Com o arado vieram
as carroças e carretas. Enquanto na década de 1850 eram poucas as carroças,
hoje quase todo o colono dispõe da sua. Para debulhar milho o velho Herzer comprou
a primeira máquina procedente da América por 38 mil réis. Na época era muito
dinheiro. Mas pagou-se em pouco tempo porque debulhar com as mãos era uma
operação penosa. Somaram-se depois os "moinhos de vento" utilizados
para limpar os produtos. Até máquinas
para picar o pasto tornaram-se comuns. A semeadura das culturas estrangeiras,
como ervilhas, lentilhas, cevada, centeio e trigo, era feita em junho. Não são
muito cultivadas porque normalmente a colheita não compensa. Em agosto
planta-se o feijão. Antes, porém, é preciso limpar o terreno das ervas daninhas
e da palha de milho. Quando se trata de uma roça nova é preciso remover a
madeira. Antigamente cometeram-se muitos erros nesta tarefa. (134) Abusava-se
da queima quando agora se age com mais cautela. Antes de mais nada
providencia-se por lenha para dois ou três anos. A madeira aproveitável é
levada para casa ou vendida para os fabricantes de carroças ou marceneiros, ou
levadas até a serraria para ser cortada em tábuas. Nos três ou quatro primeiro
anos não há nada a fazer com o arado uma roça nova.
Onde se lavra os pés
de milho não deveriam ser queimados mas deixados no local. Neste particular
muito colono prejudica a sua terra pois, donde
tira a terra fertilidade se tudo é queimado. O feijão é plantado com a
enxada em terra boa a uma distância de um passo em todas as direções. Em terra
mais antiga um pouco mais perto, colocando quatro feijões em cada cova. Pode ser plantado também no sulco do arado
que não pode ser muito fundo, porque o feijão custa germinar numa profundidade
maior. Numa área de terra de 25 braças de largura e 50 de comprimento, cabem
duas quartas ou 18 litros de feijão e a
colheita média rende de seis a sete sacos (um asco são oito quartas ou 72
litros). No mês de outubro é preciso limpá-lo mais uma vez e a colheita
acontece em dezembro. As batatas são plantadas em agosto e a colheita ocorre
também em dezembro para a primeira semeadura. A segunda é feita em janeiro e a colheita em junho. Depois
de semeado o feijão e a batata, lavra-se a terra para o milho, o arroz, o amendoim, a mandioca, a
batata doce e a cana de açúcar.
O milho pode ser
plantado a qualquer hora entre setembro e o Natal. A melhor ocasião são os
meses de outubro e dezembro. A semeadura é feita com a enxada a uma distância
de dois passos em todas as direções, depositando-se de quatro a cinco grãos em
cada cova. No meio do milho planta-se abóbora. Uma quarta de milho requer o
equivalente de terra de duas quartas de feijão. O milho plantado em setembro
amadurece em março. O milho pode ser associado à mandioca, sendo preferível,
entretanto deixar a mandioca sem outra cultura associada, mantendo a distância
de um bom passo entre cada planta. A mandioca não é semeada mas plantada com
mudas com três a quatro borbulhas, depositadas na terra, utilizando-se a rama
do ano anterior. A raiz é a parte aproveitável da mandioca. Fervida fornece um
alimento muito nutritivo. A farinha, principalmente misturada com feijão, vem a
ser um bom alimento. A mandioca permite outros usos na cozinha. A raiz é uma
excelente ração para cavalos, vacas e porcos, especialmente para vacas leiteiras. O leite produz uma
manteiga bonita e saborosa.
O amendoim é semeado
com o arado. Coloca-se no sulco a intervalos de um passo. A distância não deve ser
muito grande. O amendoim floresce fora da terra, depois a flor dobra-se para
dentro da terra e a vagem amadurece dentro do chão. Fornece um óleo saboroso e
de bela aparência. Numa boa colheita um saco de sementes rende de 20 a 24 ascos
e goza de boa aceitação no mercado. Como no caso da mandioca, as mudas da cana
de açúcar vêm de plantas do ano anterior, fincadas no chão ou plantadas com o
arado à distância de um passo. O destino principal da cana de açúcar é o
alambique. Fornece também um bom pasto para cavalos e reses, além de fazer-se
melado com o suco. A melhor forma de plantar arroz é com a enxada colocando as
sementes individualmente a intervalos pequenos. Com o arado não convém porque
as sementes caem fundo demais no chão e nascem mal. De maneira geral arroz
prefere terra molhada, mas há variedades que se dão bem em terreno enxuto. Como
a mandioca o arroz tem boa aceitação no mercado. A batata doce é um bom
alimento para cavalos, reses e porcos. Não é ruim quando fervida. Muitas
pessoas não a comem por causa do gosto doce. (135) A batata doce é um planta
com baraço, que se estende de dois a três metros sobre o chão. Forma tubérculos
que chegam a pesar de quatro a cinco quilos. As mudas não podem ser plantadas
muito próximas. Estando madura colhe-se o baraço usado como pasto. Todas essas
culturas têm que ser plantadas os meses de setembro e outubro e, antes de se
desenvolverem exigem uma capina que as livra de toda a erva daninha.
