Archive for maio 2016

Deitando Raízes #17

Capítulo décimo
O episódio dos Mucker e da varíola
Neste capítulo queremos relatar dois acontecimentos que causaram tristeza e pavor em vez de júbilo e alegria em nossa picada. Primeiro foi o episódio dos Mucker. Não atingiu tão duramente Bom Jardim quanto o outro flagelo. A epidemia da varíola causou um enorme alvoroço e consternação. O fato  de como se originou a assim denominada seita dos Mucker ficou amplamente conhecido pelos jornais de 1874, entre eles o Deutsches Volksblatt. (65) Primeiro foi tratado como uma interpretação errônea  em que incorreram  os colonos, devido a uma aberração na explicação da Bíblia e depois foi terminar numa espécie de delírio religioso. O cenário do movimento foram as colônias localizadas nas proximidades do Ferrabraz. Mais tarde espalhou-se para a vizinhança mais afastada. Não raro defende-se o ponto de vista de que as idéias, de modo especial as religiosas, não tem grande importância ou seriam de todo inofensivas. Parece tratar-se de um grande engano como ficou lamentavelmente provado com os Mucker. A imaginação desvairada de Jacobina em julgar-se a Messias, transpôs, em pouco tempo, o âmbito das idéias, para alastrar-se para o terreno social. Legitimada pela plenitude do próprio poder e pela infalibilidade da sua pessoa, declarou inválidos vários matrimônios legítimos. Seguiram-se desordens, desavenças e inimizades entre as famílias do lugar. As  idéias aparentemente desandaram e mostraram a sua força destrutiva. Não demorariam para florescer e depois espalhar a  semente destruidora por toda a redondeza. Com o aumento do poder, a heresia partiu para a perseguição. Com a finalidade de angariar adeptos lançou mão da violência, incluindo assassinatos, provocando a intervenção das autoridades. A essa altura as idéias aberrantes passaram a constituir-se num perigo para a comunidade. Os hereges revelaram-se abertamente como revolucionários. Perdura ainda hoje na memória do povo a ridícula campanha empreendida pelas tropas imperiais, sob o comando do coronel Genuíno, apoiado por um bando de colonos alemães voluntários. Até artilharia foi levada ao campo, para dobrar o punhado de  rebeldes. Estes sucumbiram finalmente, não pela tática de guerra das tropas regulares, mas pela valentia dos colonos alemães, revoltados contra os atos de violência dos Mucker.
Em Bom Jardim os Mucker não encontraram eco nem sequer entre os protestantes, ordeiros demais para fazer causa comum com essa perturbação da paz. Uma única família associou-se aos assassinos, mas não demorou para mudar-se de Bom Jardim. Não aconteceram incursões de rapinagem  dos Mucker em nossa picada, mas se afirmássemos que não há adeptos, faltaríamos à verdade. Na verdade o medo e o pavor perante esses malfeitores, que assassinavam e incendiavam  em outras picadas, foi muito grande e por vezes muito próximo. Repetidas vezes  correu a notícia de que os Mucker pretendiam formar uma ramificação em Bom Jardim, mas sempre se mostrou infundada. Contudo nunca se deixou de adotar as medidas de segurança que a prudência exigia em tais circunstâncias. Durante a noite montava-se guarda em alguns pontos. O velho Johann Finger se encarregava de um posto destes lá em cima perto da igreja. Na hipótese de uma ameaça de ataque, reuniria a linha toda tocando o sino. Felizmente nunca foi notado algo de suspeito e a paróquia ficou livre de tal provação. Na verdade, porém, o alívio geral veio com a notícia de que os Mucker haviam sido vencidos, mortos ou aprisionados.
Um inimigo muito mais perigoso, a varíola, invadiu a região de Bom Jardim. Nenhuma vigilância contra ela se mostrou eficaz. Ainda hoje, quando se fala no assunto, um suspiro sai do peito daqueles que presenciaram a terrível epidemia. E com razão pois, foram tempos negros e tristes.
