Deitando Raízes #36

Não é possível subdividir todo o período para depois pintarmos nas minúcias a situação, tanto do comércio, quanto da indústria. Contentamo-nos por isso com uma apreciação fornecida em 1834 por uma testemunha. Não faremos outra coisa do que acompanhar o nosso informante pelas picadas. Depois do passeio ofereceremos uma descrição da situação atual e, com isto, teremos facilmente condições  para perceber o crescimento significativo em ambos os setores.
No caminho que leva a São Leopoldo e Bom Jardim, o viajante encontra um grande açude perto de João Lourenço Flores, hoje nas mãos de João von Hohendorf. Perto de Bom Jardim escuta-se o matraquear do moinho de Carl Wilke. No começo todos os moradores eram obrigados a procurá-lo e o faziam com prazer porque o moleiro praticava preços acessíveis, embora usasse como medida um velha caixa de chapéu. No matinho do Dietrich encontramos  o terceiro moinho pertencente a Arendt. Mais tarde passou para as mãos de Einsfeld e hoje não existe mais. Mais próximo, instalado mais tarde e movimentado por outro arroio o moinho de Uflacker, hoje em poder de Lenk. Funciona perto da ponte nas proximidades de Simonis (Tiefenthäler). Sua grande roda pode ser vista da estrada. O primeiro moinho de trigo ao lado do arroio, onde hoje mora Johann Pohren, pertenceu a Wahl, depois a Juca da Silva.  Como os moradores de Bom Jardim desejavam ter seu próprio moinho, ajudaram a  construir um de graça. É de notar que, como era usual  nas velhas construções, as tabuinhas de telhado eram encaixadas umas nas outras. Infelizmente o moinho não se sustentou por muito tempo porque o arroio não tinha água suficiente em todos os períodos do ano. Após passar por várias mãos foi desmontado e vendido. O primeiro dono de atafona foi Heinrich Müller, cujo nome combinava bem com seu empreendimento. No começo a farinha era processada manualmente, com dois homens operando a torradeira. O operário encarregado da torrefação recebia uma pataca por dia. Apesar da instalação precária produzia de cinco a seis sacos de farinha por dia.
Perto da água indispensável para a atividade residiam vários curtidores. Na entrada de Estância morava Billbahn, um curtidor de couro branco. Mais adiante em direção a Simonis atuavam  Matzenbacher e Drin. Um certo Han Nikel Blauth exercia sua profissão onde hoje mora Blauth. Todos eram competentes na profissão.
Karl Ritter foi o primeiro tecelão  onde hoje reside Karl Dietrich. Mais tarde encontramos na sede de Bom Jardim Reismüller e Peter Adam Noschang, pai do famoso Johann Noschang. Utilizavam principalmente algodão como também em menor quantidade linho.
Antes da Revolução tinham muito trabalho porque  comprava-se pouca roupa e todas as mulheres fiavam, geralmente até altas horas da noite. No período da guerra civil a atividade cresceu ainda mais, pois, na maioria das vezes Porto Alegre estava fechada e os colonos entregues à própria sorte. Depois da Revolução cresceu o comércio e o trabalho noturno diminuiu.
É interessante assinalar aqui os preços daquela época. Por um côvado pagavam-se seis vinténs. Com isto o tecelão, mesmo com uma atividade mais intensa, com certeza não chegava a milionário. Fazia suas contas em milhões de réis e não milhões de mil réis.
A roda de fiar do primeiro cordoeiro estava instalada na atual colônia de Schenkel. O mestre cordoeiro era um solteirão e, como era costuma nas picadas, conhecido simplesmente pelo nome de o " cordoeiro Louis". Os antigos moradores lembram-se muito bem como lidava com o fogo, como manuseava a espadela, como andava orgulhoso de cá para lá e como manipulava a alavanca. Como se pode ver muito antes de Albert Boroschewski, já se praticava a nobre arte do cordoeiro em território da nossa paróquia.
Prestemos agora um pouco atenção às vendas daquele tempo. Antes do conflito, até Revolução Farroupilha adentro, funcionava lá embaixo no morro Lehm, onde hoje mora  Peter Weber, a casa, melhor, a cabana de Georg Gehring, a pequena venda de Lavalt, junto com um matadouro. Mais para cima, onde fica a moradia de Emil Rösse, funcionava a venda de Paul Kasper. Voltaremos a ela mais tarde. Jacob Eckert abrira em 1830 uma venda na localidade de onde hoje se encontra  a casa de Nikolaus Schmitt.
No caminho para o Buraco do Diabo encontrava-se o estabelecimento dos sócios Run  e Käfer, famosos por terem comprado a colônia por uma garrafa de cachaça. Como última das vendas registramos aquela de Mehring, localizada  no outro do  Feitoria, e que hoje até hoje permanece fiel à sua finalidade. Lá mora Jacob Lamb. Sem forçar a situação podemos acrescentar uma pequena referência ao primeiro Kerb de verdade. Não como aconteceu na venda de Paul Kasper onde folhas de laranjeira e pentes foram os primeiros instrumentos de música, mas instrumentos de verdade, feitos de latão e madeira. Os três músicos foram Bopp, Damm e Curtius. O Kerb durou três dias, de sábado até segunda feira e os músicos teriam recebido uma soma escandalosa. Fala-se em 500 mil  réis. Na frente do local foi levantada uma "árvore do Kerb" de cinco pés de altura e, enquanto os músicos tocavam, o povo todo dançava alegremente em volta da árvore. A copa era ponta de um pinheiro, enfeitada com bandeirinhas. Acima da coroa pendia uma guirlanda  de flores, da qual sobressaía uma garrafa de "moscatel" legítimo valendo dois mil réis. No final do Kerb a árvore foi introduzida no salão pela janela para continuar a mesma dança alegre. O rapaz que foi escolhido como o mais guapo e o mais enxuto do salão, foi um tal  Matzenbacher da Estância. Entremos no salão. Encontramos o dono, auxiliado por três rapazes e seis moças. Cabia-lhes manter tudo em movimento. Em compensação pagavam menos pela bebida e a música do que os outros.
