Falar
em saúde ou na sua antípoda a doença nos primeiros cem anos da imigração alemã
no Sul do Brasil, significa tocar num assunto que deixava as pessoas e as
comunidades em constante sobressalto. É verdade que os imigrantes trouxeram bons
hábitos de higiene e alimentação que, aliados a uma formação média de bom nível, fizeram com que a mortalidade infantil fosse
relativamente baixa e as condições de saúde de crianças e adultos aceitável em situações normais. A
questão assumia outras proporções nos casos de doenças mais sérias e de
acidentes de trabalho com ferimentos graves. Tornava-se dramática nos períodos
de epidemias de tifo, cólera, varíola, que exigiam a intervenção de médicos ou
pelo menos pessoas com conhecimentos mais avançados de medicina. O Pe. Ambros
Schupp caracterizou assim o estado das coisas com a saúde nos primeiros tempos
da imigração, na sua obra: “A Missão dos Jesuítas Alemães no Rio Grande do
Sul”:
Práticas de medicina - Parte #1
A situação na colônia no
que diz respeito a doenças foi durante muito tempo lamentável. Na colônia
praticamente não havia médicos e, por isso mesmo, tanto mais charlatães. Mandar
vir um médico da cidade significava na prática sacrificar uma fortuna e nem
então se tinha certeza que de fato se tratava de um médico pois, muitos que se
apresentavam como médicos e doutores, na verdade eram apenas contínuos de
farmácia, auxiliares de hospitais ou pessoas do gênero. (Schupp. 2004, p.
204-205)
Consideradas
essas circunstâncias fica relativamente fácil deduzir os recursos disponíveis
para socorrer os colonos nas suas enfermidades. Naquelas rotineiras como gripes, resfriados, febres ou
ferimentos superficiais, o povo recorria aos remédios caseiros de chás,
compressas, água com sal, infusões à base de aguardente, etc. Não raro
procuravam-se charlatães ou algum pseudo
médico que por acaso estivesse ao alcance. Em doenças mais graves e ou
ferimentos mais sérios a única saída
consistia em entregar a questão nas mãos
de Deus e rezar. Pode-se afirmar que esta era na verdade a situação na grande
maioria das comunidades coloniais nas primeiras gerações da imigração.
Diante
dessa penúria em relação à assistência relacionada com a saúde e às doenças, tanto
pastores protestantes quanto sacerdotes católicos costumavam prestar, ao lado
da assistência pastoral propriamente dita, também algum socorro no plano da
saúde. O Pe. Schupp ao referir-se a esta
questão deixou registrada a atuação dos padres Lipinski, Blees e Pfluger.
Já o Pe. Lipinski dispunha
de sua farmácia homeopática e, mesmo que suas
doses ínfimas não produzissem grandes efeitos, contribuíam para elevar a
confiança dos pacientes e aliviar o seu sofrimento. Os doentes não se esqueciam
dos seus préstimos e ainda muito tempo mais tarde lembravam-se dele com grata
recordação. Mais tarde o Pe. Blees
conquistou, por assim dizer, fama
de médico com suas curas, a ponto de muitos colonos vindos de mais longe
procurarem seus conselhos e sua ajuda. Nas suas excursões levava sempre três
coisas: sua farmácia homeopática, seu bom humor e seu consolo cristão. As três
faziam dele um hóspede bem-vindo em toda
a parte. (Schupp, 2004, p. 205)
A
medicina pastoral era praticada por muitos outros sacerdotes que, ao lado da
atividade religiosa, costumavam prestar também esse serviço de solidariedade e
caridade. Além das práticas homeopáticas como chás, infusões e outras formas,
popularizou-se na segunda metade do século dezenove, o método Kneipp da cura
pela água. Seu maior divulgador foi o Pe. Mathias Pfluger, vigário de São
Salvador, hoje Tupandi. Ele tinha sido colega de seminário de Kneipp e atribuiu
à aplicação do método sua cura quase milagrosa:
Quando nós dois estudávamos
juntos no seminário, fui acometido de tifo, levando-me à beira do túmulo.
Kneipp, porém, dizia com certeza intuitiva: Confia em mim, eu te curo. E como
segundo os médicos não tinha mais nada a perder, submeti-me à sua cura, que
Kneipp, porém, aplicou em segredo, mas com tanto êxito que os médicos se
mostraram estupefatos. (citado por Chupp, 2002, p. 205).
A
recuperação do Pe. Pfluger foi tão
completa quanto duradoura. Ordenou-se
sacerdote, entrou depois na Companhia de Jesus, foi mandado para a Missão do sul
do Brasil, fundou e organizou a paróquia de São Salvador, onde faleceu em 1905
aos 77 anos de idade. Entende-se assim que ele difundisse esse método entre os
próprios paroquianos e os das paróquias vizinhas. Devido à popularidade que
conquistou esse método, ele merece alguns comentários.
