Depois
de frustradas as tentativa de implantar um projeto de colonização, no Rio
Grande do Sul, os dirigentes da Sociedade União Popular foram em busca de uma
área em Santa Catarina. Ao longo da margem direita do rio Uruguai, no extremo
oeste daquele estado, uma companhia protestante adquiria 2000 quilômetros de
floresta virgem. Em 1924 ofereceu à Sociedade União Popular 500 quilômetros da
porção mais ocidental, na fronteira com a Argentina. Na biografia do Pe. Rick o
Pe. Rambo deixou a observação: “A compra foi acertada após longas negociações.
As terras ofereciam uma vantagem rara no sul do Brasil. Não havia dúvidas sobre
a legalidade dos títulos de propriedade nas mãos dos donos”. (Rabuske, Arthur,
Rambo, Arthur, 2004, p. 59).
O
Pe. Rick descreveu a sua primeira viagem à região nos seguintes termos:
Em inícios de 1926, quando
o término das intranquilidades revolucionárias permitiu uma colonização
organizada, viajei em companhia do Sr. Faulhaber (diretor da companhia de
terras) e dos irmãos Stangler até Barril, e de lá, na estrada em construção até
Porto Feliz (sede da colonização protestante), para, no dia seguinte, descermos
o rio Uruguai num barco a motor. Pernoitamos ao relento e, ao amanhecer do dia
seguinte, chegamos ao rio Macaco, onde encontramos um agrimensor alemão de nome
Mayentzhüsen. Em nossa volta erguia-se a floresta virgem. Os conhecedores da
região diziam que os solos eram excelentes. As árvores eram vigorosas, mas as
madeiras nobres haviam sido roubadas por balseiros argentinos. (Rabuske, Arthur
- Rambo Arthur. 2004, p. 59)
O
ano de 1926 pode ser considerado como fundamental e decisivo para a colonização católica do
extremo oeste de Santa Catarina. Foram realizadas quatro reuniões da Diretoria
da Sociedade União Popular para tratar da aquisição da área e dar início à
colonização. A primeira dessas reuniões teve lugar no dia 25 de janeiro de 1926
em Santa Cruz do Sul, a segunda no dia 28 de janeiro também em Santa Cruz do
Sul e a terceira, com a participação dos delegados, em Novo Hamburgo, em 16 de
março e a quarta, só com a Diretoria, em 6 e 7 de junho do mesmo ano.
As terras ofereciam uma vantagem rara no sul do Brasil. Não havia
dúvidas sobre a legalidade dos títulos de propriedade, nas mãos dos donos”.
(Rabuske, Arthur – Rambo, Arthur. 2004, p.5)
Porto Novo
O
ano de 1926 pode ser considerado como o começo definitivo da colonização no
estremo oeste de Santa Catarina. De quatro reuniões da Diretoria da Sociedade
União Popular saiu a decisão da compra da área pela qual deveria começar o
projeto. Na ata da primeira dessas
reuniões realizada em Santa Cruz do Sul em 25 de janeiro de 1926, constam
detalhadamente os dados sobre a aquisição dos primeiros cem lotes. O Senhor
Herrmann Faulhaber diretor da Empresa Chapecó-Peperi Ltda, proprietária do
complexo de terras e o Secretario Geral da Sociedade União Popular, Pe Johannes
Rick, seu presidente, Senhor Jacob Becker, o Senhor Albano Volkmer, gerente
geral da Central das Caixas Rurais e
outros integrantes das Caixas e delegados, acertaram os termos da aquisição dos
primeiros cem lotes no valor total de cento e dez contos (110:000$000) ao custo
de um conto e cem mil réis (1:100$000) o lote. Nos acertos iniciais entrou
ainda o compromisso de a Companhia Chapecó-Peperi Ltda. construir uma estrada
entre Porto Feliz (Mondai) e Porto Novo. A ata registra ainda as tratativas
envolvendo a infra-estrutura e a expansão da área a ser colonizada. Ao molde de
Serro Azul Porto Novo deveria evoluir como uma colonização étnica e
confessionalmente identificada. (Maiores detalhes sobre o a história posterior
e evolução do empreendimento podem ser encontrados em “Somando Forças – O
projeto social dos Jesuítas no sul do Brasil – do autor do presente capítulo).
