Considerações finais
Passado, presente e futuro.
Quando um cristão
crente faz uma retrospectiva da sua
vida, vem-lhe espontaneamente aos lábios as palavras do salmista:
"Bendizei ao Senhor porque Ele é bondoso e eterna é sua
misericórdia." se isto é verdadeiro onde se trata de uma única vida
humana, tanto mais evidente se torna quando está em jogo uma comunidade ou até
um povo inteiro. No momento em que a comunidade paroquial de Bom Jardim lança
um olhar sobe o passado, têm-se a nítida
impressão que a benevolência de Deus a conduziu durante estes 70 anos.
Para muitos imigrantes as coisas não andaram bem no Brasil, como mostraremos
(87) em detalhes mais adiante. Começou com a primeira colônia de suíços em Nova
Friburgo no ano de 1818-1819. Durante três a quatro anos viveu uma existência miserável. A mesma sorte tiveram os outros
assentamentos com alemães e suíços até 1820, nas províncias do Rio de Janeiro e
Espírito Santo. Legitimaram o desesperado juízo emitido por von Eschwege, sobre
a então colônia chinesa: "Teve o fim que terão todas as colônias no Brasil ainda imaturo." Que tristeza para
os primeiros moradores de Bom Jardim, se tivessem recebido terras totalmente
imprestáveis e tivessem sido obrigados a se dispersar pelo país ou até
sucumbir, o que não foi uma raridade. Em
vez deste malogro fora reservado a Bom
Jardim, um destino feliz. Os imigrantes viram o trabalho coroado de êxito e podem olhar confiantes para o futuro. A
situação melhorou de ano para ano e chegou ao ponto em que os parentes na terra
natal só os podem invejar. Por isso cabe
render gratidão pública e sincera a Deus, por ter sido tão bom para com
eles. Não deveriam deixar de lembrar aos filhos
os tempos passados e vividos em situação difícil na Europa. Que
diferença entre a vida precária no Hunsrück e na região do Mosela e a
abundância de que gozam na sua magnífica picada! Lá a propriedade da maioria
não passava de um palmo de largura de terra e aqui são donos de uma gleba
senhorial. Lá faltava-lhes tudo, roupas, alimentos, enquanto aqui dispõem de
fartura e até se permitem luxo no vestir. Lá a sua condição não passava em
muito a do jornaleiro ou mensageiro,
enquanto aqui se tornaram homens livres
e independentes. Devem gratidão também à nova pátria, que se mostrou tão
generosa, embora lhes seja permitido reclamar para si o mérito que a presente
situação feliz, se deve principalmente a eles próprios. Seus vizinhos
brasileiros - ao menos os que se dedicam à agricultura - empobrecem e regridem,
enquanto eles melhoram sem parar o seu bem estar e progridem constantemente. Agradecem
a Deus e devem à sua diligência, à sua energia e à sua persistência, a boa
condição em que vivem.
Os povoamentos
alemães nos rios do Sinos, Caí e Taquari, usufruem todos da mesma sorte de Bom
Jardim. Todos têm os maiores
motivos para agradecerem à
providência divina. Observados numa visão de conjunto do alto de um morro, por
ex., do Fritzenberg, ou dum morro da Feliz, ou da torre da igreja de Estrela ou
Santa Cruz, de imediato nos vem à mente a Terra Prometida e o povo de Israel.