É compreensível que a venda servisse apenas de vez em quando para dançar. Sua função principal consistia em abastecer o povo por preços acessíveis com as mercadorias mais indispensáveis. Por dinheiro comprava-se tudo nelas: gêneros alimentícios, açúcar, sal, café, cachaça baiana, tecidos como riscado, chita, brim - Blau Nanking nicht so schwer wie Koskla - era  moda número um, conforme uma testemunha da época. Conseguiam-se também tecidos de lã, inclusive "manchester" macio como veludo. Oferecia uma vantagem adicional muito apreciada pelos colonos.  A semente do picão não fica presa neles.
Na época as coisas não eram tão cômodas para os negociantes como são hoje. Viajavam pessoalmente a Porto Alegre a fim de fazer suas compras, numa viagem que consumia de oito dias a duas semanas e mandava de trem até São Leopoldo o que compravam.
Examinemos um pouco mais de perto os veículos de transporte do início da colônia. Eram de quatro rodas e quatro animais, dois bois e dois cavalos os  puxavam. Na carroça cabiam 14 sacos. O custo do transporte importava em nove patacas. Um balaio com galinhas equivalia a dois sacos e dois recipientes com manteiga (18 polegadas de altura e 14 de largura). O preço dos produtos da época: cinco ovos valiam dois vinténs, um galo de quatro a seis vinténs, uma libra de manteiga de 10  12  vinténs. O primeiro queijo que apareceu no comércio foi fabricado pela mulher de um tal Werner, irmã do professor Allgayer. Maiores informações serão dadas mais abaixo quando identificarmos individualmente as pessoas. No que diz respeito ao transporte de produtos para distâncias maiores, soubemos de Friedrich Fröhlich que Pipin Philipp Kerber e Ph. Diefenthäler eram donos de canoas e barcos no rio dos Sinos. Mediam 14 pés de comprimento e oito a 12 de largura. Os remos mediam 24 pés. A tripulação era normalmente composta por quatro homens mais o patrão que cuidava do leme. Um remava na frente e dava o compasso e os outros lhe davam o suporte. Recebiam duas patacas por dia.
Os barcos transportavam também passageiros para Porto Alegre numa viagem que se prolongava da manhã até a noite. Os parceiros constantes e pouco exigentes de Fr. Fröhlich  eram Fridr. Feyh e Rösten . Apreciavam sobretudo um bom café. Contudo não recusavam bebidas mais fortes o que deve significar a expressão de um velho gaiato, que dizia dos  que “marinheiros estavam lotados”. Prestemos um pouco de atenção  ao ofício de alfaiate, residente na casa de Niebenich.  Depois dele havia  um tal Johann Lauermann e um tal Klein, perto da represa do Jãozinho Flores.
Um certo Geiseler era alfaiate itinerante. Passava de casa em casa, apreciava um copinho para enfrentar a sede, o que lhe custou a vida. Caiu com o rosto numa pequena poça de água e não conseguiu levantar-se. (142) Como todos os profissionais na época, o alfaiate praticava preços moderados. A confecção de um traje inteiro custava quatro mil réis, só a calça uma pataca. Em vez de casacos usavam-se jaquetões compridos. Os coletes eram chamados pelo nome francônio antigo de "pano para o peito". As calças na época vinham  apenas com braguilha. O jaquetão de casamento de Jacob Lerner era de riscado, com riscas vermelhas, azuis e brancas. As calças eram do mesmo riscado branco daquele que hoje se usa para fazer acolchoados de panos. A cabeça era enfeitada com um boné  de pele  de lontra e os pés calçavam um par de sapatos sólidos e toscos pois, como alfaiates havia também sapateiros eficientes. O senior destes últimos Jacob Eckert morava numa casa que no começo ficava perto do arroio, em frente a Georg Gehring. Tratava-se de uma construção toda singular. Os postes eram angicos vivos que sustentavam as traves. Mais tarde fixou-se na picada um parceiro de ofício, um alfaiate parisiense, chamado assim por causa do seu nome de família Schneider e por sua antiga  permanência na capital da França. Os sapateiros cobravam barato por seu trabalho. Um par de sapatos de couro de três a cinco patacas a dois mil réis. Os de couro de cabra custavam o mesmo, tato fazia se amarelos, vermelhos ou verdes. Sapatos de couro de reses que alcançavam até o tornozelo tinham o mesmo preço. Chinelos de couro de reses ou sapatos  leves custavam de quatro a cinco patacas. Botas de couro de terneiro valiam seis mil réis, aquelas de couro de rês quatro mil réis. Sobre a situação dos preços do couro, falaremos no capítulo nono da segunda parte, por ocasião da breve biografia de Friedrich Klos.
Conforme nos relatou o informante neste capítulo, o primeiro açougueiro foi o velho Berghan, perto da atual igreja protestante, na propriedade de Simonis. Abatia animais todos os dias e o filho do velho Fuchs abastecia a partir dele toda  picada. A onça  de carne era vendida a um ou dois vinténs.