A colheita dos
frutos do campo começa em novembro com as ervilhas, uma quarta rendendo dois a
três ascos. Depois vem o feijão, centeio, lentilha, cevada e por o fim o trigo.
O feijão rende na média seis ascos por quarta. Uma família de duas pessoas
costuma plantar sete quartas e as maiores plantam relativamente mais. Há famílias
que chegam a plantar até três sacos. O centeio dá-se bem em terras altas.
Nestas condições uma boa safra rende até sete a oito sacos por quarta. Este
produto, porém, não tem boa aceitação no comércio. As lentilhas são uma cultura
muito insegura porque exigem um solo leve e fraco. Num chão mais ou menos forte
desenvolvem apenas rama e não carregam vagens. O mesmo acontece com o trigo e a
cevada. Um ano de boas colheitas costuma alternar com três ou quatro
frustradas.
Dezembro é um mês
duro para os colonos É o mês da colheita e, ao mesmo tempo, acontece a segunda
semeadura do milho. Setembro e outubro são os meses da derruba do mato. As
capoeiras podem ser roçadas em novembro. Plantado o milho colhe-se o feijão e
demais produtos. A roça é novamente limpa
de toda a erva daninha. Somam-se outras tarefas em casa. As construções
precisam ser consertadas, os potreiros limpos, os muros, as cercas e tudo o
mais revisado e reparado. A colheita do amendoim cai em fins de fevereiro. As
pequenas touceiras são arrancadas e postas a secar durante três ou quatro dias
e depois debulhadas. A palha do amendoim chega a um pé de altura e seca serve
como boa forragem para o inverno. Como já foi mencionado, numa boa safra um saco rende de 20 a 24 sacos e não se
requer uma área muito grande, de preferência de solo leve. Em março ou abril
acontece a colheita do arroz. Cortam-se as espigas que são logo colocadas sobre
o pano e debulhadas com o auxílio de cavalos. Duas ou três pessoas conseguem
colher de sete a oito ascos por dia. Uma área de 25 por 25 braças braças rende
com facilidade de 16 a 18 ascos. Há apenas 12 ou 15 anos que o arroz conquistou
o seu lugar no comércio. A colheita do milho começa em março, isto é, quando
ele já está em condições de ser aproveitado e colhe-se o necessário para o uso.
A colheita propriamente dita acontece em maio e junho. Depois de madura
dobra-se a espiga um pouco abaixo da sua base, para que a chuva não penetre e
os papagaios e micos, sérias ameaças para o milho, não o estraguem. Para uma quarta de milho
requer-se uma área de 25 por 50 braças,
podendo render até 20 sacos. Uma família com seis ou sete pessoas em condições
de trabalhar, plantam de 18 a 20 quartas o que representa uma montanha de 100 vezes sessenta quilos.
Para a mandioca e a
batata doce não há data certa para a colheita. São colhidos na medida da
necessidade. O fabricante de farinha de mandioca começa a atividade em abril. A
farinha de mandioca ocupa um excelente lugar no mercado. Até maio ou junho a
cana de açúcar está madura para destilar a cachaça. Em Bom Jardim, na Quarenta
e Oito e na Picada Café contam-se cerca de 30 alambiques.
