Capítulo sexto
A história da companhia alemã
Desde o começo pairava uma nuvem (39) escura sobre a colônia alemã, ameaçando os colonos com não poucos infortúnios. Logo agora que a paisagem assumia um crescente perfil de florescimento e riqueza, esta nuvem tornava-se cada vez mais negra e carregada. A nuvem representava a insegurança da posse da terra, a falta de provas legais do direito de posse de cada colono em particular da terra por ele ocupada. A fim de entender melhor a questão, é preciso ter uma vista de conjunto sobre toda a Colônia de São Leopoldo e acompanhar sua evolução desde seus primeiros começos até o ano de 1863. Comecemos com um apanhado da localidade onde agora se encontra a cidadezinha de São Leopoldo. Na margem esquerda do Rio dos Sinos situava-se o domínio imperial da Feitoria Velha e, na margem direita, a Estância Velha. Em 1824 as duas áreas foram destinadas por D. Pedro I para a colonização alemã. Em volta destes domínios havia outras terras, em parte propriedade do Estado, em parte propriedade de particulares, a eles doadas em diferentes épocas e por diversos motivos. Infelizmente não havia uma clara definição de limites entre essas possessões. Acontecia que o Estado presenteava áreas sobre as quais a posse era duvidosa. Obviamente essas doações foram mais tarde contestadas, ou o próprio governo foi obrigado a reconhecer como inválidas as concessões. O governo imperial que no primeiro momento dividira as possessões em lotes de 160.000 braças quadradas e os distribuíra, reconheceu que seriam necessárias muito mais terra para os imigrantes. Encarregou seus funcionários a acrescentar aos domínios citados as terras de propriedade do estado mais ao norte. Como conseqüência dessa medida surgiram até 1830 novas picadas conhecidas como Costa da Serra, Bom Jardim, Quatorze, Quarenta e Oito, Hortêncio, Dois Irmãos e Schwabenschneis. Formaram com São Leopoldo o núcleo original das colônias alemãs. Como, com o avanço das picadas, essas áreas do governo estavam sujeitas a litígios, apareceram proprietários cujas reclamações não puderam ser desprezadas assim no mais. A posse dos colonizadores foi compreensivelmente posta em dúvida. Um outro inconveniente resultou das medições inexatas dos lotes. De acordo com as determinações das autoridades eles deveriam medir 100 braças de frente e 1.600 braças de fundo. Não demorou para ficar claro que este nem sempre era a realidade, porque as linhas de limites foram traçadas com grande inexatidão. Acontecia então que o mesmo lote foi atribuído a dois proprietários ou de dois vizinhos um tinha demais e o outro de menos terra. Resultaram daí processos dispendiosos, cujas vítimas foram sempre os colonos. Somou-se ainda que, no decorrer dos anos, a localização inexata das colônias, ou então que muitos colonos simplesmente fixaram-se em algum ponto nas terras do Estado, sem credenciais para tanto, resultando em mais fonte de perturbações.
Detenhamo-nos nos imigrantes que dividimos em classes.
A primeira classe recebeu a promessa das seguintes vantagens: viagem livre de despesas do embarque até a colônia; a cidadania brasileira logo após a chegada; livre prática da religião; doação de um lote colonial com 160.000 braças quadradas - ou 272 Morgen prussianos; alguns cavalos, algum gado vacum e animais menores; subsídios para os primeiros anos; isenção do serviço militar e de impostos pelos primeiros dez anos.
Como contrapartida o colono obrigava-se: a não vender a sua propriedade nos primeiros dez anos, ocupar o lote e cultivá-lo. Com estes privilégios foram contemplados os 126 colonos vindos em 1824, assentados na Feitoria Velha, como também os demais chegados até 1827.
Pertencem à segunda classe aqueles que já não receberam mais a passagem livre. O ministro Miranda encarregado dos negócios coloniais, declarara no dia 11 de abril de 1827, que não aceitaria mais nenhuma despesa referente à viagem e a intenção de modificar alguns artigos nas condições constantes no contrato. Apesar de todas as declarações o agente Major Schäfer conduziu o agenciamento de colonos baseado nas condições de 1824 (da primeira classe), o que resultou numa grande confusão, na medida em que o governo agia conforme as novas condições do contrato e os colonos de acordo com as antigas. A situação prolongou-se até 1830. O número de imigrantes somava 4.856 pessoas. Acresce a eles um número significativo de soldados que, terminado o tempo do serviço militar, pretendiam entrar na posse dos seus lotes.