 De então para cá os tempos mudaram para melhor, nao os preços. Em vez das pequenas vendas contamos agora com casas de comércio espaçosas, oferecendo de tudo,  tanto na entrada da piada, quanto no meio e no interior. Simonis está estabelecido na entrada depois vem Strassbuger, Christian Müller, Bauermann, Röse e Lamb. Agora somos servidos por um número maior e mais preparado de profissionais: sapateiros, alfaiates, seleiros, marceneiros, funileiros, dentistas, torneiros e cordoeiros, inclusive costureiras e cirurgiões.
Com que olhar de espanto  Paul Kasper, um dos primeiros vendeiros de Bom Jardim, não observaria algumas das vendas de hoje fartamente abastecidas. Quem sabe perderia toda a vontade e abandonaria a profissão. Já não tem mais  a temer a concorrência e não tem mais necessidade de preocupar-se  em comprar e vender. Só sobrevive a lembrança da sua figura e do seu negócio. Ambos tiveram a seu tempo a sua razão de ser e a sua utilidade. Para fazer~lhes as honras entremos por um momento no seu negócio. A venda é pequena, baixa e oferece pouca escolha de mercadorias. Contudo deparamo-nos com coisas singulares que hoje já não encontramos. Que correias estranhas são aquelas aí amontoadas? O povo jovem não tem a mínima noção, apesar disto o produto ainda hoje é objeto de comércio. Trata-se do toucinho cortado em tiras que, na época, era oferecido nesse formato e não na forma banha. Quanto aos  tecidos havia pouca escolha. Encontramos apenas  mescla e chita colorida, nada de cachimira ou qualquer outro tecido caro. (142). Em compensação os preços eram baixos. Comprava-se o côvado [1] de mescla por uma pataca e a mesma medida de chita por 12 a 16 vinténs. Por uma toalha de algodão o vendeiro pedia 20 vinténs.
Entende-se por si mesmo que, nessas circunstâncias, os colonos não usassem ou não tivessem como ostentar luxo com a roupa. A roupa que usavam era, na maioria dos casos, tecida por eles próprios, sem tintura e de grande simplicidade. Se alguém possuía um terno completo, usado nos domingos e dias de festa, julgava-se melhor do que todos aqueles que não podiam permitir-se tal luxo. O velho Gewher vangloriava-se ingenuamente depois de mandar costurar um traje completo de mescla, com as palavras que ficaram gravadas na memória do nosso informante: "Agora tenho uma farda completa." Do vendeiro que vendeu todas essas maravilhas conta ainda que, nos primeiros tempos, possuía um carro de duas rodas, com ele mantinha o negócio embalado. Atrelava uma junta de bois chamados Schit e Struel e estimulava-os com constantes gritos e comandos. Esses eram os velhos tempos patriarcais que cederam lugar a outros e novos tempos, na maioria dos casos menos pitorescos  poéticos, aliás como de resto em geral mudou.




[1]

Deitando Raízes #35

Com o arado vieram as carroças e carretas. Enquanto na década de 1850 eram poucas as carroças, hoje quase todo o colono dispõe da sua. Para debulhar milho o velho Herzer comprou a primeira máquina procedente da América por 38 mil réis. Na época era muito dinheiro. Mas pagou-se em pouco tempo porque debulhar com as mãos era uma operação penosa. Somaram-se depois os "moinhos de vento" utilizados para limpar  os produtos. Até máquinas para picar o pasto tornaram-se comuns. A semeadura das culturas estrangeiras, como ervilhas, lentilhas, cevada, centeio e trigo, era feita em junho. Não são muito cultivadas porque normalmente a colheita não compensa. Em agosto planta-se o feijão. Antes, porém, é preciso limpar o terreno das ervas daninhas e da palha de milho. Quando se trata de uma roça nova é preciso remover a madeira. Antigamente cometeram-se muitos erros nesta tarefa. (134) Abusava-se da queima quando agora se age com mais cautela. Antes de mais nada providencia-se por lenha para dois ou três anos. A madeira aproveitável é levada para casa ou vendida para os fabricantes de carroças ou marceneiros, ou levadas até a serraria para ser cortada em tábuas. Nos três ou quatro primeiro anos não há nada a fazer com o arado uma roça nova.
Onde se lavra os pés de milho não deveriam ser queimados mas deixados no local. Neste particular muito colono prejudica a sua terra pois, donde  tira a terra fertilidade se tudo é queimado. O feijão é plantado com a enxada em terra boa a uma distância de um passo em todas as direções. Em terra mais antiga um pouco mais perto, colocando quatro feijões em cada cova.  Pode ser plantado também no sulco do arado que não pode ser muito fundo, porque o feijão custa germinar numa profundidade maior. Numa área de terra de 25 braças de largura e 50 de comprimento, cabem duas quartas  ou 18 litros de feijão e a colheita média rende de seis a sete sacos (um asco são oito quartas ou 72 litros). No mês de outubro é preciso limpá-lo mais uma vez e a colheita acontece em dezembro. As batatas são plantadas em agosto e a colheita ocorre também em dezembro para a primeira semeadura. A segunda  é feita em janeiro e a colheita em junho. Depois de semeado o feijão e a batata, lavra-se a terra para o  milho, o arroz, o amendoim, a mandioca, a batata doce e a cana de açúcar.
