Capítulo sétimo
O progresso
cultural na Colônia
Nosso século gosta
de ser chamado de o Século da Ilustração e mesmo o Brasil considera-se um país
com nível de formação. Mas não basta situar-se no século dezenove para
participar do grade progresso. É indispensável para tanto o esforço de cada
indivíduo em particular. Vale o mesmo para as colônias. Somente por meio do
esforço individual será possível iluminar as cabeças dos moradores da mata
virgem. Pergunta-se. Foi feito neste sentido todo o necessário para que se
apropriarem de todos os conhecimentos de que o nosso tempo se orgulha? Para
esta pergunta infelizmente somos obrigados a dar uma resposta negativa. O sol
do século dezenove ilumina também o nosso
país, mas os raios da hodierna ciência não penetraram fundo na
escuridão. Dos colonos em geral e de
modo especial dos de Bom Jardim, podemos afirmar sem receio, o nível cultural
não é o que deveria ser. São poucos os que superam um nível modesto. Só
uma parcela dos adultos preservou
destreza no ler, escrever e calcular aprendido na escola. A maioria nem
alcançou um nível mais elevado nestes fundamentos da formação, devido a uma
freqüência escolar muito curta e irregular. Dos católicos de Bom Jardim ninguém
freqüenta uma escola mais adiantada. Até o momento não saiu nenhum sacerdote
deste meio, nem seminarista nem professor público. No máximo alguns
freqüentaram por algum tempo o Colégio de São Leopoldo ou a Escola Complementar
de Dois Irmãos. Olhando em volta identificamos muito poucos que dominam o
português ou alimentam pretensão por maior conhecimento.
Seria uma injustiça
se não aceitássemos os motivos alegados para explicar essa situação negativa. A
colônia é jovem como de resto a vida cultural em todo o país. Cabe em primeiro
lugar cuidar do progresso da vida material,
antes de se permitir pensar numa formação superior. Objetamos. Mas já faz um
bom tempo que a luta pela vida não é mais tão árdua. Por acaso não há muitos
colonos que já conquistaram riqueza? O luxo com roupas, chapéus, selas para
senhoras, arreios de prata, botas finas de cano longo e, sobretudo, as altas
somas gastas no jogo, mostram que há dinheiro circulando e não raro muito
dinheiro. Porque é gasto com coisas materiais? A resposta é: a juventude não
alimenta desejos por uma formação mais aprimorada. Prefere nos dias úteis e nos
domingos distrair-se com a caça e as diversões. Respondemos. Para que servem os
pais se não é para orientar os filhos e chamar-lhes a atenção para os bens
maiores da cultura? Será que os nossos descendentes estão condenados a formar
um povo inculto?
Pais responsáveis
(152) com certeza não o desejarão seriamente. Uma outra desculpa. Não sobra
tempo para coisas desse gênero. Durante a semana é preciso trabalhar e no
domingo é preciso recuperar-s de alguma maneira do cansaço. Não negamos para
ninguém, nem aos velhos, nem aos jovens alguma
diversão. Acontece que o aprender também pode ser uma forma de lazer,
depois do esforço físico durante a semana.
O que impede que nos
domingos se dediquem algumas horas à formação? Com certeza há muitas
oportunidades para ampliar os conhecimentos, oportunidades que não faltam em
Bom Jardim. Não são poucos os que pensam que a formação é de todo inútil.
Continuemos a viver como os avós e bisavós e tudo está em ordem. Isto não passa
de um julgamento precipitado. Os antepassados dos colonos atuais trouxeram uma
boa formação escolar e a transmitiram aos filhos. Mas com o tempo esses
conhecimentos herdados, foram
enfraquecendo, como mostra a experiência. Quem ousaria afirmar que a geração de
hoje possui o mesmo nível de conhecimentos dos imigrantes? Assim é de todo
falsa a afirmação de que hoje se procede da mesma maneira como os antigos.
