Diante
desse quadro como conscientizar os adultos pelo sentido e o valor da
preservação da natureza e como educar as crianças já a partir do maternal aprenderem o que é a natureza e se convencerem
da necessidade de lidar com ela de forma racional. Estamos indiscutivelmente
diante de desafios de proporções difíceis de dimensionar. Por onde começar?
Edward Wilson mais vezes citado e comentado mais acima assim se manifestou em
sua obra “A Criação”, sobre que base e quando deveria começar a educação
ecológica.
A ascensão à Natureza
começa na infância, portanto o ideal é que a ciência da biologia seja
introduzida logo nos primeiros anos de vida. Toda criança é um naturalista e explorador principiante. Caçar, coletar,
explora novos territórios, buscar tesouros, examinar a geografia, descobrir
novos mundos – tudo isso está presente em seu cerne mais íntimo, talvez
rudimentarmente, mas procurando se expressar. Desde tempos imemoriais as
crianças foram criadas em estreito
contato com o ambiente natural. A sobrevivência da tribo dependia de um
conhecimento íntimo, tátil dos animais e plantas silvestres. (Wilson, 2008,
p.158)
O
afastamento da natureza começou com a
“revolução dos alimentos” conforme Darcy Ribeiro ou se preferirmos com a
“primeira traição à natureza” no entendimento de Edward Wilson. Bem
considerando os dois, o antropólogo e o biólogo tem razão, cada qual à sua
maneira. De um lado a revolução dos alimentos ou revolução agrícola e pastoril munida das tecnologias
que a impulsionaram, ampliaram e aperfeiçoaram o ritmo, a abundância e a
qualidade do acesso aos recursos oferecidos pela natureza. De outro lado essa
dinâmica foi afastando gradativamente uma porcentagem crescente de pessoas do
contato e da convivência íntima e diuturna da “sua casa”. Hoje um sem número
vivem praticamente no total confinamento prisioneiros da artificialidade das
metrópoles e megalópoles. Mas, os detalhes dessa história já foram objeto de
uma reflexão mais acima. Como complemento indispensável para lidar com essa
realidade e pensar seriamente numa
solução para reequilibrar, de alguma forma, a relação do homem com o meio
ambiente e as tecnologias de que dispõe para explorar seus recursos requer uma
avaliação séria. “Hoje, a maior parte da humanidade reside num mundo fabricado
artificialmente. O berço inicial da nossa espécie, foi quase que esquecido
completamente”. (Wilson, 1008, p. 159).
Acontece
que a espécie humana, pela sua origem e evolução, encontra suas raízes ontologicamente
fincadas no mundo que alimenta o corpo e
oferece os estímulos para a alma dar vasão às suas potencialidades. Por essa
razão, por mais distante e isolado que as pessoas passem seus dias, essa
vinculação existencial com a “mãe e pátria”
nunca se desfaz. Mesmo que esse lar primordial esteja cada vez mais distante,
ele nunca será completamente esquecido. Como um paraíso perdido mas não
esquecido, mesmo que fisicamente distante, sua melodia é percebida de muitas
formas na arte, na religião, nos mitos e, principalmente, na nostalgia de pelo
menos viver e degustar a atmosfera aconchegante, caminhando por uma trilha de montanha,
admirando o silêncio eloquente e a sinfonia de uma floresta, beber na concha da
mão a água cristalina de um arroio não contaminado que desce do planalto e de
cascata em cascata vai ao encontro do “imenso mar do Belo” como o “pai Homero”
se referiu ao oceano. Não é por nada que exatamente os países mais
desenvolvidos com grande concentração humana em áreas urbanas de grande porte,
como nos Estados Unidos são exemplos de preservação ambiental. Possuem 59
parques propriamente ditos mais inúmeras florestas nacionais e áreas de preservação
ambiental. Cabe ao Congresso demarcar as áreas dos parques com finalidade de
preservação de suas características originais geológicas, topográficas, flora e
fauna e, ao mesmo tempo servirem de recreação e lazer mesmo para os cidadãos
comuns. São proibidas quaisquer tipo de atividades que perturbem os animais
nativos, prejudiquem a flora ou agridam a sua fisionomia geográfica. Esses
parques são verdadeiras universidades e escolas ao ar livre. O primeiro a ser
criado foi o parque Yellowstone em 1872, o maior situa-se no Alasca medindo 32.375 Km2.
O total da área protegida chega 211.000 km2. 14 dessas áreas foram declarados
patrimônio mundial pela UNESCO. Wilson informa que os americanos passam mais
tempo em jardins zoológicos do que eventos esportivos e mais tempo ainda em
parques e reservas naturais nacionais. As florestas nacionais e as reservas naturais,
geram uma renda anual em torno dos 20 bilhões de dólares. Um símbolo de riqueza
pessoal é a casa de campo situada num ambiente rural e serve de refúgio para as pessoas encontrarem
momentos de paz e reflexão e reencontrar-se a si mesmas num ambiente que lembra
o paraíso perdido mas não esquecido da espécie humana. (cf. Wilson, 2008, p.