Não é possível precisar com exatidão quando a moléstia entrou. Com toda a probabilidade aconteceu assim. Uma das meninas do  professor Schütz, de nome Maria, que fora com o professor brasileiro (sua escola ficava perto da casa paroquial) adoeceu repentinamente. O velho professor não conhecia a doença e não deu muita importância, (66) Uma vez melhor, sentada na cama, recebeu a visita de outras crianças que levaram cana de açúcar. Em seguida adoeceram 12 crianças. Percebeu-se então que não se tratava de erupção inofensiva da pele, mas da letal varíola. Com as crianças o mal entrou em muitas famílias. a escola ficou fechada durante quatro ou cinco meses, mas o mal estava feito. Pelo fato de atribuir-se a culpa ao professor, não demorou que ele se transformasse em bode expiatório. Ninguém o recebia em casa, o que, sem dúvida causou uma grande amargura no bom homem. A varíola assumiu uma proporção assustadora. A feição da pequena cidade, a fileira de casas  lá embaixo  no Buraco do Diabo, perto da ponte em direção à Picada Café, mostrava um quadro de desolação. Todas as casas estavam trancadas, o que dava uma impressão sobremodo triste. Até os caminhos de entrada na picada foram trancados com árvores derrubadas e nenhum estranho, além de algum padre, ousava entrar no território tomado pela epidemia. Os laços familiares e de amizade pareciam rompidos. Os estragos da doença eram de tal ordem que incutiam medo. Muitas famílias perderam vários dos seus membros. O velho Cassel, por ex., perdeu três filhos, dois solteiros e um casado. Contudo, como costuma acontecer em tais situações, de um lado exagerava-se o medo e, do outro, cometia-se a maior insensatez. Ninguém além do Pe. vigário Steinhart pensou numa ação defensiva organizada, recorrendo a meios sensatos. Como pouco tempo antes fora fundada a Associação para Homens, o Pe. Steinhart dirigiu-se ao seu presidente, o sr. Herzer para movê-lo a adotar os meios necessários. Já que este nada fez, o vigário não perdeu tempo e tomou a causa para si. Viajou imediatamente até Porto Alegre para aconselhar-se com médicos experientes e, se fosse o caso, providenciar por medicamentos. O velho Dr.  Heinzelmann mostrou-se extremamente receptivo e insistiu muito que se partisse o mais rapidamente possível para a vacinação dos sãos. Mas quem em Bom Jardim se encarregaria da vacinação? Não havia médico nem outra pessoa  que entendesse da arte. Sem perder tempo o Pe. Steinhart aprendeu a vacinar com o Dr. Heinzelmann e depois ensinou outras pessoas. Como o procedimento não é dos mais difíceis aprendeu-o logo. Depois o Pe. Steinhart voltou à Picada Berghan, feliz por poder prestar um grande serviço a sua paróquia.
No começo só uma minoria quis ouvir falar em vacina. Achavam-na mais perigosa do que a proximidade dos doentes  de varíola. Acontece que antigamente já se aplicara a vacina e, na ocasião, o remédio se mostrara de efeito duvidoso. Evidentemente os procedimentos não foram de acordo com a orientação dos médicos. Injetara-se o pus de doentes adultos sob a pele de pesas sadias, o que resultou em que todos os vacinados contraíssem a varíola. Com a insistência do pároco e em vista dos evidentes resultados positivos ligados à vacinação e, como o contágio se tornou mais raro, veio, finalmente, a reviravolta na atitude doa população. As pessoas  desejosas de serem vacinadas afluíam  em tal número que o padre foi obrigado a pensar em entregar sua função de médico a auxiliares leigos. Entre estes Philipp Becker teve méritos especiais. Na mesma ocasião uma modesta moça  da Picada 48, Anna Maria Horn,  fez-se credora de muitos méritos. Como a varíola afetara sua família com virulência, ela adquirira uma certa familiaridade coma doença e seu tratamento. Além disto, pulsava em seu peito um coração magnânimo tomado de sentimento cristão em relação ao amor ao próximo. Entrava sem medo nas  moradias, onde os doentes de varíola jaziam normalmente sós e abandonados e lhes dava assistência. Com certeza ninguém se admira ao tomar conhecimento de que a moça entrou mais tarde no convento das (67)  franciscanas para dedicar toda a sua vida ao serviço dos doentes e a outras práticas de caridade cristã.
O vigário tomou para si o cuidado dos pobres doentes de varíola. Faz parte da missão do sacerdote católico, portar-se como o bom pastor da comunidade, de modo especial em ocasiões de perigo e necessidade. Não demorou e ele próprio  contraiu a doença, sem no começo dar-lhe muita importância. Finalmente a doença o prostrou e, durante quatro dias, sua vida estava a perigo. Mas não demorou, restabeleceu-se com a ajuda de Deus e ter condições de entregar-se outra vez com destemor à sua nobre missão. A melhor compreensão da sua sublime atuação nos dá o diário da paróquia, do qual destacamos literalmente a respectiva parte. Na sua singeleza produz uma forte impressão no leitor simples, ainda mais porque não foi redigido com a intenção de uma futura publicação:
No dia 15 de junto de 1874 espalhou-se  inesperadamente a notícia que a seita dos Mucker devastara o Leonerhof [1] com fogo e assassinatos. A notícia encheu de grande susto e pavor  a população inteira. As pessoas não quiseram mais  permanecer nas casas durante a noite e de dia andavam armadas.
26 de junho notícias ruins aumentam a consternação.
28 de junho. Poucas pessoas se fizeram presentes na missa. Orações públicas foram feitas  para que Deus afastasse tamanha desgraça. À tarde algumas pessoas vieram para a confissão. 
29 de junho. Hoje é a festa de São Pedro e São Paulo, mas o medo abafou o clima festivo.
Na mesma data lê-se a observação: Já no começo deste mês os fiéis  pediram a Deus para que os sacerdotes não lhes fossem tirados. [2] Os  bispos estavam sendo encarcerados e os sacerdotes hostilizados. Muitos vieram confessar-se e receber a comunhão e nas sextas-feiras organizaram devoções em favor desta causa. Enquanto a maioria dos colonos abandonava as casas, confiando em Deus, julgamos mais sensato permanecer em nossa moradia, sem descuidar das precauções indispensáveis. Johann Finger, nosso vizinho lá acima, caminhava para cá e para lá. na frente da sua casa.