Encontramo-nos, sem dúvida, numa situação de inferioridade. E nos perguntamos:
como será o futuro. De mais a mais, os colonos de hoje têm motivos muito mais
sérios para se interessar por uma boa formação do que nos tempos passados. Ela
é indispensável para o exercício da cidadania. Numa república compete ao povo
governar-se a si mesmo. Perguntamos: Como é possível que uma pessoa inculta
participe do governo? Nem sequer será um bom eleitor, muito menos um escrivão,
juiz distrital e, em deputado em Porto Alegre ou, quem sabe, no Rio de Janeiro,
nem pensar. Faltam-nos homens para discursar em
concentrações populares ou em reuniões de associações, em ocasiões como
eleições municipais ou em outro nível. Acontece que um homem que sabe
apresentar-se em público, vem a ser um fenômeno entre nós.
Porque razões é tão
diferente em outros países? Porque lá se tem a formação e os conhecimentos em
alta conta e se fazem esforços para
promover a formação própria ou, pelo menos dos filhos, entre os quais há belos
talentos. Aliás a formação é necessária para a atividade econômica, para
agricultura, para a indústria e o comércio. O agricultor sem formação nem de
longe tira o proveito da sua terra, quanto aquele um pouco mais culto. Não tem
visão do futuro e movimenta-se numa eterna rotina que, apesar de todo o empenho
da força física, termina reduzindo à esterilidade a sua terra como ficou
evidente quando foram escritos os artigos sobre a questão das florestas na
região colonial. Como é que um profissional se aperfeiçoa quando não lê e não
se informa sobre os grandes progressos, que acontecem em outros lugares? Um
comerciante que não entende de leis e não conhece regulamentos, não pode deixar
de operar no prejuízo. Além disto a formação é da maior importância para a vida
da Igreja. Somente aquele que continuar se instruindo estará em condições de
não perder a cabeça e de ter uma resposta para muitas acusações e objeções, com
que os descrentes atacam hoje a Igreja. Pois, quem defenderá a Igreja nos
nossos dias? O Estado se retirou e não tardará em combatê-la aberta ou veladamente. Restará o povo
católico a quem caberá assumir a defesa do cristianismo. Significa uma missão nobre
e gloriosa, tarefa a ser cumprida pelos leigos de hoje. E, sem formação,
estarão eles em condições de duradouras para assumi-la? Com muita dificuldade,
sem dúvida, de acordo com a opinião dos que têm consciência dessa realidade.
Finalmente a formação constitui-se numa condição indispensável para a vida em sociedade do
nosso tempo. (153) Quem quer ser visto como uma pessoa sem formação, quem quer
passar por ridículo perante seus concidadãos, quem quer ser passado para trás ?
Só mesmo um louco.
Mas muitos dos que
concordam com as nossas considerações,
perguntarão: Como continuaremos a nossa formação, já que não dispomos de nenhum
recurso aqui na mata virgem? Quero apontar apenas três meios disponíveis para os moradores de
Bom Jardim. Temos em primeiro lugar a
Escola Complementar. Foi criada há poucos anos pelo vosso zeloso vigário Pe. Pedro Gasper e já colheu belos
frutos. Porque não são mais os pais que mandam os filhos para esta escola nos
domingos à tarde?
Um segundo caminho
de acessos fácil à formação, também fruto do esforço do vosso pároco, são as
associações para rapazes e homens. As
freqüentes apresentações de peças de teatro são prova da sua contribuição para
com elevação e a difusão da cultura.
Porque a filiação a essas associações não é mais numerosa, contribuindo para
infundir-lhes mais dinamismo e entusiasmo.. Os sacerdotes estão dispostos a
dedicar-se com entusiasmo e investir com as habilidades de que dispõem.
Os jornais e livros
constituem finalmente o terceiro meio. O que neles se lê deve ser verdadeiro e
decente. O que um católico encontrará de útil, por ex., nos jornais liberais que circulam por aqui?
