Deitando Raízes #39

Capítulo oitavo
Os veteranos da colônia e os retratos
de membros proeminentes da comunidade
Quando falamos dos veteranos de Bom Jardim, não nos referimos apenas àqueles cidadãos que participaram de guerras e nelas colecionaram louros. Incluímos entre eles muitos homens que chegaram a uma idade mais avançada do que a maioria dos compatriotas e, como veneráveis testemunhas do passado, viveram longo tempo entre a geração mais nova. Enumeramos entre eles todos aqueles que, nas mais diversas atividades, tiveram uma influência maior ou se distinguiram  de alguma forma. É mais do que justo de que a sua memória  se mantenha viva entre nós. Devem perpetuar-se em nosso meio como o cume das montanhas da nossa terra, ou como os gigantes da floresta virgem, na qual foram pioneiros. Da sua memória projetaram-se muitos ensinamentos para a presente geração e  continuam vivos entre nós como exemplos, embora já falecidos e sepultados.
Antes de nos ocuparmos individualmente com cada um recordemos os costumes daquele tempo.
Johannes Finger conta:
"No começo reinava entre nós a maior e a mais sonhada harmonia. Ninguém de nós possuía alguma coisa e por isso mesmo não se conhecia inveja, vaidade, vício e motivos de desunião. A veracidade e a honestidade era outra virtude que florescia entre nós. Posso afirmar sem exagerar que se mente mil vezes mais do que então. Hoje quase não se pode areditar no que se fala, quando naquela época se podia confiar  na palavra de cada pessoa."
"Nosso espírito de poupança era exemplar. Poucas vezes havia música ou dança e todos em peso se faziam presentes. Não ocorriam pancadarias e não se bebia vinho do Reno. Não se invadia o salão de dança montado em cavalos. Não se quebravam os pescoços das garrafas por pura exibição e não se bebia cerveja Christina [1] que custa dois mil réis a garrafa. Guardávamos o dinheiro que se resumia em notas pequenas e moedas de prata e o poupávamos para os nossos filhos."
"As roupas (161) e a alimentação não eram tão refinados como o são hoje, traindo evidências de desperdício, especialmente no que se refere ao vestuário.  Éramos comedidos e discretos e nem por isso menos felizes e satisfeitos. Tínhamos trabalho mais do que o suficiente e, parece-me, que os ossos de nós velhos eram mais sólidos, os músculos mais fortes do que os dos nossos filhos e netos. Trabalhávamos no sol e para manter em forma nossas energias, não tínhamos necessidade da cachaça como tônico dos nervos. Talvez nos respondam: vocês dispunham dos escravos que trabalhavam em seu lugar. Puro engano, meus jovens senhores. Só  poucos colonos ricos tinham condições de manter escravos e não era o trabalho do negro que fazia alguém progredir. Tornamo-nos o que somos pelo nosso próprio esforço e conquistamos o que temos. Além disto o sistema de escravidão dos negros não nos agradava pois, quantas famílias brasileiras empobreceram apesar dos muitos escravos. Lembro-me sempre do espetáculo feio que observei no navio em Porto Alegre. Os negros, crianças e adultos, homens e mulheres, eram oferecidos para a venda. O preço oscilava entre 600 a 1.200 mil réis de acordo com a idade e a força. E como me revoltou o tratamento a que eram submetidos! Será possível que se tratem pessoas humanas como o capataz do mercador de escravos tratou os infelizes negros? Para mostrar que tinham dentes sadios bateu com o punho no queixo, fazendo estalar os dentes uns contra os outros, cena que me abalou até o íntimo. E que tratamento indigno foi dispensado aos negros. Mesmo na colônia foram privados do batismo! Tanto assim que, depois da emancipação em 1888 o nosso vigário Pe. Eultgen, batizou pessoas de bastante  idade. Haviam, portanto, permanecido pagãos por todo este tempo e isto num país que se declarava Terra da Santa Cruz."
Passemos agora dos rápidos registros  sobre as condições sociais, para as personalidades de maior importância, que se sobressaíram em nossa picada. Ocupemo-nos, antes de mais nada, com os profissionais. Antes de começar vejo-me obrigado a observar que todos nós éramos obrigados a tocar, em grande parte, todas a profissões. Além disto, porém, dispúnhamos de alguns homens versados em cada ramo.
O pai de Jacob Schmitt, foi um competente marceneiro. Na época morava na 48. Quando se pretendia algum móvel melhor, mais apurado, um armário por ex., uma mesa, uma cama, recorria-se a ele.
Jorge Eckert era um excelente sapateiro que, já no tempo dos Farrapos, trabalhava com cinco ou seis aprendizes. Sua moradia ficava lá onde hoje mora Nikolaus Schmitt. Quando os soldados apareceram nas redondezas, fugiu para o mato levando com ele todo o estoque de botas, sofrendo assim pouco prejuízo. Se tivesse ficado com os calçados e couros em casa, os numerosos fregueses que apareciam, teriam saqueado para valer a oficina.
Os alfaiates eram pouco procurados na época, porque cada qual encarregava-se de ser seu próprio alfaiate e não havia muita preocupação com calças finas e casacos bem talhados. Naquele tempo o provérbio: "o traje faz a pessoa", não tinha muita aplicação. Éramos homens sem que  os alfaiates nos fizéssemos como tais.