Acontece que aqueles assentamentos formam também um povo, pois, ocupam a mesma
região e une-os o duplo vínculo da língua alemã e os hábitos alemães. Nem
pensam numa unidade política. Sentem-se bem como estão agora. Com raras
exceções todos querem formar um povo de
Deus, na medida em que se mantém unidos
na fé em Deus e na divindade de Jesus Cristo. Rodeia-os o paganismo,
naturalmente o moderno, não menos nocivo
e infame do que os velhos ídolos de pedra, bronze e madeira. Mantêm-se fiéis ao
velho Deus que os conduziu da antiga terra da servidão e lhes deu uma terra
onde, pela sua fertilidade flui “leite e mel”. As virtudes cristãs, a
laboriosidade fizeram com que todos os
inimigos fossem vencidos. As comunidades
florescem materialmente e, como diz Isaías, o povo inteiro vive no esplendor da
paz, na tenda da confiança e no seio do conforto. Como diz poeticamente a
Sagrada Escritura, cada colono vive feliz à sombra da sua figueira e da sua
videira. Na maioria dos casos não se trata apenas de uma representação poética,
mas de uma realidade palpável. Ainda outras belas imagens da (88) Sagrada
Escritura podem, com propriedade ser aplicadas ao pé da letra, aos alemães da
parte norte da região colonial: "Quão belas são as tuas tendas, ó Jacó,
tuas moradas, ó Israel! Como vales cobertos de florestas, como jardins
irrigados perto dos rios, como cabanas que o Senhor erigiu, com os cedros junto
à água!" A razão mais profunda dessa bênção já está assinalada no Livro
Sagrado: "Não há ídolo em Jacó, não se vêm figuras de deuses em Israel, seu Deus está com ele, com
ele se encontra o clarim da vitória do seu rei."
Na verdade basta
olhar para a nossa colônia alemã. Em toda parte erguem-se igrejas e capelas nas picadas - tronos de
Deus em meio ao povo. As igrejas são como os cetros erguidos de Deus, protegendo seu povo. Nas grandes
festas observam-se os piedosos freqüentadores da igreja, peregrinando aos
templos de Deus e, durante o ano todo os sinos elevam suas vozes de manhã e à
noite. A colônia deve o seu sucesso, em primeiro lugar, à religião. Sem a
religião um povo necessariamente estagna, como fica evidente nas redondezas
imediatas, pois somente pela influência da fé, mantém-se sadias as virtudes
civis e morais.
Como a colônia seria
tristonha sem domingo, sem as festas e a prática da religião. Não tardaria em
transformar-se num belo campo de trabalho do Estado, com trabalhos forçados,
dando a impressão desoladora de uma cidade sem torres e sem o badalar de sinos.
Ao um cenário destes faltaria todo o
impulso e todo o estímulo da beleza e da
verdadeira alegria.
A religião é a
melhor garantia para o futuro da colônia. Enquanto a cepa alemã no Brasil
permanecer fiel à fé, ela estará bem. Com o dar-se bem de forma alguma entendemos a acumulação de
riquezas que nem de longe dão satisfação a todos. Conta-se que certa vez um
milionário observou um trabalhador
degustar com tanto apetite um assado de carne de rês, que teria exclamado: "Daria
um milhão se a comida me apetecesse como para aquele trabalhador."
Portanto só o dinheiro não resolve. Também a felicidade do agricultor não
cresce no mesmo ritmo da fortuna. O velho sábio
Bias
deixa claro nas suas palavras, como a riqueza em si não aguça o juízo de um
colono ignorante: "O rico ignorante é uma ovelha com lã de ouro." Da
mesma forma o aumento da fortuna por si só não tem o crescimento da felicidade
como conseqüência. Satisfação, sobriedade, trabalho e amor à ordem e, antes de
mais nada honestidade, são importantes para a prosperidade do colono. Onde
faltam estas virtudes, a riqueza contribui pouco e não durará muito. De outra
parte quando essas virtudes rurais todas forem cultivadas, na maioria dos
casos, o sucesso costuma acontecer. Qualquer um reconhece que estas virtudes
fazem mais facilmente parte do quotidiano de um homem cristão do que de um não
cristão. Do ponto de vista cristão, o único habilitado a julgar o mundo e
atrair a verdadeira felicidade social deve, em última análise, subordinar toda
a sua atividade aos planos de Deus. Somente quando o colono for aquilo que ele deve ser,
de acordo com a sua vocação, será de fato feliz, isto é, levará um vida
honrada, sossegada e satisfeita. Do contrário, porém, sua situação honrada como
cidadão, de forma alguma estará assegurada
e sofrerá o desprezo e a humilhação de todos os demais níveis profissionais.
