Reflexões sugeridas pela Encíclica Laudato si - 38 -

Neste capítulo da Encíclica o Papa  aponta a contribuição que a religião está em condições de oferecer para resolver os graves problemas a serem enfrentados pelos ecologistas. Acabamos de constatar que a colaboração entre as Ciências Naturais e as Ciências do Espírito é possível. Mais. Não é só possível como explicitamente proposta por ambos os lados. Esse propósito mutuamente declarado por porta vozes altamente credenciadas de ambos os lados, é fundamental. Pela enorme complexidade do tema a efetiva colaboração de todos os campos do saber, não é só desejável, como indispensável. Nessa empreitada ninguém, por razão alguma, está autorizado a se omitir. De outra parte negar a validade  da participação nesses diálogo ou desqualificar a contribuição  que não venha do próprio campo de interesse, impede que se chegue a um resultado conclusivo. Isto vale tanto para a Ciência, quanto para a Filosofia, a Teologia e a Religião. Qualquer unilateralidade  ou exclusividade nessa missão, termina em fundamentalismo o que a significa a sentença de morte para um conhecimento que mereça esse nome. Neste sentido vai a advertência do Papa.

Se tivermos presente a complexidade da crise ecológica e suas múltiplas causas, deveremos reconhecer que as soluções não podem vir de uma única maneira de interpretar  e transformar a realidade. É necessário recorrer também às diversas riquezas culturais dos povos, à arte e à poesia, à vida interior e à espiritualidade. Se quisermos, de verdade, construir uma ecologia que nos permita reparar tudo que temos destruído, então nenhum ramo das ciências e nenhuma forma de sabedoria pode ser transcurada, nem sequer a sabedoria religiosa com a sua linguagem própria. (Laudto se, 63).

Ao que tudo indica  já não há mais impedimento que as Ciências Naturais e as Ciências do Espírito dialoguem e juntas formulem uma proposta de solução para a grave questão ecológica. Já existe abertura suficiente de ambas as partes. Há mais de 60 anoso Papa Pio XII criou a “Pontifícia Academia de Ciências”. Trata-se de um fórum no qual cientistas das mais diversas especialidades e orientações são convidados ao debate questões de fronteira do conhecimento com seus colegas de outras áreas. Seis são as áreas de destaque: Ciências Básicas,  Ciência e Tecnologia dos Problemas Globais, Ciência dos Problemas do Mundo em Desenvolvimento, Política Científica, Bioética, Epistemologia. O princípio que orienta os esforços da Academia foram resumidas nas palavras do Papa Bento  XVI: “A natureza é uma história cuja evolução e o sentido da sua escrita é interpretada de acordo com as diferentes aproximações das Ciências, pressupondo sempre a presença do seu Autor, que quer-se revelar por meio dela”.

A Encíclica faz referência a uma forma de conhecer a natureza que costuma causar calafrios aos que poderíamos chamar de cientistas ortodoxos. Chamamos de cientistas ortodoxos aqueles que só aceitam os resultados de suas pesquisas capazes de conhecer a natureza e rejeitam qualquer outra forma de entendimento. Acontece que do outra lado a Filosofia e a Teologia ortodoxa pretende entender a natureza pela lógica dos seus silogismos. Essa guerra inútil e mortal ao verdadeiro conhecimento separou os dois campos durante 200 anos e em parte ainda continua. Acontece que essas duas vias de conhecer resulta numa visão totalmente racionalizada da natureza. Para esse tipo de cosmovisão o recurso a outras vias do conhecimento como intuição, arte beleza, percepção sensorial, não passam de um romantismo ou misticismo que não resiste minimamente aos rigores da experimentação ou da lógica formal.

Sucede que o conhecimento da natureza construído apenas sobre a racionalidade científica e filosófico-teológica, pode até ser considerado o esqueleto e os músculos que garantem solidez. Falta, entretanto, a vida, a alma para as realidades que constituem o nosso habitat. Para  preencher essa lacuna, para dar alma, coração e sentido para “a nossa casa” é necessário recorrer a outras vias para conhece-la e, principalmente para entende-la e usufruí-la. Essa via chama-se “percepção sensorial-intuitiva”.

Se a via da racionalidade filosófica tem sua consolidação em Aristóteles, 300 anos antes de Cristo e a via científica há menos de 500 anos, pergunta-se: quais foram as bases sobre as quais a humanidade consolidou o conhecimento antes?; ou aquilo não era conhecimento?. Desqualificá-lo como ilegítimo, significa nada mais nada menos do que rebaixar o homem do paleolítico e neolítico à condição de bárbaro. Hoje felizmente nenhum cientista sério, nenhum antropólogo, etnógrafo ou etnólogo ainda se vale de conceitos como “selvagem-selvageria” ou “bárbaro-barbárie” ao se referir à pré-história. Não há dúvida de que o conhecimento daquele longo período de dezenas e centenas de milhares de anos é um verdadeiro conhecimento. Tanto assim que impediu que a espécie humana não sucumbisse às implacáveis leis da natureza que comandam a evolução. De outra parte dispomos de elementos e conhecimentos suficientes daquele período que cobre a história total da humanidade acima de 95%, de que nos deparamos com um conhecimento tão legítimo quanto o nosso.