Na
introdução da sua obra “A Cura pela Água” o pároco Kneipp detalhou as bases
sobre as quais se apoiava o seu método.
Em primeiro lugar o “o corpo humano é uma obra prima saída das mãos de Deus.
Cada pecinha ajusta-se à maior e todas elas no seu conjunto formam um todo
harmônico”. A perturbação da harmonia chama-se doença. Todas as enfermidades,
chamem-se com se quiser, têm a sua origem no sangue ou melhor na perturbação do
sangue, tanto na circulação quanto na composição, por líquidos deteriorados. A cura se dá pela eliminação
dos ingredientes perturbadores do sangue que são as doenças. Essa eliminação se
dá por meio da “cura pela água”. A água age de três maneiras: separa os agentes
tóxicos do sangue, elimina-os e fortifica o organismo debilitado. Kneipp
afirmava que todas as doenças curáveis tem cura pelo método que ele criou, por
agirem na raiz da própria enfermidade: separando os agentes tóxicos,
eliminando-os, restabelecendo a circulação normal e, finalmente, temperando e
fortificando o organismo.
O
método Kneipp da “Cura pela Água” gozou de uma aceitação impressionante na
Europa e em outras partes do mundo, nas décadas finais do século XIX. Para se ter uma ideia, entre 1886 e 1893
houve 44 edições do seu manual. Não é aqui nem o lugar nem a ocasião para
entrar no mérito terapêutico do método. Em todo o caso a sua popularização pelo
Pe. Pfluger ainda repercute em
comunidades por ele atendidas no atual município de Tupandi e arredores, onde a
aplicação de práticas do método Kneipp ainda hoje podem ser observadas.
O
método Kneipp divulgado pelo Pe. Pfluger e os tratamentos por meios
homeopáticos de todo o tipo de enfermidade foram diminuindo na medida em que
médicos formados se foram instalando na região colonial. O Pe. Schupp informa
que, a partir daí, os superiores
proibiram as farmácias homeopáticas e a função de médicos, aos padres que
cuidavam daquelas paróquias
Referimo-nos
até aqui às práticas de saúde entre os colonos alemães católicos, normalmente
por conta de padres encarregados da pastoral. Do lado dos evangélicos a
assistência aos colonos, apresentava características muito semelhantes. Parece
que entre eles a presença de profissionais da saúde leigos aconteceu mais cedo
do que entre os católicos. Até um médico, o dr. Carl Gottfried von Ende,
encontrava-se entre as primeiras levas. Mas uma assistência mais permanente
ficou a cargo de pastores a serviço das diversas comunidades. Se entre os
católicos sobressaíram os padres
Lipinski, Blees e Pfluger, entre os
protestantes o pastor Peters é a personalidade mais emblemática. Nascido
em 1842 veio ao Brasil em 1871 e seu campo de trabalho veio a ser o Forromeco
com as quatro comunidades: Forromeco,
Feliz, Francesa, Porto dos Guimarães (São Sebastião do Caí). Não vem ao caso
aqui as enormes dificuldades que no começo tornaram sua atividade pastoral
extremamente difícil. Um dos fatores que finalmente lhe conquistou a confiança
e o apreço, foram suas habilidades no tratamento das doenças mais comuns do
quotidiano da colônia. Como estudante no Seminário de Barmen atuara como
enfermeiro voluntário durante uma epidemia de cólera, familiarizando-se com os
procedimentos mais essenciais de enfermagem, o que lhe seria muito útil no
contato com os problemas de saúde dos colonos a ele confiados. A prática adquirida cuidando de afetados pela
cólera, somada ao aprofundamento dos conhecimentos relativos a doenças, doentes
e respectivos tratamentos, o Pastor Peters aliou cuidado pela saúde da alma ao
bem estar do corpo. O êxito nos dois
planos conquistou-lhe, por fim, admiração e a veneração dos fieis.