Uma lei promulgada em 15 de dezembro de 1830 proibia o uso de qualquer recurso monetário do Estado em favor da colonização. Com esta medida cortou-se momentaneamente qualquer imigração posterior. Apenas no ano de 1844, depois da assim chamada Guerra dos Farrapos, recomeçou novamente a imigração a partir da Alemanha. Os colonos aqui fixados foram entregues à própria sorte, sem contudo entrar em decadência econômica como muitos temiam, pois, antes de mais nada contavam com o apoio solidário e o exemplo de como lidar com a terra, por parte dos primeiros imigrantes.
Acontece que já em 1834 o governo imperial se convenceu do equívoco que cometera com a lei de 15 de dezembro de 1830 de não conceder a exclusividade da imigração pelas Províncias. Ele próprio empenhou-se fortemente na causa. Por motivo da Guerra dos Farrapos esta medida só entrou em vigor em vigor em 1844.
À terceira classe de imigrantes pertencem àqueles que chegaram depois de 1844 até 1850 e receberam lotes coloniais de graça. Com esta finalidade o Governo Provincial mandara destacar um certo número de colônias, encarregando o engenheiro Büff desta tarefa. Resultaram daí as linhas: Erval, Travessão do Erval e Padre Eterno, localizadas ao norte de São Leopoldo. Esses locais atraíram poucos colonos por causa das más condições de comunicação. Conforme as condições estabelecidas as terras deveriam voltar para o governo. Mas os lotes coloniais entregues aos proprietários foram transformados em papéis públicos e com eles praticavam-se negociatas como numa bolsa.
Em 15 de setembro de 1850 foi promulgada uma nova lei de terras, proibindo futuras doações e a aquisição de lotes coloniais por compra. Já vimos como o Presidente Sinimbu, ignorando esta lei, permitiu o acesso gratuito às terras aos colonos que chegaram em 1854. (47) Mais tarde, entretanto, na maioria dos casos, a lei foi cumprida à risca. Surgiu assim a quarta classe de imigrantes, os assim chamados voluntários, que compravam as terras com recursos próprios. Enumeram-se aqui a colônia privada de Teutônia e a Sommerpikade. Esta última foi implantada por um empreendedor particular Jacob Blauth em 1847 e, até 1861, recebeu ininterruptamente reforços. A mesma evolução positiva tiveram as picadas Ferrabraz, com um prolongamento, um para o norte, outro para o sul, sob a liderança dos antigos colonos Krämer e Schmitt.
Embora, como já foi dito mais acima, o governo estivesse proibido de dar terras, preservou-se o direito de agir livremente ao vendê-las. Desta maneira favoreceu uma detestável prática de especulação, pela qual agravou a insegurança dos títulos de propriedade. A fim de dar um basta a esta situação que se tornara insuportável, os excelentes embaixadores e ministros credenciados pelo reinado da Prússia e a Federação Suíça, os senhores Eichmann e von Tschudi, solicitaram ao governo brasileiro que se ocupasse seriamente com a segurança do direito de posse dos imigrantes alemães e suíços.
O senhor von Eichmann, com seu empenho incansável em favor de São Leopoldo, conseguiu de fato que o governo imperial se comprometesse com a nomeação de uma comissão especial, encarregada da medição dos lotes coloniais e a expedição de títulos de propriedade. No seu memorandum de 14 de julho de 1863 o embaixador von Eichmann traçou as linhas mestras de ação para comissão. Determinou que, antes de mais nada era preciso equacionar a questão legal, isto é, reconhecer que o dispositivo da lei de 18 de setembro de 1850 e a regulamentação de 30 de janeiro de 1854, relativa à legitimação e medições judiciais, não podia ser aplicada aos colonos; que a doação de terras pelo Imperador aos imigrantes alemães significou para eles um título legal de posse; que se obrigava a fornecer para os colonos a garantia legal da posse. Tendo obtido a aceitação para esta questão, Eichmann, declarou que estava de acordo como o Presidente da Província, de que fosse nomeado um funcionário "ad hoc", com a incumbência específica de cuidar da medição de todas as colônias, a conferência dos títulos daqueles que no momento ocupavam propriedades duvidosas, a expedição de documentos que garantiam o direito de propriedade conforme a lei.