As raízes remotas do conhecimento devem ser procuradas entre os caçadores e coletores do paleolítico. Munidos com as ferramentas mais rudimentares que se possam imaginar, a sobrevivência aconteceu na dependência total das condições ambientais. Valendo-se dos cinco sentidos com janelas, como vias de contato  com o habitat natural, o homem foi obtendo as informações  indispensáveis para garantir a sobrevivência. Orientado pelos instintos instrumentalizados pela intuição e os resultados postos à disposição da inteligência reflexa, foi colocando  os fundamentos do conhecimento. A partir daí, somando observação a observação, experiência a experiência, explicação a explicação, resposta a resposta, consolidaram-se, em velocidade geométrica, os corpos do conhecimento, ao mesmo tempo em que a humanidade se dispersou pelos continente e ilhas do planeta inteiro. Não se pode esquecer que em paralelo, em estreita interdependência  e mútua emulação com o instinto, intuição e reflexão, aconteceu a descoberta, a diversificação e aperfeiçoamento dos instrumentos e utensílios. Do mais antigo instrumento conhecido como tal, o rudimentar, tosco e pouco eficiente “machado de punho”, evoluiu uma sofisticada tecnologia e indústria de  lascamento de sílex, granito, basalto  e vidro vulcânico. Do primeiro artefato multifuncional, pouco eficiente, evoluiu, durante dezenas de milhares de anos, um arsenal de ferramentas e instrumentos líticos especializados: ferramentas para cavar, cortar, arremessar, defender-se, tirar a pele de animais, separar a carne dos ossos, Entre os objetos de pedra, sílex e vidro vulcânico, merece destaque uma variedade sem conta de pontas de flecha, facas, punhais de vidro vulcânico de tamanhos fora do comum, cujo acabamento exigiu técnicas refinadas de  lascamento. Explica-se que entre os vestígios materiais que acompanham a história da humanidade, predominam os artefatos de pedra. Pela sua natureza são muito mais duráveis e resistentes à ação do tempo do que qualquer outra matéria prima. Pelo fácil manuseio. disponibilidade em qualquer lugar, versatilidade para utilidades múltiplas, a madeira, osso, chifre, dentes, etc. foram certamente utilizadas. Sujeitas à uma rápida  destruição pelos agentes da natureza, aparecem só muito mais tarde na história.

A sobrevivência e o sucesso histórico do homem do paleolítico, portanto, dependia inteiramente dos seus instintos, sua intuição e sua inteligência reflexa. instrumentalizada por um aparato de tecnologias complexo, variado e multifuncional,  servindo-se das matérias primas imediatamente disponíveis no seu habitat. Por todos os milênios e dezenas de milênios, pelos quais o paleolítico se prolongou, a humanidade viveu na mais completa simbiose  com a natureza, na forma e modalidade própria de cada região geográfica.

O grande salto deu-se por volta dos 15.000 anos atrás. Darcy Ribeiro chamou-o de “Revolução dos Alimentos” e Edward Wilson de “Primeira Traição à Natureza”. Tem na agricultura e domesticação de animais seu fator dinâmico determinante. Mas não foi só por essas duas novidades. Veio implementado por outras de difícil dimensionamento. Destaca-se o uso do fogo, a descoberta de metais “in natura”,  cobre, estanho, prata e ouro. A descoberta da amálgama do cobre e estanho dando no bronze, veio a ser de importância sem igual.  A tecnologia da fundição de ferro veio  completar esse quadro. Tecnologias cada vez mais apuradas de manipulação dessas matérias primas aceleraram exponencialmente o processo civilizatório no decorrer do neolítico. Depois de visitar o “Field Museum” de Chicago o Pe Rambo comentou num tom quase jocoso que qualquer pessoa minimamente instruída entende, do que viu sobre a cultura do homem assim chamado primitivo.