Para tanto, muito contribuiu
o fato de prestar assistência médica a
todos os doentes e, tanto em virtude do dom natural para essa profissão quanto
através de uma prática que sempre mais se ampliava, tornou-se capaz de realizar grandes coisas. Não só prescrevia
medicamentos, como também realizava operações. E é maravilhoso que não tenha
falhado em nenhuma das muitas, por vezes complicadas operações ou que alguma delas tenha tido fim trágico. A fama de seus
conhecimentos médicos e de sua destreza, em breve, ultrapassaram os limites de
suas comunidades. Foi visitado, consultado, buscado, e seu trabalho se
multiplicou de maneira tal que o cansava e desgastava. (Os Dois Vizinhos e
outros textos, 1997, p. 193)
É claro que a prática médica
lhe aplainou o caminho em muitas dificuldades. Jamais estive no Forromeco sem que de fato muitas pessoas,
em busca de socorro, viessem à casa
pastoral, e Peters não conseguia andar a cavalo, em sua comunidade e
fora dela, sem que fosse consultado por doentes. A procura e a confiança nele
eram muito grandes e deve-se dizer que tinha um tino admirável para descobrir a
causa dos sofrimentos e grande segurança ao operar. Era um “médico por graça de
Deus”, como bem foi dito, e como tal foi benfeitor de milhares. ( ... ) Como
fosse consciencioso, de modo algum quis assumir o papel de “charlatão”. Por
isso reiniciou seus estudos de medicina, iniciados em Barmen. Em breve, podiam-se
encontrar em sua biblioteca as mais recentes e melhores obras da área de
terapêutica; sua biblioteca tornava-se, ano após ano, mais completa e seus
instrumentos eram tão diversificados que um médico urbano ocupadíssimo,
certamente não teria necessitado de mais. (Os dois Vizinhos e outros textos,
1997, p. 201).
Deixando
de lado o charlatanismo desde o começo presente no meio colonial, o Pastor
Peters e em escala menos visível os padres jesuítas antes mencionados, foram os
protótipos do médico prático. No caso de
Peters falou-se em “médico por graça de Deus”. Comumente a referência a estes é
de médicos que “praticando” tornaram-se profissionais.
Eles podem ser encontrados, até 1930, em não poucas comunidades coloniais pelo
sul do Brasil, prestando serviços de alto valor. Não há necessidade de insistir
que, também partir da segunda metade do
século dezenove médicos formados em escolas de medicina na Alemanha, emigraram
para o Brasil. A grande maioria, porém, estabeleceu-se nos centros maiores para
atender às comunidades urbanas de
imigrantes assim como a população em geral.
Classificamos
as doenças de que nos ocupamos até aqui como aquelas rotineiras: gripes,
resfriados, infecções das vias respiratórias e outras mais, relacionadas
normalmente à mudanças na rotina climática ou acidentes mais leves como fratura
de braços ou pernas, cortes superficiais, etc. A situação tornava-se bem mais complicada
quando enfermidades mais graves como pneumonia, pleurisia, apendicite, surtos
de tifo, varíola, mordida de cães raivosos, partos complicados ou acidentes
graves de trabalho, exigiam socorro especializado. Nas três primeiras décadas
um pouco mais havia por fazer do que confiar na capacidade de reação de cada
enfermo ou entregar a questão nas mãos
de Deus. Já durante a década de 1850, com a formação das comunidades urbanas de
imigrantes em Pelotas, Rio Grande, Porto Alegre e outras cidades,
estabeleceram-se aí também médicos que atendiam em seus consultórios
particulares e/ou na Santa Casa. Nos casos de urgência o maior problema ficava
com a distância e as condições de
transporte do doente ou do acidentado. No momento em que se configurava uma
situação do gênero numa picada no interior do vale do Caí, por exemplo, a
remoção até a Santa Casa dividia-se em três etapas. Na primeira carregava-se o
acidentado numa maca improvisada até o local onde numa segunda etapa era levado
de carroça até o porto fluvial de Caí ou Montenegro. A viagem continuava depois
numa lancha pelo rio até Porto Alegre.
Não é difícil de entender de que, em tais circunstâncias, um número mínimo de
casos graves pudessem ser socorridos com chance de êxito. Evidentemente só em
situações em que o paciente estava em condições de sobreviver à viagem, fato
que se dava por ex. quando alguém era mordido por um cão raivoso, sofria de
tuberculose, casos de queimaduras mais sérias ou outros males que exigiam um
tratamento que reclamava recursos especializados e acompanhamento presencial do
médico e de enfermeiras. Jornais, almanaques, periódicos e outras
publicações da época jornais registraram muitos exemplos a respeito.