Na opinião de von Eichmann esse funcionário não deveria ser apenas um engenheiro, pois não se tratava só de traçar linhas geométricas numa terra desocupada. Sua tarefa deveria consistir na harmonização da situação atual, resultado de um processo de 30 anos, com os princípios com que o governo pretendia colonizar
De acordo com essa orientação deveriam ser equacionadas essas intrincadas questões, ou aplicando a letra da lei, ou por entendimento, ou tomando em consideração o fato consumado. Tendo em visa tudo isto caberia a ele cumprir a sua missão, munido de amplos poderes, grande sabedoria e dignidade, valendo-se de clarividência, conhecimentos, sentimento de justiça e imparcialidade.
O comissário do governo encontraria diversas categorias de donos de colônias. (48) Primeira. Os colonos que mandaram efetuar as medições judiciais conforme determina a lei de 18 de setembro de 1850 e conseguiram o direito de posse por meio de uma sentença. O comissário precisaria apenas a obtenção de um excerto da sentença contida nas atas e providenciar seu cumprimento.
Segunda. Os colonos que eram herdeiros legais e em condições de apresentar os certificados que os funcionários da administração da Colônia expediram para aqueles que receberam suas colônias das autoridades. O direito de posse destes colonos precisaria ser regulamentado de acordo com estes documentos, adaptados às modificações que dispunham sobre a posse a longo prazo.
Terceira. Aqueles que perderam os certificados mas cujos nomes estão consignados nos registros dos funcionários da administração. A esses se aplicar-se-iam os mesmos procedimentos da categoria anterior.
Quarta. Aqueles que, observadas as formalidades prescritas pela lei, compraram as colônias dos seus antecessores. Deveriam ser considerados como legítimos sucessores dos primeiros colonos.
Quinta. Aqueles que compraram terras sem as formalidades prescritas, seriam obrigados a se submeter à decisão do comissário e de acordo com a justiça. Se fossem confirmados na posse, estariam obrigados a pagar os impostos devidos ao tesouro, como se a venda se tivesse dado conforme manda a lei.
Sexta. Aqueles que não receberam a quantidade de terras que o governo prometeu. Estes teriam direito à compensação. No caso de não haver terra suficiente disponível na respectiva picada ou na vizinhança, para a compensação, o comissário deveria encontrar meios para atendê-los em outro local com uma porção maior de terras.
Sétima. A sobra das terras que o comissário localizasse em algumas das picadas ou fora da colônia de cujos limites já foram por ele fixados, devia ser destinada exclusivamente para as compensações de que trata o número 6, ou para o assentamento de novos colonos. Sob hipótese alguma as sobras poderiam ser vendidas a especuladores estranhos à colonização.
Oitava. Nenhuma exclusão de terras devolutas nas imediações das picadas podia ser sancionada pelo Presidente da Província, sem a participação do comissário.
Essas foram as propostas do embaixador prussiano, aceitas pelo Governo Imperial e que serviram de base para as instruções para a comissão do Ministério da Agricultura.
Segundo Adalbet Jahn a comissão deu início aos trabalhos já no ano de 1863 e, em 4 de janeiro de 1864, começou as medições de cada lote colonial. Mas quanto mais esperanças a comissão depositou no início nas atividades tanto menos correspondeu à confiança nela depositada. Não é aqui o lugar para ir mais a fundo na sua composição, reformulação e dissolução. Interessam-nos em primeiro lugar os seus resultados. Segundo Jahn foram os seguintes. Entre 1824 e 1854 comissão medira todos os lotes coloniais que foram distribuídos aos colonos, como também as compensações registradas nos livros das medições. Além disto mandara expedir a maioria dos títulos de terras pelo Presidente da Província e por meio dele devolvê-los em grande parte aos antigos donos. O fato de não estar em condições de expedir todos os títulos de propriedade pela primeira autoridade da Província, não estava em suas mãos da comissão de fazê-lo e por isso não lhe cabe culpa: primeiro porque as medições das áreas de compensação só ficaram concluídas no final do trabalho da Comissão e, segundo, (49) porque não poucos colonos, apesar de repetidas solicitações, não apresentaram os documentos para a Comissão, de maneira que esta, sem as provas da posse legal, não tinha como expedir os títulos pedidos.