A
data oficial da fundação de Porto Novo
ficou sendo 11 de abril de 1926. A liderança do primeiro grupo de pioneiros
coube o Pe. Max von Lassberg, veterano fundador das fronteiras de colonização
de Serro Azul, Santo Cristo, San Alberto e Puerto Rico, no alto Paraná na
Argentina. Rezou a primeira missa à sombra do primeiro laranjal cultivado em
Porto Novo. Ele anotou em suas “Reminscências”.
Dessa forma chegamos em
Porto Novo no sábado. Não havia nem casa, nem cabana, nem barraca, mas um
bonito pomar de laranjeiras. Nele acampamos, mais de trinta pessoas e acendemos
vários fogos. Perto da noite começamos a arrumar entre as árvores o altar para
a missa da manhã seguinte. Como pano de fundo, estendemos uma capa limpa entre as árvores e fixamos nela um
crucifixo. A mesa foi armada com varas e folhas e depois ornamentada. Amarramos
as velas em duas estacas fincadas no chão. Depois de cuidar das coisas de Deus,
cuidamos também de nós. Para comer tínhamos o suficiente e cada qual arrumou a
cama onde como lhe agradou. Dormimos bem. O misterioso rumor do grande rio misturou-se
com os nossos sonhos. A santa missa começou pelas oito horas da manhã. Os
homens rodearam o altar numa atitude solene e piedosa. Na magnífica catedral de
Deus, por meio do Santo Sacrifício, imploraram a bênção para a nova colônia.
(Reminiscências. 2002, p. 124)
Os
trinta pioneiros que acompanharam o Pe. Lassberg, procediam de Serro Azul,
Santo Cristo e Selbach. Considerando que as duas primeiras colonizações, contavam
com menos de trinta anos desde a sua fundação e a terceira não muito mais, uma
boa parte deles havia participado da
abertura dessas fronteiras. Foram os herdeiros autênticos da estirpe de homens
e mulheres que ousaram abandonar tudo na Europa, enfrentar o oceano e construir a vida e o futuro no Brasil. Deve-se isso a
um misto de espírito aventureiro, de inquietude, de vontade de progredir sem
parar e à mística quase messiânica de uma missão a cumprir.
Uma
grande admiração, um reverência atávica deve ter-se apoderado dos exploradores,
ao contemplarem aquele majestoso cenário de florestas intocadas. Bem como seus
ancestrais germânicos do centro e norte da Europa, souberam encarar a mata
virgem como promessa de um porvir promissor.
No Paraná – uma nova
fronteira?
No
decorrer da década de 1950 foram adquiridos os últimos lotes postos à venda
pela Sociedade União Popular no este de Santa Catarina. O crescimento
vegetativo da população continuava no mesmo ritmo das décadas anteriores. Aos
excedentes da região colonial mais
antiga, somavam-se os da Serra, Missões e Alto Uruguai e, por incrível que
pareça, o fenômeno já emitia os primeiros sinais de alerta em Porto Novo,
passada apenas uma geração da sua fundação.
Diante
dessa realidade, e tendo em vista os empreendimentos bem sucedidos de Serro
Azul, Santo Cristo e Porto Novo, os dirigentes da Sociedade União Popular
focaram suas atenções sobre o oeste do Paraná, já que no oeste de Santa
Catarina não havia mais terras
disponíveis com área suficiente. Grandes complexos de mata virgem aguardavam o
momento de cederem lugar a terras cultivadas. A qualidade do solos e a
topografia pouco acidentada eram um convite irresistível. O aproveitamento
integral, inclusive com emprego de máquinas, acenava para um futuro promissor.
Conforme a Ata da Reunião da Diretoria, de 26 de março de 1954, deliberou-se
sobre um novo projeto de colonização. Na ocasião, reuniram-se os membros da diretoria, o presidente, Antônio
Campani, o secretario geral, Dr. Arthur Fischer, o segundo conselheiro José
Wiest. Convidados haviam sido o Pe. Balduino Rambo e o secretário itinerante,
Pe. Albano Berwanger e o responsável pelo departamento de colonização. O Dr.