Neles a doutrina da Igreja, a própria doutrina cristã é, propositadamente
distorcida, zomba-se dos costumes católicos e as ordens religiosas são
desprezadas e perseguidas. Porque um filho da Igreja ficaria indiferente a
tamanhas calúnias contra a fé, mais ainda, contribuir com o seu dinheiro. Seria
o cúmulo da falta de juízo e grosseira ingenuidade. Se quiserem informações
úteis, assinem o "Deutsches Volksblatt", o veículo do seu partido e
irmãos de fé. Ocupa a dianteira por muitas milhas todos os jornais em língua alemã, não só pelo número de
assinantes quanto, sobretudo, como porta-voz da informação e do verdadeiro
progresso.
Se alguém quiser
oferecer à família toda algo de atraente e instrutivo, assine "Stadt
Gottes" ou "Zeitschrift für die Christliche Familie".
Encontgrará neles tudo o que há de novo
na Igreja, no Estado, na Arte, na Ciência, na Indústria e Comércio. Os números
de cada ano encadernados são uma fonte de laser e ensinamento. Os volumes
anuais podem ser entregues aos filhos como peças de herança, fazendo com que
nas famílias que se fundam se disponha
de uma fonte sadia de formação. Por motivo de consciência um pai de família não
pode permitir que jornais e livros maus
entrem na sua casa. Com eles entra na família não somente a incredulidade e a
imoralidade como fica comprometida também a felicidade temporal dos pais e dos
filhos. Não poucos ingênuos bem intencionados acreditam que estas matérias não
lhes causam danos, porque são capazes de distinguir o verdadeiro do falso. Essa
opinião não passa de um enorme equívoco. Como a chuva que, por dias, cai sobre
o chão não deixa de amolecê-lo, um mau jornal não deixa de levar às piores
conseqüências.
Imperceptivelmente
(154) mas sem parar os erro e os falsos princípios permeiam a alma, minam a
solidez dos princípios e dominam o homem todo com a sua maneira de ver e sentir
sem Deus. A água caindo ininterruptamente destrói a pedra dura. (água mole e pedra dura tanto dá até que fura). Da mesma
forma a falta de fé rói e destrói as
convicções mais sólidas. Acontece que, às vezes, as conseqüências deploráveis
de tais leituras que surpreendem com tristeza
toda a família, manifestam-se apenas mais tarde. Um católico muito
fervoroso observou por ocasião de um suicídio: É o resultado das longas más
leituras.
Mais cedo ou mais
tarde manifestam-se os serros infiltrados no espírito e então, na maioria dos
casos, já é tarde. Se alguém lê apenas bons livros, tem o espírito instruído,
enobrecido o coração e, em dias difíceis, e a verdade lhe dar-lhe-á
segurança.
Para a colônia faz
falta uma verdadeira Ilustração. Não queremos nada com a falsa. Da sua semente
nascerá sem tardar a desgraça e a miséria.
Pode-se concluir de
que, com o progresso da "inteligentia" as coisas não se encontram no
nível em que deveriam estar. Ainda mais lamentável é o fato de que a média do
povo católico sofre em parte ainda do velho obscurantismo, que custa ser
superado. Santo Tomás de Aquino o chama de sobras do paganismo e uma reflexão
serena nos leva a dar-lhe razão. Falamos do que se costuma chamar de
superstição, praticada inadvertidamente por muitos católicos e por isso não
imputável, por terem crescido neste meio.
Esse lamentável atraso
alastra-se em três direções. De um lado
é a curiosidade em saber o que o futuro reserva escondido no seu seio
misterioso, algo alegre ou algo triste, uma curiosidade muito natural, mas que
facilmente leva a descaminhos. É sabido que pessoas de formação aprimorada
entregam-se a essa loucura, de modo especial nos dias de hoje, que tanto se
orgulham com a sua "luz". É
fato conhecido também que os adeptos ilustrados da superstição procuram, não
raro, revelações impossíveis pagando preços altos para os adivinhos e
cartomantes. É verdade que na colônia não se chegou ao ponto das grandes
cidades. Apesar disto temos informações de que esse tipo de erva daninha viceja
em alguns lugares na sombra escura da mata virgem. Consta, por ex., que uma
certa mulher lê o futuro numa velha peneira. A bruxa, como a chamaríamos,
serve-se de uma tesoura. Não nos arriscamos a julgar se pretende livrar as
pessoas, cortando os defeitos e as aberrações que se encontram no caminho das
pessoas.