Com acerto Alban Stoz define sem enfeites o colono sem religião: "De todos
os animais o colono é o animal mais decaído, uma frase cuja veracidade não é
difícil de comprovar."
Felizmente o colono
alemão é por natureza religioso. O
eterno e o invisível o impressionam e ele não se sente à vontade quando os sinais externos da religião
estão ausentes numa casa. (89 Quando confia
a filha a um rapaz como esposa, investiga antes o pretendente no que se
relaciona com a religião, para não correr o risco de expor a filha a um
evidente risco. Nunca agradecerá demais a Deus por esta sua índole. Um feliz
instinto preserva-o de alianças com os sem Deus e da adoção de seu modo de vida.
Quanto mais pesa sobre a vida do operário de fábrica a vida sem religião, por
estar rodeado pelas distrações da cidade, que lhe impedem uma reflexão
tranqüila, o mesmo não vale para o colono. Para ele uma existência sem religião deve ser negra e muito desoladora. Por isso o colono agarra-se à religião em
vista do seu próprio interesse. No momento em que surgirem algumas dúvidas a
respeito, observe os pequenos
agricultores brasileiros, que residem na sua vizinhança, onde a religião
deixou de ocupar um lugar na vida.
Pergunta-se, ganharam alguma coisa negligenciando a religião? Qualquer colono alemão tem a resposta. Será que deseja
o mesmo destino para os filhos e netos? Caso contrário trate de ter em alta consideração a religião e sua prática. Ela oferece ao colono o que para
ele é da maior importância: um corpo sem
vícios e por isso mesmo sadio e o que é mais valioso, uma alma forte, espírito
de sacrifício, fortaleza e sobriedade.
A gratidão como tal
deveria servir sempre aos colonos como motivo para permanecerem fiéis a Deus e
a religião. Nem de longe correu tudo bem para os imigrantes no Brasil. Isto
ficou muito claro logo na primeira
leva para a acima mencionada fundação da colônia de Nova Friburgo. Por
esse motivo vamos demorarmos com a sorte
daquele assentamento para que, com a comparação desta colônia, se sintam ainda
mais estimulados a agradecer a Deus.
A ocasião para
chamar imigrantes estrangeiros para o Brasil foi a vinda da Família Real
Portuguesa, fugindo de Napoleão. Pretendia-se com isso povoar convenientemente
as gigantescas áreas do país. A totalidade da população de então, incluindo as
tribos selvagens do Hinterland, não deveria ultrapassar em muito os quatro
milhões, dispersos pelo rico território.
O governo português tomou então a si a tarefa de aumentar a população, no mais
breve tempo possível. Mas donde se esperaria que viesse? O luso-brasileiro
nativo representava um pequeno número e, na melhor das hipóteses, só depois de
muitos séculos, evoluiria para um povo forte e numeroso. O aporte de imigrantes de Portugal oferecia
poucas perspectivas, visto o país ter sofrido um forte despovoamento. A
população negra escrava era pouco significativa para se poder esperar dela
alguma coisa neste sentido. Os índios no interior do país, na época da
descoberta numerosos como a areia do mar, desde então, tinham diminuído em
número em toda a parte. Suas reduções, sob a condução dos missionários
jesuítas, estavam decaídas e, por isso, nada se podia esperar delas. Até pelo
contrário. Seu número decrescia e estavam ameaçados de completa extinção diante
do avanço da civilização. Não havia pois, como esperar dos elementos
disponíveis que transformassem o Brasil num estado poderoso. As atenções do
governo voltaram-se logicamente para os
países estrangeiros. Já naquela época a Europa estava fortemente sobre-povoada
e em condições de ceder, sem prejuízo, um excedente
significativo por ano. Para lá pois que
se foi em busca de imigrantes. Dentre todos os países a Alemanha e a Suíça
ofereciam as melhores perspectivas. Os governantes do Brasil não pretendiam
simplesmente elevar o número de habitantes. Interessava-os de modo especial
conquistar uma população culta e de bons costumes para o Brasil, disponível,
como em parte nenhuma, entre as nações germânicas. Esta sábia política foi
praticada por quase um século, carreando incomparáveis vantagens para o Brasil.