Arthur Fischer mostrou aos presentes como os últimos lotes de Porto Novo não
demorariam a serem vendidos; como o número de candidatos à compra de terras
crescia de dia para dia; como, por isso, urgia partir para um novo e amplo
projeto de colonização. As terras na mira da diretoria situavam-se no oeste do
Paraná, concentradas ao longo do rio Capanema. O Dr. Fischer comunicou que
haviam sido feitos entendimentos com a “Fundação
Paranaense de Colonização e Imigração”, com sede em Curitiba. Para o começo do
novo núcleo de colonização, a Sociedade União Popular pretendia adquirir 1500
lotes medindo dez alqueires cada um, no município de Foz do Iguassú. Até uma
minuta de contrato de compra havia sido elaborada. As negociações, entretanto,
estagnaram nesse ponto, pois, surgiram dúvidas sobre a legitimidade de posse
daquelas terras, por parte da “Fundação Paranaense de Colonização e Imigração”.
Outro fator que levou à desistência dessa área foi o fato de muitos lotes já
terem sido escriturados em nome de terceiros.
Com
essa dúvida as negociações com a empresa foram encerradas e partiu-se para
outra alternativa. Veio então a oferta
da companhia “Pinho e Terra”, também com sede em Curitiba. As terras
oferecidas compunham-se de 1000 lotes de dez alqueires, numa extensão de vinte quilômetros de frente e doze de fundos,
pela margem esquerda do rio Iguassú. O complexo de terra fazia parte das possessões das “Empresas Incorporadas”
conhecidas como “Chopinzinho”. Os solos eram de boa qualidade e a estrada de
Pato Banco a Laranjeiras do Sul conferia à região um localização econômica
favorável. Uma vistoria mais detalhada, mostrou as terras de qualidade inferior
na parte alta, o afloramento da rocha, o
terreno pedregoso e, principalmente, as condições de venda exigidas por parte
da “Pinho e Terra”, levaram, à desistência do negócio.
A
terceira empresa a oferecer terras no
Paraná foi a “Clevlândia Industrial e
Territorial”, também na margem esquerda do rio Iguassú, a jusante das terras da “Pinho e Terra”. Em
1954 uma comissão formada pelo Pe. Balduino Rambo, o Senhor Albino Both e o Dr.
Mário Fontana, sobrevoou a área, com foco no complexo “Missões”, localizado em
ambas as margens do rio Capanema. À
primeira vista constataram-se, entre os aspectos positivos, a ausência de
intrusos, a mata “branca”, sinal de bons
solos, topografia suave, abundância de mananciais e fontes. Uma comissão maior
formada pelos Padres Balduino Rambo e Luiz Sehnem, os Senhores Egon Berger,
Bruno Lengert, Albino Both, Willi Eich, Bernardo Macke, Bruno Werlang, Bruno
Eidt e Albino Franz examinou a área por terra.
No relatório a comissão foi unânime em afirmar que as terras
vistoriadas, pela sua localização, acessibilidade, características
edafológicas, topográficas e climáticas, satisfaziam plenamente às condições
estabelecidas pela Sociedade União Popular.
A
análise dos títulos de posse, entretanto, demonstrou haver sérias dúvidas sobre
a lisura de uma série de negociações efetivadas, relativas à legitimidade da
segurança legal da posse daqueles complexos de terras. Em resumo a conclusão
levou à desistência também daquela área. O desfecho frustrado do empreendimento
foi comunicado ao público da Sociedade União Popular pelo Pe. Balduino Rambo,
no nr. 8. Do Skt. Paulusblatt de 1954.
Quando há dois anos e meio
viajamos para o Paraná, não tínhamos a menor ideia das incríveis confusões
envolvendo a posse das terras. Inclusive a área oferecida pelo governo mostrou-se
insegura e envolvida em processo. São circunstâncias que talvez pouco
interessam aos especuladores de terra e aos intrusos. Nós, entretanto, não nos
permitimos fundar uma colônia, sem sentirmos chão firme debaixo dos pés. Além
disso, a tarefa colonizadora da Sociedade União Popular não é somente uma
questão de dinheiro, é também uma questão de consciência. (Skt. Paulusblatt.
Nr. 8. 1954. P. 218)
Esse
comunicado publicado no órgão oficial da Sociedade União Popular por seu
redator soa como a decisão final, sobre o terceiro grande projeto de uma
colonização étnica e confessionalmente identificada. Encerra-se assim também o
atendimento a um dos objetivos estabelecidos para a Sociedade União Popular por
ocasião da sua fundação, isto é, “preocupar-se com novas colonizações para
católicos” com se previa no item 4, nº. 2 do esboço dos estatutos.