O certo é que, com
revelações do tipo quantos filhos uma mãe ainda pode esperar, ou qual a cor da
barba do futuro marido, não poucas vezes confunde e atemoriza o espírito infantil das pessoas, ou, como já
ocorreu, arruínam a paz doméstica e provocam a discórdia na família. Façamos a
pergunta tranqüila e sensata: Como é que uma mulher velha chega a se apropriar
de tais conhecimentos, não revelados às
pessoas mais instruídas? Diante mão não é aceitável que Deus e os anjos
transmitam este tipo de mensagens aos vaticinadores. (125) De forma alguma o
misterioso futuro pode ser conhecido pela posição do sol, pelas linhas das
mãos, pelo estridular do grilo, ou pelas configurações estranhas formadas pelo
chumbo derretido despejado na água. Não resta outra coisa à pessoa que reflete
do que atribuir ao inimigo maligno, fatos que nem a natureza nem a Revelação à luz da razão explicam, quando constatados e
não forem meras ilusões. Por isso a consulta aos adivinhos era castigada com a
morte No Antigo Testamento, não porque o espírito maligno não está em condições
de prever com certeza o futuro, mas porque o simples pedido direto ou indireto
dirigido ao inferno, constitui-se num crime digno da morte. A razão está no
fato de que, por esse procedimento, o anjo decaído é igualado a Deus.
De maior significado
é, digamos abertamente, uma outra superstição pagã. Falamos dos rituais
(Brauchen) sobre cuja condenação poucos tem clareza. Como os leitores devem saber há em algumas picadas certas
pessoas, homens e mulheres, que simulam ter mais conhecimentos do que os
demais. São os curandeiros e médicos que sem terem estudado, algumas vezes
realizam curas de males, como se afirma, em que médicos experimentados
falharam. Quando se trata de recolocar
no lugar um braço e um pé destroncado, recorre-se confiante a um milagreiro de
identidade duvidosa. O sujeito apenas assopra sobre o membro machucado, faz
alguns gestos cabalísticos, aperta aqui e acolá, murmura algumas palavras
incompreensíveis, quem sabe até piedosas e a perna se alinha e o tendão vai
para o lugar, a junta se move, o unheiro morre, a erisipela perde a cor. Em
poucas palavras a doença some como que por encanto.
Mas não é só o homem
como também os animais se livram com facilidade de males graves. As larvas
somem das feridas, a ferida fecha e cicatriza e em lugar da magreza forma-se
uma pele lustrosa e carne gorda. O milagre aconteceu. Não negamos que tais
curas acontecem e até concedemos que
são freqüentes. Por isso ouve-se seguido a observação: "contudo ajuda"
e um segundo acrescenta com ar piedoso: "Com certeza ajudou," e um
terceiro grita alegremente: "E ajudará sempre."
O que dizer a isto?
Que o recurso de fato ajuda ou vai ajudar, ainda não é prova que seja
permitido. Sobre isto decide naturalmente o fato de o recurso estar em sintonia
com os ensinamentos da fé católica. Pergunta-se então: Afinal os meios de cura
de que falamos podem ser considerados permitidos? Permitidos em princípio são
aqueles que a natureza e suas potencialidades nos põe à disposição. Por isso a
ninguém é proibido recorrer aos conselhos de um médico experimentado e valer-se
dos medicamentos prescritos.
Porque então os
médicos não se valem dos mesmos recursos
dos feiticeiros? Faltam-lhe, por acaso, os conhecimentos sobre os
potenciais da natureza das diversas ervas, sais, infusões, ou do corpo humano?