Em 1818 o Rei D.
João VI fechou um acordo com o agente suíço Gachet com a finalidade de chamar
imigrantes. As condições foram sobremaneira vantajosas para os imigrantes, o
que ficou claro pelo que o rei prometeu e daquilo que cabia aos imigrantes
realizar. O rei prometeu custear as despesas para 100 famílias de colonos, sob
a condição de que fossem católicos romanos. De acordo com o número de pessoas
cada família receberia, de graça, um determinada área de terra e o gado
correspondente (bois, cavalos ou mulas, ovelhas, vacas, cabras e porcos).
Também as sementes indispensáveis seriam fornecidas, para que, imediatamente
depois da chegada, tivessem condições de cultivar os mais diversos produtos,
como cereais, feijão, batata, arroz, milho e outros. Durante os primeiros dez
anos os imigrantes não pagariam impostos a nenhum título. Além disto receberiam
uma compensação em dinheiro nos primeiros dois anos, sendo cada suíço
contemplado com 160 réis ao dia, durante o primeiro ano e a metade no segundo.
A colônia pioneira deveria ter como centro uma vila e duas aldeias e se
denominaria Nova Friburgo. Uma capela equipada com todo o necessário, deveria
ser construída às custas do reino local. Finalmente, logo na chegada ao país,
os imigrantes seriam reconhecidos como cidadãos de pleno direito e gozando de
todos os privilégios do súditos portugueses.
Foram estas as
promessas realmente reais de D. João VI. Como contrapartida estabeleceu algumas
exigências mais do que justificadas. A primeira determinava que entre os
imigrantes comuns houvesse os profissionais usuais como carpinteiros,
sapateiros, alfaiates, etc. Pretendia-se com isto que a vila a ser formada fosse de proveito para o país. Em segundo
lugar deveriam os imigrantes formar uma comunidade e, em vista dela, trazer dois ou três sacerdotes,
um médico e um farmacêutico. Durante os primeiros 20 anos os novos cidadãos só
poderiam dispor sobre a metade dos bens móveis e imóveis. Aquelas pessoas que
viajassem às custas do estado não
poderiam ser impedidas de retornar à pátria, caso o desejassem. No que
diz respeito a obrigações militares, a nova colônia é obrigada a formar uma
guarda de autodefesa, ao ultrapassar o número de 150 homens em idade de servir
nas armas, entre os 18 e 40 anos, com a tarefa de cuidar da ordem e
tranqüilidade na colônia. Além disso caberia a ela destacar um entre cada 20
homens, em idade de serviço militar, para as tropas armadas portuguesas de modo
especial o corpo suíço.
Os pontos principais
desse acordo deixam claro de que os suíços poderiam aceitá-lo prontamente, até com satisfação. As condições
foram talvez até mais favoráveis do que
aquelas sob as quais muitos alemães vieram ao Rio Grande do Sul. Acontece que
Nova Friburgo não chegaria ao bem estar que o Rio Grande do Sul oferecia com
tanta abundância.
Ainda no mesmo ano
de 1819 o governo nomeou um inspetor para a futura colônia. Foi-lhe dado o
encargo da compra das terras necessárias e a concretização dos preparativos
determinados pelo acordo. Uma área de terras foi adquirida ao norte do Rio de
Janeiro, (91) 24 léguas da capital, limitada no leste e oeste por terras da
coroa. Na média três léguas de frente e três léguas de fundo. Cada lote
individual media 300 braças de frente e 750 de fundo, uma área, portanto, de
225.000 braças quadradas (cerca de 425 "Morgen" prussianos). Enquanto
da parte dos portugueses as medições avançavam num clima de negligência, os colonos
suíços já se encontravam em viagem. Embarcados em oito navios, somavam mais
famílias do que o acordado. Por sua própria conta o agente reunira o maior
número possível de famílias. Quanto mais famílias tanto maior o prêmio a ele
devido.