1. de julho. Perdura a mesma situação.
18 de julho. Espalha-se o boato que alguns colonos contraíram varíola. Por não julgar a situação grave, dirigi-me até a Picada dos Portugueses para o meu retiro anual, enquanto o superior da Missão, P. Wilhelm Dörlemann substituía-me no posto.
28 de julho. Quando voltei fui informado de que a varíola irrompera na picada.
29 de julho . Sepultamento de uma criança de escola de nome Gölzer, vítima da varíola. De hoje em diante visito diariamente os doentes de varíola.
2 de agosto. Hoje à tarde (domingo) veio a notícia de que os Mucker foram derrotados e fugiram.
6 de agosto. Viajo até Dois Irmãos e na ida e na volta visito os doentes de varíola.
8 de agosto. Assisto aos doentes ministrando-lhes os santos sacramentos.
8 de agosto. (domingo). À tarde dirijo-me até o Bohnenthal para ministrar os Santos Sacramentos aos enfermos.  Só tarde volto para casa.
10 de agosto. Fico com os enfermos enquanto mando o irmão leigo até a Picada dos Portugueses, com a finalidade de colher conselhos respectivos à epidemia com o P. Blees, um homem muito experimentado.
12 de agosto. Durante a noite eu próprio fui acometido pela doença. Apesar disto atendo o chamamento do Bohnenthal para socorrer o enfermo Jacob Kehl.
De manhã dia 10 coube-me  o sepultamento da esposa de Heinrich Schmitt, nascida Wolfart. Quase não consegui terminar a missa. Depois da Santa Missa chegou o P. Blees e, imediatamente, despachamos um mensageiro a São Leopoldo, para trazer um substituto para mim.
13 de agosto. Apesar de doente vejo-me forçado a realizar um sepultamento. À tarde apresentou-se o P. Joseph Haag, qual anjo mandado do céu.
15 de agosto. Foi Celebrada uma missa em ação de graças pelo término da guerra dos Mucker, mas só poucas pessoas apareceram.
16 de agosto. Encontro-me  novamente em condições  de rezar a Santa Missa. O P. Joseph administra os Santos Sacramentos no Bohnenthal. Quase todos os dias ocorre um enterro.
21 de agosto. Carl Sänger chama-me para o  Bohnenthal. O jovem casal Jacob Link e Carolina Sänger, os dois acometidos pela mesma doença, faleceram no mesmo momento. Depois de atender a mulher, dirigi-me ao homem doente, o qual não parecia correr perigo, mas no mesmo instante ele faleceu.
22 de agosto. Enterro no  Bohnenthal.
23 de agosto. O pavor diante da epidemia é tão grande que as pessoas ficam longe até da igreja e fogem o mais longe possível das casas dos contaminados. Só poucos participam dos enterros.
27 de agosto. À tarde viajo a Porto Alegre para informar-me junto aos médicos sobre remédios contra a doença. Pergunto sobre vacinação e informo-os sobre a resistência dos colonos a ela. Com muita simpatia o Dr. Heinzelmann ensinou-me os procedimentos da vacinação e presenteou-me com alguns livros úteis sobre medicamentos.
29 de agosto. Sepultamento de Johannes Dilly Ur. Depois explico às pessoas a utilidade da vacinação e exorto-os a seguir as determinações dos médicos.
30 de  agosto. Philipp Becker começa com a vacinação partindo da nossa casa. Eu o instruíra bem no assunto.
1. de setembro. Philipp Becker leva adiante a vacinação e aos poucos os preconceitos desaparecem.
Parece ser de grande utilidade para muitos, pois enquanto antes todos contraíam a doença quando um dos membros da família era contaminado, isso agora já não acontecia. Pelo menos os vacinados resistiam por mais tempo à doença e esta já não se mostrava tão virulenta.
2 de setembro. Ontem passou por aqui o  professor Marschall da Holanda para aprender a vacinar. Ocorreu também o enterro de Mathias Kunzler, casado há pouco tempo e para hoje está marcado o do jovem Johannes Sewald.
8 de setembro. Realiza-se uma procissão para implorar  a Divina Misericórdia. Os moradores do Bohnenthal chegaram antes da missa. Depois da missa os bomjardinenses os acompanharam até a ponte  do Buraco do Diabo. A partir deste dia cresceu novamente o número de freqüentadores da igreja.
13 de setembro. Começou um movimento contra o professor Schütz. Algumas pessoas mal intencionadas espalharam o boato de que ele, devido à sua imprudência, era o responsável pela disseminação da varíola. Esclareci tudo no sermão e as pessoas se acalmaram.
19 de setembro. O número de doentes diminui significativamente.
25 de setembro. Sou chamado para atender a uma senhora protestante, para verificar se ela talvez contraíra varíola, porque os médicos diziam que não, mas não se confiava no seu diagnóstico.