Afinal para que servem os médicos e porque estudam tanto, se um indivíduo ignorante entende mais do que qualquer um deles? Porque não
recorrer ao estranho "hocus pocus", [1] que se
aprende com facilidade? A resposta talvez seja: (156) porque se trata de um
talento individual, um dom da natureza único, inato e por isso não se aprende.
Mas, pergunto, donde
sabes que se trata de fato de um meio
natural e que não haja outra explicação? Basta observar o cerimonial e as
perguntas ridículas por meio das quais se pretende realizar as curas ou, de
fato, se realizam. Por acaso essas cerimônias não apontam claramente para uma
ajuda de outra natureza, de que o curandeiro é dotado? Um curandeiro desses
diz, por ex., "Frederico tem o pé destroncado, Jesus foi pelos judeus
pendurado. Como o estar suspenso não prejudicou a Jesus, o destroncamento não
te prejudica." Como é que essas palavras e a invocação dos nomes mais
sublimes são capazes de curar por si? Se não têm esse poder qualquer um está em
condições de curar um pé destroncado, o que não é o fato. A prova está no fato
de se recorrer apenas a determinadas pessoas.
Além disso cada
pessoas sensata deveria formular a seguinte pergunta: afinal o que confere a essas palavras, simples palavras
tamanho poder? qual a resposta para essa pergunta? Por acaso quer dizer que
Deus relaciona o efeito com a fórmula? Nesse caso estará obrigado a provar como
e quando e, além disto, mostrar por que via chegou ao seu conhecimento. É
evidente que a resposta lhe causará embaraço e o obrigará a confessar
publicamente a sua ignorância. Concede com isto que pratica algo para o qual
lhe falta a base suficiente. Portanto, pratica algo que lhe é estranho e não o
consegue explicar, nem por causas naturais, nem pela intervenção de Deus.
Novamente não há outra saída a não ser concordar que a ajuda tem sua origem em
algo que não pode aceitar. Mas, posto que a cura venha do espírito maligno, o
que em casos em que os recursos naturais não são suficientes, deve ser admitido,
porque nós homens atormentados não
sentimos alívio, mesmo se buscamos a solução no inferno? A simples
pergunta demonstra em que estado de
espírito as pessoas se encontram. Olhemos para o Salvador no deserto.
A terceira tentação
pela qual foi prometido ao Salvador o reino
da terra com a glória do mundo, terminou também com a repulsa do
tentador: "Retira-te, satanás."
E como ficamos nós
se insistimos: (157) "contudo ajudou". Suponhamos que as pedras se
tivessem transformado em roscas e cucas para o Kerb ou o Salvador descesse num
para-quedas diante das pessoas
estupefatas no templo. Teria por acaso triunfado? Com certeza não. Estaria
derrotado e teria sucumbido à tentação.
E como palavra
final: Adorarás somente a Deus e servirás apenas a Ele e não ao demônio, nem na
mínima coisa, nem nas situações mais prementes. Essa deve ser a posição do
verdadeiro católico. Devo servir a Deus mesmo que não tenha pão para comer ou tenha que submeter-me a
outros sofrimentos. Como é vedado aceitar o alimento corporal das mãos do
demônio, assim está proibido aceitar da sua mão o remédio, nem para a saúde do
filho, nem da mulher.
De outra parte os
assim chamados milagreiros mostram claramente em nome de que poder e de quem
agem. O próprio mistério com que envolvem o seu cerimonial, a negação descarada
de suas práticas suspeitas perante o sacerdote, não recomenda as pessoas que se
valem de tais práticas. A tudo isso soma-se a teimosia, o orgulho e, não em
último lugar, a ganância imunda, fazendo aparecer a inconfundível pata do
diabo.