O caixeiro viajante - O caixeiro viajante e sua mula
O deslocamento desde as casas matrizes de
Porto Alegre em busca dos comerciantes do interior, oferecia uma série de desafios a serem enfrentados e vencidos. Para
começar, era preciso escolher o melhor e o mais seguro meio de locomoção. Numa
época em que as primeiras ferrovias estavam sendo construídas e a navegação
fluvial estreava nos rios da região, a locomoção terrestre era forma mais
rápida e mais segura pra alcançar todas picadas, também as mais afastadas sem
falar da Campanha, cavalgando nas condições mais precárias que se podem
imaginar. Nestas condições a mula era a montaria mais indicada, por ser um
animal pouco exigente, robusto, versátil, de apreciável longevidade, bem acima
do cavalo, embora mais lenta e despida da aura de nobreza e da fama dos lances
épicos do cavalo do gaúcho. Aliás, a mula imortalizou-se na história do Rio
Grande do Sul, por ter sido um dos esteios da pujança econômica no período do
charque. Caravanas e mais caravanas de mulas, revezavam-se no transporte de
charque para o centro do País. Percorriam a lendária estrada das mulas,
saindo de Charqueadas, passando por
Porto Alegre, Viamão, Glorinha, Santo Antônio da Patrulha, São Francisco de
Paula, Jaquirana, Vacaria, atravessando
Santa Catarina, Paraná, São Paulo, para terminar em Minas Gerais. E no momento em que no Rio Grande do Sul
começava uma nova fase de progresso
econômico, a mula foi novamente convocada como peça fundamental para colaborar
do processo. Desta vez não mais como besta de carga, mas como portadora dos
intermediadores do comércio que carregavam em suas bruacas algo mais do que
amostras, faturas, encomendas e pagamentos. Em seu lombo viajavam também as
novidades e as notícias vindas da capital do Estado, do País e do grande mundo,
para alcançarem as comunidades e os moradores mais distantes do interior
colonial de da Campanha.
O caixeiro viajante e sua mula perfaziam uma
simbiose perfeita, capaz de dar conta da tarefa que lhes fora confiada, isto é,
garantir o pulsar da economia regional, veicular a cultura, fazer circular a informações de toda natureza
entre a Capital, os centros urbanos e as
picadas mais remotas na mata. Por meio deles chegavam também as notícias dos
acontecimentos do País e do mundo, fazendo às vezes do jornal, do rádio e
porque não da televisão de hoje. Atuava, enfim, como poderoso antídoto contra o
isolamento, a estagnação, a involução e o empobrecimento econômico, social,
cultural e físico das comunidades do interior. Em ocasião alguma da história a
mula, esse animal tão útil e inúmeros países e, ao mesmo tempo, considerado o
escravo entre os animais, desprezado, símbolo da falta de inteligência, da
teimosia irracional e de uma estupidez primigênia e insanável, experimentou um
reconhecimento de sua utilidade, tão explícito e tão sincero, como lhe foi
dedicado pelos caixeiros viajantes. Nos versos que intitulou de “Mula Morta”, o
poeta “Cyclop”, pseudônimo do caixeiro viajante Alfred Wiedemann, descreveu em
versos o que significou a mula para esses agentes comerciais. Reproduzo o
conteúdo dos versos em prosa livre:
Era uma vez um caixeiro viajante que há
muitos anos cavalgava sua mula. Onde
quer que fosse encontrado, irradiava seu
alto astral, porque a profissão de caixeiro viajante lhe dava prazer. Montava
uma velha mula que não vendia nem por 5 contos. Cavalgava-a de acordo com as
regas da velha escola, enfrentando sem medo as pequenas e grandes dificuldades.
Em muitas ocasiões pelearam juntos duras escaramuças.
São do caixeiro viajante Alfred Spindler os
versos aqui reproduzidos em prosa livre: Tens quase trinta anos. Passaste por
inúmeras borrascas, sempre me carregando em segurança nas horas negras e nos
momentos agradáveis. Nunca vacilaste ou renegaste a caminhada. Passamos juntos,
apenas nós dois, incontáveis e inesquecíveis noites no meio do mato.
Inteiramente a sós cruzamos o campo, tendo como companhia apenas as cobras, as
rãs e as corujas. Apesar de não conversares comigo eu te entendia. Sem errar e
para minha sorte interpretava o teu relinchar ao longe. É verdade, não poucas
vezes te evadiste do potreiro durante a noite. Mas a tua magnífica voz indicava
ao dono irritado onde te encontravas. E quantas não foram as memoráveis
ocasiões em nós dois atolamos no lodo. Nessas ocasiões o chicote e as esporas
eram inúteis. Teu apetite foi sempre grande e sadio. Mostravas-te satisfeito
quando te serviam, tanto milho quanto raízes ásperas, pasto picado ou palha
seca. E quando os outros zombavam de mim tu me mostravas a tua simpatia. Como
uma autêntica mula não me abandonaste
diante da ameaça de acidente iminente. Agora nunca mais passarás
necessidade, até o dia da tua morte tranquila, irás privar comigo pois, só te montarei
para passear.