26 de setembro. Abaixo de forte chuva sou chamado para assistir a uma moça doente. Só ouvi sua confissão por não julgá-la tão doente. Ela contudo faleceu inesperadamente. Trata-se de Catarina Sewald. Seu enterro será amanhã.
Até aqui o diário com seus registros curtos mas comoventes.
Se os esforços do padre foram grandes no exercício da caridade corporal, o católico deve valorizar ainda mais o que ele realizou em defesa da fé  por ocasião do dogma da infalibilidade e da guerra Mucker. A nuvem de poeira que a questão da infalibilidade do papa levantou na Alemanha, atravessou o  oceano e chegou a baixar sobre a mata virgem, como um denso nevoeiro. Também em Bom Jardim algumas cabeças desorientaram-se, porque imaginavam a infalibilidade como algo perigoso. Mas o vigilante pároco abriu a tempo os olhos dos fiéis de lá. Nos seus sermões voltava sempre de novo ao dogma, explicando-o sob todos os seus aspectos. Mostrou que por meio dele o papa não estava sendo transformado num ser sem pecado ou numa espécie de  deus na terra, mas exatamente como aconteceu com os apóstolos, assistido pelo Espírito Santo, seria preservado de qualquer erro referente à doutrina. No começo as explicações não deram muita clareza e ocasionaram não poucas discussões.
Contaram-me como, de modo especial dois membros da comunidade, Jacob Finger e Johannes Dilly, se encontraram na sombra junto a uma fonte no potreiro do Schneck e, repassaram até altas horas da noite, o que tinham escutado no sermão. Na ocasião um dos teólogos leigos esqueceu o guarda-chuva novo em folha, no local da discussão. Ao procurá-lo logo em seguida ele tinha evaporado. Um outro ficou com a cabeça confusa, provavelmente como conseqüência das muitas  reflexões, um aviso para que os católicos aceitem  docilmente os ensinamentos da fé, em vez de cismar sobre eles. Como se tratava de um homem de excepcional piedade, não nos cabe evidentemente culpá-lo por sua desgraça.
Bom Jardim, como a região da mata virgem inteira, permaneceu fiel à Igreja e sua fé tornou-se mais sólida, como se pode avaliar pela festa do papa que se seguiu. O P. Steinhart portou-se com a mesma vigilância  em relação ao movimento Mucker. Repetia o alerta de manter-se afastado  dos encontros da seita, porque a simples curiosidade nestas coisas pode levar à ruína. Seguido  chamava a atenção para o evangelho de Mateus 24-23 onde se fala dos falsos profetas: "Quando então alguém vos diz: Cristo está aqui ou acolá, não lhe deis crédito. Pois apresentar-se-ão falsos cristos e falsos profetas e operarão grandes feitos e grandes milagres, ao ponto de os escolhidos serem induzidos ao erro, se isto fosse possível. Eu já vos disse antes. Mesmo que vos digam. Reparem ele está no deserto, não ide procurar; reparem ele se encontra dentro de casa, não acrediteis." Nesta passagem os acontecimentos do Ferrabraz estão colocados com surpreendente clareza, porque a pessoa que lá se apresentou como Cristo  de fato apareceu em recintos  domésticos diante dos seus seguidores. Onde se encontra a carniça aí se reúnem as águias. isto é, os gaviões e os abutres. Os católicos foram preservados desta aberração por seu destemido cura de almas. Mesmo entre os de outra confissão, como já foi relatado mais acima, apenas dois atenderam ao aliciamento. (70) Um terceiro que mais observara do que aceitara a doutrina da seita, não demorou em afastar-se. A atitude dos "cristos" acima citados o teriam levado a esta decisão.  A defecção poderia ter-lhe custado caro, pois os sectários o teriam morto se o muckerismo como um todo não se tivesse afogado no próprio sangue, com a intervenção da força pública.
Faz parte do ofício do cronista cristão, a partir dos acontecimentos narrados, elevar de vez em quando os olhos a Deus, a fim de meditar  sobre eles à luz da Fé. Queremos fazê-lo também em relação   ao escândalo dos Mucker e da epidemia da varíola. Perguntamos em primeiro lugar o que nos cabe pensar como católicos sobre o muckerismo. Conforme o apóstolo (1Cor. 11,11) é necessário que ocorram aberrações religiosas, para que os cristãos sejam postos à prova, isto é, é altamente provável que devido à fraqueza, ao orgulho, à inconstância,  à sede de novidades do homem,  ocorram divisões e doutrinas errôneas.
Deus permite tais coisas para confirmar  os fiéis na verdadeira fé e na sua fidelidade à Igreja. E foi o efeito que  aquelas perturbações religiosas produziram sobre os fiéis de Bom Jardim e, assim, de fato do mal resultou o bem.
Como qualquer outra provação a epidemia da varíola teve o efeito de chamar a atenção dos fiéis sobre Deus e a eternidade. As mortes não esperadas e as incertezas da vida, constituem-se num poderoso alerta para afastar-se  do caminho do pecado e praticar o bem. Para a prática do bem são exatamente os tempos de perigo para a vida corporal, que oferecem em abundância, as mais belas ocasiões. Essa prova foi também de grande utilidade para Bom Jardim e, por isso mesmo, é preciso reconhecer com gratidão neste flagelo a mão da providência divina, visando em primeiro lugar a salvação da alma.




