Pela
influência, para não dizer hegemonia, pior ainda, a tirania, que a “Teoria
Crítica” formulada pela Escola de Frankfurt exerce em todos os níveis de
ensino, também no Brasil, merece algumas considerações.
A
matriz da “Teoria Crítica” desenvolvida pelos pensadores da Escola de Frankfurt
fundamenta-se na lógica do marxismo. Entretanto, ampliaram o seu alcance, tornando-a válida
não só para a Economia, mas para o funcionamento da dinâmica da cultura como um
todo e o potencial de manipulação da mesma por meio das mais diversas formas de
comunicação social hoje disponíveis. O resultado prático leva o nome de
“Indústria da Cultura”, isto é, a manipulação da produção cultural com todas as
suas vertentes pelos meios de comunicação, com o objetivo de anular a individualidade
e fazer valer o pensamento politicamente
correto ou a ideologia hegemônica, como ensina Gramsci. Assim a Teoria Crítica
caracteriza-se como a antípoda do Idealismo que defende a individualidade como
fator determinante na dinâmica da evolução das culturas. O que parece mais
grave na Indústria da Cultura é o fato de negando a individualidade, as pessoas
são reduzidas a simples números num rebanho tangido conforme as regras ditadas
pelo pensamento politicamente correto. Com isso se destrói o princípio de que o
individuo é essencialmente um ser moral dotado da capacidade de discernir o que
é certo ou errado e, o mesmo tempo livre para agir de acordo ou contra os
ditames dessa consciência. Os donos do pensamento hegemônico valendo-se dos
meios de comunicação social, as instituições de ensino de todos os níveis e
outros meios de que dispõe, tentam moldar a cosmovisão das pessoas de acordo
com seus objetivos, isto é, impor a cultura de cima para baixo e desta maneira
traçar o caminho de como fazer história. Neutralizam-se, melhor, destroem-se,
assim, os ditames da consciência dos
indivíduos e, por isso mesmo, a ética junto com a liberdade pessoal. Ético ou
moral vem a ser aquilo que é vendido
como tal pelo aparato da propaganda em todas as suas modalidades, engajada nos
objetivos de um projeto cultural defendido por seus teóricos e executado pelos
seus adeptos.
Abre-se
com isso um leque de reflexões sem conta e efeitos embutidos na proposta da
“Teoria Crítica”. Não é aqui nem o momento nem o lugar para uma reflexão
exaustiva dessa questão. Chamamos apenas a atenção ao que leva a defesa da sua
proposta e, sobretudo, seu significado prático, quando entram em pauta iniciativas, projetos e
estratégias para enfrentar os graves problemas que resultam da ação predatória
do homem ao lidar com a natureza, “a nossa casa”, a “nossa mãe e pátria”, explorando seus recursos e, pelo direito
natural, o justo acesso a eles por todo
e qualquer ser humano. Não há necessidade de um esforço especial para concluir
o que resulta na prática no momento em que o referencial do que o ético ou
moral é ditado pelo politicamente correto, ou se preferirmos pela tirania do
pensamento hegemônico.
E
com essas considerações chegamos à última reflexão inspirada no Capítulo II da
Encíclica Verde. Parece oportuno relembrar o pensamento que inspirou e com que
apresentamos o livro “A Natureza como Síntese”, Edit. Oikos, 2017.
Em dezembro de
2015, realizou-se em Paris a Conferência Internacional do Clima.
Reunidos estavam os chefes dos governos das grandes potências, dos emergentes,
além de representações de países do terceiro mundo. O show foi comandado pelas estrelas dos primeiros. Não deixaram de
se fazer ouvir também as vozes das organizações que pululam pelo mundo afora,
com o propósito sincero ou nem tanto para salvar o que sobrou da natureza “a casa da
humanidade” na qual surgiu a espécie humana, a briga e sustenta. (A. Rambo,
2017, p. 13)
Como
não podia deixar de ser os debates que orientaram aquela conferência tiveram
como preocupação central os interesses geopolíticos, geoeconômicos,
geoestratégicos além de outros mais ou menos legítimos ou não. O documento
final assinado por 180 países o confirma mais nas entrelinhas do que nas
próprias linhas. Mas esse é um assunto com que nos ocupamos em outra passagem
das presentes reflexões. O que preocupa não é tanto o que o documento final
assinado por perto de duas dezenas de países, mas o que falta nele. Os
compromissos assumidos pelas autoridades signatárias baseia-se numa lógica que
o condenam diante mão à inocuidade pelas propostas apresentadas, pelos prazos
de execução estipulados e, principalmente, o cumprimento do proposto entregue à
reponsabilidade e, como tal, ao arbítrio dos governos de plantão no momento de
por em prática as necessárias medidas.