O homem que, como caçador e coletor, há muitos anos vagava pelas florestas e estepes, não era nem meio ou três quartas partes animal, de forma alguma. Tratava-se de um verdadeiro homem, até certa forma altamente dotado, muito astuto e piedoso à sua maneira, como são os selvagens de hoje. Foi ele o inventor de todos os instrumentos que servem para cortar, furar, desbastar, serrar, aplainar. O homem primitivo confeccionava de madeira, conchas, ossos, chifres e sílex, tudo que hoje se fabrica de aço e ferro. inventou a técnica de assar, de fritar, de refogar, de cozinhar, e, com isto, as artes básicas usadas na cozinha. A tarefa que hoje confiamos tranquilamente, às cozinheiras e aos cozinheiros, o homem primitivo teve de tentar, experimentar e  excogitar, penosamente. Ele foi o descobridor do fogo, a energia benfazeja, sem a qual nenhuma tecnologia humana é possível. Se hoje acionamos o fogo sob as panelas, atrelamos às máquinas a vapor, ao motor, aos nossos carros, aos navios, às máquinas voadoras, devemos em última análise, ao homem antigo, que entrou em contato com o fogo, quando da queda de um raio, na erupção de um vulcão, ou aprendeu a produzi-lo pela fricção da madeira ou batendo um fragmento sílex contra o outro. Ele foi, também, o inventor das armas: do arco e da flecha, do machado de guerra, da massa, dos punhais e das lanças arremessadas com as mãos. Sorte sua que não descobriu a pólvora e a bomba atômica, porque a humanidade já teria perecido nos tempos primigênios. Foi o inventor da arte de costurar, comprovada pelas numerosas peças de chifre e osso, com o mesmo feitio e quase tão finas como as nossas agulhas de aço. Confeccionava vestes com peles de animais, e não vagava nu por aí, como querem os que gostam de venerar animais como seus avós. Foi o inventor da moradia humana, primeiro em cavernas, depois em buracos subterrâneos, cabanas e, finalmente,  em casas de verdade, mesmo que fossem menos confortáveis que os nossos arranha-céus ou palácios. Certamente tinham melhor ventilação e reuniam a família em volta da chama amiga, como diz a canção: “E se o fogo arde num lugar hospitaleiro, estamos protegidos e, à luz das chamas comemos até nos saciar”. (Rambo. Três Meses na América, 2.015, p. 400-401)

    A intuição teve em Jean Jacques Rousseau a sua reabilitação como forma legítima de conhecimento. A percepção imediata das realidades naturais pelos sentidos, resulta na construção informal e espontânea dos corpos do conhecimento que subjazem às mais diversas culturas. Com sua autoridade incontestável o grande filósofo da modernidade deixou claro que o homem busca a matéria prima  do conhecimento no mundo ambiente em que vive e apropria-se dela por meio dos sentidos. A forma peculiar como essas percepções são  elaboradas depende da natureza de cada uma delas, do entorno cultural em que é recebida e da maneira única pela qual é percebida e elaborada pelas mentes individuais. Rousseau contentou-se, filósofo que foi, em apresentar a ideia sem propor caminhos para pô-las em prática. Talvez não intuísse o tamanho do potencial prático embutido nessa maneira de conceber  a gênese do  conhecimento. O valor prático, inovador e revolucionário, encontra-se exatamente no plano mais sensível e mais decisivo da vida individual e coletiva: A Educação. Mas este é uma questão que merece uma série de reflexões à parte. Não é aqui o momento nem a oportunidade.

Pelas reflexões feitas até  aqui, tendo como guia a Encíclica “Laudato si”,  além de cientistas das mais variadas orientações filosóficas ficou claro que a natureza é um “fato”, um “ente” objetivo de alta complexidade finamente calibrado. Esses conceitos significam, no fundo no fundo que a natureza é um gigantesco sistema, “uno” na sua essência ontológica, porém, múltiplo nas suas manifestações. A natureza é una na complexidade e plural na sua realização. Dito de outra maneira. A pluralidade das formas e manifestações têm a sua  base na unidade que, por sua vez, lhes confere sentido e razão de ser.

Partindo desse pressuposto percebemos  que para a compreensão desse “ente” complexo todos os recursos disponíveis precisam ser invocados para, num  esforço combinado de muitas mãos, retratar o que a natureza de fato representa e as mensagens que nos quer comunicar. Para tanto, só para recordar são convidadas a participar todas as formas de conhecer: das Ciências Naturais, das Ciências do Espírito, das Ciências Humanas, das Letras e Artes, da percepção sensorial, da Intuição, do conhecimento popular, da contribuição das Culturas e Civilizações. Conclui-se daí que, para enfrentar a crise ecológica, é preciso tomar de alguma forma em consideração, todas essa formas de conhecer. Vai neste sentido a observação da Encíclica.

Se tivermos presente a complexidade da crise ecológica e suas múltiplas causas, deveremos reconhecer que as soluções não podem vir de uma única maneira de  interpretar e transformar a realidade. É necessário recorrer também às diversas riquezas culturais dos povos, à arte e  à poesia, à vida interior e à espiritualidade. Se quisermos, de verdade, construir uma ecologia que nos permita reparar tudo que temos destruído, e então nenhum ramo das ciências e nenhuma forma de sabedoria pode ser transcurada; nem sequer a sabedoria religiosa com sua linguagem própria. (Laudato se, 63)