O milho pode ser plantado a qualquer hora entre setembro e o Natal. A melhor ocasião são os meses de outubro e dezembro. A semeadura é feita com a enxada a uma distância de dois passos em todas as direções, depositando-se de quatro a cinco grãos em cada cova. No meio do milho planta-se abóbora. Uma quarta de milho requer o equivalente de terra de duas quartas de feijão. O milho plantado em setembro amadurece em março. O milho pode ser associado à mandioca, sendo preferível, entretanto deixar a mandioca sem outra cultura associada, mantendo a distância de um bom passo entre cada planta. A mandioca não é semeada mas plantada com mudas com três a quatro borbulhas, depositadas na terra, utilizando-se a rama do ano anterior. A raiz é a parte aproveitável da mandioca. Fervida fornece um alimento muito nutritivo. A farinha, principalmente misturada com feijão, vem a ser um bom alimento. A mandioca permite outros usos na cozinha. A raiz é uma excelente ração para cavalos, vacas e porcos, especialmente  para vacas leiteiras. O leite produz uma manteiga bonita e saborosa.
O amendoim é semeado com o arado. Coloca-se no sulco a intervalos de um passo. A distância não deve ser muito grande. O amendoim floresce fora da terra, depois a flor dobra-se para dentro da terra e a vagem amadurece dentro do chão. Fornece um óleo saboroso e de bela aparência. Numa boa colheita um saco de sementes rende de 20 a 24 ascos e goza de boa aceitação no mercado. Como no caso da mandioca, as mudas da cana de açúcar vêm de plantas do ano anterior, fincadas no chão ou plantadas com o arado à distância de um passo. O destino principal da cana de açúcar é o alambique. Fornece também um bom pasto para cavalos e reses, além de fazer-se melado com o suco. A melhor forma de plantar arroz é com a enxada colocando as sementes individualmente a intervalos pequenos. Com o arado não convém porque as sementes caem fundo demais no chão e nascem mal. De maneira geral arroz prefere terra molhada, mas há variedades que se dão bem em terreno enxuto. Como a mandioca o arroz tem boa aceitação no mercado. A batata doce é um bom alimento para cavalos, reses e porcos. Não é ruim quando fervida. Muitas pessoas não a comem por causa do gosto doce. (135) A batata doce é um planta com baraço, que se estende de dois a três metros sobre o chão. Forma tubérculos que chegam a pesar de quatro a cinco quilos. As mudas não podem ser plantadas muito próximas. Estando madura colhe-se o baraço usado como pasto. Todas essas culturas têm que ser plantadas os meses de setembro e outubro e, antes de se desenvolverem exigem uma capina que as livra de toda a erva daninha.
A colheita dos frutos do campo começa em novembro com as ervilhas, uma quarta rendendo dois a três ascos. Depois vem o feijão, centeio, lentilha, cevada e por o fim o trigo. O feijão rende na média seis ascos por quarta. Uma família de duas pessoas costuma plantar sete quartas e as maiores plantam relativamente mais. Há famílias que chegam a plantar até três sacos. O centeio dá-se bem em terras altas. Nestas condições uma boa safra rende até sete a oito sacos por quarta. Este produto, porém, não tem boa aceitação no comércio. As lentilhas são uma cultura muito insegura porque exigem um solo leve e fraco. Num chão mais ou menos forte desenvolvem apenas rama e não carregam vagens. O mesmo acontece com o trigo e a cevada. Um ano de boas colheitas costuma alternar com três ou quatro frustradas.
Dezembro é um mês duro para os colonos É o mês da colheita e, ao mesmo tempo, acontece a segunda semeadura do milho. Setembro e outubro são os meses da derruba do mato. As capoeiras podem ser roçadas em novembro. Plantado o milho colhe-se o feijão e demais  produtos. A roça é novamente limpa de toda a erva daninha. Somam-se outras tarefas em casa. As construções precisam ser consertadas, os potreiros limpos, os muros, as cercas e tudo o mais revisado e reparado. A colheita do amendoim cai em fins de fevereiro. As pequenas touceiras são arrancadas e postas a secar durante três ou quatro dias e depois debulhadas. A palha do amendoim chega a um pé de altura e seca serve como boa forragem para o inverno. Como já foi mencionado, numa boa safra  um saco rende de 20 a 24 sacos e não se requer uma área muito grande, de preferência de solo leve. Em março ou abril acontece a colheita do arroz. Cortam-se as espigas que são logo colocadas sobre o pano e debulhadas com o auxílio de cavalos. Duas ou três pessoas conseguem colher de sete a oito ascos por dia. Uma área de 25 por 25 braças braças rende com facilidade de 16 a 18 ascos. Há apenas 12 ou 15 anos que o arroz conquistou o seu lugar no comércio. A colheita do milho começa em março, isto é, quando ele já está em condições de ser aproveitado e colhe-se o necessário para o uso. A colheita propriamente dita acontece em maio e junho. Depois de madura dobra-se a espiga um pouco abaixo da sua base, para que a chuva não penetre e os papagaios e micos, sérias ameaças para o milho,  não o estraguem. Para uma quarta de milho requer-se uma área  de 25 por 50 braças, podendo render até 20 sacos. Uma família com seis ou sete pessoas em condições de trabalhar, plantam de 18 a 20 quartas o que representa  uma montanha de 100 vezes sessenta quilos.
Para a mandioca e a batata doce não há data certa para a colheita. São colhidos na medida da necessidade. O fabricante de farinha de mandioca começa a atividade em abril. A farinha de mandioca ocupa um excelente lugar no mercado. Até maio ou junho a cana de açúcar está madura para destilar a cachaça. Em Bom Jardim, na Quarenta e Oito e na Picada Café contam-se cerca de 30 alambiques.