Guardo ainda boas lembranças de um certo ferreiro de nome Schatter Sortão  um homem honrado e leal. De manhã cedo junto à bigorna fazia acompanhar as vigorosas marteladas com uma alegre canção. Também o velho Schuler, na entrada da picada  não perdia para ninguém em aplicação, força e sua maneira de ser, para muitos um tanto rude.
Nem os açougueiros levavam seu ofício ao nível dos seus colegas de profissão de hoje. Na época abatia-se  no máximo a cada quatro semanas. Eu mesmo treinei o ofício durante 12 anos  com Jacob Müller. Um certo Herrmann era açougueiro na Estação. Os colonos não costumavam  carnear na sexta feira. De mais a mais não  consumiam muita carne, nos dias de abstinência nem pensar.
Os senhores médicos da época eram personagens bem diferentes dos de hoje. Lembro-me com satisfação do velho coronel Hildebrand de São Leopoldo. Socorria as pessoas com a melhor das disposições, sem cobrar demais. Qual é o doutor de hoje que cultiva ainda o espírito daquele homem honrado, que um dia afirmou: "Poderia  estar de posse de um barril cheio de onças, se não tivesse doado meus proventos a pessoas necessitadas."Também o velho Wolfenbüttel é credor de uma recordação honrosa em Bom Jardim. Queria muito bem às pessoas e com que cordialidade comunicava-se com os pacientes no seu dialeto holandês.
Foi desta maneira que Johannes Finger julgou os homens do tempo da sua juventude. Segundo o "Volksblatt",  o "Kosertiz Zeitung" escreveu sobre ele. “Em Bom Jardim às 11 horas em dezembro de 1896, com 81  anos de idade, entrou para o descanso eterno, o muito conhecido Johannes Finger, o conhecido o "Fingerhannes". Foi um dos primeiros povoadores da nossa região e, como costumava contar, participou de todas as alegrias e sofrimentos. É, portanto, um dos últimos representantes alemães e, como é previsível, em poucos anos  nenhum dos velhos veteranos estará mais entre nós. É obrigação nossa dedicar-lhes uma palavra de recordação e honrar a sua memória. O velho Fingerhannes era conhecido como uma personalidade singular, aberto e honesto, confiável nos atos e nas palavras. Creio que se pode afirmar que era um dos poucos que não tinha inimigos. Fazia parte dos membros mais assíduos da comunidade católica de Bom Jardim à qual pertencia e, por isto mesmo, ela lhe deve muito. Estava preparado para o seu fim, cansado e farto da vida. Descansa em paz, velho amigo, que a terra te seja leve”.
Se um homem, embora católico convicto, encontra tamanho reconhecimento nas colunas do "Koseritz Zeitung", nós da nossa parte não precisamos acrescentar nada. Só uma coisa queremos destacar. "Que estava farto da vida". Esta expressão tem no máximo sentido para um materialista, de maneira alguma para um católico. Da sua boca ouvimos muitas vezes. "Como Deus quiser. Estou pronto." E nos últimos tempos não se cansava em dizer ao sacerdote que o visitava: (163) "Padre, o  senhor precisa intervir com firmeza. Há tantos homens moços que não querem acreditar em Cristo. Sem a fé em Cristo a vida não tem sentido." Quando, pouco antes de falecer, arrastou-se penosamente até a igreja. Pediu a um dos netos que buscasse o padre com  recado que queria receber mais uma vez a Santa Comunhão.
Quando o padre apareceu ergueu as mãos para as arcadas da igreja e chorando disse: "Tudo isto é obra minha." Ao  padre que disse: "Deus te recompensará," respondeu: "Sim, eu o acredito e também o espero."  Mais tarde, no leito da morte, sua primeira palavra foi: "Padre, como é bom morrer perto do senhor." Por fim pediu que se colocasse o crucifixo sobre seu peito, presente do seu velho amigo Pe. Trappe, e que depois da morte fosse sepultado com ele. Que estava bem preparado para a morte ficou claro por uma declaração feita ao padre que lhe garantiu que estava pronto para a eternidade. "Rezo sempre de manhã e de noite e à noite também canto. Rezo também nas suas intenções." Um homem de fé tão robusta não está farto da vida, muito menos um grande devoto da Santíssima Virgem.
Acrescentemos uma pequena lembrança sobre esta última virtude. Quando nos dias úteis o padre escutava do altar o barulho de um terço nos bancos, ele podia ter a certeza: o velho Fingerhannes  está presente e está tirando o terço do bolso. É digno de nota também que ele como único homem destinou um mil réis para a coroa de Nossa Senhora, cuja aquisição fora decidido que seria tarefa exclusiva das senhoras. Para doá-lo desceu especialmente até a casa paroquial, como costumava fazê-lo muitas vezes, para cuidar da parreira, ou bater um papo tranqüilo sobre os velhos tempos que, por vezes, se prolongava até além do almoço.
Já que falamos do Fingerhannes queremos acrescentar uma curta biografia do seu sogro que, começou a vida cultivando  sua colônia na picada. Foi um verdadeiro pioneiro da mata virgem no verdadeiro sentido da palavra, forte, robusto, procedente  da região de Binger no Reno. Conforme o testemunho do Fingerhannes só dormia três horas.