Acrescentamos aqui
(136) algumas observações sobre a
criação de animais. Os cavalos e mulas são compradas dos tropeiros que vêm da
Campanha ou descem de cima da Serra. Pelo preço que são vendidos não compensa o
colono criar esses animais. Se nos primeiros anos o colono dispunha de no
máximo dois ou três cavalos, hoje qualquer um é dono de três cavalos ou mulas,
famílias maiores cinco, seis ou sete cavalos. Convém lembrar que todas as
culturas de vagens são debulhadas com o auxílio de cavalos, além disto é longe
demais para ir a pé para a igreja e recorre-as aos cavalos e o rapaz ao chegar
aos 16 ou 17 anos quer ter seu próprio cavalo. A alimentação do cavalo tem que
ser uniforme e o pasto limpo. Durante o inverno o cavalo do colono contenta-se
com seis espigas de milho ao dia, uma abóbora e cinco ou seis canas de açúcar
de manhã e à noite. Nestas condições mantém-se forte e apto para trabalhar a
qualquer hora. Cavalos e mulas que puxam diariamente o arado ou engajados no
transporte, exigem um volume maior de milho. No verão o cavalo contenta-se com
três espigas de milho e algum pasto verde por dia. O cavalo não deveria ficar
sem milho. A regularidade e o asseio no trato
é essencial. Nos primeiros anos o colono não dispunha de muitas reses,
no máximo duas ou três, porque também no Brasil vale o ditado: "Uma vaca
socorre toda a pobreza." Uma vaca de leite recebe como alimentação milho,
abóbora, pasto verde, ervilhaca, aveia e no verão mandioca, batata doce e pasto
verde. A vaca é como um armário. Colocando-se muito nele, pode-se tirar muito,
isto é, quem cuida da alimentação pode esperar uma boa ordenha. Hoje quase
todos os colonos dispõem de uma junta de bois de canga, porque os bois são mais
adequados para o trabalho na roça do que os cavalos e mulas. Além de tudo rende
um bom dinheiro no açougue depois de trabalhar por sete ou oito anos.
Examinemos agora a
manipulação bastante rudimentar das matérias primas como o colono costuma executá-la na sua própria casa. Na Quarenta e
Oito superior usam atafonas caseiras. O
preparo deste importante alimento é relativamente simples. De manhã colhem-se
as raízes de mandioca na roça e as crianças as limpam. Depois de raladas são
lavadas e prensadas para separar o caldo tóxico. Em seguida a massa úmida é
colocada em grandes frigideiras de cobre e torrada, um trabalho que exige
bastante esforço. O produto colocado em sacos está pronto para a venda ou o
consumo próprio. Paralelamente extrai-se o polvilho de grande utilidade em
confeitos finos e engomação de roupas. É
óbvio que há colonos que se dedicam à fabricação de farinha a nível industrial,
reservando as demais atividades agrícolas para uma ocupação complementar, isto
é, na medida em que são necessárias para suprir as necessidades domésticas. Já a distribuição de cachaça
exige mais profissionalismo. Demanda maiores investimentos, mas em compensação
rende maiores resultados. A matéria prima é a nossa cana de açúcar em vez do
centeio e a batata inglesa na Europa. Prensadas as canas, o caldo passa para um
tacho adequado, no qual acontece a fermentação. Como se sabe trata-se de determinadas bactérias as
responsáveis pela fermentação do açúcar e da produção de álcool. Nos últimos
tempos o preço da pipa baixou bastante. Compreende-se que essa indústria seja
bastante rentável, considerando que durante muitos anos a pipa valia 24 mil
réis. Produzindo de cinco a oito pipas o alambiqueiro reunia uma bela soma. O
fabricante de farinha também fazia bons negócios, vendendo 100 sacas por ano a
10 mil réis a unidade o que lhe rendia uma bela soma. Soubemos de um desses
fabricantes que ele mandou construir uma casa no valor de cinco contos, pagos
com o resultado de um único ano.
Vamos deter-nos também um pouco com a fabricação de vinho,
que aos poucos entrou num ritmo maior, oferecendo aos colonos a perspectiva de
uma rica fonte de receita. A variedade de uvas americanas é a que dá os melhores
resultados. Ela oferece a vantagem adicional de, por causa da casca mais
grossa, sofrer menos com as pragas do que as de película mais fina. Acontece
que na média geral toma-se pouco cuidado com a fabricação de um vinho puro e
robusto. Espera-se que com o tempo associações agrícolas cada vez mais
importantes, operem uma mudança neste setor. Com isso as colônias alemãs assim
como as italianas estarão em condições de concorrer no mercado. O simples
lucro, por si só, significaria um poderoso estímulo para os colonos. Pela
medida [1] pagava-se
1.800 a 2.000 réis. Partindo desta base é fácil calcular o que renderiam para o
produtor de cinco a seis pipas por ano. Conclui-se que, entre nós, não faltam
condições favoráveis para uma atividade
altamente lucrativa. O que nos falta é empenho e capricho e, mais
freqüentemente, determinação e espírito empreendedor, muito mais presentes entre os italianos do que entre os
alemães. O velho "Miguel alemão" [2] ama
trotar pelo velho caminho, sem olhar nem para a direita, nem para a esquerda.
Com muita dificuldade decide-se por algo novo, obedecendo ao velho ditado:
"No que o colono não é forçado ele não move nem a mão nem o pé."
