 12 de junho de 1936. Pelo que parece legítimo deduzir a partir deles, na parte que fala das finalidades, a Liga Colonial do Reich, propunha-se a lutar antes de mais nada pela reconquista das colônias perdidas  quando do término da Primeira Guerra Mundial. Argumentam os estatutos com o direito que a Alemanha teria com relação à possessão  de colônias, para atender às exigências da industrialização e à conquista do espaço vital necessário para a expansão do germanismo. 

Embora os estatutos indiquem que a organização destinava-se, em primeiro lugar, para recuperar as colônias da África e as possessões marítimas do Índico e do Pacífico, fica implícita a defesa do direito de conquista do “espaço vital”, o “Lebensraum”, para a materialização do pangermanismo. 

O que interessa de perto aqui resume-se na questão se a Liga  Colonial do Reich significou objetivamente  aquela ameaça que os termos do Relatório lhe pretende atribuir. Analisando a questão hoje, tantos anos depois, parece haver também nisso uma boa dose de exagero. As razões são várias.

Primeiro. Os núcleos regionais da Liga, se existiram, foram postos fora da lei, como aconteceu com a JTB, com o NSDAP, com todas as outras associações teuto-brasileiras  e com partidos políticos brasileiros, quando foi implantado o Estado Novo. Com as sedes lacradas, os documentos apreendidos e os associados e líderes dispersos, proscritos, expulsos do País, encarcerados ou confinados, foi-se no mínimo noventa por cento da sua periculosidade. 

Segundo. Foi exagerado o potencial de a Liga representar o papel  de cabeça de ponte no esforço de submeter ao jugo nazista, em regime de dominação colonial, estados inteiros do Brasil, ou províncias inteiras da Argentina e do Chile. 

Terceiro. Uma organização do tipo “Liga Colonial do Reich” significava talvez alguma motivação  para grupos pequenos e restritos de pessoas de nacionalidade alemã ou com dupla nacionalidade. Para a grande massa de teuto-brasileiros  de terceira ou quarta geração, os apelos colonialistas nada significavam e por isso mesmo eram incapazes  de sensibiliza-los e menos ainda empolgá-los.

O último segmento do Relatório II ocupa-se com o boicote comercial praticado por firmas importadoras e exportadoras da Alemanha em relação a parceiros aqui no Brasil. Os critérios para que alguém ou alguma firma fosse boicotada podiam ser três: motivos raciais, especialmente quando envolviam judeus; firmas teuto-brasileiras que hostilizavam o nacional-socialismo; firmas luso-brasileiras pelos dois motivos. O caso mais emblemático aconteceu com a Editora Metzler Ltda. Seu proprietário, Franz Metzler, combatia publicamente o nazismo no seu jornal “Deutsches Volksblatt”, o jornal de maior prestígio entre os teuto-brasileiros católicos. Hostilizava  o nazismo por razões políticas e principalmente por motivos religiosos. Como jornal católico de grande penetração no meio católico, fustigava o lado antirreligioso e imoral do nacional-socialismo.

Um outro alvo do boicote foram os exportadores de fumo que de alguma maneira não seguiam à risca as exigências dos importadores alemães no que se referia  à manutenção de funcionários ética e ideologicamente  contrários ao nazismo. 

A Câmara de Comercio Brasil-Alemanha estava encarregada de fornecer as informações sobre a orientação político-ideológica  e a identidade étnica. Ao aceitar essa incumbência a Câmara de Comércio intrometeu-se em assuntos que, de forma alguma, condiziam com a sua função como intermediadora do comércio entre os dois países. Imiscuindo-se em assuntos político-ideológicos, descambou para o terreno da ilegalidade e a competência de interferir cabia à Policia Federal. 

O episódio da prática de boicote sugere duas reflexões.

A primeira relaciona-se com o boicote da exportação de fumo. Tratando com discriminação firmas brasileiras de exportação  por motivos étnicos, políticos  e ideológicos.  Pelo que dá  a entender o Relatório, o boicote comercial visava quase que exclusivamente o tabaco no Rio Grande do Sul. A ameaça que essa prática ilegal pudesse afetar substancialmente a capacidade brasileira de amealhar divisas via exportação, parece remota.