Na poesia “O velho viajante”, novamente de
Alfred Wiedemann, encontram-se os versos carregados de nostalgia: “Já não tenho
mula para encilhar e, como nos velhos tempos, cavalgar por aí, pelo mundo
afora. Meu velho amigo “Hans” continua em paz o teu caminho. Nós dois nos entendíamos
tão bem, nós dois, tu e eu”. - Numa outra passagem da mesma poesia
homenageia a mula: “Nós próprios estamos curtidos como nunca e entendemos de
todo tipo de negócio. E contudo, a estimada mula nos tão familiar como se fosse
um parente nosso. Nas viagens cuidamos de nós por último, como mando o dever do
cavaleiro. Trata o “Hans” primeiro depois te senta à mesa”. - ou
ainda: “O orelhudo nos é muito útil nas viagens. Onde quer que nos demoremos
e sua companhia, na casa do Jacó Rock ou
do Matias Lütz, a conta é religiosamente dividida. Em não poucas colônias
ouve-se dizer, no momento em que se pretende regatear o pernoite: “O custo do
pasto para o senhor e sua mula importa em 25 mil réis”.
Numa outra poesia Alfred Wiedemann refere-se
assim à sua mula: “Bem cedo da madrugada encilha e encerra com o por do sol,
caso a mula não se esqueça de andar neste tempo, ou assustada talvez o tenha
despejado no barro. Por horas, sem parar, conversa com sua companheira a mula”.
E para concluir lê-se nos versos de outras
poesia de Wiedemann, intitulada “A mula Morta”:
- “O que seria capaz de causar-te
tanta tristeza?. As lágrimas escorriam como resina. Meu bom e estimado Emil
Barz, a tua dor é compreensível para qualquer um. Depois que levamos até o
lugar definitivo aquela que tanto tempo te serviu com fidelidade, escreveste
entre lamentos, em meio às faturas, no teu livro de viagem: Aí jazes sobre a
relava verde, tu que foste o maior prazer para os meus olhos. Estás livre agora
para gramar descansada, ó, mais elegante e mais estimado dos animais. Daqui em
diante, quem irá carregar pela picada as
bruacas há pouco feitas para ti sob medida. Quem troteará pela noite levando
com tanta segurança a sua carga?”
Caixeiros viajantes - Os pioneiros
Numa postagem passada caracterizamos a
importância dos caixeiros viajantes pra
a economia, em especial a prática comercial, além da sua contribuição como
portadores de cultura para o interior colonial. Falaremos agora da velha
guarda desses viajantes, os riscos da
profissão, o caixeiro e sua mula.
Os caixeiros viajantes contaram, no nascer e
no desenvolver da sua história, com um
“grupo fundador”, personagens com características marcantes, personagens com traços épicos,
idealistas e românticos, empreendedores, honestos e bem coma vida.
Um dos caixeiros viajantes mais antigos foi
Hugo Emmermann, nascido em Dorneken. Desembarcou em Porto Alegre em 1870.
Encontrou o primeiro emprego na loja de ferragens de Guilherme Bier. Fundou a
Firma Ernesto Bemke & Cia, tendo como sócios Ernesto Bemke e Hugo Lau. Em
1883 desligou-se da firma e começou a viajar para F. J. Friedrichs. Faleceu no
ano seguinte, admirado por todos como cumpridor do dever e um colaborador leal.
Um dos representantes mais emblemáticos de
autêntico caixeiro viajante foi Albrecht Lorenz. Emigrou em 1871 passando primeiro por Buenos Aires e Montevidéu. Sem
êxito desembarcou em Porto Alegre em 1872 onde encontrou emprego na Firma F. A.
Engel, passou pela Firma de Bernhard Wahlrich. Tentou a sorte como proprietário de terra e como dono de hotel,
mas sem resultado. Retornou a profissão de caixeiro viajante a serviço de C. J.
Schilling. Em 1891 a firma abriu uma filial em São Sebastião do Caí e Lorenz a
administrou até o seu falecimento. Lorenz foi um dos fundadores do Clube dos
Caixeiros Viajantes e seu primeiro presidente. Homem de bem com a vida
destacava-se pelo bom humor, pelas histórias e piadas que contava.
Um outro veterano da velha guarda foi Heinrich
Fuhrmeister, falecido em Wiesbaden na Alemanha em 1898. Desembarcou em Porto
Alegre em 1872. Começou trabalhando para a Firma de Fazendas Hoffmann &
Cia. Mais tarde associou-se a Carl Pohlmann na Firma Pohlmann & Cia. Uma
extraordinária consciência do dever e uma exatidão à toda a prova marcavam
todas as ações deste homem inteiramente dedicado ao trabalho. Na cidade ou na
colônia, quem não conhecia o velho Fuhrmeister?