159). O Brasil conta hoje com 71 parques administrados pela Fundação Chico
Mendes. O grande problema do Brasil não parece ser a falta de interesse pela
preservação por meio de parques, mas a sua administração: número insuficiente e
preparado para tomar conta dos serviços contínuos de um parque, falta de verbas, má administração,
corrupção, fiscalização deficiente da caça e exploração de matérias primas, e
por ai vai.
Depois
dessa digressão insistindo que cabe aos responsáveis pelo bem estar e saúde
física e mental dos cidadãos, criar condições e zelar que todos de alguma forma
tenham acesso a esses bens, voltamos a nos fixar no caso específico da educação
ecológica. Pelo fato que a natureza vem a ser “a casa” da humanidade é
imprescindível que o relacionamento com ela não se resuma em servir de abrigo e
fornecedora dos recursos de subsistência, mas o de um “lar”, duma “querência” no sentido
pleno do conceito. É sobre esse pressuposto que deve ser concebida e conduzida
a conscientização da geração adulta e educada a geração a caminho de assumir a
responsabilidade pela condução do futuro da humanidade. Futuro da espécie humana depende, melhor,
exige, segundo a Encíclica, “uma corajosa
revolução cultural” (Laudato si, 114), colocando no seu devido lugar o
avanço da tecnologia como “ferramenta” do progresso e não como “instrumento” de
poder. Se essa consciência é válida para o progresso como um todo, assume um
significado todo especial quando se trata da natureza pois, afinal sem os
recursos que oferece e os estímulos que desperta, o progresso é impossível e a
própria espécie humana inviável.
Essa
corajosa revolução começa pela educação como já insistimos mais acima. Já que
os adultos já não são mais passíveis de uma educação integral, apenas até certo ponto reeducáveis, resta para essa
geração uma única saída a conscientização de que a agressão à natureza alcançou
um nível alarmante. Se continuar nesse ritmo a humanidade como espécie
biológica corre sérios riscos de degradação inclusive a sua própria
sobrevivência. A reversão desse quadro somente poderá ser alcançado por meio de
uma educação ecológica que irá permear a formação da própria personalidade das
gerações responsáveis pelo futuro da “nossa casa”. Não se trata de uma missão
impossível por uma razão muito simples. Embora a abertura para as realidades
naturais esteja como que dormente em meio a uma civilização artificial,
asséptica e distante da natureza, em cada criança se esconde latente o reencontrar-se
com o chão virgem no qual estão fincadas as suas raízes biológicas e entrar em
sintonia com a geografia, as plantas e animais, como o mais peculiar e mais bem-dotado
personagem da grande sinfonia que é a natureza. A pergunta crucial que se
coloca é essa: Como tornar realidade e como formatar a maneira de possibilidade
de um contato direto das crianças e adolescentes em contato com a natureza. Em
ambientes rurais esse contato acontece de forma espontânea e faz parte do
cotidiano de qualquer criança. Basta que escola dê um retoque do que acontece
de qualquer forma reforçando a consciência do significado das realidades
naturais. Em escolas de centros urbanos
maiores é preciso encontrar formas de, pelo menos ocasionalmente os alunos entrarem em contato com a natureza para
admirar, degustar, farejar, encher os ouvidos e sentir a natureza em seu estado
quanto mais original possível. Não há
dúvida que a dificuldade em por em prática esse contato se torna mais
problemático na medida que o isolamento e a artificialidade dos centros urbanos
dificultam o contato direto com o ambiente natural. Mas, mesmo assim os
parques, jardins zoológicos e botânicos, praças, ou mesmo os quintais em
residências, podem servir de alguma forma como sucedâneos, embora limitados,
para a criança sentir, ou pelo menos intuir algo “do paraíso perdido mas não
esquecido”. Propostas de educação ambiental são muitas. Para não alongar mais
ofereço algumas sugestões do nosso já conhecido conhecedor da natureza, Edward
Wilson.
Tenho várias sugestões, já
bem testadas pelo tempo, para pais e professores, inclusive para líderes
religiosos que desejam cultivar a competência do naturalista em uma criança.
Comece bem cedo; ela já está pronta. Abra as portas para a natureza, mas não a
empurre. Pense nela como um caçador-coletor. Ofereça oportunidades para
explorar em espaços abertos naturais, ou então em substitutos – em exposições,
zoológicos e museus. Dê liberdade para que a criança procure, sozinha ou em
rupo pequeno de indivíduos com interesses afins. Deixe que perturbe um pouco a
natureza, por sua conta e sem orientação. Coloque à disposição dela guias de
campo sobre plantas e os animais do lugar; binóculos, e até microscópios, se possível em casa, e
pelo menos na escola. Incentive e elogie tais iniciativas. Na adolescência,
permita que ele ou ela tentem suas aventuras com outros, que explore áreas
silvestres e países estrangeiros, conforme as oportunidades e as finanças.
Possibilite que o aprendizado de todas as coisas se dê de acordo com o ritmo de
cada um. Ao final do processo, o adolescente talvez escolha uma carreira em
advocacia, em marketing ou no exército, mas será um naturalista para toda a
vida, e vai agradecer a você por isso”. (Wilson, 2008, p. 161-162)