A segunda reflexão é sugerida pelo episódio da discriminação envolvendo a Editora Metzler Ltda. e seu jornal “Deutsches Volksblatt. Como consta no Relatório, a Editora foi perseguida  por se ter posicionado abertamente contra as pregações nacional-socialistas. Acontece que o “Deutsches Volksblatt”, quando da proibição das publicações em língua alemã, teve a sua circulação também interditada. O mesmo aconteceu com outros jornais, almanaques, periódicos, etc., de orientação religiosa, nas quais o nazismo sofria severas criticas devido ao seu discurso  e ação anti-religiosa. 

Analisando a questão, parece que os nacionalizadores assustados  com a penetração da ideologia nazista, cometeram um equívoco lamentável ao jogar na vala comum da proscrição um “Deutsches Volksblatt”, junto com panfletos, volantes, jornais e tablóides, abertamente a favor e a serviço da ideologia nacional-socialista. É mais um fruto da confusão em que língua, cultura, hábitos, valores, etc., eram considerados como sinônimos de ideologia política. Se, ao contrário, os agentes da nacionalização tivessem incentivado os responsáveis pelos jornais  e outras publicações  em língua alemã anti-nazistas, teriam a favor de si os aliados mais eficazes para imunizar de vez a grande massa de teuto-brasileiros contra a ideologia estranha. Em nome de um nacionalismo mal entendido, xenófobo e beirando as fronteiras da paranóia, jogaram fora uma das armas mais poderosas que tinham em mãos. O resultado não poderia ter sido outro. Provocaram uma animosidade  generalizada contra a nacionalização e deixaram as comunidades teuto-brasileiras  expostas à propaganda clandestina. A população de origem  alemã privada dos seus jornais e privada das suas pregações dominicais, tornara-se perigosamente  vulnerável  às investidas de qualquer um que lhes falasse numa língua que defendia seus valores e hábitos, mascarando ideologias estranhas.

Ressalvadas as proporções, aconteceu aqui um fenômeno semelhante àquele que se deu quando os exércitos alemães invadiram a Rússia. Os aldeões da Ucrância  foram a seu encontro, saudando-os como libertadores. Em vez de retribuir a disposição daquela gente de se ver livre do jugo bolchevista, os comandantes alemães ordenaram  a tática da terra arrasada. Cometeram assim o erro mais elementar  e, a longo prazo, fatal. Em vez de solidificar uma aliança espontânea  com os camponeses da Ucrânia, sem o menor motivo, fizeram deles um enorme potencial de  resistência e de sabotagem. Se as tropas alemãs tivessem acolhido a aliança oferecida pelos urcranianos, com muito  probabilidade não teriam amargado as derrotas que se seguiram.

Algumas conclusões
Concluímos com isso as breves  considerações sobre o Relatório II, elaborado pelo DOPS, sob a coordenação da Chefatura da Policia. Resumindo, creio que se pode registrar entre outras as seguintes constatações.

Primeiro. O Relatório ocupa-se, sem dúvida, com uma série de fatos que de forma alguma poderiam ter sido ignorados pelas autoridades tanto civis como policiais. Entre eles, destaca-se a tentativa de instalação de um radio transmissor de longo alcance no navio alemão “Rio Grande; a posição declaradamente favorável ao nazismo de certos lideres religiosos; o rumo que uma série de organizações teuto-brasileiras começavam a seguir; a orientação de setores da imprensa veiculando matérias favoráveis à ideologia nacional-socialista. Nenhuma dessas e de outras questões permitia qualquer tibubeio. Era preciso enfrentar com vigor o mal no seu nascedouro e, desta maneira, atalhar seus efeitos. 

Segundo. Outras questões, como foi a de legalizar União da Juventude Teuto-Brasileira, posta fora da lei; o episódio do boicote comercial; a acusação  contras os pastores  evangélicos como porta vozes disfarçados do nacional-socialismo, etc. parecem pouco relevantes quando encarados com seriedade e objetividade. 

Terceiro. Ao analista de hoje salta aos olhos o exagero no significado que se atribuiu indistintamente a todos esses fatos. As circunstâncias criadas pelo envolvimento progressivo do Brasil no conflito mundial explicam de alguma forma a reação das autoridades  municipais, estaduais e federais. Não justificam, porém, atmosfera de pânico e terror que espalharam entre as populações  de origem alemã.