Não menos popular foi Albert Deistel, nascido em 1852 em Klostermannsfeld,
desembarcando em Porto e 1877, empregou-se na Firma de Carlos Daudt. Nos longos
anos que viajou pela colônia a serviço deste estabelecimento, conquistou muitas
simpatias com sua jovialidade. Mais tarde estabeleceu-se por conta própria no
ramo do comércio de ferro bruto. Aqueles que privaram com ele, nunca esqueceram
o velho e jovial camarada.
Otto Drück nasceu em Porto Alegre em 1853.
Sua primeira atividade como viajante foi
para a Casa C. Schilling. Entrou mais tarde na
Firma C. Wahlrich. Por longos anos percorreu a colônia como caixeiro
viajante para esta firma. Mais tarde trabalhou na mesma condição para F. X.
Friedrichs. Além disso desenvolveu como sócio sua atividade na Firma A. Ribeiro
& Cia e quando a firma assou para as mãos de seu irmão C. A. Drügg e Carlos
Daudt & Cia, associou-se a elas. Acreditamos não estarmos exagerando ao
afirmarmos que esse veterano caixeiro viajante, após tantos anos percorrendo a
região colonial, fosse respeitado pelos colegas de profissão. Também seus
numerosos amigos na mata virgem, demostravam a mais espontânea alegria quando cruzavam com a figura por todos conhecida, vestindo suas roupas
coloridas e montando uma soberba mula.
Alfred Schrunk nasceu em 1860 em Rivera no
Uruguai. Estudou na Alemanha e em 1876 veio para o Rio de Janeiro e o ano
seguinte para Porto Alegre. Começou a vida como funcionário da diretoria dos
transportes de imigrantes para a recém iniciada colonização de Conde D’Eu e
Dona Isabel. Conquistou o apreço de todos os imigrantes a ele confiados numa
época em que nem sempre recebiam tratamento humano da parte dos funcionários do
governo. Em especial no alto Forromeco, muitos colonos perguntavam por notícias
e num tom de indisfarçável amizade recordavam-se do “gordo Schrunk” e não se
esqueciam de lhe mandar saudações.
Não é a qualquer um, como foi o caso de
Heinrich Teschner, viajar por 28 anos. Nasceu em 1852 em Wagstadt na Silésia
austríaca e desembaraçou em Porto Alegre em 1874. Encontrou o primeiro emprego
na casa de comércio de C. J. Schilling. Viajou para esta casa até transferir-se
para Bastian & Meyer e mais tarde para Bastian e & Cia. Faleceu em 1901
depois de trabalhar 21 anos na mesma casa.
Leopold Bastian nasceu em São Leopoldo mas
transferiu-se para Porto Alegre em 1871.
Trabalhou com Heinrich Teschner na Firma Bastian & Meyer. Começou
depois a percorrer a colônia como caixeiro viajante para H. Bom. Em 1874 passou
para a firma Barbedo & BAstian para,
em seguida tornar-se sócio de B & M. Depois tornou-se sócio da casa de
comércio de fazendas de Bastian & Cia. Muitos anos se passaram desde que
encilhou pela última vez sua mula para, de botas e esporas, oferecer aos filhos
da mata virgem as maravilhas a sua firma. Seria conhece-lo pouco se achássemos
que não se recorda com prazer de suas atividades como jovem, que lhe serviram
como escola preparatória para ser comerciante
estabelecido por conta própria.
J. G. Magnus foi colega de Bastian na firma
Barbedo Bastian. Nasceu em Torres. Em 1874, com 24 anos veio a Porto Alegre. Na
condição de caixeiro viajante a serviço da citada firma, percorreu a região do mato e do campo. Passou depois
para a firma Chaves & Almeida também como viajante. Em 1883 estava em
condições de estabelecer-se por conta própria.
Phillipp Becker dedicou-se durante 20 anos à
profissão de caixeiro viajante, para no final, trabalhar como procurador no
mesmo estabelecimento. Conhecido na Praça 15 de Novembro como o “homem do
ferro”, foi o único que ousou deixar-se fotografar com um chapéu pouco
condizente com uma caixeiro viajante. Nasceu em Porto Alegre em 1853 e começou
a carreira no ramo das ferragens na firma Böhmer & Dörken. Em 1890
estabeleceu-se por conta própria.
O homem que de forma alguma não conseguiu,
ou não quis deixar de viajar foi o moselano Ernst Schmeiders, nascido em Cron
em 1851. Desembarcou em Porto Alegre em 1871 e encontrou colocação na casa de
ferragens de Th. Friederichs & Birnfeld. Administrou mais tarde um negócio em comissão,
estabelecendo-se em 1880 por conta própria com uma firma de porcelanas,
ferragens e miudezas, com dedicação especial para as últimas. Costumava-se
dizer: o que nãos se encontra em lugar nenhum em Porto Alegre, acha-se em algum
canto no Schneiders. Os fatos demonstraram que o negócio não era nada mau. Grande foi o número daqueles que
aprenderam, com mais ou menos proveito a cartilha de Schneiders. Quem
lidou durante muitos anos com a
diversidade de sortimento, desde as imensa
torradeiras fabrico de farinha,
até as pulseiras “para senhoras ordinárias”, podia ter certeza: “eu aprendi
alguma coisa” e encontrava colocação em outro lugar.