A viagem marítima
foi menos funesta para os colonos por causa das tempestades do que pelas
doenças. Num único navio morreram 110 imigrantes. De uma estrada do Rio de
Janeiro até o Morro Queimado, em moldes europeus, nem falar. E os colonos foram
obrigados a percorrer essa estrada no período das chuvas e sem animais de
carga. Compreende-se que novas doenças se manifestassem. Muitos caíam
prostrados pelo esforço excessivo, contraindo malária pelo ar e pela água. Finalmente as casas para a
recepção foram alcançadas. Esperava-se encontrar nelas um refúgio confortável.
Mas que terrível decepção depois de tantas fadigas. Não havia lugar suficiente
nem para o número de imigrantes reduzido pelas mortes. Nas cabanas
amontoavam-se tantos quantos cabiam, enquanto os demais eram obrigados a
acampar ao relento, ocasionando mais numerosos casos de doenças e mortes. E,
somente depois da chegada começaram a ser feitas as medição dos lotes
coloniais, levados a efeito até com a luta com bandos de índios que vagavam
pelas redondezas. depois de três meses de uma penosa espera chegou, finalmente,
o dia do sorteio dos lotes. O feliz dia caiu em 23 de abril de 1820, dia
afortunado que incidiu como um benfazejo raio de sol sobre o ânimo sombrio dos
colonos, infundindo-lhes nova vontade de viver. Triunfante cada pai de família
levou o número para os seus. Sentia-se como se tivesse ganho a sorte grande na
loteria. Cheio de entusiasmo pintava para si mesmo todas as maravilhas da sua
nova posse, que ainda não contemplara
com os olhos. Logo no dia seguinte trataram de examinar a terra que lhes fora
presenteada e começar o trabalho que os recompensaria. A decepção era grande
quando alguém se deparava com rochas nuas em vez de chão fértil e em vez de uma
floresta rica, pântanos sem fundo. Apesar de tudo lançaram-se com destemor ao
trabalho duro. Alguns que alertaram o inspetor Miranda sobre a impossibilidade
de cultivar a terra a eles destinada, receberam um novo lote em outro lugar.
Porém, mal foram semeadas as primeiras culturas, para as quais só puderam
contar com uma parca ajuda, ficou claro que a terra na sua totalidade não valia
nada. Em vez de áreas planas ou
inclinações suaves, havia uma enorme seqüência de morros intercalados por
gargantas estreitas e íngremes. Da metade para o alto os morros eram formados
por rochas estéreis. Nos vales íngremes a umidade era demasiada e a luz pouca.
A semeadura, ou apodrecia ou torrava sobre a rocha e parecia que apenas as
ervas daninhas e samambaias se davam bem sobre as terras que haviam sido destinadas
aos colonos. A tudo isto acrescia o que no Brasil faz a maior diferença para o
sucesso de uma colônia ao lado da boa qualidade da terra, isto é, um mercado
para os produtos nas proximidades. Entende-se assim que os dois primeiros anos da colonização no Brasil,
foram dois anos de fome, no sentido mais elementar do termo. Os subsídios e oito vinténs por dia por
pessoa, no primeiro ano e quatro no segundo, mal davam para um nível de vida
precário. Pensar no futuro só com temor.
É evidente que a
(92) responsabilidade principal por esta situação desastrosa coube ao governo.
Jamais poderia ter trazido famílias honradas para o país sem antes providenciar
por uma área adequada; sem antes ter feito as devidas medições; sem ter
previsto um mercado acessível por estradas transitáveis. Por isso foi o único
responsável pela total ruína do novo assentamento, da qual falaremos
rapidamente.