O genro contou que de manhã comia uma manta de toucinho com pão. Este hábito pressupunha naturalmente um legítimo estômago alemão e grandes esforços no trabalho. Lavrava com a enxada e abria sulcos mais retos que um arado. No começo Isaías  Noll, este era o nome deste homem valente, semeava cereais, até que apareceu a ferrugem.
Mais tarde os cereais e a aveia voltaram a produzir, mas desta vez eram outras variedades. Conforme lembra o Fingerhannes, os porcos eram tão selvagens que  era preciso abatê-los  a tiro e não com se procede normalmente. Também o pão que era assado no forno à esquerda da entrada da casa, era tão áspero que machucava a boca. O Fingerhannes levou para casa a filha do velho Isaías Noll, ou melhor, mudou-se para a casa dela e viveu até o fim na colônia de Isaías Noll. Que ela lhe foi uma mulher fiel, conclui-se (164) dos hábitos cultivados até seus últimos dias. Muitas vezes na ida ou na volta da igreja, fazia uma visita à sepultura da mulher. Podia ser visto com o braço apoiado sobre a pedra, cobrindo o rosto com a mão e, não raro, as lágrimas descendo pelo rosto.
No dia 13 de setembro faleceu no Bohnenthal Michel Marmit, um homem  que, na verdade, fora um dos fundadores de Dois Irmãos. Mas pelo fato de ter passado os últimos anos na nossa paróquia e jaz sepultado no Bohnenthal, queremos render aqui um breve tributo à sua memória. Michel Marmit nasceu no dia dois de junho de 1814 em Waderriel (?) na província do Reno. Emigrou para o Brasil em 1827. Reproduzimos aqui a descrição da viagem conforme ele mesmo deixou registrado para os filhos.
"No oceano fomos surpreendidos por uma tempestade que nos jogou em todas as direções. Perdemos todos os mastros e, durante 14 semanas, boiamos entre a água e o céu. O capitão, os marinheiros e os emigrantes davam-se por perdidos. O capitão declarou que só Deus em pessoa poderia ajudar. Foi então que, católicos e protestantes,  decidiram fazer uma oração de contrição. As 700 pessoas ajoelharam-se, rezaram em voz alta e prometeram santificar o dia em que desembarcassem e escolher como patrono da igreja o santo daquele dia. E o que aconteceu? Em meio à angústia fez-se ouvir o troar de um canhão. O corpo do navio temeu e o povo ergueu-se. Neste momento ouviu-se um segundo estampido.
Era uma fragata a procura de navios em dificuldade. Amarraram o navio na fragata e arrastada por ela, cortando as ondas, desembarcaram no dia 29 de setembro em Rio Grande. Pouco depois de chegados apareceu o imperador D. Pedro I em companhia da esposa  e se pôs a conversar com os imigrantes. O príncipe herdeiro brincava junto ao cais, caiu nas ondas e, ao emergir pela segunda vez, foi salvo por Michael Marmit.
De lá a viagem seguiu até a Porto Alegre e depois em carroças até Sapucaia, depois até o Portão na casa de Georg Berg, onde ficaram alojados por quatro semanas. Em Dois Irmãos compramos a colônia de número 38 à direita por 140 mil réis. Erguemos a nossa moradia entre as raízes de uma figueira e entre animais selvagens ferozes. Em 1831, 12 homens construíram uma capela de madeira, consagrada no dia de  São Miguel pelo padre espanhol Antônio.  Segundo o relato de seu filho, o velho Marmit foi o primeiro a empunhar o machado e derrubar árvores para erguer uma casa de Deus na nova Pátria. Com sessenta anos costumava subir no telhado podre da igreja. As tabuinhas podres soltaram-se debaixo dos seus pés e ele escorregou até a beirada inferior do telhado. Conseguiu equilibrar-se e voltar ao trabalho com ânimo redobrado. Mais tarde foi construída uma igreja nova com ele sempre na liderança. Perdeu dois filhos na Guerra do Paraguai, Mathias e Peter. Todas essas vicissitudes não o abateram e, há seis anos, festejou as bodas de ouro em companhia da esposa e 11 filhos vivos. Todos os domingos e feriados peregrinava regularmente para a igreja, até oito de dezembro de 1896. Assim nos informou o filho Georg. Seu último desejo e derradeira vontade merece louvor e imitação. Ao falecer obrigou os filhos a doar 50 mil réis para a capela do Bohnental.
Um personagem moldado (165) de maneira diferente pelo destino foi o velho Mossmann. Suas vivências mostram o drama vivido por um emigrante na viagem para o Brasil.