O
documento carece de uma análise exaustiva da exigência ética e do dever
moral de que os recursos naturais são
bens comuns e, portanto, a oportunidade de acesso a eles é um direito natural
de qualquer pessoa. Mas, essa questão
também já foi abordada mais acima, como também já foi examinado o alerta da
Encíclica tendo em vista as doutrinas e práticas de disciplinamento do corpo.
Uma conclusão que não pretende esgotar toda a extensão e profundidade da
relação do homem com a natureza, consiste num repensar e redefinir os conceitos
políticos, econômicos, culturais, antropológicos, históricos, filosóficos,
teológicos e, sobretudo, éticos e morais que regem as relações do homem com a
“sua casa”, “sua mãe e pátria”. O Papa na sua encíclica sinaliza com ênfase
nessa direção ao propor uma revisão da
Cosmologia e da Teologia Natural de mãos dadas com resultados que o avanço das Ciências Naturais oferecem a todo
o dia que passa.
O Novo Testamento não nos
fala só de Jesus terreno e da sua relação tão concreta e amorosa com o mundo; O
mostram também como ressuscitado e glorioso, presente em toda a criação com seu
domínio universal. ‘Foi Nele que aprouve a Deus habitar toda a plenitude e, por
Ele e para Ele, reconciliar todas as coisas (...), tanto as que estão na terra
como as que estão no céu´. (Cl 1, 19-20). Isto lança-nos para o fim dos tempos,
quando o Filho entregar ao Pai todas as coisas ‘afim de que Deus seja tudo em
todos’. (1Cor 15,28). Assim as criaturas deste mundo já não nos aparecem como
uma realidade meramente natural, porque o Ressuscitado as envolve
misteriosamente e guia para um destino de plenitude. As próprias flores do
campo e as aves que Ele admirado, contemplou com seus olhos humanos, agora são
cheias da sua presença luminosa. (Lauato si, 100)
Acontece
que a ciência e tecnologia pela sua natureza não são nem boas nem más, em outras palavras são eticamente
neutras. O homem dotado de razão e liberdade destina-as tanto para fins moralmente aceitáveis ou rejeitáveis.
Teilhard de Chardin comentando esses viés da questão deixou a advertência de
que todo o progresso da humanidade deve-se às “maravilhosas ferramentas” que as conquistadas da ciência e
tecnologia desenvolveram nos últimos dois séculos. Mas, chama a atenção que há
um lado preocupante em tudo isso. Os especialistas nas mais diversas áreas
levam as pesquisas até ponto em que a penetração até as minúcias da
estrutura e funcionamento dos seres
vivos, ou o desmonte e análise das peças de uma máquina, o fazem ignorar ou
desperceber que o tecido que estão dissecando ou a peça que estão examinando, fazem
parte funcional de um organismo ou que a peça que procura substituir ou
consertar foi desenhada por um
engenheiro mecânico como componente funcional sem o qual o todo de uma máquina
não funciona ou funciona mal quando danificado. Quando a especialização
ultrapassa um determinado nível termina por confinar o universo do especialista
numa redoma mental e conceitual hermeticamente limitada. Para evitar esse
perigoso afunilamento da mente, Oscar Niemeyer o mais respeitado arquiteto
Brasileiro recomenda que nos currículos como engenharia, arquitetura e outros
mais se inclua a filosofia e história para que os especialistas ou técnicos nas
respectivas áreas, estejam em condições de participar de reflexões sobre a
vida. Aliás, a produção de conhecimento de alto nível, e o desenvolvimento de
tecnologias de ponta do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets),
deve-se, sem dúvida ao currículo dos seus cursos com o feitio recomendado pelo
exímio arquiteto que projetou Brasília. A superespecialização sem a
complementação de conhecimentos oferecidos pelas Humanidades, Letras e Artes
pode até levar a resultados tecnicamente irretocáveis, porém, monstrengos sob o
ponto de vista humano. Uma cabana de costaneiras numa paisagem rural construída
por um prático semianalfabeto pode sugerir muito mais conforto, aconchego e
calor humano do que um apartamento de luxo num prédio imponente no centro de
uma metrópole. Voltando a Niemeyer, aquele prático certamente percebe e entende
muito mais da vida e das suas alegrias e dramas humanos, assuntos do seu
quotidiano do que um engenheiro enclausurado no seu gabinete climatizado,
montando projetos de edifícios, viadutos, pontes. E, depois do expediente
enfrenta um trânsito infernal, respira o odor do asfalto e se recolhe a um
apartamento, também climatizado, sem possibilidade de encher os pulmões com a
brisa da tarde cheia de vida, soprando do campo aberto. Creio que deu para
sentir o que acomete muitos especialistas quando seu ofício os sega para o
grande mundo humano e as pessoas que o rodeiam com seus dramas e alegrias que
não são passíveis de medição com uma régua ou não previstos num programa de
computador.