Acrescentamos aqui (136) algumas  observações sobre a criação de animais. Os cavalos e mulas são compradas dos tropeiros que vêm da Campanha ou descem de cima da Serra. Pelo preço que são vendidos não compensa o colono criar esses animais. Se nos primeiros anos o colono dispunha de no máximo dois ou três cavalos, hoje qualquer um é dono de três cavalos ou mulas, famílias maiores cinco, seis ou sete cavalos. Convém lembrar que todas as culturas de vagens são debulhadas com o auxílio de cavalos, além disto é longe demais para ir a pé para a igreja e recorre-as aos cavalos e o rapaz ao chegar aos 16 ou 17 anos quer ter seu próprio cavalo. A alimentação do cavalo tem que ser uniforme e o pasto limpo. Durante o inverno o cavalo do colono contenta-se com seis espigas de milho ao dia, uma abóbora e cinco ou seis canas de açúcar de manhã e à noite. Nestas condições mantém-se forte e apto para trabalhar a qualquer hora. Cavalos e mulas que puxam diariamente o arado ou engajados no transporte, exigem um volume maior de milho. No verão o cavalo contenta-se com três espigas de milho e algum pasto verde por dia. O cavalo não deveria ficar sem milho. A regularidade e o asseio no trato  é essencial. Nos primeiros anos o colono não dispunha de muitas reses, no máximo duas ou três, porque também no Brasil vale o ditado: "Uma vaca socorre toda a pobreza." Uma vaca de leite recebe como alimentação milho, abóbora, pasto verde, ervilhaca, aveia e no verão mandioca, batata doce e pasto verde. A vaca é como um armário. Colocando-se muito nele, pode-se tirar muito, isto é, quem cuida da alimentação pode esperar uma boa ordenha. Hoje quase todos os colonos dispõem de uma junta de bois de canga, porque os bois são mais adequados para o trabalho na roça do que os cavalos e mulas. Além de tudo rende um bom dinheiro no açougue depois de trabalhar por sete ou oito anos.
Examinemos agora a manipulação bastante rudimentar das matérias primas como o colono costuma  executá-la na sua própria casa. Na Quarenta e Oito  superior usam atafonas caseiras. O preparo deste importante alimento é relativamente simples. De manhã colhem-se as raízes de mandioca na roça e as crianças as limpam. Depois de raladas são lavadas e prensadas para separar o caldo tóxico. Em seguida a massa úmida é colocada em grandes frigideiras de cobre e torrada, um trabalho que exige bastante esforço. O produto colocado em sacos está pronto para a venda ou o consumo próprio. Paralelamente extrai-se o polvilho de grande utilidade em confeitos finos e engomação  de roupas. É óbvio que há colonos que se dedicam à fabricação de farinha a nível industrial, reservando as demais atividades agrícolas para uma ocupação complementar, isto é, na medida em que são necessárias para suprir as necessidades  domésticas. Já a distribuição de cachaça exige mais profissionalismo. Demanda maiores investimentos, mas em compensação rende maiores resultados. A matéria prima é a nossa cana de açúcar em vez do centeio e a batata inglesa na Europa. Prensadas as canas, o caldo passa para um tacho adequado, no qual acontece a fermentação. Como se  sabe trata-se de determinadas bactérias as responsáveis pela fermentação do açúcar e da produção de álcool. Nos últimos tempos o preço da pipa baixou bastante. Compreende-se que essa indústria seja bastante rentável, considerando que durante muitos anos a pipa valia 24 mil réis. Produzindo de cinco a oito pipas o alambiqueiro reunia uma bela soma. O fabricante de farinha também fazia bons negócios, vendendo 100 sacas por ano a 10 mil réis a unidade o que lhe rendia uma bela soma. Soubemos de um desses fabricantes que ele mandou construir uma casa no valor de cinco contos, pagos com o resultado de um único ano.
Vamos deter-nos  também um pouco com a fabricação de vinho, que aos poucos entrou num ritmo maior, oferecendo aos colonos a perspectiva de uma rica fonte de receita. A variedade de uvas americanas é a que dá os melhores resultados. Ela oferece a vantagem adicional de, por causa da casca mais grossa, sofrer menos com as pragas do que as de película mais fina. Acontece que na média geral toma-se pouco cuidado com a fabricação de um vinho puro e robusto. Espera-se que com o tempo associações agrícolas cada vez mais importantes, operem uma mudança neste setor. Com isso as colônias alemãs assim como as italianas estarão em condições de concorrer no mercado. O simples lucro, por si só, significaria um poderoso estímulo para os colonos. Pela medida [1] pagava-se 1.800 a 2.000 réis. Partindo desta base é fácil calcular o que renderiam para o produtor de cinco a seis pipas por ano. Conclui-se que, entre nós, não faltam condições  favoráveis para uma atividade altamente lucrativa. O que nos falta é empenho e capricho e, mais freqüentemente, determinação e espírito empreendedor, muito mais  presentes entre os italianos do que entre os alemães. O velho "Miguel alemão" [2] ama trotar pelo velho caminho, sem olhar nem para a direita, nem para a esquerda. Com muita dificuldade decide-se por algo novo, obedecendo ao velho ditado: "No que o colono não é forçado ele não move nem a mão nem o pé." Concordamos obviamente que existem louváveis  exceções. Reconhecemos também que há aqueles que são extremamente criativos, como temos o exemplo de uma dona de casa que, com a escassez de água potável no verão, coloca os recipientes de leite na brisa fresca da noite e, desta maneira, consegue produzir o ano todo manteiga em boas condições, apesar do calor do verão.
Fechamos o capítulo sobre a atividade rural acrescentando os preços dos principais produtos nos últimos anos. Não há dúvida de que os números dizem muito mais do que qualquer discurso. Apreciemos, por fim, o transporte utilizado para os diversos produtos. Em primeiro lugar temos a considerar as honradas mulheres dos colonos. Cabia a elas a venda dos ovos, da manteiga  e do queijo caseiro. Com isso controlavam, por assim dizer, as rédeas do comércio. Os vendeiros eram obrigados a se entender com elas. Entende-se por si mesmo que pagassem pelos ovos mais do que o preço do dia, pois não fariam negócios se não fossem compensados  de alguma outra maneira pelos prejuízos. Com a manteiga acontecia algo semelhante. O vendeiro não olhava pela qualidade e pagava tanto pela má quanto pela boa qualidade.