Mosmann saíra do Hunsrück com a mulher e quatro filhos. O irresponsável capitão do navio desembarcou-os na costa do Pará  e, além disso, os fez atestar que ele tinha cumprido com a obrigação para com eles. Com isto se foi abandonando-os na praia deserta. Para os alemães começou então uma marcha penosa pela praia do mar, alimentando-se com farinha e cachaça. Por  causa do terrível calor eram obrigados a esperar pela vazante para caminhar sobre a areia úmida. No norte não havia estradas e os viajantes obrigaram-se a seguir pela costa. Muitas vezes os homens faziam a travessia dos pequenos rios com água até o pescoço, enquanto os negros do local carregavam as crianças nos ombros. Entende-se que, devido ao verão permanente, não precisassem de muita roupa. Uma calça, uma camisa e um chapéu de abas largas. Quando chovia guardavam a camisa dentro do chapéu e, satisfeitos, marchavam como índios improvisados. Parando a chuva tiravam a camisa de dentro do chapéu e deixavam as calças secar no corpo. Além dos Mossmann tomaram parte nesta viagem  as famílias Walter, Engerhoff, Gewehr e outras. Depois de uma marcha e 200 horas chegaram exaustos e maltrapilhos em Pernambuco. O homem dedicou-se à sua profissão de sapateiro enquanto a mulher pedia esmolas. Felizmente não necessitavam de muitos utensílios domésticos, nem sequer uma cama, porque não havia inverno no local. Depois de muita espera e incerteza o governo deu-lhes finalmente terra e pequenas cabanas, doação concedida também aos jovens de 20 anos. Cultivavam um certo tipo de batata, cana de açúcar e mandioca. Eles próprios preparavam a farinha torrando-a num forno. Embora próximos da cidade do Recife em Pernambuco, não lucravam nada com as hortaliças, porque as grandes formigas devoravam tudo. Começaram então a queimar carvão, carregando-o em cestos até a cidade, cinco horas distante.Valiam-se para isso de cavalos não castrados. levando-os pelo cabresto. Compraram os cavalos em estado lamentável dos tropeiros, recuperaram-nos com mandioca e cana de açúcar, dando-lhes um boa aparência. A família trabalhou durante oito anos e conseguiu ajuntar algum dinheiro. Não abandonaram o desejo de juntar-se com os alemães no sul, principalmente porque as crianças sofriam do mal da terra. Com o dinheiro custearam a viagem marítima até o  Rio Grande e sobrou o bastante para comprar meia colônia de Lavalt por 600 mil réis. Neste lote Mossmann construiu primeiro uma choupana, um rancho e mais tarde uma casa melhorada. Acabara de mudar-se para lá quando veio a Revolução. Mossmann ficou do lado dos Farrapos e passou as dificuldades das quais já falamos. Na medida em que a Revolução se aproximava do seu final, entregou-se ao ofício de sapateiro em companhia de dois rapazes e um aprendiz. Ganhou um bom dinheiro com as assim chamadas botas para as fazendas e sapatos para os militares. Dos oito filhos um faleceu em Pernambuco. Em 1844 Mathias Lauermann casou com a filha Rosina. Depois de um longo e feliz casamento faleceu em 1892 de uma morte súbita mas não sem estar preparada. Duas outras filhas, as pernambucanas, por terem nascido no estado de Pernambuco, casaram, uma com Philipp Renner e a outra com Carl Sänger. O próprio Mossmann faleceu em 1886 com a fama de um homem correto e trabalhador.




[1] Marca de cerveja inglesa importada

Deitando Raízes #38

Capítulo sétimo
O  progresso cultural na Colônia
Nosso século gosta de ser chamado de o Século da Ilustração e mesmo o Brasil considera-se um país com nível de formação. Mas não basta situar-se no século dezenove para participar do grade progresso. É indispensável para tanto o esforço de cada indivíduo em particular. Vale o mesmo para as colônias. Somente por meio do esforço individual será possível iluminar as cabeças dos moradores da mata virgem. Pergunta-se. Foi feito neste sentido todo o necessário para que se apropriarem de todos os conhecimentos de que o nosso tempo se orgulha? Para esta pergunta infelizmente somos obrigados a dar uma resposta negativa. O sol do século dezenove ilumina também o nosso  país, mas os raios da hodierna ciência não penetraram fundo na escuridão.  Dos colonos em geral e de modo especial dos de Bom Jardim, podemos afirmar sem receio, o nível cultural não é o que deveria ser. São poucos os que superam um nível modesto. Só uma  parcela dos adultos preservou destreza no ler, escrever e calcular aprendido na escola. A maioria nem alcançou um nível mais elevado nestes fundamentos da formação, devido a uma freqüência escolar muito curta e irregular. Dos católicos de Bom Jardim ninguém freqüenta uma escola mais adiantada. Até o momento não saiu nenhum sacerdote deste meio, nem seminarista nem professor público. No máximo alguns freqüentaram por algum tempo o Colégio de São Leopoldo ou a Escola Complementar de Dois Irmãos. Olhando em volta identificamos muito poucos que dominam o português ou alimentam pretensão por maior conhecimento.
Seria uma injustiça se não aceitássemos os motivos alegados para explicar essa situação negativa. A colônia é jovem como de resto a vida cultural em todo o país. Cabe em primeiro lugar  cuidar do progresso da vida material, antes de se permitir pensar numa formação superior. Objetamos. Mas já faz um bom tempo que a luta pela vida não é mais tão árdua. Por acaso não há muitos colonos que já conquistaram riqueza? O luxo com roupas, chapéus, selas para senhoras, arreios de prata, botas finas de cano longo e, sobretudo, as altas somas gastas no jogo, mostram que há dinheiro circulando e não raro muito dinheiro. Porque é gasto com coisas materiais? A resposta é: a juventude não alimenta desejos por uma formação mais aprimorada. Prefere nos dias úteis e nos domingos distrair-se com a caça e as diversões. Respondemos. Para que servem os pais se não é para orientar os filhos e chamar-lhes a atenção para os bens maiores da cultura? Será que os nossos descendentes estão condenados a formar um povo inculto?