[1] Hoje Sapiranga
[2] Referência à Questão Religiosa na qual os bispos de Olinda e Maranhão foram presos e tramitava um projeto de lei na Assembléia Nacional visando a expulsão dos jesuítas do Brasil.

Deitando Raízes #16

Capítulo nono
Bom Jardim torna-se paróquia
Do tempo da Guerra do Paraguai há um outro episódio que precisa ser recuperado e que assumiu um significado de ampla repercussão: a ereção da picada em paróquia em 1867.
Em primeiro lugar é preciso tomar consciência do que significou  esta mudança. No que diz respeito à situação eclesiástica, Bom Jardim foi separado da paróquia de São Leopoldo e elevado à condição de distrito autônomo. Equivaleu mais ou menos à declaração da maioridade da picada. Pois de conformidade com o direito canônico o pároco é o representante do bispo em todas as funções pastorais. Daí fica claro que a comunidade paroquial católica, contrariamente à comunidade protestante ou civil, não forma uma corporação que ordena seus interesses independentemente das autoridades eclesiásticas. Como o bispo administra a diocese assim o pároco administra a paróquia, sem depender da concordância dos membros da comunidade, no exercício das suas funções.
É verdade que ao lado do pároco atuam o fabriqueiro  e os censores. Não se pode esquecer, entretanto, que o direito dos censores não lhes cabe por princípio, previsto na constituição da Igreja, mas, antes de mais nada, concedido às comunidades pelas autoridades eclesiásticas. O governo da Igreja é pela própria natureza, da competência dos religiosos. Os leigos, sejam eles quem forem, (59) participam apenas na medida em que parece proveitoso aos pastores de almas. Por esta razão é o pároco que preside todas as comissões que se ocupam com assuntos relacionados com a Igreja. Sem a sua concordância nada de importante pode acontecer, se é que se pretende  salvaguardar o caráter católico de tais corporações. Em assuntos católicos a decisão em todas as comunidades de igreja, atinentes a questões católicas, dependem unicamente do pároco local e, por isso mesmos cabe a ele toda a responsabilidade. Conclui-se daí que nem o coral está autorizado a tomar uma posição independente, caso não queira afastar-se do chão católico, pois, conforme o Direito Canônico, o canto é apenas uma parte do culto divino. Assim cabe ao sacerdote como presidente  disciplinar o canto.
Como representante do bispo encontram-se sob a vigilância  do pároco os fundos da escola e dos pobres, quando os houver. Fazem parte do ofício do pároco não só os batizados e a comunhão pascal, como também os proclamos, [1] os matrimônios, a unção dos enfermos e os funerais. Em conseqüência desta investidura todos que se encontram dentro dos limites da paróquia, dependem do pároco e um simples sacerdote só  pode exercer estas funções com a autorização do pároco. Muito menos um matrimônio tem validade sem a presença do pároco local. Ministrar e supervisionar  a instrução religiosa na escola assim como zelar por ela na escola sob o ponto de vista religioso, constitui-se em mais um direito da Igreja. Quando então o pároco assume a escola, não o faz por motivos pessoais e clericais, mas como uma questão de obrigação em conformidade com o espírito católico. A presença do pároco na comunidade é importante também sob o ponto de vista social. Encarrega-se dos livros de registro dos batizados, matrimônios e óbitos e, não raro, os registros da confirmação. Com a elevação a paróquia, Bom Jardim foi beneficiado com todas essas vantagens. Por força da legislação do Estado, acresceram outras funções como a de juiz de paz,  de inspetor, atribuições pelas quais garantia-se também o progresso material da comunidade paroquial.