Portanto, todos estão convidados, melhor convocados para contribuir, cada qual com o que lhe cabe, par arrumar a “nossa cassa” e preservá-la de danos ainda mais profundos. Depois dessas considerações o Papa dirige sua atenção na perspectiva em que a Igreja Católica e, por extensão, o cristianismo como um todo, compreende a questão ecológica e os motivos que devem animar os critérios para não se omitir. O compromisso com o “salvamento da vida na terra” faz parte da própria doutrina cristã pelo fato de envolver o “maior dos mandamentos: amai-os uns aos outros”. Ora, o amor ao próximo pressupõe que as pessoas  encontrem um ambiente que lhes permita uma existência digna. Em conjunto com outras condições o habitat natural, a “nossa casa”, ocupa um lugar de primeiríssima importância. Mais acima já nos ocupamos amplamente com essa temática. Morar numa casa confortável é o ponto de partida para a realização pessoal, o sucesso no relacionamento com as pessoas e, por isso mesmo, para a harmonia e a paz social. É condição também para que as pessoas  tenham como usufruir do gozo pleno daquilo que o homem tem de mais humano: as emoções, a apreciação do artístico na natureza, a contemplação do belo, a percepção do divino nas modalidades mais inusitadas. “Por isso, é bom  para a  humanidade e o mundo, que nós crentes, conheçamos melhor os compromissos ecológicos que brotam das nossas convicções” (Laudato se, 64),


Reflexões sugeridas pela Encíclica Laudato si - 37 -

Capítulo II
O Evangelho da Criação

No capítulo I a Encíclica faz um diagnóstico do “que está a acontecer com a nossa casa”. A natureza  “é casa da humanidade”. As preocupações ecológicas devem-se fundamentar sobre a riqueza e a complexidade desses conceito. Este conceito não se esgota no fato de a espécie humana ter-se originado em algum momento da história da terra e evoluído até o presente momento como as demais espécies vivas. A natureza é mais do que isso. Não se resume em fornecer alimentos, abrigo e condições para perpetuar a espécie. Se fosse apenas isso, em termos de significado para o homem, ela não passaria além do que significa a casinha para o João de Barro, o ninho para o sabiá e a toca para o tatu. Acontece que a competência, a amplitude e os limites das Ciências Naturais resume-se nesse campo da subsistência física. Não se pode nem se pretende questionar a importância desse lado da preocupação com a ecologia. Entretanto, a natureza como casa é muito mais do que ambiente protegido por quatro paredes, repartições internas adequadas para servir de abrigo no qual o se humano nasce, cresce, encontra proteção contra as intempéries, a ameaça dos animais selvagens e até do próprio homem. Além de alimentar-se, proteger o corpo e reproduzir-se o homem tem demandas espirituais a serem atendidas. Para ser de  fato “uma casa”, a natureza precisa  oferecer as condições para suprir as exigências tanto materiais, quanto espirituais. Em outras palavras. A natureza somente então é uma “verdadeira casa” quando permite a realização harmônica do “humano no homem” –“Die Mesnchlichkeit”. Sobre este pressuposto holístico é que as preocupações ecológicas devem ser conduzidas, as políticas concebidas e as ações planejadas. Do contrário, as mais belas intenções e os mais pomposos acordos estagnam em iniciativas e ações tópicas de interesses nobres ou nem tanto.

No Capítulo II intitulado “O Evangelho da Criação”, a Encíclica começa chamando a atenção para a necessidade de a Ciência e a Religião se darem a mão, para juntos, respeitando as competências de cada lado, apresentarem um retrato completo do que vem a ser a natureza. Depois de apontar algumas dificuldades que podem atrapalhar uma aliança estratégica entre a Ciência e a Religião, no enfrentamento do grave problema da agressão ao ambiente natural, o Papa cita a negação da Criação, por parte de políticos, pensadores e cientistas, como um dos mais difíceis de superar. Não poucos desqualificam como irracional a alternativa da Criação ou pelos menos com totalmente secundária. Com isso jogam para a periferia dos debates, nada menos do que a metade  da questão inviabilizando, na verdade, a compreensão do todo da natureza. Ficam de fora, ou marginalizadas as contribuições das Ciências Humanas, Artes, Filosofia, Teologia e Religiões. Esses campos têm muito a oferecer para “uma ecologia integral e o pleno desenvolvimento do Gênero humano. Todavia a Ciência e a Religião que fornecem  diferentes abordagens da realidade, podem entrar num diálogo intenso e frutuoso para ambos”. (Laudato si, 62).

A disposição para o diálogo encontra ressonância positiva entre um número crescente de cientistas de peso. Para evitar qualquer interpretação distorcida, registro o  que Edward Wilson, nosso conhecido, manifestou a respeito. Ele vem a ser um representante emblemático do cientista que não trabalha com parâmetros fora do campo da sua especialidade e quanto ao resto se declara “um humanista secular”. No seu livro “A Criação- como salvar a vida na Terra, registrou:

Já conheço grande parte dos argumentos religiosos em favor da Criação e gostaria de aprender mais. Agora apresentarei ao senhor, e outros que queiram ouvir, os argumentos científicos. O senhor não irá concordar com tudo que afirmo sobre a origem da vida – a ciência e a religião não se mesclam facilmente nesse assunto – mas gostaria de pensar que nessa questão, que é crucial, nós dois temos um propósito comum. (Wilson, 2.008, p. 16)

O propósito  comum, “a salvação da vida na terra” de Wilson vem a coincidir com a salvação da “nossa casa” do Papa Francisco. Felizmente, a essa altura da história, vozes de peso partindo das mais diversas especialidades, vão fazendo coro, cada uma à sua maneira com o apelo de Edward Wilson. Einstein é de opinião que “sem a Religião a Ciência é manca e sem a Ciência  a Religião é cega”. Stephen Hawkings conclui seu livro “Uma breve história do tempo” com o parágrafo.