Pais responsáveis (152) com certeza não o desejarão seriamente. Uma outra desculpa. Não sobra tempo para coisas desse gênero. Durante a semana é preciso trabalhar e no domingo é preciso recuperar-s de alguma maneira do cansaço. Não negamos para ninguém, nem aos velhos, nem aos jovens alguma  diversão. Acontece que o aprender também pode ser uma forma de lazer, depois do esforço físico durante a semana.
O que impede que nos domingos se dediquem algumas horas à formação? Com certeza há muitas oportunidades para ampliar os conhecimentos, oportunidades que não faltam em Bom Jardim. Não são poucos os que pensam que a formação é de todo inútil. Continuemos a viver como os avós e bisavós e tudo está em ordem. Isto não passa de um julgamento precipitado. Os antepassados dos colonos atuais trouxeram uma boa formação escolar e a transmitiram aos filhos. Mas com o tempo esses conhecimentos  herdados, foram enfraquecendo, como mostra a experiência. Quem ousaria afirmar que a geração de hoje possui o mesmo nível de conhecimentos dos imigrantes? Assim é de todo falsa a afirmação de que hoje se procede da mesma maneira como os antigos. Encontramo-nos, sem dúvida, numa situação de inferioridade. E nos perguntamos: como será o futuro. De mais a mais, os colonos de hoje têm motivos muito mais sérios para se interessar por uma boa formação do que nos tempos passados. Ela é indispensável para o exercício da cidadania. Numa república compete ao povo governar-se a si mesmo. Perguntamos: Como é possível que uma pessoa inculta participe do governo? Nem sequer será um bom eleitor, muito menos um escrivão, juiz distrital e, em deputado em Porto Alegre ou, quem sabe, no Rio de Janeiro, nem pensar. Faltam-nos homens para discursar em  concentrações populares ou em reuniões de associações, em ocasiões como eleições municipais ou em outro nível. Acontece que um homem que sabe apresentar-se em público, vem a ser um fenômeno entre nós.
Porque razões é tão diferente em outros países? Porque lá se tem a formação e os conhecimentos em alta conta e se fazem  esforços para promover a formação própria ou, pelo menos dos filhos, entre os quais há belos talentos. Aliás a formação é necessária para a atividade econômica, para agricultura, para a indústria e o comércio. O agricultor sem formação nem de longe tira o proveito da sua terra, quanto aquele um pouco mais culto. Não tem visão do futuro e movimenta-se numa eterna rotina que, apesar de todo o empenho da força física, termina reduzindo à esterilidade a sua terra como ficou evidente quando foram escritos os artigos sobre a questão das florestas na região colonial. Como é que um profissional se aperfeiçoa quando não lê e não se informa sobre os grandes progressos, que acontecem em outros lugares? Um comerciante que não entende de leis e não conhece regulamentos, não pode deixar de operar no prejuízo. Além disto a formação é da maior importância para a vida da Igreja. Somente aquele que continuar se instruindo estará em condições de não perder a cabeça e de ter uma resposta para muitas acusações e objeções, com que os descrentes atacam hoje a Igreja. Pois, quem defenderá a Igreja nos nossos dias? O Estado se retirou e não tardará em combatê-la  aberta ou veladamente. Restará o povo católico a quem caberá assumir a defesa do cristianismo. Significa uma missão nobre e gloriosa, tarefa a ser cumprida pelos leigos de hoje. E, sem formação, estarão eles em condições de duradouras para assumi-la? Com muita dificuldade, sem dúvida, de acordo com a opinião dos que têm consciência dessa realidade. Finalmente a formação constitui-se numa condição  indispensável para a vida em sociedade do nosso tempo. (153) Quem quer ser visto como uma pessoa sem formação, quem quer passar por ridículo perante seus concidadãos, quem quer ser passado para trás ? Só mesmo um louco.
Mas muitos dos que concordam com  as nossas considerações, perguntarão: Como continuaremos a nossa formação, já que não dispomos de nenhum recurso aqui na mata virgem? Quero apontar apenas três  meios disponíveis para os moradores de Bom  Jardim. Temos em primeiro lugar a Escola Complementar. Foi criada há poucos anos pelo vosso zeloso  vigário Pe. Pedro Gasper e já colheu belos frutos. Porque não são mais os pais que mandam os filhos para esta escola nos domingos à tarde?
Um segundo caminho de acessos fácil à formação, também fruto do esforço do vosso pároco, são as associações  para rapazes e homens. As freqüentes apresentações de peças de teatro são prova da sua contribuição para com elevação e a difusão da  cultura. Porque a filiação a essas associações não é mais numerosa, contribuindo para infundir-lhes mais dinamismo e entusiasmo.. Os sacerdotes estão dispostos a dedicar-se com entusiasmo e investir com as habilidades de que dispõem.