Queremos, além disto, responder às seguintes perguntas interessantes e importantes. Porque a Igreja criou as paróquias como centros de referência da vida religiosa? Não seria preferível instalar o maior número possível de capelas e rezar nelas alternada e regularmente missas? De forma alguma. A Igreja procede com sabedoria e critério e nas suas organizações pauta as ações de acordo com perspectivas amplas. Aonde terminaríamos se existissem apenas pequenas capelas? Por acaso seria possível celebrar  o culto divino católico com a devida pompa e grandiosidade? O ano litúrgico deve proporcionar ao povo todas as verdades da nossa santa religião e mostrar como uma representação viva aos fiéis, os mistérios da vida de Cristo, que se celebram ao longo do ano. Como se celebraria dignamente  o Natal, a Páscoa, o Pentecostes e, principalmente, realizar devidamente uma procissão de Corpus Christi? Todas essas celebrações pressupõem recintos espaçosos, paramentos caros e uma grande  participação do povo. Além disto é exatamente neste dia em que toda a comunidade paroquial deveria sentir-se como uma única família e, para tanto, é preciso que se reúna num único lugar. Este é também o pressuposto para que possam acontecer com brilhantismo até as solenidades profanas. Esta é também a razão porque as autoridades eclesiásticas não vêm com bons olhos que nas festas maiores do ano, ocorram programações religiosas nas igrejas filiais (igrejas e capelas). Nas festas de família os filhos e filhas reúnem-se na casa paterna. Com a mesma razão os membros das comunidades das capelas deveriam encontrar-se na igreja paroquial, único lugar onde os dias festivos são celebrados com o brilho que lhes é devido. Querer fazer valer a própria vontade contra determinações claras e objetivas  da Igreja, significa miopia e estreiteza e conseqüentemente teimosia anti-católica.  Igualmente não católica é a atitude, observada cá e lá,  de recusar-se a assumir as obrigações comuns para com a igreja paroquial à qual se pertence e fazer apenas sacrifícios pela capela própria. Esse tipo de capelas merece ser abandonado de todo pelos sacerdotes, pelo fato de não quererem assumir as suas obrigações mais óbvias. Deveriam levar em conta o que muitos parecem ignorar, que nem sequer é permitido construir uma capela sem a autorização do bispo. Com isto, porém, o pároco não é automaticamente obrigado a rezar missa no local. O máximo que pode acontecer é que os fiéis gozem de vantagens nas ocasiões em que o pároco oferece a  oportunidade de uma visita. A freqüência dessas visitas epende, é claro, da sua disponibilidade e do acerto feito com a comunidade. Na hipótese, por ex., de estar sozinho, só raras vezes e apenas em dias de semana, terá condições de deslocar-se até uma capela e raras vezes a visita poderá acontecer num domingo.  Se puder contar com um auxiliar, dificilmente permitirá que este se desloque até a picada, nas festas maiores do ano, pelo fato de precisar dele para a celebração da missa festiva. Com certeza é mais importante que esta seja celebrada com muita solenidade, do que em vários lugares de forma discreta e abreviada. Qualquer um entende que as cerimônias eclesiásticas, quando se pretende que impressionem,  terão de ser conduzidas  de acordo com as prescrições  da Igreja.
É do interesse saber também quais foram as personalidades às quais se deve o benefício da elevação de Bom Jardim a paróquia. Ninguém pode negar que foi um grande bem, também no sentido profano, para quem de alguma forma tem familiaridade com as circunstâncias daqui. Onde quer que seja o comércio e a movimentação do povo concentra-se na vizinhança da igreja católica e a localidade mais insignificante entra, de imediato, num ritmo de progresso material, logo que é elevada à condição de paróquia e passa a contar com um sacerdote residente. É por esse motivo que observamos comerciantes não católicos, tomados de uma  grande vontade de contar com um sacerdote católico  na vizinhança. Essas pessoas sabem muito bem que com sua presença está colocada a precondição para o florescimento material. Vem-nos às memória o exemplo de Dois Irmãos com a sua "Judengasse"- ("Beco dos Judeus"), o desenvolvimento de São Sebastião e, neste momento Pareci. A igreja paroquial e o pároco polarizam como um ímã a população em torno de si. Mais ainda. A maioria das localidades mais importantes do estado, devem a sua origem ao mesmo modelo. Logo depois de instalar-se uma capela, agrupavam-se em sua volta os comerciantes e, pouco a pouco, com a afluência  contínua de moradores, formaram-se as pequenas e promissoras cidades de hoje. No interior da Europa não foi diferente. Artesãos e camponeses concentravam-se em volta dos mosteiros, porque estes normalmente  encarregavam-se  da cura de almas e buscavam os professores para as suas escolas. Depois dessa digressão voltemos a Bom Jardim.
Conforme a legislação da época em vigor, exigia-se para a instalação de uma paróquia o empenho conjunto do poder espiritual e temporal, para conferir um determinado lugar esta  distinção. A Assembléia Provincial de comum acordo com o bispo, decidiu que Bom Jardim fosse elevado à condição de paróquia. O mérito que levaram as autoridades a aprovarem a proposta coube a vários homens que se interessaram de forma extraordinária pela causa. Nomeamos em primeiro lugar o coronel Hildebrand simpático à causa da colonização alemã e nela empenhado. Já nos referimos a ele anteriormente. (61) Também merece destaque o há pouco falecido Johann Finger, ao qual devemos em grande parte as informações.  A serviço desta missão viajou 29 vezes a São Leopoldo para encontrar-se com o coronel Hildebrand, então juiz da circunscrição e sete vezes a Porto Alegre, para tratar o assunto com o Presidente de Província. Entre outros tomaram a si a causa o engenheiro Mabilde e o vigário de Dois  Irmãos, chegando-se por fim a um bom termo.
Outros fatores devem ter contribuído para que Bom Jardim fosse  distinguido com esse honroso privilégio. Já que no Brasil cabe ao dinheiro não pouca importância, estamos inclinados a arriscar o palpite de que dois  vendeiros ricos, ambos de confissão evangélica, ter-se-iam empenhado com entusiasmo pela causa. Na vida os motivos de natureza puramente espiritual, misturam-se, não raro, com razões temporais. Com isto não queremos criticar ninguém, mas ressaltar a importância do acontecimento em todas as suas dimensões.
No que se refere à extensão da paróquia, cobriu até recentemente,  a mesma área do tempo em que foi criada. Somente Algumas alterações menos importantes foram introduzidas mais tarde, como se pode verificar dos excertos dos registros que seguem.