No entanto, se de fato descobrirmos  uma teoria completa, todos acabarão compreendendo seus princípios amplos, não apenas alguns cientistas. Então, devemos todos  -  cientistas, filósofos e pessoas comuns  -  ser capazes de tomar parte na discussão para saber o porque de nós e o universo existimos. Se descobrirmos a resposta para isso, será o triunfo supremo da razão humana  -  pois, então conheceremos  a mente de Deus. (Hawlings, 2015, p. 229)

A Stephen Hawkings, um dos físicos mais influentes ainda vivos, vem somar-se Francis Collins, diretor do “Projeto Genoma Humano” e um dos mais respeitados especialistas em Genética Médica. Sua opinião sobre os limites da Ciência e seus métodos  e a necessidade de recorrer a uma solução completa fora desse âmbito, está expressa na seguinte reflexão.

Também fica claro para mim que a Ciência, apesar dos seus poderes inquestionáveis de desvendar os mistérios do mundo natural, não me iria levar mais adiante na resolução da questão de Deus. Se Deus existe, se encontra fora do mundo natural, portanto, os instrumentos científicos não são ferramentas certas para aprender sobre Ele. Em vez disso,  como eu estava começando a entender por olhar para dentro do meu coração, a prova da existência de Deus teria de vir de outras direções e a decisão definitiva deveria se basear na Fé, não em provas. Ainda perseguido por perturbar as incertezas do caminho que eu havia tomado, eu precisava aprender que aceitara a possibilidade de uma visão do mundo espiritual, incluindo a existência de Deus. (Collins, 2.007, p. 38-39)

As referências que acabamos de anotar pretendem ser amostras representativas de cientistas de primeira linha demonstrando que da parte da Ciência existe vontade explícita para o dialogo com as Ciências Humanas, Artes, Filosofia, Teologia e Religião, sobre preocupações que dizem respeito a “nossa casa comum”, a Natureza. A pergunta que a essa altura se põe logicamente é esta: O que cabe às Ciências Naturais e o que cabe às Ciências do Espírito em busca da compreensão holística da Natureza como base para os que têm a missão de assumir o ônus de formular as políticas, tomar as iniciativas e oferecer planos de ação em questões que dizem respeito à ecologia.

O caminho foi traçado já há 100 anos pelo especialista em formigas e térmites  e sua relação simbiótica com fungos, Erich  Wassmann e redesenhado pelo cosmólogo e teólogo polonês Michael Keller. Erich Wassmann (1859-1931) associou-se aos cientistas e filósofos na virada do século XIX e XX, assumindo uma posição mais cautelosa em suas críticas às teorias e hipóteses evolucionistas, mas, ao mesmo tempo levar a sério as conquistas da Ciência, fazendo delas aliadas quando se trata de clarear aspectos tanto do interesse da Ciência, quanto da Filosofia e Religião. Wassmann resumiu suas conclusões no periódico Stimmen der Zeit com o título: “A concepção cristã da Natureza à luz das modernas descobertas científicas”: “Quem sabe, a pergunta seja esta: Será que toda a cosmovisão cristã não se fundamenta sobre a “imagem antiga do mundo”, totalmente modificada pelos progressos das ciências modernas? Como se pode esperar que a cosmovisão cristã seja ainda hoje moderna? Por acaso não se tornou de todo insustentável quanto àquela imagem do mundo? (Stimmen der Zeit, 1921, Vol 100, p, 126)

Para responder a essa pergunta, Wassmann recorreu a dois conceitos: “Weltbild e Weltauffassung”. Definiu “Weltbild” como sendo a “imagem do mundo” o “retrato do mundo”, desenhado num dado momento, a partir dos conhecimentos científicos disponíveis, sobre as realidades naturais, suas relações mútuas e as leis que as regem. “Weltbild”, portanto corresponde à imagem do universo, do mundo e da natureza, assim como a ciência os retrata com os dados disponíveis a cada momento. Cabe ao cientista, valendo-se dos métodos científicos adequados inventariar e identificar o que sucede na natureza. O cientista, valendo-se das observações físicas, químicas, modelos matemáticos, cálculos de estatística, características do clima, tenta entender os elementos que lhe interessam e formular as hipóteses capazes de auxiliar na  compreensão da natureza. Com esses dados em mãos desenha o “Weltbild”, o “retrato do mundo”. Na medida em que as pesquisas científicas progridem e sempre novas revelações acontecem, o “retrato” precisa ser retocado e atualizado. Portanto, esse “retrato” exige, pela própria natureza, um permanente redesenhar, na medida em que novos dados científicos forem produzidos.