Na conclusão da Comissão em 1869 consta que foram distribuídos 1114 títulos aos colonos; que para serem entregues faltavam 397 títulos; que avia ainda 173 títulos de lotes em poder da Presidência e mais 300 títulos de compensação.
Os resultados provam de maneira irrefutável que a Comissão contribuiu em muito para a segurança do direito à propriedade dos colonos. Mas teria cumprido a sua tarefa com muito mais brilho, se tivesse evitado alguns deslizes. O primeiro consistiu no fato de que o Comissário encarregado das medições, confiou, com a anuência do Presidente, a um empreendedor a medição de todas as compensações. Determinou ao mesmo tempo que todas as compensações fossem subtraídas à Picada de Padre Eterno. Com isso prejudicou obviamente os moradores da Picada Feliz, Hortêncio e Dois Irmãos, que poderiam ter sido beneficiados com compensações dentro dos limites de suas picadas. O Comissário, entretanto, não liberou estas terras. Um erro muito maior ainda foi a permissão do Presidente da Província de que especuladores comprassem as sobras nas picadas de Hortêncio e Dois Irmãos. Isto, apesar de ser indiretamente conhecido por seus subalternos, portanto, também dele, mostra até que ponto o triste sistema da venda de sobras a especuladores, representou o mal maior na colônia. Aliás o senhor von Eichmann já o havia apontado no seu momorandum, como fator de desmoralização da colonização. Esta venda cai tanto mais em vista, quando colonos e o Curador (Adalberto Jahn: "As colônias de São Leopoldo"), pediam expressamente que aos moradores da Feliz não fossem atribuídas compensações sete a oito milhas distantes, quando ainda havia terras devolutas nas proximidades.
O Curador acima citado concluiu o seu relatório sobre as medições com as seguintes palavras que fazem pensar:
"Não se pode negar que foi de essencial proveito para a maior parte do município de São Leopoldo, no que se refere à antiga colônia governamental. Não só foram fixados os limites entre as diversas picadas, como concedidos todos os lotes e expedidos a maioria dos títulos de propriedade."
"Deve ser considerado como um grande mal o fato de que não poucas medições não corresponderam às expectativas dos proprietários e não foram corrigidas apesar das reclamações do Curador. Apesar disto aconselha-se aos colonos que mantenham e respeitem os limites traçados pela Comissão e assinalados nas planilhas e nos títulos. Acontece que um prejuízo moderado em terras é preferível a um processo que, mesmo ganho, não compensa o desgosto, o ressentimento e a inimizade com o vizinho."
O arquivo da Comissão, extinta em cinco de outubro de 1869, por um ato do Ministro da Agricultura, foi confiado à Repartição de Terras Públicas, com a incumbência de requerer à Presidência da Província, os títulos que ainda faltavam e, a fazer chegar às mãos dos respectivos donos, os títulos ainda não distribuídos.
A grande maioria dos colonos alemães (50) estava satisfeita com os trabalhos da Comissão. Sua gratidão não se endereçava apenas ao Imperador do Brasil, cujo governo manifestou tanta benevolência. Dirigia-se igualmente à pátria alemã que possibilitou, por meio do seu embaixador, o senhor Eichmann, esse grande benefício. Desde então a consciência das relações para com a Alemanha enfraquecidas reavivaram-se, pois, os alemães daqui perceberam que na velha pátria ainda havia interesse por eles. A consciência do pertencimento às raízes seria mais tarde reforçada com o andamento da guerra franco-alemã. Desse assunto voltaremos a falar mais tarde.
