Para evitar contratempos na implantação da nova fronteira de colonização a Associação dos Agricultores tomou algumas providências. Entregou a Diretoria Central a responsabilidade a competência para da andamento e execução à obra. Além disso foram tomadas outras iniciativas para facilitar a consolidação da obra. Obedecendo ao disposto na resolução de nº 7 da Assembleia Geral, em cada município foram credenciadas uma ou duas pessoas para orientar os candidatos à emigração para a nova colônia. Essa providência tinha as suas razões. Estava em jogo um empreendimento de grandes proporções. Os desejosos de se estabelecer na nova fronteira de colonização eram, na totalidade, filhos de agricultores, simples, confiantes e até ingênuos, dotados de uma enorme vontade de construir o futuro em terras virgens e, não poucos, movidos por um tal ou qual espírito de aventura. Compreende-se assim que se generalizara um clima favorável para todo tipo de espertalhões aproveitarem-se da ocasião. Como sempre acontece em tais circunstâncias, apresentam-se aqueles que ofereciam terras quase de graça, outros vendiam terras inexistentes, outros ainda vendiam duas ou mais vezes a mesma colônia. Prometiam-se våantagens e facilidades impossíveis e sempre havia os desavisados que se deixavam enganar. Por isso, pessoas bem informadas sobre os detalhes da colonização e merecedoras de confiança tinham condições para diminuir em muito esses riscos.
Mais duas providências foram acrescentadas que podiam ser aplicadas também em iniciativas de colonização fora da jurisdição da Associação dos Agricultores, em colônias estaduais como de Santa Rosa, municipais como de Santo Ângelo, de companhias colonizadoras particulares ou mesmo empreendimentos de pessoas físicas, já em andamento na região da Serra e avançando para o Alto Uruguai. Insistiu-se que, em primeiro lugar, que os colonizadores formassem, quanto possível, grupos maiores de pessoas que se conheciam. Desaconselhava-se a dispersão entre colonos estranhos. Esse tipo de medida tinha como objetivo imediato facilitar o começo de uma nova vida em situações normalmente precárias. Facilitaria também a organização de novas comunidades. Houve também consenso entre os participantes da Assembleia, católicos, protestantes e italianos e que o povoamento se desse à base de comunidades confessional e etnicamente identificadas. Essa preocupação ficou expressa na resolução de nº 9 da Assembleia: “Ao se tratar de assentamentos novos, expressou-se o desejo generalizado de que fosse sugerido o critério da separação por confissão religiosa”.
Fazer da confissão religiosa um critério para orientar novos assentamentos, pior ainda por etnia, soa aos ouvidos de hoje como algo inaudito, um contrassenso, um atentado de tudo que se prega por aí como sendo politicamente correto, sobre inclusão e outras palavras de ordem. Na primeira década do século XX, porém, figurava entre os procedimentos perfeitamente normais. Embora na Associação dos Agricultores, católicos e protestantes, padres e pastores, representantes da colônia italiana e do meio luso-brasileiro, analisassem e debatessem juntos a problemática colonial e, unidos, procurassem soluções para todo o tipo de desafio, contudo sob o aspecto teológico e doutrinário assim como no cultivo das tradições de cada um permaneciam cada qual fiel à sua. O respeito mútuo pautava o relacionamento confessional e étnico. De um depoimento publicado no “Bauernfreund”, nº 5, 1903, p. 37, consta:
O que se pode prever é que a Associação contribuirá grandemente para a preservação do relacionamento confessional pacífico entre católicos e protestantes. Pois, logo nos primeiros contatos muitos dos irmãos da outra confissão mostraram vontade e determinação de se filiarem à Associação. E, de fato, a Associação compõe-se hoje de quase metade de protestantes, uma prova de que eles não se orientam por uma mentalidade estreita e exclusivista e, ao mesmo tempo, constitui-se numa prova de que na colônia reina um espírito de boa convivência entre os irmãos separados pela religião.
Um outro aspecto da questão mercê ser apontado. Estamos a 6 décadas do Concílio Vaticano II. Um católico casar com uma protestante ou vice-versa, acarretava numa série de inconvenientes e obrigava à sujeição de cláusulas canônicas hoje ultrapassadas. Ao católico proibia-se servir de padrinho num batizado protestante. Frequentar o culto numa igreja evangélica era interpretado como uma atitude herético, passível de excomunhão. De outra parte, não se admitia padrinho protestante em batizado católico e o cônjuge protestante num casamento misto, era obrigado a prometer educar os filhos como católicos, e não interferir nas convicções do parceiro ou parceira. Para as gerações do começo do terceiro milênio, fica difícil de entender esses preceitos canônicos. Acontece que até o concílio Vaticano II, faziam parte dos critérios que regulamentavam as relações interconfessionais entre católicos e protestantes.
Certos ou errados os critérios utilizados, discutível ou não a orientação seguida, católicos e protestantes foram capazes de deixar de lado as diferenças e as querelas de natureza doutrinaria e confessional, para naquelas circunstâncias únicas, para unidos, colocarem os fundamentos da sociedade colonial no noroeste do Rio Grande do Sul no começo do século XX. E, enquanto é possível avaliar acertaram o rumo e escolheram as estratégias corretas e empregaram os meios eficazes. O resultado está aí para comprová-lo. Nas Missões, no Alto Uruguai e na região da Serra fervilha em centenas e milhares de propriedades, uma próspera atividade agrícola em constante crescimento. Os métodos e as técnicas acompanharam a evolução da história. Modernas rodovias substituíram as precárias trilhas de cem anos passados. Os resultados da produção avolumam-se a cada ano, agroindústria e o agronegócio estão em alta. Espalhada pela colônia ou concentrada em vilas e cidades de tamanho pequeno ou médio, vive trabalha uma população progressista e próspera.