O segundo conceito de Wassmann é “Weltauffassung” – “Concepção do mundo ou Cosmovisão”. A cosmovisão pergunta pela causa primeira do universo, do mundo, da natureza e especialmente do homem. Enquanto o “Weltbild” explica “o como” acontecem as coisas na natureza e como ela funciona, a “Weltaauffassung” responde as questões de fundo como   “donde?”, “para que?” e “para onde?”. Nessa moeda de dupla face que é a natureza é tarefa privativa das Ciências Naturais, desenhar a “cara”  -   das Ciências do Espírito e Humanas, inclusive Letras e Artes dar forma à “coroa”.

Fica claro com isso que o cientista sem a contribuição do filósofo, do humanista e do artista, fica limitado a observações e resultados empíricos, porque, “Cada teoria envolvendo a natureza contém um elemento metafísico, na medida em que tenta identificar as relações entre as realidades apreensíveis experimentalmente.  ( ... ) De outra parte o filósofo da natureza movimenta-se no verdadeiro campo da metafísica em busca do extra sensível. Procura responder a interrogações substantivas, mais fundamentais, sobre a origem das leis naturais e a harmonia que reina entre elas”. (Wassmann, Stimmen der Zeit, 1921, Vol 1000, p. 126-127).

Wassmann resumiu a sua proposta de um esforço comum entre as Ciências Naturais e as Ciências do Espírito em busca de compreensão holística da natureza nos seguintes termos

Conclui-se daí, em que medida  “Weltbild” se relaciona com “Weltauffassung”. As conclusões metafísicas só então são verdadeiras quando fluem logicamente das leis naturais formuladas pelas Ciência Naturais e por elas fundamentadas. Neste sentido verifica-se, sem dúvida uma relação, no nível  do espírito, entre “Weltbild” desenhado pela Ciência e “Weltauffassung” da Filosofia Natural. Essa relação, entretanto, não é absoluta, senão relativa. No decurso do tempo “Weltbild” muda, e tem que mudar, de acordo com as descobertas e conquistas das Ciências Naturais. Acontece, porém, que os questionamentos últimos que perguntam pela causa da ordem no mundo como um todo permanecem eternamente as mesmas. Em resumo a questão é esta: As realidades naturais e suas leis subsistem  por si mesmas ou é forçoso apelar par a explicação que tem como base a existência de um Deus pessoal que, da plenitude do seu ser, deu origem a um mundo criado. Sendo assim, resta-nos, em última análise, no plano da concepção metafísica da “Weltauffassung”, a alternativa: ou o monismo nas suas mais variadas modalidades, do extremo hilozoísmo ao extremo do panteísmo, ou então o Teísmo. (Wassmann, Stimmen der Zeit, 1921, Vol. 100, p. 27).

Quase 100 anos depois que Erich Wassmann publicou a sua a sua conclusão de “como” a natureza funciona, tarefa das Ciências Naturais e o “donde”, o “porque” e o “para que”, missão das Ciências do Espírito, Michael Keller, chegou a uma conclusão praticamente idêntica: “A Ciência nos dá o conhecimento do mundo e a Religião nos dá o sentido”. Os dois fundamentaram suas conclusões em dados científicos. Wassmann observando estudando colônias de formigas e térmites e sua relação simbiótica com fungos e Keller de dados da física e cosmologia. Na mesma base de raciocínio Edward Wilson argumentou a partir da observação de ecossistemas naturais e humanizados e Francis Collins tendo como base a genética e sua aplicação na medicina.


Bastem esses quatro exemplos para mostrar que o esforço solidário e complementar  entre as Ciências Naturais e as Ciências do Espírito, têm condições de construir a ponte entre a Ciência e a Religião. Sendo assim, a esperança expressa  na Encíclica de que a “ciência e a religião que oferecem diferentes abordagens da realidade, entrem num diálogo intenso e frutuoso para ambas” (Laudato si, 62), não é só possível como se encontra e pleno andamento.

Reflexões sugeridas pela Encíclica Laudato si - 36 -

Diante desse cenário a única coisa a ser feita são políticas e ações eficientes em favor do salvamento da “nossa casa”, da “nossa mãe e pátria”, da “nossa querência”, a natureza. Em que consistem essas bases políticas,  econômicas, sociais e, antes de mais nada, éticas, já foi objeto de reflexões anteriores, mais acima. É oportuno, a essa altura da nossa caminhada em favor do salvamento da vida na terra, aprender o que já está sendo feito e o potencial que oferecem essas iniciativa.