Os jornais e livros constituem finalmente o terceiro meio. O que neles se lê deve ser verdadeiro e decente. O que um católico encontrará de útil, por ex.,  nos jornais liberais que circulam por aqui? Neles a doutrina da Igreja, a própria doutrina cristã é, propositadamente distorcida, zomba-se dos costumes católicos e as ordens religiosas são desprezadas e perseguidas. Porque um filho da Igreja ficaria indiferente a tamanhas calúnias contra a fé, mais ainda, contribuir com o seu dinheiro. Seria o cúmulo da falta de juízo e grosseira ingenuidade. Se quiserem informações úteis, assinem o "Deutsches Volksblatt", o veículo do seu partido e irmãos de fé. Ocupa a dianteira por muitas milhas todos os jornais  em língua alemã, não só pelo número de assinantes quanto, sobretudo, como porta-voz da informação e do verdadeiro progresso.
Se alguém quiser oferecer à família toda algo de atraente e instrutivo, assine "Stadt Gottes" ou "Zeitschrift für die Christliche Familie". Encontgrará neles  tudo o que há de novo na Igreja, no Estado, na Arte, na Ciência, na Indústria e Comércio. Os números de cada ano encadernados são uma fonte de laser e ensinamento. Os volumes anuais podem ser entregues aos filhos como peças de herança, fazendo com que nas famílias que se fundam  se disponha de uma fonte sadia de formação. Por motivo de consciência um pai de família não pode permitir que jornais e livros  maus entrem na sua casa. Com eles entra na família não somente a incredulidade e a imoralidade como fica comprometida também a felicidade temporal dos pais e dos filhos. Não poucos ingênuos bem intencionados acreditam que estas matérias não lhes causam danos, porque são capazes de distinguir o verdadeiro do falso. Essa opinião não passa de um enorme equívoco. Como a chuva que, por dias, cai sobre o chão não deixa de amolecê-lo, um mau jornal não deixa de levar às piores conseqüências.
Imperceptivelmente (154) mas sem parar os erro e os falsos princípios permeiam a alma, minam a solidez dos princípios e dominam o homem todo com a sua maneira de ver e sentir sem Deus. A água caindo ininterruptamente destrói a pedra dura. (água mole e  pedra dura tanto dá até que fura). Da mesma forma a falta de fé  rói e destrói as convicções mais sólidas. Acontece que, às vezes, as conseqüências deploráveis de tais leituras que surpreendem com tristeza  toda a família, manifestam-se apenas mais tarde. Um católico muito fervoroso observou por ocasião de um suicídio: É o resultado das longas más leituras.
Mais cedo ou mais tarde manifestam-se os serros infiltrados no espírito e então, na maioria dos casos, já é tarde. Se alguém lê apenas bons livros, tem o espírito instruído, enobrecido o coração e, em dias difíceis, e a verdade lhe dar-lhe-á segurança. 
Para a colônia faz falta uma verdadeira Ilustração. Não queremos nada com a falsa. Da sua semente nascerá sem tardar a desgraça e a miséria.
Pode-se concluir de que, com o progresso da "inteligentia" as coisas não se encontram no nível em que deveriam estar. Ainda mais lamentável é o fato de que a média do povo católico sofre em parte ainda do velho obscurantismo, que custa ser superado. Santo Tomás de Aquino o chama de sobras do paganismo e uma reflexão serena nos leva a dar-lhe razão. Falamos do que se costuma chamar de superstição, praticada inadvertidamente por muitos católicos e por isso não imputável, por terem crescido neste meio.
Esse lamentável atraso alastra-se em três direções. De um lado  é a curiosidade em saber o que o futuro reserva escondido no seu seio misterioso, algo alegre ou algo triste, uma curiosidade muito natural, mas que facilmente leva a descaminhos. É sabido que pessoas de formação aprimorada entregam-se a essa loucura, de modo especial nos dias de hoje, que tanto se orgulham com a sua "luz".  É fato conhecido também que os adeptos ilustrados da superstição procuram, não raro, revelações impossíveis pagando preços altos para os adivinhos e cartomantes. É verdade que na colônia não se chegou ao ponto das grandes cidades. Apesar disto temos informações de que esse tipo de erva daninha viceja em alguns lugares na sombra escura da mata virgem. Consta, por ex., que uma certa mulher lê o futuro numa velha peneira. A bruxa, como a chamaríamos, serve-se de uma tesoura. Não nos arriscamos a julgar se pretende livrar as pessoas, cortando os defeitos e as aberrações que se encontram no caminho das pessoas.
O certo é que, com revelações do tipo quantos filhos uma mãe ainda pode esperar, ou qual a cor da barba do futuro marido, não poucas vezes confunde e atemoriza  o espírito infantil das pessoas, ou, como já ocorreu, arruínam a paz doméstica e provocam a discórdia na família. Façamos a pergunta tranqüila e sensata: Como é que uma mulher velha chega a se apropriar de tais  conhecimentos, não revelados às pessoas mais instruídas? Diante mão não é aceitável que Deus e os anjos transmitam este tipo de mensagens aos vaticinadores. (125) De forma alguma o misterioso futuro pode ser conhecido pela posição do sol, pelas linhas das mãos, pelo estridular do grilo, ou pelas configurações estranhas formadas pelo chumbo derretido despejado na água. Não resta outra coisa à pessoa que reflete do que atribuir ao inimigo maligno, fatos que nem a natureza  nem a Revelação  à luz da razão explicam, quando constatados e não forem meras ilusões. Por isso a consulta aos adivinhos era castigada com a morte No Antigo Testamento, não porque o espírito maligno não está em condições de prever com certeza o futuro, mas porque o simples pedido direto ou indireto dirigido ao inferno, constitui-se num crime digno da morte. A razão está no fato de que, por esse procedimento, o anjo decaído é igualado a Deus.