Os perfis dos caixeiros viajantes que
selecionamos de muitos outros que percorreram as colônias e a região dos campos
a serviço de casas de importação e exportação de Porto Alegre, são
paradigmáticos para esse personagem tão familiar na segunda metade do século
XIX e nas primeiras décadas do século XX. A missão que importava na sua razão
de ser consistia em garantir o fluxo do comércio entre as grandes casas de Porto
Alegre e as vendas nas picadas mais distantes na mata virgem. Faziam às vezes de bancos transportando volumes grandes
de dinheiro vivo e faziam o papel do correio, levando correspondência e
pequenas encomendas. Sobretudo, porém, atuavam como portadores de cultura,
pessoas que eram vindos do meio urbano, com boa formação e não poucos deles
propagadores do pensamento liberal. Por essa razão encontravam por vezes
desconfianças e restrições por parte das pessoas e lideranças religiosas, nas
comunidades coloniais mais conservadoras.
A Campanha de Nacionalização e a imprensa
Entre
das perguntas que poderiam ser formuladas quando se pretende entender Campanha de Nacionalização, poderia ser
esta: Qual foi o motivo porque os responsáveis por essa campanha elegeram como alvo
prioritário os imigrantes alemães e seus descendentes. Numericamente os
alemães ocupavam um modesto quarto lugar entre os diversos grupos de
imigrantes. Depois da independência, entraram no Brasil mais imigrantes
portugueses, espanhóis e italianos do que alemães. O que, entretanto, lhes
conferiu uma posição de destaque, aquilo que de fato marcou e marca ainda hoje
a presença alemã no Brasil, foi sua contribuição a nível cultural.
Destacamos,
em primeiro lugar, o grande valor dado à educação pelos imigrantes alemães.
Organizaram uma vasta rede de mais de mil escolas, instaladas, administradas e
controladas pelas comunidades. Devido a essas escolas, ao ser desencadeada a
Campanha de Nacionalização em 1938, o analfabetismo estava praticamente
erradicado nessas comunidades, quando no restante do País ultrapassava os 80%.
E segundo lugar, as comunidades alemãs organizaram-se solidamente em torno de
suas igrejas, escolas e cemitérios, casas de comércio, artesanatos e
instalações para o lazer e fomento da cultura. Recebiam das igrejas e escolas
uma orientação doutrinária segura, além de diretrizes disciplinares
responsáveis por uma conduta disciplinada e respeitadora em relação às
autoridades religiosas e civis. Em terceiro lugar, pelas inúmeras associações, sociedade e clubes
fomentaram uma intensa e movimentada vida associativa, oferecendo lazer e
incentivando a arte, o canto, o teatro e múltiplas outras atividades. Grandes e
abrangentes iniciativas de organização e interesse comum: a “Associação
Rio-Grandense de Agricultores” o “Bauernverein”, a “Sociedade União Popular” o
“Volksverein”, a “Liga das Uniões Coloniais”, tinham como finalidade coordenar
a vida e a atividade das comunidades, assim como identificar, avaliar, propor
soluções e traçar estratégias, para enfrentar os desafios e as necessidades de
caráter comum que as comunidades enfrentavam.
As
atividades, a iniciativas e os projetos que acabamos de caracterizar contaram
com a imprensa nas suas mais variadas modalidades, como o instrumento de
formação e informação por excelência, já que na época o rádio estava apenas
engatinhando como veículo de comunicação, a televisão uma possibilidade e os
demais não passavam de um sonho. Pois bem. Desta forma a imprensa
teuto-brasileira destacou-se como “o instrumento” responsável pela realização
do sonho que levou os imigrantes a se fixarem em terras brasileiras. Entretanto,
essa decisão teria que ser complementada por uma outra, isto é, esquecer o
passado como cidadãos de outros Estados e empenhar-se de corpo e alma na
edificação de uma nova pátria. Essa decisão não significou o esquecimento muito
menos a negação da tradição e dos valores dos antepassados. Pelo contrário colocaram esse imenso tesouro
cultural amealhado durante uma história milenar, a serviço da nova pátria. Foi
nesse passado que encontraram as ferramentas que lhes garantiram o êxito na
inserção numa outra pátria, num outro continente, fazendo-os progredir e
prosperar. E nessa caminhada em busca da inserção progressiva na sociedade
nacional brasileira, a imprensa nas suas mais diversas modalidades, desempenhou
um papel decisivo.