Diante da má
situação do momento e da desoladora perspectiva
para o futuro, a maioria das famílias suíças abandonou a colônia recém
fundada. Os artesãos partiram para as cidades menores nas redondezas do Rio de
Janeiro. Muitos rapazes solteiros ofereceram-se para o alistamento na legião
estrangeira e a maioria dos agricultores dirigiu-se para a localidade do Canta
Galo, onde optaram por dedicar-se ao cultivo do café. Para trás ficaram apenas
os teimosos determinados a arrancar a
fortuna do chão com o seu trabalho, o que mais tarde provou ser um esforço
inútil. Permaneceram as pessoas de mais idade, renitentes a uma nova mudança de
residência e aqueles impedidos de
mudar-se por causa de circunstâncias familiares. O próprio governo reconheceu
que estas colonização fora um erro e ele próprio incorrera num solene fiasco,
ao encaminhar os primeiros imigrantes vindos da Alemanha para a colônia suíça,
em grande parte abandonada. Se esta decisão tivesse sido cumprida, teria
resultado uma edição dobrada da história dos sofrimentos dos suíços. Entretanto
uma boa estrela protegia a sorte dos alemães que foram encaminhados para o Rio
Grande do Sul. Estes têm todos os motivos para, de tempos em tempos, olhar para
a sina dos irmãos suíços e agradecer a
Deus que não lhes fosse reservado o destino deles. Os suíços em questão gozavam
de um bem estar muito maior na sua terra
natal, do que a imensa maioria dos imigrantes alemães procedentes do Hunsrück
ou do Palatinado Bávaro. E quão diferentes foram os destinos posteriores! Já
durante a viagem de navio contraíram doenças contagiosas, enquanto os alemães
tiveram, na sua maioria, uma boa travessia. Os suíços só tiveram decepções na
nova terra, enquanto os alemães contavam com apoio e, na sua grande maioria,
chegaram a um existência confortável, depois de alguns anos de esforços e
privações. A colônia suíça de Nova Friburgo desfez-se em pouco tempo, enquanto
os assentamentos de alemães deitavam raízes vigorosas, desenvolveram-se,
consolidaram-se e terminaram num grande florescimento. Não há dúvida de que
também para os alemães foram reservadas privações. A Guerra dos Farrapos fez
tremer a colônia como uma tormenta furiosa. Passou felizmente por ela como um
navio por uma tempestade no oceano. Na maioria os colonos dispunha de uma
significativa reserva de espírito religioso. Era este o lastro que os
salvaguardou do naufrágio, isto é, que o povo não decaísse de todo. Mesmo durante os horrores da guerra
civil brilhavam as estrelas das velhas virtudes alemãs da honestidade,
respeitando em meio à guerra, a propriedade, a humanidade, evitando ações
violentas a não ser em casos extremos, assim como a consciência da justiça e da
ordem. Só muito poucos demonstravam prazer pelo selvagem ofício da guerra e estes
não eram, na sua grande maioria, os caracteres mais honrados. A grande maioria
que partiu forçada para a luta, voltava na primeira oportunidade para a picada.
Somente trabalhando sentiam-se no seu
elemento.
Depois do tempo dos
Farrapos apenas constrangimentos menores perturbavam as colônias. Um número
quase imperceptível foi envolvido na campanha contra Rosas e mais tarde contra
o Paraguai. Na velha pátria, a Alemanha,
as coisas passaram-se diferentes no ano de 1870. As famílias sofreram danos
muito maiores e, além disto, arcavam com pesados impostos e o serviço militar,
problemas que na prática não nos afetavam no meio da mata virgem. E que diferença fizeram a varíola e a guerra
dos Maragatos? Considerando o pouco que perdemos e o muito que poderíamos ter perdido, não nos
resta outra coisa senão agradecer a Deus, por ter conduzido a colônia com
tamanha benignidade e ter abençoado com tanta abundância. E com este
agradecimento fechamos a primeira parte da nossa Crônica.