Deitando Raízes #23

A evolução interna
Introdução
Não poucos dos amigos leitores terão pensado que a Crônica estivesse concluída e devem ter feito especulações sobre o termo "Parte I, a Evolução externa." Deve ter-lhes parecido que não havia mais nada a ser relatado. Mero engano, pois segue agora a história da evolução interna  de Bom Jardim e arredores. A primeira parte serviu, por assim dizer, como moldura fartamente ornamentada, na qual queremos inserir o quadro multicolorido  do retrato da evolução da vida interna da colônia.
O fato de termos na primeira parte um esboço da história do Brasil, não só se justifica na Crônica, quanto foi indispensável, considerando o círculo de leitores e nos imaginamos também que tenha sido muito útil. Qualquer um que conhece o nosso povo sabe que o conhecimento da História Brasileira e sua seqüência cronológica, é o ponto fraco dos colonos. Quantas vezes aconteceu que, ao perguntarmos as datas a narradores de histórias, aliás bem ao par das coisas, tivemos como resposta um menear de cabeça ou a observação de que deve ter sido em tal ou tal ocasião. Não deve, portanto, surpreender que queiramos contribuir para sanar este mal.
Cada um entende que se tratou de sentido figurativo, quando chamamos a primeira parte  de moldura. Incluímos muitos relatos e considerações. Mas, comparando com a segunda  não é menos variado e menos rico em conteúdo. A evolução interna, objeto da segunda parte, contém o mais importante. Quando se conhece uma pessoa apenas por fora, assim como é retratada por uma fotografia e, além disto, ainda se sabe qual a posição que ocupou, isto não basta nem de longe, para avaliá-la pelos seus valores reais. É indispensável penetrar no seu interior, conhecer claramente seus pensamentos, seus planos, suas aspirações, suas intenções, pois são eles que conferem às ações externas o seu verdadeiro sentido e função. E, para que conheçamos de saída o caminho que iremos percorrer, e quais os espetáculos a que assistiremos, queremos apresentar em resumo as conteúdos  individuais de que se compõe a segunda parte. É nossa intenção traçar um quadro claro e completo da vida e do andamento das primeiras sete décadas  da colônia. Este panorama irá desdobrar-se pouco a pouco diante dos nossos olhos. Deixemos que os diferentes traços se revelem, como as luzes e sombras se distribuem e, como finalmente, emergem as figuras com vida. Em primeiro lugar, acompanhemos a história de como das velhas capelas surgiu a igreja de hoje e quais as mãos que se empenharam na sua construção. Na igreja e no seu interior é preciso chamar a atenção aos acabamentos, inclusive as veneráveis figuras que presidiram os cultos.  Em segundo lugar vamos acompanhar a evolução da escola paroquial desde os seus primeiros começos e com ela os veneráveis professores responsáveis pela formação da juventude. No terceiro capítulo teremos uma comparação mais aprofundada da administração, como ela aconteceu e como ela se aperfeiçoou. O capítulo quarto ocupa-se com as profissões a começar do início até o seu estado atual. No capítulo quinto, tomando como referência a grandiosa construção da ponte no Buraco do Diabo, examinaremos  as vias de comunicação, a construção e denominação das mesmas, assim como o comércio e a circulação. Desta maneira será possível estabelecer comparações mais precisas entre a realidade de então e a de agora, no que diz respeito a preços e gêneros alimentícios, a diárias, etc. O capítulo sexto nos familiarizará com a vida do povo na colônia. Observaremos suas características no que se refere aos costumes, usos, virtudes, defeitos, nas situações alegres e tristes. No capítulo sétimo faremos uma avaliação  das eleições quanto à sua natureza e aberrações, o que aliás poderá ser muito útil para o futuro. Os progressos no plano espiritual, o valor ou a negligência em relação a uma formação de nível mais elevado, será a preocupação do capítulo oitavo. O capítulo  nono  reunirá uma coleção abrangente de histórias de vida, capazes de  oferecer aspectos interessantes desta história. No décimo capítulo vamos observar em detalhe as belezas da paisagem de Bom Jardim e arredores e apreciar Bom Jardim também pelo lado geológico e da história natural. O último capítulo, enfim, servirá de homenagem aos primitivos habitantes da região, os motivos pelos quais foram desapareceram e os vestígios de armas e recipientes, com os quais os colonizadores entraram em freqüente contato.
Esta enumeração já permite concluir que a segunda parte contém os aspectos mais importantes dessa Crônica. Passemos sem mais para o capítulo primeiro.
Capítulo primeiro
A. Capela e Igreja
É evidente que desde os primeiros começos dos assentamentos na nossa colônia pensou-se em providenciar por uma casa de Deus. Tratava-se de católicos bem instruídos e fervorosos, que deixaram a velha pátria acostumados a freqüência  regular do culto divino e a recepção dos santos sacramentos. Devem ter sentido uma falta dolorosa ao não encontrarem na mata virgem, nem sacerdotes nem igreja. Foi-lhes especialmente amargo nos primeiros tempos. Quantas vezes o domingo foi para eles um dia de tristeza e aflição, porque não tinham nada daquilo tudo que o cristão considera mais santo e mais  desejável, isto é,  a santa missa, a missa solene e o sermão. Especialmente aflitiva era a situação nos dias das grandes festas. A velha senhora, de Johann Franz, costumava expressar com dor  essa falta: "Hoje celebramos um feriado tão lindo e nem sequer uma santa missa nos é dado assistir."
Os mais jovens contam como a família do velho Taglieber, reuniu-se no Natal, relembrando com nostalgia as belas celebrações  de Natal da Europa. Não poucas vezes as mulheres devem ter chorado, o coração sangrando e as crianças se juntavam de forma comovente aos lamentos dos pais. Na época nem suspeitavam  de que a Providência lhes reservara um papel importante, isto é, restaurar o prestígio da fé católica e da vida eclesiástica no Brasil, com sua igreja decaída, privilégio reservado aos novos povoadores. E, para sentirem com mais intensidade o valor da religião em suas vidas, tiveram que passar necessariamente por este duro aprendizado e, graças a Deus, aprenderam para valer a lição e deram um brilhante exemplo (96) para seus conterrâneos brasileiros.
Conforme o ditado: as boas coisas exigem tempo, apenas depois de muitas idas e vindas, chegaram a uma casa de Deus digna, como a que hoje domina altaneira em Bom Jardim. 

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