O
Papa aponta para o pior dos resultados
negativos quando as conquistas da Ciência e Tecnologia servem como
instrumentos de poder.
Não podemos, porém, ignorar
que a energia nuclear, a biotecnologia, a informática, o conhecimento do nosso
próprio DNA e outras potencialidades que adquirimos, nos dão um poder tremendo.
Ou melhor: dá, àqueles que detêm o conhecimento e sobretudo o poder econômico
para o desfrutar, um domínio impressionante sobre o conjunto do Gênero humano e
do mundo inteiro. Nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma, e nada
garante que utilizará bem, sobretudo se considera a maneira como está a fazer.
(Laudato si, 104)
Não
há necessidade de grande esforço para comprovar o alerta da Encíclica. O
simples fato de que a humanidade está em condições de inventar e produzir
artefatos cada vez mais potentes e destruidores já por si só deveria assustar.
O exemplo mais gritante temos no constante aperfeiçoamento da energia atômica
para desenvolver armas de um poder devastador imprevisível. Ninguém de sã razão
irá negar que de posse das tecnologias de fabricação de armas atômicas somada
ao desenvolvimento de artefatos que são capazes de transportá-los a dezenas de
milhares de quilômetros, transforma até países economicamente insignificantes,
em ameaça para o equilíbrio regional até
do mundo todo. Em mãos de títeres ébrios de poder, seus
recursos são canalizados em benefício de suas ambições, condenando o
povo a se contentar que as parcas migalhas que sobram ou simplesmente
abandonado à própria sorte. O poder que essas conquistas colocam nas mãos dos
que as geram e dos que dispõem delas, é preocupante e em certos casos
assustador. À tecnologia que tem como objetivo o aproveitamento cada vez mais
exaustivo da energia nuclear, soma-se o arsenal dos demais armamentos
destinados a alimentar guerras e conflitos. A serviço de sistemas
totalitários e nas mãos de autênticos genocidas vitimaram dezenas de
milhões de pessoas nos campos de batalha, campos de concentração e sob bombardeios
impiedosos de cidades com sua população civil de mulheres, crianças, inválidos,
enfermos em hospitais e idosos, no decorrer do último século. E não podemos
deixar de chamar a atenção aos efeitos agressivos à natureza que acompanham ou
são consequência do descontrole e do uso sem limites, por ex., do emprego da
energia nuclear. Lembramos como exemplos o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki e
o acidente com a usina de Chernobil na Ucrânia e de Fukushima no Japão. Se todo esse poder e potencial tivesse sido
investido para melhorar as condições de vida dos povos e não na marginalização
e no mútuo extermínio, a “nossa casa” seria de fato, relembrando os conceitos
que acompanham as nossas reflexões, uma “querência”, “uma mãe e pátria”. Infelizmente, admoesta o Papa,
Tende-se a crer que toda a
aquisição de poder seja simplesmente progresso, aumento de segurança, de
utilidade, de bem-estar, de força vital, de plenitude de valores, como se a
realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da
tecnologia e da economia. a verdade é que o homem moderno não foi educado para
o reto uso do poder, porque o imenso crescimento tecnológico não foi
acompanhado por um desenvolvimento do ser humano quanto à responsabilidade, aos
valores, à consciência. (Laudato si, 105)
Bem
considerado “o homem moderno não foi educado para o reto uso do poder