A mulher do colono normalmente não recebe dinheiro em troca dos ovos e da manteiga, mas leva em troca as compras necessárias para o abastecimento da casa. Desta forma o negócio com ovos e manteiga não passa de um comércio de troca. Um componente fascinante e peculiar entre nós vem a ser o transporte com parelhas de mulas.  Movimentam-se em todas as direções pela paisagem, com a única diferença que a composição não é formada por caixas de madeira mas criaturas vivas. O trem de ferro requer trilhos, (138) o séqüito de mulas não precisa deste suporte de ferro. Um trem de ferro exigiria no mínimo um cabo de aço e uma roda dentada para subir até o alto para onde sobe o cortejo de mulas, ou descer a encosta estéril por onde elas se movimentam com facilidade. Mas também não é bem assim. O cortejo de mulas dispõe do seu trilho pelo chão enlameado e revolvido, com a diferença de que aqui os trilhos são colocados transversalmente, formando as conhecidas armadilhas conhecidas como “amansa burros”. Servem também com o trilha para o cavaleiro solitário, porque lhe sinaliza o caminho que deve tomar ao cruzar pelos  trechos de lama, se quiser evitar os buracos. O cortejo dos orelhudos segue, em passo cadenciado, como se fosse um comboio, carregando a sua carga convencional. As mulas parecem ter consciência de que estão a serviço  da civilização e do progresso e raramente permitem-se  pulos de satisfação, tão próprios da sua natureza. Mas a lei física que pesa sobre o rei da criação e por ele transferida para o mundo animal, não tarda em conduzi-los para caminhos mais tranqüilos e  seguros. No cortejo das mulas não falta o maquinista e o encarregado dos freios, nem mesmo o apito sinalizador. O condutor do cortejo vai montado  no animal de carga da frente, muitas vezes um menino de 10 a 12 anos. Sua montaria  carrega a sineta, cujo badalar monótono orienta o cortejo, como acontece na Europa com os trens secundários. Ao homem do freio monta no final da composição e cabem-lhe algumas tarefas  com ao seu primo no trem. Encarrega-se para que a velocidade se mantenha nos limites  previstos, valendo-se dos gritos e do estalo  do chicote. Paralelamente responsabiliza-se pelo transporte correto das mercadorias e para que não se perca algum volume pelo caminho.
Embora tenha-se observado centenas de vezes um cortejo cinematográfico de mulas cruzando a mata virgem, a vista se demora com satisfação, quando topamos com um deles na estrada. Uma vez chegado ao destino  concede-se ao veículo de transporte vivo a merecida liberdade para o retorno. Os animas não ficam mais presos uns aos outros. Cada qual pode trotar à vontade, permitindo aos nossos orelhudos abocanhar os petiscos na beira da estrada e empreender algum reconhecimento no terreno, causando algum trabalho extra para o responsável. Lembro-me como foi resolvido o abastecimento do exército cristão por ocasião da conquista de Granada no sul da Espanha. Fui entender o  seu significado pleno só mais tarde no Brasil. Em 1491 quase não havia estradas construídas naquela região. Os alimentos necessários para o exército que fazia o cerco, teve que ser providenciado de longe, no lombo de mulas. Também lá deve ter sido um espetáculo grandioso,  observar durante o dia o ininterrupto subir e descer das mulas pelas trilhas e ouvir por toda região o tilintar de centenas de sinetas.
Um espetáculo parecido deve ter oferecido a penosa expedição a Canudos, embora a cena tivesse sido menos poética. As características eram, sem dúvida, muito  mais desfavoráveis do que em Granada. Todo o noroeste da Bahia é formado por um maciço de granito de consideráveis dimensões e numerosas ramificações, dificultando em muito a circulação. Grotas, gargantas abruptas de granito vales elevados, com a rocha original coberta por uma fina camada de argila estéril, blocos de rochas desnudas, semelhantes a ousadas fortalezas, são estes os componentes  que perfazem o panorama daquela região. Com muito acerto afirmou o conhecido cientista von Martius, quando comparou a região com o conhecido distrito diamantífero no estado vizinho de Minas Gerais. "As mesmas paredes íngremes de xistos reluzentes, as mesmas calhas profundas pelas quais os arroios frescos da floresta encontram o caminho, a mesma forma das montanhas em terraços, (139) permeados por bancos de rochas nuas ou xistos que terminam em pontas agudas. Aqui e lá maciços de montanhas de itacolumita ou arenito plástico, do qual emergem aqui e acolá, poderosos veios de quartzo branco e vistoso, ora contínuos, ora fragmentados, ora decompostos em pequenos grãos irregulares, como que esmagados por uma enorme pressão. As rochas são nuas  e nos altiplanos rasos cobertos com uma camada de terra de charneca, misturada com inúmeros grãos de quartzo  branco. Num terreno destes, sobre o qual o cavalo quase não entra em questão, entram as mulas e demonstram ser os camelos da América do Sul, tanto na região dos campos quanto na paisagem montanhosa.




[1] Uma medida são quatro garrafas
[2] Maneira de designar o alemão que costuma ser mais avesso a novos empreendimentos do que o italiano.