Com todos  os reparos que possam fazer e as limitações inerentes, os diversos protocolos assinados sobre o clima, com destaque para o último, o de Paris em dezembro de 2.015, é o mais vistoso, mais abrangente  e que mais  otimismo inspira, porque  trata-se de uma iniciativa encabeçada por chefes de estado representativos do mundo desenvolvido e em desenvolvimento. Convém lembrar que é exatamente nesses países onde se concentram as causas do aquecimento global. A matriz energética que movimenta seus parques industriais e seus polos econômicos é de natureza altamente poluidora e o maior vilão do aquecimento global. A incógnita fica por conta das iniciativas e ações efetivas dos signatários do acordo. De qualquer forma, ao  vincular os países signatários do protocolo a um compromisso legal, que obriga a contribuírem e efetivamente com as metas acordadas, já permite algum otimismo.

Além dos reparos de natureza política, técnica e de prazos há, salvo melhor juízo, referências apenas implícitas e à margem do documento, ao que deveria servir de base e norte de qualquer esforço em favor do meio ambiente: a terra com seus recursos é um bem comum. Como tal é “a casa da humanidade” como insiste a Encíclica, é “a mãe e pátria” como afirma o cientista, é “a nossa querência”, como se fala no Rio Grande do Sul. Por isso a natureza é muito mais do que combustíveis fósseis, mais que minérios, mais que florestas ou campos semeados com cereais, muito mais que pastagens, rios, campos naturais, montanhas, oceanos e estabilidade do clima. É tudo isso, mas além de ser tudo isso, a natureza é “casa”, é “pátria”, é “querência. E, para repetir mais uma vez, no que já insistimos tantas vezes no decorrer dessas reflexões: a natureza é um bem comum e por isso mesmo ás pessoas assiste o direito natural de morar numa “casas bem servida”. Sendo assim, qualquer política, qualquer iniciativa, qualquer um que lida com ela,  deveria obrigatoriamente legitimar-se com esse  pressuposto. Acordos políticos, econômicos e estratégicos envolvendo o meio ambientes só  então fazem sentido quando motivados pelo postulado ético implícito no conceito de bem comum.

A Encíclica “Laudato si” é de junho de 2.015. Foi devidamente publicada em mais línguas, inclusive no português. Por representar uma contribuição da autoridade de uma Encíclica e ainda mais saída da pena da autoridade moral do papa Francisco, é de se estranhar que no encontro em Paris, tenha merecido tão pouca consideração. E não procede o argumento de que a Encíclica é um documento confessional e por isso não seria oportuno fazê-lo interferir num encontro de autoridades representantes de estados laicos. Acontece que trabalhar com referenciais éticos não implica em intromissão nem do estado nem da sociedade laica. A consciência do bem e do mal e consequentemente o senso ético faz parte da própria natureza humana, independente de filiação ou não confessional. A Encíclica remete toda a sua argumentação par esse fundamento. Sendo assim ela representa um documento de validade universal no tempo e no espaço. Todo o empenho em favor da natureza encontra nesse fundamento solidez suficiente par enfrentar os desafios que a questão ecológica oferece. O documento pontifício tem, implícita ou explicitamente, o dever ético-moral como referência.

Finalmente reconhecemos, a propósito da situação e das possíveis soluções, que se desenvolveram nas diferentes perspectivas e linhas de pensamento. Num dos extremos, alguns defendem a todo o custo o mito do progresso, afirmando que os problemas ecológicos resolver-se-ão simplesmente com novas aplicações técnicas, sem considerações éticas nem mudanças de fundo. No extremo oposto, outros pensam que o ser humano, com qualquer uma das intervenções, só pode ameaçar e comprometer o ecossistema mundial, pelo que convém reduzir a sua presença no planeta e impedir-lhe todo o tipo de intervenção. Entre estes extremos, a reflexão deveria identificar possíveis cenários futuros, porque não existe um só caminho de solução. Isto deixaria espaço para uma variedade de contribuições que poderiam entrar em diálogo a fim de chegar a respostas abrangentes. (Laudato se, 60)

O Papa conclui o primeiro capítulo da Encíclica com uma reflexão que ele chama de “diversidade de opiniões”. Entende que as iniciativas relativas ao meio ambiente são de uma complexidade tal que não há um fórmula mágica única. São em primeiro lugar complexos porque seu objeto, a natureza, é complexa. Como já apontamos mais acima a natureza é um gigantesco sistema e é preciso entendê-la como tal e como tal lidar com ela. A natureza não se resume na vida que nela prospera. Compreende também o chão sobre o qual e do qual a biosfera se sustenta. Acontece que o habitat inclui a natureza geológica que fornece o substrato mineral que entra na composição da estrutura dos seres vivos e do chão em que deitam suas raízes. A natureza inclui também as peculiaridades geográficas responsáveis pelo desenho do cenário físico, da moldura física, com suas características edafológicas, morfológico-topográficas e climatológicas que moldam numa profusão sem limites as fisionomias naturais.