Concordamos obviamente que existem louváveis
exceções. Reconhecemos também que há aqueles que são extremamente
criativos, como temos o exemplo de uma dona de casa que, com a escassez de água
potável no verão, coloca os recipientes de leite na brisa fresca da noite e,
desta maneira, consegue produzir o ano todo manteiga em boas condições, apesar
do calor do verão.
Fechamos o capítulo
sobre a atividade rural acrescentando os preços dos principais produtos nos
últimos anos. Não há dúvida de que os números dizem muito mais do que qualquer
discurso. Apreciemos, por fim, o transporte utilizado para os diversos
produtos. Em primeiro lugar temos a considerar as honradas mulheres dos
colonos. Cabia a elas a venda dos ovos, da manteiga e do queijo caseiro. Com isso controlavam,
por assim dizer, as rédeas do comércio. Os vendeiros eram obrigados a se
entender com elas. Entende-se por si mesmo que pagassem pelos ovos mais do que
o preço do dia, pois não fariam negócios se não fossem compensados de alguma outra maneira pelos prejuízos. Com
a manteiga acontecia algo semelhante. O vendeiro não olhava pela qualidade e
pagava tanto pela má quanto pela boa qualidade.
A mulher do colono
normalmente não recebe dinheiro em troca dos ovos e da manteiga, mas leva em
troca as compras necessárias para o abastecimento da casa. Desta forma o
negócio com ovos e manteiga não passa de um comércio de troca. Um componente
fascinante e peculiar entre nós vem a ser o transporte com parelhas de
mulas. Movimentam-se em todas as direções
pela paisagem, com a única diferença que a composição não é formada por caixas
de madeira mas criaturas vivas. O trem de ferro requer trilhos, (138) o séqüito
de mulas não precisa deste suporte de ferro. Um trem de ferro exigiria no
mínimo um cabo de aço e uma roda dentada para subir até o alto para onde sobe o
cortejo de mulas, ou descer a encosta estéril por onde elas se movimentam com
facilidade. Mas também não é bem assim. O cortejo de mulas dispõe do seu trilho
pelo chão enlameado e revolvido, com a diferença de que aqui os trilhos são colocados
transversalmente, formando as conhecidas armadilhas conhecidas como “amansa
burros”. Servem também com o trilha para o cavaleiro solitário, porque lhe
sinaliza o caminho que deve tomar ao cruzar pelos trechos de lama, se quiser evitar os buracos.
O cortejo dos orelhudos segue, em passo cadenciado, como se fosse um comboio,
carregando a sua carga convencional. As mulas parecem ter consciência de que
estão a serviço da civilização e do
progresso e raramente permitem-se pulos
de satisfação, tão próprios da sua natureza. Mas a lei física que pesa sobre o
rei da criação e por ele transferida para o mundo animal, não tarda em
conduzi-los para caminhos mais tranqüilos e
seguros. No cortejo das mulas não falta o maquinista e o encarregado dos
freios, nem mesmo o apito sinalizador. O condutor do cortejo vai montado no animal de carga da frente, muitas vezes um
menino de 10 a 12 anos. Sua montaria
carrega a sineta, cujo badalar monótono orienta o cortejo, como acontece
na Europa com os trens secundários. Ao homem do freio monta no final da
composição e cabem-lhe algumas tarefas
com ao seu primo no trem. Encarrega-se para que a velocidade se mantenha
nos limites previstos, valendo-se dos
gritos e do estalo do chicote.
Paralelamente responsabiliza-se pelo transporte correto das mercadorias e para
que não se perca algum volume pelo caminho.
Embora tenha-se
observado centenas de vezes um cortejo cinematográfico de mulas cruzando a mata
virgem, a vista se demora com satisfação, quando topamos com um deles na
estrada. Uma vez chegado ao destino
concede-se ao veículo de transporte vivo a merecida liberdade para o
retorno. Os animas não ficam mais presos uns aos outros. Cada qual pode trotar
à vontade, permitindo aos nossos orelhudos abocanhar os petiscos na beira da
estrada e empreender algum reconhecimento no terreno, causando algum trabalho
extra para o responsável. Lembro-me como foi resolvido o abastecimento do
exército cristão por ocasião da conquista de Granada no sul da Espanha. Fui
entender o seu significado pleno só mais
tarde no Brasil. Em 1491 quase não havia estradas construídas naquela região.
Os alimentos necessários para o exército que fazia o cerco, teve que ser
providenciado de longe, no lombo de mulas. Também lá deve ter sido um
espetáculo grandioso, observar durante o
dia o ininterrupto subir e descer das mulas pelas trilhas e ouvir por toda
região o tilintar de centenas de sinetas.