Com  ao concordância do Exmo Sr. Bispo foi publicada em oito de maio de 1875  a lei de nr. 998, pela qual a antiga divisão sofreu  uma alteração. É o seguinte teor: O bacharel José Antônio de Azevedo Castro, Presidente da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, faz saber que a Assembléia Legislativa Provincial decidiu o seguinte, o que eu, Presidente, confirmo: Art. 1. Fica alterada a lei de nr. 635 de 1867 na parte que fixa os limites da paróquia de Bom Jardim. Parágrafo único. A citada paróquia de Bom Jardim terá os seguintes limites: para o sudoeste uma linha que começa no marco divisório da última colônia da Linha Capivara e termina no marco nr. 1 da colônia   de Costa da Serra, Para o sul estende-se uma linha a partir do último ponto nomeado, em direção leste até a colônia de nr. 19; para o sudeste localiza-se a Capela da Piedade (Hamburgo); para o leste uma linha que vai do Travessão da Piedade e Dois Irmãos para o norte até a linha divisória de Nova Petrópolis, da Linha Nova  e das 14 Colônias até a Barra, confluência do Feitoria com o Cadeia e, desse ponto, até uma linha que termina no marco limítrofe da última colônia da Picada Capivary. Desta maneira  a paróquia de Bom Jardim compreende  dentro de seus limites  todos os territórios que levam o nome de Capivary, Costa da Serra, Bom Jardim, Quarenta e Oito e Café.
Art. 2. São incorporados na paróquia de São José do Hortêncio os territórios de Linha Nova e 14 Colônias.
Art. 3. Revogam-se todas as disposições em contrário.
Assim, no que se refere aos limites da paróquia decretados em 1867, como foi assinalado acima, foram mantidos em linhas gerais, desde o começo até hoje. De direito também Holanda pertencia a Bom Jardim, mas permaneceu por algum tempo ainda sob a jurisdição de São José do Hortêncio. Decisivo nesta questão foi o desejo dos moradores da Picada Café e o fato de Bom Jardim contar com um único sacerdote, enquanto que em São José residiam mais sacerdotes. Não demorou, porém, para ficar claro que sem Holanda, Bom Jardim não dispunha de renda suficiente e, além disso, não tinha trabalho suficiente para um pároco. O bispo já estava disposto a retirar o sacerdote da pequena paróquia, quando em 1875 se firmou um acordo, com a anuência do bispo diocesano, (62) entre o pároco de São José e o de Bom Jardim, pelo qual Holanda era atendida a partir de Bom Jardim, como acontece até hoje.
A ereção canônica da paróquia aconteceu  no ano de 1869 pelo Revmo. S. Bispo D.  Sebastião Dias de Laranjeira. Com essa finalidade dirigiu-se a Bom Jardim, em companhia de alguns dignitários eclesiásticos e participou da missa solene comemorativa do ato. O primeiro vigário foi  Pe. Franz Schleipen, que anteriormente havia exercido a função de capelão no local. Desde a sua chegada o povo o recebeu como "seu vigário" e foi-lhe preparada uma recepção em grande estilo. Evidentemente todos estavam convencidos  de que, com a elevação a paróquia e com um sacerdote residente, Bom Jardim ganhara muito em prestígio e importância. Por essa razão o acontecimento foi de satisfação e  alegria generalizada. O cortejo festivo foi organizado a partir da casa do sr. Emmerich. Tomaram parte nele não só os católicos, como também moradores protestantes da paróquia, destacando-se entre eles os srs. Herzer e Reser.
Inicialmente havia sido programado que o coral e a banda de música se apresentassem juntos, para dar um efeito maior. Mais tarde, por insistência do professor Schütz, foi decidido que o coral e a banda se apresentassem em separado. Foi melhor assim, pois as celebrações puderam ser melhor coordenadas. Uma criança declamou uma bonita poesia de boas vindas. Agradou a tal ponto que o Pe. Schleipen pediu para guardá-la como recordação. Mais tarde foi impressa para que outros a guardassem como lembrança do acontecimento tão importante para Bom Jardim.