De maior significado é, digamos abertamente, uma outra superstição pagã. Falamos dos rituais (Brauchen) sobre cuja condenação poucos tem clareza. Como os leitores  devem saber há em algumas picadas certas pessoas, homens e mulheres, que simulam ter mais conhecimentos do que os demais. São os curandeiros e médicos que sem terem estudado, algumas vezes realizam curas de males, como se afirma, em que médicos experimentados falharam.  Quando se trata de recolocar no lugar um braço e um pé destroncado, recorre-se confiante a um milagreiro de identidade duvidosa. O sujeito apenas assopra sobre o membro machucado, faz alguns gestos cabalísticos, aperta aqui e acolá, murmura algumas palavras incompreensíveis, quem sabe até piedosas e a perna se alinha e o tendão vai para o lugar, a junta se move, o unheiro morre, a erisipela perde a cor. Em poucas palavras a doença some como que por encanto.
Mas não é só o homem como também os animais se livram com facilidade de males graves. As larvas somem das feridas, a ferida fecha e cicatriza e em lugar da magreza forma-se uma pele lustrosa e carne gorda. O milagre aconteceu. Não negamos que tais curas acontecem   e até concedemos que são freqüentes. Por isso ouve-se seguido a observação: "contudo ajuda" e um segundo acrescenta com ar piedoso: "Com certeza ajudou," e um terceiro grita alegremente: "E ajudará sempre."
O que dizer a isto? Que o recurso de fato ajuda ou vai ajudar, ainda não é prova que seja permitido. Sobre isto decide naturalmente o fato de o recurso estar em sintonia com os ensinamentos da fé católica. Pergunta-se então: Afinal os meios de cura de que falamos podem ser considerados permitidos? Permitidos em princípio são aqueles que a natureza e suas potencialidades nos põe à disposição. Por isso a ninguém é proibido recorrer aos conselhos de um médico experimentado e valer-se dos medicamentos prescritos.
Porque então os médicos não se valem dos mesmos recursos  dos feiticeiros? Faltam-lhe, por acaso, os conhecimentos sobre os potenciais da natureza das diversas ervas, sais, infusões, ou do corpo humano? Afinal para que servem os médicos e porque estudam tanto, se um indivíduo  ignorante entende  mais do que qualquer um deles? Porque não recorrer ao estranho "hocus pocus", [1] que se aprende com facilidade? A resposta talvez seja: (156) porque se trata de um talento individual, um dom da natureza único, inato e por isso não se aprende.
Mas, pergunto, donde sabes  que se trata de fato de um meio natural e que não haja outra explicação? Basta observar o cerimonial e as perguntas ridículas por meio das quais se pretende realizar as curas ou, de fato, se realizam. Por acaso essas cerimônias não apontam claramente para uma ajuda de outra natureza, de que o curandeiro é dotado? Um curandeiro desses diz, por ex., "Frederico tem o pé destroncado, Jesus foi pelos judeus pendurado. Como o estar suspenso não prejudicou a Jesus, o destroncamento não te prejudica." Como é que essas palavras e a invocação dos nomes mais sublimes são capazes de curar por si? Se não têm esse poder qualquer um está em condições de curar um pé destroncado, o que não é o fato. A prova está no fato de se recorrer apenas a determinadas pessoas.
Além disso cada pessoas sensata deveria formular a seguinte pergunta: afinal  o que confere a essas palavras, simples palavras tamanho poder? qual a resposta para essa pergunta? Por acaso quer dizer que Deus relaciona o efeito com a fórmula? Nesse caso estará obrigado a provar como e quando e, além disto, mostrar por que via chegou ao seu conhecimento. É evidente que a resposta lhe causará embaraço e o obrigará a confessar publicamente a sua ignorância. Concede com isto que pratica algo para o qual lhe falta a base suficiente. Portanto, pratica algo que lhe é estranho e não o consegue explicar, nem por causas naturais, nem pela intervenção de Deus. Novamente não há outra saída a não ser concordar que a ajuda tem sua origem em algo que não pode aceitar. Mas, posto que a cura venha do espírito maligno, o que em casos em que os recursos naturais não são suficientes, deve ser admitido, porque nós homens  atormentados não sentimos alívio, mesmo se buscamos a solução no inferno? A simples pergunta  demonstra em que estado de espírito as pessoas se encontram. Olhemos para o Salvador no deserto.
A terceira tentação pela qual foi prometido ao Salvador o reino  da terra com a glória do mundo, terminou também com a repulsa do tentador: "Retira-te, satanás."
E como ficamos nós se insistimos: (157) "contudo ajudou". Suponhamos que as pedras se tivessem transformado em roscas e cucas para o Kerb ou o Salvador descesse num para-quedas  diante das pessoas estupefatas no templo. Teria por acaso triunfado? Com certeza não. Estaria derrotado e teria sucumbido à tentação.