Quarto. A consideração mais importante, entretanto, refere-se a outra faceta da questão. A maioria dos episódios continha, de fato, um potencial de periculosidade nada desprezível. Todos eles, contudo, limitavam-se a grupos e circunstâncias  localizadas e identificadas. A polícia dispunha de instrumentos para neutralizá-los na sua ação. De outra parte, oitenta a noventa por cento da população de teuto-brasileiros, encontrava-se fora do alcance e da influência exercida  pelos postos avançadas do nazismo. Listar qualquer teuto-brasileiro no rol  dos nazistas, constituiu-se num funesto equívoco. Essa grande massa  de cidadãos brasileiros de origem alemã nada mais ambicionava  do que pôr em prática a sua cidadania através do trabalho honesto, cumprindo assim suas obrigações cívicas e religiosas. O nazismo pouco, melhor dito, nada tinha a lhes oferecer. A maioria o rejeitava por causa do seu combate à religião e religiosidade. 

Com tudo isso não se pretende afirmar que não se desse importância  às organizações e aos indivíduos  comprometidos com a propaganda do nacional-socialismo. Seu número e, principalmente, sua virulência e fanatismo exigiam das autoridades responsáveis uma postura firme. Uma investigação inteligente, seguida de uma ação policial eficiente, os teria reduzido à inanição, dispensando esforços e  aparatos excepcionais. No País existiam leis suficientes e eficientes para o caso e, em tempo de guerra, acresciam ainda as regras próprias para a situação, fruto de tratados internacionais. O perigo alemão no Sul do Brasil foi exagerado e transformado num monstro que na realidade não passava de um caso de policia, um pouco mais complicado do que os do dia a dia.

Bicentenário da Imigração - 65

Cabem aqui as mesmas conclusões que foram válidas nos dois episódios que envolveram a instalação de um rádio-transmissor no cargueiro alemão “Rio Grande”  e todo o “affaire” relativo  à  sociedades alemãs acusadas de servirem de via de penetração ao nazismo. O problema existiu e ninguém vai nega-lo. Se o problema existia, era preciso leva-lo a sério e não perder tempo  para colocar em marcha as providências necessárias para fazer-lhe frente. Masm, nos casos já citados, tratava-se de um perigo localizado, envolvendo lideranças, grupos e indivíduos que não representavam a intenções da maioria. E, também aqui, o próprio Relatório da policia  fornece os melhores subsídios, para apoiar essa conclusão. Entre eles podem-se destacar as instruções e orientações que o Sínodo Riograndense fez chegar aos subalternos. O Relatório registra, no final do capítulo terceiro, um episódio que comprova  que, na própria Alemanha, atuavam lideranças evangélicas muito fortes contra o nazismo. O líder dessa reação foi o pastor Niemöller. Ele foi confinado no campo de concentração e, o próprio Hitler teria posto o seu confronto com  o pastor nos seguintes termos: “ou Niemöller ou eu”. Dele escreveu o secretario executivo do Conselho das Igrejas de Cristo na América, Dr. Henry Smith Laiper: 

No dia primeiro de julho os sinos das igrejas que ainda existem no Terceiro Reich, quando badalaram estavam lembrando o início do terceiro ano do reverendo dr. Martin Niemöller, um dos mais destemidos, mais notáveis e mais eficientes lideres da Igreja Evangélica Alemã, que se recusou a aceitar a liderança nazista nos assuntos internos da Igreja e, recusou-se também,  em consentir que ele mesmo fosse transformado em “Gleichgeschaltet” (coordenador) para fins políticos.
Naquela data, todos os ministros dos Estados Unidos e em outros países democráticos, uniram-se em espírito com os mártires da Alemanha, numa demonstração de solidariedade na luta contra os esforços para restringir a liberdade do espírito humano contra as suas tentativa de estabelecer o neopaganismo. (Relatório II, 1942, p. 207)

A observação final a esse capítulo poderia ser a mesma dos anteriores. O próprio material que foi apresentado  como prova da infiltração  generalizada do nazismo na Igreja Evangélica Luterana e a sua disseminação entre os fieis, foi exagerado. Na verdade, o número e, principalmente  o valor dos documentos registrados a favor da tese do Relatório, parecem bem menos convincentes do que se supunha.