Bom Jardim foi pouco afetado pelas medições porque, desde o começo as colônias estavam bem demarcadas. Bem diferente foi com a Picada Café . As divisas eram muito menos precisas. Por isso a maioria foi obrigada a submeter-se a modificações nas posses de suas terras. Num lado havia aí 73 colônias, no outro, em direção à Linha Nova, mais umas 50. O Diretor das medições era um certo senhor Krüger. Colonos mais antigos afirmam que era austríaco de nascimento, mas não tinha o caráter bondoso dos austríacos, Sob sua coordenação trabalharam os jovens Tatsch da Picada 48 e Peter Marschall, mais tarde professor na Picada Holanda. Von Krüger hospedava-se na casa de Johann Link e bancava o grande enquanto seus subalternos trabalhavam. As pessoas mais antigas lembram-se bem como esses últimos executavam suas tarefas. As medições anteriores tinham sido feitas pelo velho Tatsch (pai do aqui nomeado) e o povo estava satisfeito. Mas agora à revelia da lei e da justiça eram-lhes surrupiadas algumas ou até muitas braças. Desta maneira as duas colônias de Jacob Jung com a nova medição, ficaram apenas com 140 baças de frente, sem qualquer compensação pelos fundos. Johann Franz, então sacristão em São José do Hortêncio, morava também na Holanda, perdeu também uma tira de uma braça de largura e 1.800 de fundo. Como a esses aconteceu à maioria dos outros. O povo preferiu aceitar as novas determinações a envolver-se em processos dispendiosos, nos quais os únicos a tirar proveito eram os advogados. Certas ou erradas, as medições empreendidas pelo governo, foram aceitas como válidas, como por ex., aconteceu com Jacob Jung com suas duas colônias, com 35 braças nos fundos a menos do que na frente. Com base nestas medições o senhor von Krüger expediu os títulos reconhecidos como legais. A fim de acrescentar mais algumas particularidades, observamos que naqueles anos os preços das terras encontravam-se em forte elevação. O acima nomeado Johann Franz comprou ao chegar, meia colônia por 230$. Poucos anos mais tarde pagou pela mesma área 1.000$. O mesmo vendeu por pouco dinheiro uma valiosa área de terra, sobre a qual Peter Link construiu um moinho.
Uma avaliação da pessoa do senhor Krüger coordenador (presidente da Comissão de medição na Picada Café), vem do seu colaborador, o senhor Peter Marschall, a quem abrimos um pequeno espaço para não incorrermos no risco de parcialidade. Conforme ele o referido senhor teria sido um homem honrado. Devido, porém, às circunstâncias complicadas, não lhe foi possível contentar a todos. Mas sempre estivera empenhado em assegurar a todos os colonos os que lhes pertencia, na medida em que estivesse ao alcance de suas possibilidades. Destacou como traços positivos de sua personalidade a afabilidade e simpatia no trato, tanto com os subalternos quanto com os moradores. Não se poderia acusá-lo de falta de cortesia, mesmo quando um colono entrou (51) no seu quarto sem bater. E se além disto levou uma vida folgada não é motivo de censura porque, segundo Johann Link, sempre se mostrou um pagador pontual, Além disto teria sido um homem de mão muito aberta, a tal ponto que teria causado surpresa nos auxiliares. De modo especial demonstrava a mais refinada cortesia para com os sacerdotes que de tempos em tempos visitavam a picada. Consta que em certa ocasião mandou as próprias roupas para o sacerdote para que as trocasse com as molhadas durante uma chuva. E, finalmente, quando viajou para o Rio de Janeiro, a única visita que fez foi ao cura de almas católico.
Fechamos este capítulo com algumas observações relativas à situação econômica daquele período. Naquele tempo prosperava a viticultura na Picada Café. O velho serralheiro Joseph Sebastiani vendia muito vinho. Alambiques também já os havia antes que Johann Link instalasse o seu. Mais tarde veio somar-se uma cervejaria. O bem-estar da colônia crescia de ano para ano na Picada Holanda, assim como no Schneidersthal e no Bohnenthal e em toda a Picada Bom Jardim. As nuvens carregadas oriundas da questão dos limites e dos títulos, esvaíra-se em grande parte. Somente alguns resquícios, na forma de processos, pairavam ainda sobre alguns lotes coloniais. Em geral, porém, brilhava o mais belo sol sobre Bom Jardim, fazendo jus ao seu belo nome: "Bom Jardim!"