Deitando Raízes #34

Capítulo quarto
Agricultura e Circulação
Sem minerais, sem vegetais e (130) sem animais é impensável qualquer tipo de atividade. O mundo mineral fornece-nos armas e instrumentos. O reino vegetal presenteia-nos com os alimentos indispensáveis que vêm das plantas, assim como utensílios, moradias feitas de madeira. O reino animal supre, enfim, a dieta vigorosa de carne e os auxiliares no trabalho. No seu primeiro estágio a atividade humana resume-se na criação de animais e cultivo de vegetais. Os resultados da criação de animais e os produtos da agricultura, servem como matéria prima para a indústria que, a partir dela elabora  os mais diversos objetos exigidos pelas nossas necessidades reais e imaginárias. O comércio apropria-se da produção das indústrias, a fim de fazê-la circular, ora em regiões mais próximas, ora nas mais afastadas do mundo.
Os artigos comercializados são trocados por produtos  ou dinheiro que, por sua vez, contribuem para a distribuição da produção das diversas procedências, tanto animais quanto vegetais. Para que o comércio se desenvolva e floresça, exigem-se muitas formas de distribuição, animais de carga e veículos de transporte para circular nas estradas  e navios para os caminhos marítimos. Colocamos essas observações para formarmos uma idéia correta do desenvolvimento  da agricultura, da indústria e do comércio. O Brasil e, de modo especial, a região colonial são bastante jovens. Só há pouco tempo iniciou-se o esforço para dominar as forças da natureza.
Não esperemos, pois, que diante dos nossos olhos se descortine um quadro muito brilhante. Contudo já oferece muita coisa de grande e de belo, fruto da laboriosidade alemã nas colônias.
Limitamo-nos a uma única paróquia, Bom Jardim. As características relatadas oferecem um retrato fiel da situação que encontramos também em outras colônias.
Quando os primeiros colonos chegaram no Brasil, encontraram circunstâncias muito diferentes daquelas às quais estavam acostumados na velha pátria. Em primeiro lugar novas eram as plantas, com que era preciso familiarizar-se, como a mandioca, a cana de açúcar, as abóboras, o algodão, o milho. Este último já fazia parte da agricultura na Alemanha. Mas era desconhecido para os colonos procedentes de Trier e do Palatinado. A mandioca era uma planta  nativa usada mesmo antes do descobrimento da América, cujas raízes forneciam o alimento principal para as tribos selvagens. Havia duas variedades: a mandioca doce e a venenosa. Esta com raízes revestida com casca escura, antes do uso tinha que ser liberada do ácido cianídrico contido no suco. Depois de torrada numa frigideira assume a aparência das nossas papas de aveia. Os portugueses deram-lhe o nome e farinha seca e, associada a outros alimentos, tem um sabor excelente. Os índios usavam muitos nomes, de acordo com sua estrutura e variedades. De acordo com Martins somente a língua tupi usava nove designações e segundo Ferreiro, os índios Manáos distinguiam 35 variedades diferentes de mandioca. O milho, também uma planta nativa da América, não perde de importância para a mandioca. É usado como forragem para cavalos e mulas mais do que como alimentação humana. Pelo menos os portugueses preferem pratos com farinha de mandioca. Os nossos colonos também sabem fazer com ela um pão saboroso e substancioso. O feijão, principalmente o pequeno preto, tem uma importância que, por assim dizer, chega a ser perigosa, na medida em que conquistou  uma situação privilegiada na agricultura, em detrimento de uma atividade econômica equilibrada. Também novo para os imigrantes foi o arroz, uma cultura de tamanha importância para o Brasil. Da mesma forma  o o cultivo do amendoim era uma novidade. Para muitos citadinos, com certeza, é desconhecido o hábito estranho desta planta de enterrar a flor no chão para depois desenvolver a vagem até o amadurecimento. As magníficas e saborosas laranjas no começo eram importadas da Europa. A elas vem somar-se a saborosa banana, a romã e o pêssego.
Para os que chegavam, nova era também a seqüência ininterrupta do trabalho na lavoura. Não havia invernos propriamente ditos na nova pátria e com isto o trabalho não sofria nenhuma parada. São de um modo especial as pessoas de idade que se queixam: "No Brasil não se permite descanso para o agricultor. Terminada uma tarefa uma outra o espera."
Outra diferença na agricultura vem do grande tamanho das roças, resultado do sistema de rapinagem no uso da terra. Uma colônia inteira de terra não é grande demais para uma família de tamanho médio. Enquanto na Europa uma adubação regular e uma alternância de culturas adequada, permitem que uma e a mesma área seja cultivada por gerações seguidas, aqui é preciso abandonar anualmente as áreas exaustas. Deixam-se crescer capoeiras e, depois de cinco ou seis anos, volta-se a utilizá-las. O resultado é que cada ano é preciso derrubar  e queimar mais um eito de mato. Por sorte o colono comprou barato a colônia ou até a recebeu de graça. Caso contrário ter-lhe-ia sido impossível instalar o ninho em que se sente em casa.
Nos tempos passados no Brasil um trabalho longo e, por vezes amargo e duro, era muitas vezes posto a perder, coisa que não se conhecia na Alemanha. Referimo-nos ao freqüente excesso de calor, de água e de estiagens e, de modo especial, a inimaginável fertilidade do solo, favorecendo a proliferação das ervas daninhas. Nem se fala dos inimigos viventes do homem do campo: os milhões de formigas, bandos de papagaios, famílias de macacos e, nos primeiros tempos, as varas de porcos do mato.
São de um homem do campo experiente, cujas vivências iremos trazer mais abaixo, as palavras: "Na maioria dos casos o feijão sofre danos com a chuva, quando em outubro entra na floração. O mesmo acontece com os ventos fortes que o desmatamento irracional deixa passar livremente. No período da colheita também a chuva pode ser muito prejudicial.