O capítulo quinto do Relatório II procura analisar  a importância da União  Beneficente e Educativa Alemã (Bund der Schaffenden Reichsdeutschen) como difusora da ideologia nazista. A Sociedade foi  criada, segundo od Relatório, para tomar o lugar do DAF  (Deutsche Arbeiter Front) a qual, por sua vez, representava a mais importante das organizações, a NSDAP. Quando a NSDAP foi posta na ilegalidade, a União Beneficente e Educativa Alemã deveria substituí-la. Em substituindo uma entidade proscrita por lei, é obvio que lhe cabia operar como fachada  legal, um vez registrada no Ministério da Justiça, inclusive continuado as atividades consideradas fora da lei. Uma vez comprovada a verdadeira natureza da sociedade e identificadas suas intenções reais, era forçoso submetê-la a uma zelosa vigilância, o que foi feito como indicam os documentos. Conforme esses documentos, defrontamo-nos novamente com um problema real, porém, de repercussão modesta. 

O documento de nº 44, reproduzido no original e na sua tradução nas pgs. 212-215, apresenta as condições facilitadas de uma viagem de navio fretado para a Alemanha. Estipula condições e prazos para a inscrição e a duração da viagem. 

O documento de nº 45, pgs. 221-224, registra o regulamento para alemães  natos que queiram viajar para a Alemanha em visita ou com a intenção de se repatriarem. Especifica minuciosamente os documentos pessoais exigidos para a emissão do passaporte.

O comentário anexo aos dois documentos comprova que as autoridades haviam logrado total controle sobre as pretensas viagens, ao menos no que diz respeito ao Rio Grande do Sul:

No Rio Grande não lograram os agentes pardos o beneplácito da Policia para a prática de mais esse atentado contra as nossas leis. ( ... )
Uma cousa, no entanto, é certa: mau grado as refregas sofridas, os nazistas ainda se encontram acordados e não perderam de todo a esperança de um dia, encontrarem a forma maravilhosa que lhes permita reencetar a luta a salvo da opressão policial. (Relatório II, 1942, p. 224)

Nas ps. 225-230, fica registrado o depoimento prestado à Policia pelo Sr. Walter Nas, antigo dirigente da NSDAP. Residindo em Novo Hamburgo, não ocupava mais qualquer cargo na organização em 1938. A rigor, o depoimento não esclarece grande coisa, além de que a DAP ter sido filiada e subordinada à sua congênere na Alemanha; que funcionavam células dela em Novo Hamburgo, São Leopoldo, Sapiranga e Estância Velha; que mantinha correspondência com o sr. Kurt Steffin, dirigente da entidade no Rio de Janeiro; que fora instruído pelo cônsul Ried, em Porto Alegre, no sentido  de que os assuntos referentes à  DAP tinham que ser intermediados pelo Consulado; que os sócios  pagavam mensalidades; como vários sócios da DAP, entre eles, ele próprio, se reuniam regularmente nas  terças e quintas feiras à noite para um jogo de cartas, na residência de um ou de outro no começo e, mais tarde, no café-bar de Paulo Banke; que costumavam  ouvir discursos de Hitler pelo rádio; que ele,  com seus companheiros participava da campanha de arrecadação de donativos para o inverno; que fora avisado pelo dr. Günther Schinke que a policia faria uma investigação e que, não acreditando na notícia, deixou de tomar certas providências; que no momento não exercia mais nenhum cargo na organização. Consta que o interrogatório foi encerrado neste ponto e devidamente datado e assinado.

Estamos diante de mais um documento que pouca coisa acrescenta em termos de prova a favor da infiltração nazista no Rio Grande do Sul. Torna-se muito difícil perceber no episódio o espantalho pintado pelo Relatório. 

Depois do exame dessa prova será ainda possível  acreditar-se na sinceridade dos propósitos testemunhados pela “Bund der Schaffenden Reischsdeutschen” ao Sr. Ministro da Justiça?
Certamente não. 
Está evidenciado que a verdadeira finalidade é política e não beneficente e que o objetivo não foi organizar uma sociedade dentro dos moldes da Constituição, e sim, incorporar um verdadeiro instituto, congregando todos os órgãos ativos do Partido Nacional-Socialista.