E como palavra final: Adorarás somente a Deus e servirás apenas a Ele e não ao demônio, nem na mínima coisa, nem nas situações mais prementes. Essa deve ser a posição do verdadeiro católico. Devo servir a Deus mesmo que não tenha  pão para comer ou tenha que submeter-me a outros sofrimentos. Como é vedado aceitar o alimento corporal das mãos do demônio, assim está proibido aceitar da sua mão o remédio, nem para a saúde do filho, nem da mulher.
De outra parte os assim chamados milagreiros mostram claramente em nome de que poder e de quem agem. O próprio mistério com que envolvem o seu cerimonial, a negação descarada de suas práticas suspeitas perante o sacerdote, não recomenda as pessoas que se valem de tais práticas. A tudo isso soma-se a teimosia, o orgulho e, não em último lugar, a ganância imunda, fazendo aparecer a inconfundível pata do diabo.
Portanto as curas e as libertações de males que de fato acontecem, de forma alguma são sinais de que os cerimoniais sejam permitidos. Mesmo que as feridas do corpo sarem,  não significa ainda algo de positivo para um cristão. Pelo contrário. Exatamente por meio desses benefícios aparentes, a pessoa enreda-se cada vez mais nas malhas do inimigo maligno e estimulado a confiar nas falsas soluções também em outras situações. De acordo com a nosso opinião não é cristão quem não é capaz de suportar a mínima adversidade e  procurar socorro junto ao inimigo maior de Deus, para se livrar dos seus males terrenos. Com que desdém o inimigo maligno não deve rir quando, com o menor dos motivos, é chamado em socorro pelos que se julgam bons cristãos, esquecendo-se de  Deus e da confiança Nele.
Uma terceira aberração supersticiosa consiste em munir-se de escudos espirituais cartas celestes e similares.
Apresentamos como exemplo um deles para, por meio dele, mostrar como são são recrimináveis tais procedimentos.
Será que é para rir ou chorar? (158) Rir sobre o disparate de um suposto cristão, ou chorar sobre a teimosia de um católico que resiste a qualquer tentativa de conversão? Que força poderia ter um escudo espiritual destes e de quem viria?  Não se espere nada de Deus a quem se invoca como testemunha de forças mentirosas e enganosas. Onde é que Deus prometeu que vinculou tais o quais benefícios e graças com um sinal externo? E, contudo não é raro, como ouvi dizer, que se depositam maiores esperanças numa carta mentirosa, do que nas promessas explícitas do Salvador. Quem sabe trata-se de credulidade e não de superstição insensata? Obviamente os portadores de um escudo espiritual não estão tão seguros de si, como querem aparentar, como se conclui de um episódio acontecido durante a revolução.
No momento em que o exibicionista  seria posto à prova, que nenhuma bala o acertaria, não quis evidentemente submeter-se a um teste que contudo poderia falhar. Será que com isso ele mesmo não concordou que sua confiança não era tão grande quanto alardeava? Ele mesmo terminou reconhecendo dessa forma que o escudo espiritual  não passava de um engano e de uma fraude.
E que posição diferente adota a Igreja Católica  face a estes abusos! Apóia o costume de portar medalhas ou escapulários e fortalece os fiéis na confiança desses objetos sagrados. Acontece que as promessas não se relacionam simplesmente com a possa desses símbolos bentos, mas dependem em primeiro lugar do comportamento pessoal do respectivo portador. A eficácia não depende do objeto em si, mas da oração e da bênção da Igreja. Além disto as promessas  que os acompanham estão em sintonia com  os sadios ensinamentos da Igreja e bom senso das pessoas. Por isso as promessas estão sempre condicionadas e subentendidas à idéia de que o bem material só então pode ser esperado se resultar para o bem da alma. A Igreja nunca emitiu, como não podia emitir uma carta que permitisse pecar livremente. Mesmo as pessoas levianas  que tomam o cuidado, antes de começar a dançar, tiram o escapulário, para se entregar ao vício, não percebem que ele não é um empecilho para as ações ilícitas.
Os escudos espirituais garantem proteção contra todos os atos pecaminosos pois, suas promessas valem sem qualquer condição e em qualquer situação. Não há pessoa adulta que não enxergue a que ponto essa situação contradiz a fé e o são juízo.
Recomendamos as considerações que seguem a todos aqueles que estão entregues a esse tipo de superstição. Conversem com as pessoas  que sofrem desse mal nefasto e tentem desviá-las de semelhante aberração. Seria de grande utilidade que fossem passadas informações confiáveis de acontecimentos deste gênero, ao sacerdote, para que ele, oferecendo-se  a oportunidade, se empenhar para que os últimos resquícios dessa abjeta  superstição, desapareçam do meio do povo cristão. Se alguém tiver dúvidas a respeito do seu futuro, lembre-se que Deus como pai vela pelos homens e carrega o nosso destino em suas mãos.
Se forem acometidos por sofrimentos e enfermidades (160) recorram a todos os meios naturais para livrar-se delas. Na hipótese de os meios naturais não ajudarem, invoquem os sobrenaturais: a oração que conduz os predestinados pelo caminho da cruz até a glorificação. No caso de sentir vontade de munir-se de um escudo forte, carregue sobre o peito um escapulário ou uma imagem do Sagrado Coração. Estes objetos bentos garantem de modo especial a proteção divina.




[1] Jestos e trejeitos cabalísticos que acompanavam os rituais para impressionar os que procuravam o serviço.