Neste universo, composto por sistemas  abertos que entram em comunicação uns com os outros, podemos descobrir  inumeráveis formas de relação e  participação.  Isto leva-nos também a pensar o todo aberto para a transcendência de Deus, dentro da qual se desenvolve. A Fé permite-nos interpretar o significado e beleza misteriosa  do que acontece. A liberdade humana pode prestar a sua contribuição inteligente para uma evolução positiva, como pode também acrescentar novos males, novas causas de sofrimento e verdadeiros atrasos. Isto dá lugar a apaixonante e dramática história humana, capaz de transformar-se num  desabrochamento de libertação, engrandecimento, salvação e amor, ou, pelo contrário, num percurso de declínio e mútua destruição. Por isso a Igreja com sua ação, procura não só lembrar o dever de cuidar da natureza, mas também e sobretudo proteger o homem da destruição de si mesmo. (Laudato se, p. 79).

Sobre a complexidade do chão em que a vida surgiu também ela se complexificou vertical e horizontalmente durante milhões e bilhões de anos. O resultado é esse gigantesco sistema chamado biosfera abrigando um número incalculável de subsistemas em equilíbrio finamente calibrado e de alta resolução. “A Terra, em especial  a camada de  vida que a envolve, fina como uma navalha, é o nosso lar, a nossa fonte de vida, que nos dá sustento físico e também boa parte do sustento espiritual”. (Wilson, 2008, p. 15). O Papa reforça a advertência do cientista: “Um mundo frágil, como  um ser humano a quem Deus confia o cuidado do mesmo, interpela a nossa inteligência para reconhecer como deveremos orientar, cultivar e limitar o nosso poder”. (Laudato si, 78).

Duas conclusões decorrem logicamente dessa constatação. Toda e qualquer invasão e interferência perturbadora  nessa fina calibragem reflete-se no bom desempenho do todo. É exatamente isso que vem acontecendo com a atividade do homem. Enquanto a invasão permanece na periferia, na “pintura” do quadro, na superfície do sistema, não degenera em problemas maiores pois, ele dispõe de mecanismos próprios para sanar o estrago. Quando, porém, a agressão danifica componentes vitais ao funcionamento por ex., o clima, compromete-se a integridade e continuidade do todo.

A segunda conclusão, decorre da primeira. Já que nos encontramos num estágio de agressão à natureza em que há sinais alarmantes de perturbação e comprometimento da biosfera como um todo, as iniciativas para sustar e reverter a situação precisam atuar em muitas frentes. Cabe à Ciência e aos cientistas e seus métodos e resultados, oferecer a matéria prima aos governantes, planejadores, formuladores e executores de projetos, empenhados no salvamento da “nossa casa”. “Sobre muitas questões concretas a Igreja não tem motivo para propor uma palavra definitiva e entende que deve escutar e promover o debate honesto entre cientistas, respeitando a diversidade de opiniões” (Laudato si

 61). Mas a natureza entendida como “casa da humanidade” implica em repercussões que escapam à ciência e ao cientista e seus métodos e resultados. Para a humanidade a natureza significa muito mais do alimentação, proteção e perpetuação da espécie. “Além de fornecer o pão de cada dia oferece também os símbolos de sua vida espiritual” (Rambo, 1942, p. 337). E por vida espiritual entendem-se as atividades que decorrem do fato de o homem  ser um “animal racional”, com demandas sociais, culturais psicológicas e religiosas alimentadas pelo meio ambiente nas suas manifestações mais diversas.

Colocada nessa dimensão, o lidar com a questão ecológica só faz sentido quando iluminada pela ciência e validada por uma visão antropológica, histórica, sociológica, política, econômica, cultural, filosófica e religiosa. Em outras palavras a ecologia ou, como prefere a Encíclica, o cuidado pela “nossa casa” e morada da humanidade, portanto, é um bem comum. Como tal implica em direitos e deveres que, por sua vez, encontram legitimação no “ético”, que em última análise deve  servir de base quanto às escolhas e decisões a serem tomadas.

É nesse plano que as Ciências Naturais, as Ciências Humanas, as Artes, a Filosofia  e a Teologia, encontram a plataforma comum para lidarem, com espírito desarmado e solidários, tomarem conta da ordem e saúde da “nossa casa”. Da parte da Igreja essa disposição ficou clara ao nos referirmos às manifestações dos papas a partir da década de 1940 até hoje. Da parte da ciência laica existe a mesma disposição, como ficou claro no apelo do “humanista secular” Edward Wilson, dispondo-se a dialogar com um pastor fundamentalista sobre como “salvar a terra”:


Ao encerrar essa carta, espero que o senhor não tenha-se ofendido quando falei em ascender  rumo à Natureza e não para longe dela. Eu teria grande satisfação de saber que esse desejo, tal como o expliquei neste livro, é compatível com as suas crenças. Pois, seja como for que as tenções acabem se desenrolando entre nossos pontos de visa opostos, seja como a ciência  e a religião aumentem ou diminuam de importância na mente dos homens, permanece o compromisso, ao mesmo tempo humano e transcendental, que nós dois somos moralmente obrigados a compartilhar. (Wilson, 2.008, p. 188)