Um pouco mais adiante:

Com a publicação oficial do decreto conclamamo-nos na emergência de tomar uma decisão rápida, clara e exata para poder cumpri-lo pois, teremos dois caminhos a seguir: ou perder tudo o que foi construído durante longos anos de sacrifícios por mais de 1700 sócios, ou tentar um entendimento, que de qualquer modo, permita a possibilidade de defender e garantir os interesses dos sócios.
Mais claro não é possível. É a confissão  oficial. (Relatório II, 1942, p. 230)

“Ninguém seria tão ingênuo de acreditar que a Sociedade Beneficente, de que se acaba de falar, não tenha oferecido  para seus organizadores  a via legal para exercer as atividades necessárias para a finalidade que se havia proposto. O extrato dos estatutos registrados no Ministério da Justiça não fazem supor que se tratava de uma organização clandestina”. (Relatório II, 1942, p. 244-245). Pela fachada tratava-se de uma agremiação como tantas outras similares que se dedicavam ao auxílio mútuo. Ao conseguir o registro, passou a ser legalmente considerada e reconhecida como tal. Não fica muito claro se praticou atos ilegais. Nesta questão há todo um outro aspecto que merece certa atenção. A fundação e o registro da Associação Beneficente Alemã ocorreu em 1938. Um ano, portanto, antes  de começar a Segunda Guerra Mundial e quatro anos antes antes de o Brasil declarar guerra à Alemanha. As  relações diplomáticas  desenvolviam-se na mais perfeita normalidade. Não resta dúvida de que o nacional-socialismo alimentava o maior interesse para passar uma boa imagem para os imigrantes alemães radicados em outros países e consolidar com eles o intercâmbio mais estreito possível. Mas enxergar na associação  uma forma mascarada, com a finalidade única de servir de via de penetração para o nazismo, parece um exagero.

No capítulo V do Relatório II são apresentados os mecanismos de propaganda utilizados  pelo nazismo. Os  veículos mais visados foram o rádio e a imprensa. O Relatório mostra basicamente  como entrava no Brasil a propaganda  vinda da Alemanha e a natureza do material aqui oferecido e os agentes mais comprometidos. O papel do rádio  recebeu atenção especial. (cf. Relatório II, 1942, p. 247-281) No final do capítulo, foi reproduzido um questionário destinado a apurar a penetração da rádio alemã, sua aceitação e sua clientela. Registraram-se  ainda alguns nomes  com endereço de pessoas que mantinham correspondência com a emissora alemã.

A questão relacionada com a propaganda contem novamente aspectos parecidos com aqueles analisados  até aqui. Observe-se, por ex., a imprensa. Sem pretender diminuir seu poder e sua abrangência como veículo capaz de influir na opinião das pessoas, era possível que as autoridades exercessem um controle eficiente sobre ela.

Ainda no caso da imprensa, um outro detalhe não pode ser esquecido. As populações rurais que compunham a imensa maioria eram profundamente religiosas. Os jornais, as revistas, os almanaques que liam seguiam uma linha editorial confessional. Nessas publicações não havia espaço para a propaganda do nacional-socialismo com sua proposta arreligiosoa e anti-religiosa. Seria mais fácil encontrar referências  desabonadoras do que elogiosas  ao nazismo. Recorde-se  o que envolveu o mais importante jornal católico em língua alemã no Rio Grande do Sul, o Deutsches Volksblatt, já em 1931. 

No que se refere à propaganda pelo rádio, é permitido repetir a observação feita por ocasião do episódio do navio cargueiro alemão. Apenas grupos seletos, residindo quase sempre em centros urbanos, tinham acesso a essa fonte de informação. A grande massa  de “alemães” espalhados pela região colonial ficava fora do seu alcance.