Portanto as curas e
as libertações de males que de fato acontecem, de forma alguma são sinais de
que os cerimoniais sejam permitidos. Mesmo que as feridas do corpo sarem, não significa ainda algo de positivo para um
cristão. Pelo contrário. Exatamente por meio desses benefícios aparentes, a
pessoa enreda-se cada vez mais nas malhas do inimigo maligno e estimulado a
confiar nas falsas soluções também em outras situações. De acordo com a nosso
opinião não é cristão quem não é capaz de suportar a mínima adversidade e procurar socorro junto ao inimigo maior de
Deus, para se livrar dos seus males terrenos. Com que desdém o inimigo maligno
não deve rir quando, com o menor dos motivos, é chamado em socorro pelos que se
julgam bons cristãos, esquecendo-se de
Deus e da confiança Nele.
Uma terceira
aberração supersticiosa consiste em munir-se de escudos espirituais cartas
celestes e similares.
Apresentamos como
exemplo um deles para, por meio dele, mostrar como são são recrimináveis tais
procedimentos.
Será que é para rir
ou chorar? (158) Rir sobre o disparate de um suposto cristão, ou chorar sobre a
teimosia de um católico que resiste a qualquer tentativa de conversão? Que
força poderia ter um escudo espiritual destes e de quem viria? Não se espere nada de Deus a quem se invoca
como testemunha de forças mentirosas e enganosas. Onde é que Deus prometeu que
vinculou tais o quais benefícios e graças com um sinal externo? E, contudo não
é raro, como ouvi dizer, que se depositam maiores esperanças numa carta
mentirosa, do que nas promessas explícitas do Salvador. Quem sabe trata-se de
credulidade e não de superstição insensata? Obviamente os portadores de um
escudo espiritual não estão tão seguros de si, como querem aparentar, como se
conclui de um episódio acontecido durante a revolução.
No momento em que o
exibicionista seria posto à prova, que
nenhuma bala o acertaria, não quis evidentemente submeter-se a um teste que
contudo poderia falhar. Será que com isso ele mesmo não concordou que sua
confiança não era tão grande quanto alardeava? Ele mesmo terminou reconhecendo
dessa forma que o escudo espiritual não
passava de um engano e de uma fraude.
E que posição
diferente adota a Igreja Católica face a
estes abusos! Apóia o costume de portar medalhas ou escapulários e fortalece os
fiéis na confiança desses objetos sagrados. Acontece que as promessas não se
relacionam simplesmente com a possa desses símbolos bentos, mas dependem em
primeiro lugar do comportamento pessoal do respectivo portador. A eficácia não
depende do objeto em si, mas da oração e da bênção da Igreja. Além disto as
promessas que os acompanham estão em
sintonia com os sadios ensinamentos da
Igreja e bom senso das pessoas. Por isso as promessas estão sempre
condicionadas e subentendidas à idéia de que o bem material só então pode ser
esperado se resultar para o bem da alma. A Igreja nunca emitiu, como não podia
emitir uma carta que permitisse pecar livremente. Mesmo as pessoas
levianas que tomam o cuidado, antes de
começar a dançar, tiram o escapulário, para se entregar ao vício, não percebem
que ele não é um empecilho para as ações ilícitas.
Os escudos
espirituais garantem proteção contra todos os atos pecaminosos pois, suas
promessas valem sem qualquer condição e em qualquer situação. Não há pessoa
adulta que não enxergue a que ponto essa situação contradiz a fé e o são juízo.
Recomendamos as
considerações que seguem a todos aqueles que estão entregues a esse tipo de
superstição. Conversem com as pessoas
que sofrem desse mal nefasto e tentem desviá-las de semelhante
aberração. Seria de grande utilidade que fossem passadas informações confiáveis
de acontecimentos deste gênero, ao sacerdote, para que ele, oferecendo-se a oportunidade, se empenhar para que os
últimos resquícios dessa abjeta
superstição, desapareçam do meio do povo cristão. Se alguém tiver
dúvidas a respeito do seu futuro, lembre-se que Deus como pai vela pelos homens
e carrega o nosso destino em suas mãos.
[1] Jestos e trejeitos cabalísticos que acompanavam os rituais para
impressionar os que procuravam o serviço.