Organismo – Sistema. O Organismo é definido por Bertalanffy como sendo “uma estruturação de sistemas abertos, o qual fundamentado nas condições da construção sistêmica, conserva-se em intercâmbio com as partes”. Essa definição foi o resultado das pesquisas de von Bertalanffy e de outros sobre a natureza do organismo vivo. É válido na sua essência para todos os seres vivos independentemente da sua posição na hierarquia da complexificação da natureza. Vale, portanto, tanto para os protozoários quanto para os mamíferos ou aves situados no topo da escala taxonômica. Os aprofundamentos posteriores às constatações do autor, assim como as dos especialistas seus contemporâneos, não alteraram na essência da compreensão o conceito de organismo. O que se pode afirmar é que muitos dados e muitas observações novas depõem a seu favor.
A compreensão do que seja um organismo vivo, assim como o apresenta von Bertalanffy, pede uma análise dos elementos que o integram. Em primeiro lugar o organismo vivo é um sistema aberto “no qual entra material novo e outro já servido e ou não aproveitável é descartado”. (Bertalanffy, 1949, p.124) Em outras palavras e explicando, é supérfluo afirmar que não há nenhuma dificuldade em distinguir um ser vivo de um cadáver. A constatação sobre a qual a observação empírica não deixa dúvidas, vem a ser a consequência de uma realidade biológica que acontece na base celular, tanto dos protozoários quanto dos metazoários. Nesses últimos repercute como resultado no organismo como um todo, apresentando-o como vivo ou como morto. E em que consiste em última análise no plano biológico a diferença entre “a vida e a morte?”. Consiste no fato de que a vida está presente num organismo enquanto ele perdurar como um sistema aberto. No momento em que essa condição cessa, instala-se a condição de morte, de sistema fechado, com todas as suas consequências a curto, médio e longo prazo. A condição de ser vivo requer que todas as partes do organismo, individual e integradamente funcionem como sistemas abertos. Nessa situação as células, desde as menos até as mais complexas, não são construções fechadas nem acabadas. Acontece nelas um contínuo e ininterrupto afluxo de matérias primas, de suprimentos novos. Eles são elaborados e preparados para servir às necessidades biológicas do organismo e pela corrente sanguínea carregadas a todos os tecidos, órgãos, aparelhos e sistemas. O metabolismo se encarrega de incorporar parte nas estruturas em constante renovação ou transformá-las na energia indispensável para garantir o bom andamento das atividades e funções vitais. As sobras e os resíduos da atividade metabólica são, por sua vez, encaminhados para o exterior e descartados pelos órgãos e aparelhos específicos: pulmões, rins, pele e intestinos. A natureza desses processos em permanente fluir, requerem pela própria natureza o aporte ininterrupto de “matérias primas” que são processadas pelos respectivos órgãos, transportados para os seus destinos e as sobras e resíduos descartados. Observado pelo viés da física estamos diante de um sistema de equilíbrio instável semelhante a um rio que flui alimentado sem parar pelas fontes e despejando sem parar suas águas no mar. Verifica-se, portanto, um permanente tender ao equilíbrio, sem nunca completá-lo. Em outras palavras, estamos diante de um sistema de equilíbrio instável. Na sua obra “Teoria Geral do Sistemas” von Bertalanffy resumiu a questão:
Há anos atrás foi indicado que as características fundamentais da vida, metabolismo, crescimento desenvolvimento, auto-regulação, resposta a estímulos, atividade espontânea, etc., podem ser consideradas em última análise consequências do fato de o organismo ser um sistema aberto. (Bertalanffy, 2009, p. 202)
No momento em que, por uma razão qualquer, cessa o afluxo de elementos novos, interrompe-se em cadeia a atividade metabólica e fecha-se também a porta de saída para os resíduos. O sistema entra em equilíbrio, o rio transforma-se em lago, o organismo em cadáver. Mas o autor chama a atenção a um outro aspecto do organismo vivo como sistema de equilíbrio instável. Ao mesmo tempo é verdade que o organismo considerado na sua totalidade oferece propriedades muito próximas às dos sistemas químicos em equilíbrio.
Nas células e nos organismos pluricelulares encontram-se combinações bem definidas, relações constantes entre os diversos componentes, num sistema químico em perfeito equilíbrio. Esse fenômeno é inteiramente independente da quantidade absoluta de componentes em organismos de diversos tamanhos. Conserva-se constante no acréscimo alternado, isto é, na mudança de aceitação de elementos nutritivos e na mudança das condições externas. (Bertalanffy, 1951, p. 49)
Exemplificando. O fato pode ser comparado, ressalvadas as devidas peculiaridades, a um, dez ou um milhão de litros de água. O componente fixo e constante em qualquer um desses volumes é sempre o H20. Seja numa gota ou seja num lago o H20 é o responsável que o líquido nos dois casos seja a mesma água. Um fenômeno semelhante ocorre no organismo vivo. Independente de qualquer tamanho, complexidade, forma externa, modalidade de adaptação ao ambiente externo, encontram-se nos organismos elementos estáveis que fazem com que o funcionamento dos processos vitais, na sua natureza físico-química e fisiológica, não difiram essencialmente daquilo que é responsável pela vida biológica nos organismos superiores mais complexos.
No organismo vivo, entretanto, independentemente do tamanho e da complexidade, os elementos básicos não são peças estáticas e circunscritas rigidamente a uma situação bem definida e delimitada. Sua ação não se confina à vizinhança mais imediata, mas de alguma forma perpassa o organismo como um todo. Trata-se de um fenômeno análogo ao o que acontece num sistema de vasos comunicantes. Acrescentando-se ou subtraindo-se uma porção, não importa o tamanho, o volume do conjunto do sistema é alterado. Ou, introduzindo uma gota de corante numa extremidade do sistema, ele se alastra pouco a pouco pelo volume todo contido nos vasos comunicantes. De forma semelhante, quando no organismo vivo há acréscimos, subtrações ou modificações nos seus componentes básicos, o efeito positivo ou negativo far-se-á sentir de alguma forma no sistema como um todo. Em outros termos. No momento em que algum dos componentes essenciais ao organismo vivo sofrer alterações negativas o reflexo não tardará em manifestar-se no todo e na proporção do potencial do dano embutido na alteração negativa da porção do organismo afetada. O inverso também é verdade. O vigor de um tecido ou órgão qualquer reflete-se no todo na mesma proporção da sua importância na manutenção do sistema como um todo. Assim um coração ou um fígado em bom funcionamento fazem com que o todo suporte com maior facilidade abalos mais sérios causados em outros órgãos. E vice-versa, um coração comprometido transforma-se num fator de preocupação permanente quando o todo do organismo é submetido a situações de risco. “Esta é a base da regulação orgânica”, (Bertalanffy, 1951, p. 49) conclui von Bertalanffy.
Embora o organismo como uma totalidade não possa ser considerado como um sistema em equilíbrio, sob muitos aspectos assemelha-se aos sistemas químicos em equilíbrio. “A aplicação de princípios de equilíbrio físico-químico, especialmente a lei da atuação da massa e do equilíbrio químico, são de importância fundamental para a compreensão dos processos fisiológicos”. (Bertalanffy,1951, p. 49)