O capítulo sexto do Relatório II ocupa-se com o papel da juventude Teuto-Brasileira ligada à Juventude Hitlerista. Parece fora de qualquer dúvida que aqui residiu um dos problemas mais preocupantes quando se pretende dimensionar as chances do projeto nacional-socialista em nosso meio. Pela sua própria natureza o jovem é propenso a novidades, e com facilidade passível de sedução por propostas grandiosas. A aventura, o companheirismo, o heroísmo o fascinam. Os estrategistas da propaganda nazista souberam manipular magistralmente todos esses fatores. Reuniões regulares, cantos, bandeiras, uniformes, emblemas, acampamentos, etc., faziam parte do aliciamento dos adolescentes e dos jovens. Na sua forma original a Juventude Teuto-Brasileira como organização não deixava dúvidas. Pautava toda a sua linha de conduta segundo os ditames da inspiradora alemã, a Juventude Hitlerista. Esse fato torna-se ainda mais evidente com a viagem de delegações da Juventude Teuto-Brasileira para a Alemanha e os acampamentos e programações conjuntas, realizadas em comum com a Juventude Hitlerista e com outras organizações similares procedentes de uma dúzia de países.

No estado do Rio Grande do Sul, a Juventude Teuto-Brasileira encontrava-se em plena expansão quando foi extinta por ordem do Ministério da Justiça. Em dezembro de 1937, havia ao todo 39  núcleos reunidos em sete grupos: Rio grande, Porto Alegre, Lajeado, Santa Cruz, Cachoeira, Ijuí e Erechim. (cf. Relatório II, 1942, p. 345-346).  As sedes desses núcleos  eram na maioria pequenas e médias cidades e alguns núcleos coloniais mais dinâmicos. 

A ação rápida das autoridades policiais  reduziu à inanição a Juventude Teuto-Brasileira e neutralizou o surgimento de qualquer outra organização que lhe tomasse o lugar. Tendo sido assim, a influência dessa Juventude foi passageira e limitada.

Em substituição à Juventude Teuto-Brasileira, surgiu em Porto Alegre, em agosto de 1937, a proposta para se criar uma entidade que deveria ter sido a verdadeira versão teuto-brasileira, desvinculada da tutela da Juventude Hitlerista. Examinando os objetivos propostos, não se encontra nenhum motivo sério para suspeitar da sinceridade das suas intenções. O que na época assustou muita gente foram duas questões apresentadas na proposta. A primeira  dizia respeito aos meios para promover a Juventude Teuto-Brasileira, como seria chamada. Propunha promover acampamentos, excursões, etc. Ora esse tipo de atividades estivera sempre na mira das autoridades como suspeita de mascarar uma educação para-militar; de ocasiões em que se praticava o nudismo e outras formas de lazer, no mínimo suspeitas. A segunda questão repetia e insistia num ponto de divergência irreconciliável. A Juventude Teuto-Brasileira propunha-se a transformar em bons brasileiros os descendentes, cultivando a língua e os hábitos  dos seus antepassados. De resto a  proposta poderia servir de paradigma para criar qualquer tipo de associação para fins educativos e cívicos. Parece pertinente reproduzir aqui, a declaração de objetivos que levaram à criação da UJTB.

Objetivos e Obra da União da Juventude Teuto-Brasileira. 
A União da Juventude Teuto-Brasileira é uma agremiação de jovens masculinos e femininos, filhos de alemães sediados no Brasil, fazendo assim parte da coletividade da grande nação brasileira. A suprema tarefa da JTB é a educação de seus membros  na base da camaradagem e da disciplina para o serviço da Pátria, cumprindo assim o dever de cada cidadão perante a nação brasileira.

Os  jovens aprendem que a obediência ao governo e às leis não é somente um dever patriótico, mas sim, que essa obediência é ditada pelo amor ao bem-estar da nação. Este amor os leva até a morte e nem um deles vacila em deixar a vida e o sangue no campo de batalha em defesa da querida Pátria.

Os ídolos desta juventude são os heróis da luta  da guerra do Paraguai, os valores bandeirantes e o pioneiros alemães, simples colonizadores, mas que, com esta simplicidade característica dos teutos, venceram as matas virgens dos estados sulinos, para transformá-as em terra férteis, fundando cidades, organizando indústria e comércio, sendo assim, em conjunto com os colonizadores  italianos, a base da prosperidade neste ramo, como o foram anos antes os gaúchos, valentes conquistadores do Brasil. Estes antepassados teutos não só souberam lidar com pá e machado, como também defenderam a Pátria com a arma na mão contra invasores estrangeiros e manifestaram a ordem nos tempos da revolução.