Em junho de 1871 completavam-se 25 anos que Pio IX ascendera ao trono de São Pedro. Desde São Pedro, o primeiro papa, nunca acontecera  que o governo de um papa fosse tão longo. "Non videbis annos Petri - Não viverás os anos de Pedro - clamou conforme o costume um funcionário, para o papa por ocasião da coroação. Esse teria respondido sorrindo: "non est dogma- não é dogma". Mesmo que não fosse um dogma tratava-se, contudo, de um fato histórico de grande satisfação e único, que  nessa ocasião faz recordar, aos católicos do mundo inteiro primeiro papa, São Pedro, fortalecendo a fé na santa Cátedra. Depois de em Dois Irmãos  ter-se festejado  com brilho a festa do papa, manifestou-se também em Bom Jardim  o desejo de promover uma comemoração igualmente brilhante. Bom Jardim tinha um motivo adicional para tanto, pois São Pedro era o patrono da comunidade paroquial. Inscrições foram providenciadas, grinaldas e  tecidos confeccionados, a igreja ornamentada e a festa celebrada com toda a pompa. Foi um acontecimento ainda mais memorável do que a festa da vitória da Alemanha! Foi também uma festa de vitória no sentido mais profundo, uma festa da vitória dos dezoito séculos do Reino que se estende sobre o mundo e que chamamos de Igreja Católica, festa de vitória sobre os inimigos que combatem o papado sem cessar, com muito ódio e ímpeto. Quando o pároco conclamou a comunidade um tanto fria, para uma comunhão em homenagem ao papa, apesar do frio de junho, participou tanta gente que parecia dia da comunhão pascal na comunidade. Frente ao grande entusiasmo dos fiéis o vigário um tanto desencorajado pela situação religiosa foi tomado da certeza: "de que o  que está fundamentado sobre a indestrutível rocha de Pedro não se pode dar por perdido." O êxito do evento justificou de fato a expectativa do  pároco. A vida em torno da igreja entrou num novo ritmo. A seguinte anedota caracteriza a situação de então: Um pouco antes um membro menos fervoroso da comunidade foi ter com o vigário com o Deutsche Zeitung de von Koseritz na mão. Nele liam-se as brilhantes palavras: "Dez milhões de católicos irão separar-se do papa pois milhares de sacerdotes apóiam Döllinger. Aquele cidadão acreditava que a situação que a situação na Alemanha era, de fato, tão séria e provavelmente tinha esperança de que aquele prognóstico se concretizasse. Aconteceu exatamente o contrário. Os católicos das 14 Colônias mantiveram-se fiéis ao papa e à Igreja tradicional e os novos profetas só a muito custo conseguiram arregimentar para a igreja do estado alguns milhares de católicos separatistas. Os poucos sacerdotes apóstatas, ou morreram de uma morte miserável ou se arrependeram e voltaram ao seio da Mãe Igreja.
O recenseamento do ano seguinte registrou para Bom Jardim 850 católicos que, somados aos de Holanda resultaram num total de 1.200. O número de protestantes foi um pouco maior.
De acordo com estes números Bom Jardim era uma paróquia relativamente pequena. Este fato por si só, porém, não chegava a ser uma desvantagem, porque por essa mesma razão oferecia maior facilidade para ser  administrada. E, de fato, em questão (64) de pouco tempo as coisas tomaram o rumo certo. Este fato por si só significou um resultado notável para o qual contribuiu o grande zelo dos sacerdotes e a boa vontade do povo. Para instalar uma paróquia necessita-se não menos tempo do que uma arvorezinha para transformar-se numa grande árvore.
As comunidades são como árvores, porque os organismos religiosos são vivos e não estáticos. A partir de começos modestos evoluem aos poucos, levando anos para consolidar-se como manda a sua natureza. Bom Jardim não foi uma exceção. Os moradores católicos das picadas como a Quarenta e Oito, Bohnenthal, Schneidersthal e Holanda, organizaram-se em comunidades de capelas. Formavam as quatro raízes-mestras sobre as quais se consolidou o tronco da paróquia. Assim como  a árvore se constitui numa unidade em si, deve acontecer também com uma paróquia. É preciso que nela reine unidade e entendimento aliados à harmonia e ao empenho constante. Se cada raiz se empenhasse apenas  pelos próprios interesses, nunca se desenvolveria  uma árvore harmoniosamente  acabada. Portanto, as picadas individualmente devem contribuir, à maneira das diferentes raízes, para o grande objetivo, caso se pretenda que a árvore ostente grandeza, beleza, vigor e fecundidade. Pergunta-se: não é, na verdade, algo de grande, quando vários milhares de almas em colaboração harmônica, garantem o suporte para o fomento e a continuidade da vida religiosa de um amplo território? Não é algo belo quando o culto divino é celebrado no brilho que lhe é devido por uma comunidade paroquial? Todos os galhos e ramos unem-se entre si num só corpo e numa bela ordem e o magnífico todo fundamenta-se na solidez da mesma fé, amor comum e comprometimento consciente. Uma paróquia transforma-se também numa entidade maravilhosa e sólida, como o demonstram, de modo especial, tempos de perigo e de penúria. E, finalmente, no que diz respeito à fecundidade, cada um se convence de que acontece um bem enorme numa comunidade, o que provavelmente não aconteceria fora dela. São principalmente três as grandes obras que só tem condições de terem êxito a partir da sede paroquial. A formação religiosa por meio de um culto divino regular nos domingos e dias santificados; a escola  que só então tem condições de ser levada ao nível desejado, tanto no que se refere ao aspecto administrativo como religioso, quando o pároco e o professor atuam em harmonia e entusiasmo; e, finalmente, as associações, tão necessárias nos dias de hoje, que dificilmente poderão dispensar a colaboração do pároco, se pretendem estar a serviço do verdadeiro bem estar da comunidade.




[1] Os nomes dos noivos costumavam ser comunicados do púlpito durante três domingos antes de efeturar-se o matrimônio, para que se alguém tivesse uma objeçao grave de impedimento, tivesse tempo de o fazer chegar à instância competente.