Na hipótese de as plantas maduras (132) arrancadas forem molhadas durante aquele período quente do ano, o feijão brota e a colheita perde-se em grande parte. O milho, por sua vez, exige muito calor. Mostra-se especialmente sensível na segunda plantação (safrinha). Não suporta muita chuva mas ama quando a chuva desliza lentamente pelas folhas. Com o excesso de chuva no começo cresce rápido demais, tornas-e frágil e os ventos o derrubam. Permite duas colheitas. A primeira exige sete meses para amadurecer e é a melhor e a segunda seis. O cultivo do algodão começou nos anos sessenta. A arroba valia de cinco a seis patacas. Era um preço muito baixo pelo qual mal  compensava colhê-lo além de não haver mercado suficiente.
Apesar de tudo há ainda hoje famílias que cultivam o algodão para o uso próprio. As mulheres o tecem e os rapazes maiores o processam à noite na roda de fiar. Confecciona-se assim a totalidade da roupa de cama, sacos, fronhas, roupas de trabalho, panos para a debulha, camisas e outros, resultando numa economia doméstica de grande importância.
O arbusto do algodão é uma planta muito grata. Não exige maiores cuidados além da limpeza das ervas daninhas. A colheita não costuma falhar em lugares onde não se formam com facilidade geadas.
Uma outra diferença que favorece bastante a agricultura daqui em relação à Alemanha consiste na riqueza de frutas e animais domésticos. A grande abundância de produtos agrícolas nativos, não  exclui evidentemente os alemães, como o trigo, o centeio, a aveia, a cevada, as ervilhas, as lentilhas, etc., embora esses exigirem áreas mais elevadas. Além disto a natureza oferece com prodigalidade uma boa quantidade de utensílios que, na Europa, só podem ser adquiridos por preços significativos junto a profissionais. A mata virgem fornece a pá do arado e a canga para a parelha de bois. Os cipós fornecem amarras resistente e o campo oferece vasilhas duráveis e asseadas nas cabaças de diversos tamanhos. Resumindo, conclui-se do que foi dito que, a situação do homem do campo aqui, é muito favorável, sem falar na grande vantagem que a sua terra forma um todo e não retalhos de pequenas parcelas como na velha pátria.
Façamos agora algumas  considerações sobre a vida e o modo de proceder de um colono brasileiro na mata virgem, como nos foi descrito por nosso amigo Christoph Führ, professor no Schneidersthal.
Para começo de conversa, o colono não precisa de muitos instrumentos agrícolas. Uma foice para roçar, um machado e uma enxada, e só Nos anos quarenta poucos colonos dispunham  de qualquer tipo de viatura, porque as roças situavam-se nas imediações e porque plantava-se  apenas o feijão e o milho. Tudo podia ser carregado para casa em sacos no lombo de cavalos. A madeira para  construção era reunida  carregada nos ombros ou arrastada valendo-se  de um tipo de trenó feito de forquilha de árvore.
Para reunir pedras utilizava-se um trenó semelhante àquele que os rapazes usavam na Alemanha para sufar sobre a neve no inverno. (133) Limpavam-se as roças com a enxada e com ela procedia-se também a semeadura. Como a venda dos produtos era muito precária, plantava-se o suficiente para o consumo. Numa família com apenas duas pessoas em condições de trabalhar, cultivava-se uma ou duas quartas de feijão e mesmo em famílias mais numerosas não se passava de meio saco. O feijão era debulhado na roça com utilização de uma vara, o que não era fácil no sol que queimava no verão da nova pátria.
Devido à pouca criação de porcos não se plantava tanto milho como hoje, Mantinham-se apenas tantos animais quantos necessários para suprir o uso doméstico com carne e banha. Assim, por exemplo, o velho Kunzler colheu num ano 100 sacos de sessenta quilos de milho e andava por aí orgulhoso como um imperador. Além disto cultivava-se a batata inglesa, ervilhas, lentilhas, mandioca, amendoim, cana de açúcar, na medida em que o suprimento da casa o exigia.  Pelo final dos anos quarenta as colônias entraram num ritmo de desenvolvimento mais acentuado. O comércio cresceu e com ele a vontade de trabalhar e produzir. Foram instaladas atafonas e alambiques e começou-se a lavrar a terra. Mas,  como acontece hoje, havia muitas dúvidas de como lidar com a mata. Não demorou e as dúvidas se foram e todos aderiram ao arado para preparar a terra.
Mesmo esse progresso começou modesto por não haver animais de tração adestrados. Uns faziam uma criança montar num cavalo e guiar o animal de acordo com o comando que vinha de trás. Outros levavam o cavalo pelo cabresto e, não poucas vezes lhes cabia puxar mais do que o animal. Do arado de pá móvel como na Europa, nem falar, porque aqui ele serve apenas para revirar a terra. Utilizavam-se vários modelos. Primeiro foi o arada manual, depois veio o munido de duas rodas na frente, o mesmo ainda em uso puxado por cavalos e, finalmente, o arado de bois pois. A maioria trabalha com bois.
Este último se presta melhor nos morros, entre tocos e pedras. Neste o timão vai até a canga e a pá encontra-se atrás. Trata-se de um  equipamento muito simples que todo o colono tem condições de confeccionar. No momento em que começou a produzir mais feijão, passou-se a debulhá-lo com a ajuda de cavalos. Para esta finalidade usava-se um pano de aproximadamente sete por sete metros. Sobre ele depositava-se  o feijão e cavalgava-se sobre ele até o feijão saltar das vagens. Com este método uma família de três pessoas estava em condições de arrancar e debulhar de seis a sete sacos por dia.