Estas razões levaram a UJTB a despertar nos jovens corações, a memória dos antepassados vindos da Alemanha, e lembrar que o sangue é o mesmo, e que este sangue os obriga a cultivar  e respeitar os costume e o idioma dos pais e avós.

Se na história brasileira surgem homens importantes de descendência lusa como germânica, é certo que cada um contribui com as qualidades de sua raça, qualidades estas que deram o valor para poderem servir desta forma extraordinária à nossa querida pátria. Bravura, fidelidade, camaradagem, modéstia, coragem, força de ação, tenacidade, solidez, veracidade e amor à pátria são objetivos que queremos inculcar nos jovens.

Acampamentos, raids, atletismo, educação teórica em reuniões semanais, cultivo de muúica e canto em geral, como a arte de ofícios, são os meios eficazes desta educação. Os acampamentos e raids nos fazem conhecer a grandeza do Brasil e sua magnífica natureza, nos levam ao interior para travar relações com a população dos campos, da serra, da colônia e conhecer seus costumes.  O atletismo torna juventude robusta e sadia, preparada para a luta das armas e da vida. Também temos em nossas fileiras alguns jovens alemães natos, cujo supremo dever é de formar um laço de amizade entre as duas grandes nações, e que, respeitando em todo as leis do nosso país, por gratidão à nação hospitaleira servem com o máximo prazer o nosso maior objetivo: trabalhar com ardor para a grandeza da nação brasileira. 

A UJTB compreende ser um dever natural comemorar festivamente as grandes datas de nossa pátria, como já tem dado provas de assistência social – nossos camaradas cooperam nos “Chás da pequena Cruzada” em favor da Santa Casa local, cooperam na colocação  de postes para a linha de alta tensão ao Sanatório Belém, socorreram os flagelados no arrabalde de São João/Navegantes, levando mantimentos aos que estavam cercados pelas águas, ou auxiliando as mudanças dos necessitados ou guardando as casas dos mesmos. 

A União da Juventude Teuto-Brasileira está organizada em quatro regiões: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo/Paraná  Rio de Janeiro. As corporações locais são divididas em grupos pequenos de 10 a 12 jovens, masculinos e femininos, nas idades  de 8 a 14 anos e 15 a 20 anos. 

O símbolo contido na nossa bandeira é para documentar a nossa amizade com a velha Pátria dos antepassados, um antigo emblema dos germanos, dos tempos de antes de Jesus Cristo e que significa “Vitória”. 

A UJTB é uma agremiação puramente brasileira. Não temos ligações com quaisquer grupos políticos ou sociedades e especialmente não é ligada a organizações alemãs. Como mantemos relações muito amistosas e cordiais com os “Escoteiros do Mar”, também mantemos com outras agremiações da juventude, entre outras com os escoteiros da Argentina, do Uruguai e da Alemanha. Temos aproveitado algumas experiências  destas corporações, mas nunca tentamos implantar em nossa estrutura cousas estranhas a o ambiente da nossa Pátria.

A UJTB espera de seus membros, que cultivem o idioma alemão, porém, exige que estudem e se dediquem à língua brasileira, porque é  um dever de cada cidadão conhecer a fundo o idioma de sua pátria. 

UJTB existe a 3 anos, restringindo-se sempre ao campo cultural, sem orientação política, pois sabe da responsabilidade perante a nação, que de preparar jovens cidadãos para os serviços da Pátria, tendo sempre em vista a grandeza da Nação. (Relatório II, 1942, p. 349-351).

O exame de hoje depois de  oito décadas da elaboração dos princípios que deveriam nortear a atividade da União da Juventude Teuto-Brasileira, sugere algumas reflexões. Uma delas poderia ser a seguinte. Na proposta não se observa nada de objetivo que possa por em dúvida a natureza e as intenções da organização com a finalidade de adestrá-la por meio dos mais variados instrumentos, para transformar os jovens em cidadãos úteis, conscientes e disciplinados. A celeuma em torno da fundação da UJTB somente se entende quando inserida  no contexto da época.

Há uma segunda reflexão complementar à primeira. Pelo que tudo indica, a organização não sugere o menor motivo para ser considerada clandestina. A suspeita que se lançou sobre ela é que ela deveria tomar o lugar da Juventude Teuto-Brasileira, posta fora da lei pelo Ministério da Justiça. No caso não significaria nada mais do que uma tentativa legal para perpetuar a organização proscrita. Mesmo sendo assim, não havia necessidade  para tamanho alarme. Na versão proposta, a UJTB não pretendia ser uma agremiação clandestina. Havia solicitado o competente registro ao Ministério da Justiça. Nada de errado se poderia imputar a ela após tal homologação. Mas um detalhe não pode ser ignorado. Caso a organização se desgarrasse da orientação aceita pelas autoridades competentes, a Policia e a Justiça teriam em mãos os nomes  dos responsáveis e, ao mesmo tempo, disporiam dos instrumentos para coibir abusos ou, em caso extremo, lacrar as portas da entidade e confiscar seus arquivos. Acrescente-se ainda o detalhe de que o número de regiões em que foi dividida a UJTB eram quatro. Subdivididas em pequenos núcleos de  10 a 12 jovens, assemelhando-se muito aos escoteiros. Fica difícil aceitar que essa organização, nos moldes e nas características em que foi apresentada, pudesse assumir o grau de periculosidade de que foi acusada. 

Há, ao que aprece, um outro elemento que não é de todo irrelevante.Trata-se da data em que veio ao público a proposta da criação da UJTB, setembro de 1937. Ora, não é segredo para ninguém que conhece a época que não poucos dos idealizadores do Estado Novo, na iminência de ser implantado, alimentavam uma simpatia mal disfarçada para como os nacionalismos totalitários da Europa. Faltavam, além disso, dois anos para a eclosão da Segunda Guerra Mundial. As relações diplomáticas, culturais e comerciais entre o Brasil e a Alemanha fluíam na total normalidade. Toda essa situação aconselhava  às autoridades responsáveis pelo funcionamento e o controle das associações, uma vigilância  diuturna, mas rotineira e normal, também no que se relacionava com  a UJTB. Transforma-la, dois anos mais tarde, num dos argumentos mais fortes para provar a sua condição de veículo de primeira linha na infiltração do nazismo entre os jovens, não passa de um exagero.

Mais uma consideração cabe aqui. Da maneira como se apresentou a proposta da UJTB, sem uma análise e sem comentários, pode-se transformar num contra argumento. A suspeita confirma-se com o que segue no relatório da policia. Nas pgs. 353-371, está reproduzida uma série de fotos, que deveriam documentar as atividades da Juventude Teuto-Brasileira e da Juventude Hitlerista. Exceto dois dos documentos, o de nº 84 e 85, que mostram fotografias da Juventude Hitlerista, os demais  referem-se a acampamentos e atividades diversas  da Juventude Teuto-Brasileira. Ao que se pode deduzir, falam de acontecimentos  ocorridos no ano e 1937 ou antes, pois a Juventude Teuto-Brasileira foi extinta durante o ano de 1937.  Fica de novo a interrogação: será que a Juventude Teuto-Brasileira, após dois anos com suas atividades encerradas, suas portas lacradas pela policia  e seus arquivos confiscados, significava ainda uma ameaça do tamanho que as autoridades pretendiam enxergar?

Nas pgs. 373-423, encontramos uma série de depoimentos  prestados na policia por dirigentes  da Juventude Teuto-Brasileira. Todos eles foram tomados  no decorrer do segundo semestre  de 1939. Examinando com atenção os documentos, conclui-se que também eles nada acrescentam além daquilo que já era conhecido pelas autoridades  interessadas. Reforça-se, portanto, também neste caso a sensação de que se extrapolou o  poder de sedução da Juventude Teuto-Brasileira,  de modo especial sobre as comunidades coloniais. Outra certeza que se tem, ao ler os documentos, é a evidência da desarticulação da organização. No segundo semestre de 1939, que coincidiu com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, a Juventude Teuto-Brasileira, se ainda atuava, tinha pouca ou nenhuma chance de se organizar e partir para uma ofensiva de alguma importância.