Os
responsáveis pela Campanha de Nacionalização, ao proibirem a circulação de todo e qualquer tipo de imprensa em língua
estrangeira, de modo especial a alemã, incorreram num dos equívocos mais
funestos. Cegos pela ideia fixa de que a língua alemã, a maneira ser alemã,
mantida viva e realimentada pela imprensa, representava o obstáculo mais
renitente para a assimilação para os assim chamados alemães, partiram para uma
campanha de terra arrasada. Para eles, a imprensa representava o elemento mais eficaz
para manter as comunidades alemãs isoladas, enquistadas e avessas a uma
inserção efetiva e completa na sociedade nacional brasileira.
Nas
considerações que seguem fica claro que a imprensa alemã aqui no Brasil, de
modo especial no Sul, foi a grande responsável que em meados da década de 1930,
a imensa maioria dos chamados alemães se
assumissem com cidadãos brasileiros. É óbvio que não é possível esgotar o
assunto nos limites de uma postagem de “blog”. Limito-me, por isso, a alguns dos
veículos mais significativos que circulavam
entre os teuto-brasileiros do sul do Brasil, com destaque para o
periódico “Lehrerzeitung” (Jornal do Professor) publicado pela “Associação dos
Professores e Educadores Católicos do Rio Grande do Sul”. A razão da escolha
dessa publicação está no fato de ela ter sido a responsável pela divulgação
entre os professores das escolas comunitárias pela orientação pedagógica e,
principalmente, pelo cumprimento fiel da missão confiada a essas instituições
de ensino. Acontece que essas escolas e
seus professores constavam, para os nacionalizadores, como os grandes vilões da
resistência à Nacionalização. Percorrendo as dezenas de números dos 39 anos (1900-1939)
dessa publicação quinzenal, constata-se que as acusações dos nacionalizadores
careciam de fundamento. No primeiro ano de sua circulação em 1900
“Lehrerzeitung” publicou o currículo obrigatório para todas as escolas
comunitárias católicas, que acabava de ser implantado. A língua portuguesa
constava como matéria de ensino a partir da 3ª série. O registro é importante
pelo fato de que as circunstâncias do
começo do século XX não favoreciam em nada um aprendizado mais completo do
português. Entre as dificuldades merecem destaque os seguintes. Primeiro,
poucos professores dominavam o vernáculo em nível razoável. Segundo, as pessoas
comuns não sentiam falta do português pois, a comunicação diária dava-se
exclusivamente em alemão. Exatamente por esses e outros motivos a
obrigatoriedade do português nas escolas revela sua importância. É prova, de um
lado que os responsáveis pelas escolas, professores e líderes comunitários
tinham consciência que eram cidadãos brasileiros de fato e de direito e nessa
condição tinham o dever de aprender a língua oficial do País e por isso mesmo
fazia parte dos deveres patrióticos ensiná-lo nas escolas.
No
nº 11/12 de 1916 a Lehrezeitung propõe como deveria ser ensinado o português
nas escolas comunitárias: “No que diz respeito à língua portuguesa, é preciso
cuidar, em primeiro lugar que a dominem para o uso na comunicação diária.
Recomenda-se para tanto o livrinho:
‘Sabe falar português?’, adotado em muitas escolas. Nos no nº 9/10 a insistência do aprendizado da língua
vernácula voltou devido a uma ordem do arcebispo D. João Becker, nos seguintes
termos: “Como já do conhecimento dos senhores professores, sua Excia. o Revmo. Sr. Arcebispo ordenou que em todas as
escolas católicas particulares se desse uma importância toda especial ao ensino
da língua do País. Temos que aplaudir semelhante disposição já que a
mudança das circunstâncias do tempo
exigem o conhecimento da língua portuguesa, cada dia com maior urgência”. – Em
1923 a Associação dos Professores publicou uma resolução com seguinte teor:
“Para que a escola paroquial nas colônias alemãs obtenha pleno êxito nos seus
propósitos, é necessário que, assim como a língua alemã deve continuar sendo a
base do ensino, assim a língua portuguesa deve ser cultivada com todo
entusiasmo”. - Ainda no mesmo ano de 1923, comentando a
criação de escolas complementares, o assunto língua portuguesa voltou a
preocupar os professores: “A razão mais importante que motiva a criação dessas
escolas é a convicção de que a língua portuguesa representa para nós uma
necessidade de sobrevivência. Desta maneira a língua portuguesa situa-se no
centro das preocupações. Essa necessidade generalizou o costume de mandar os
adolescentes, após a conclusão do período regular da escola, por mais um ou
dois anos para uma escola do Estado”.
- Em 1925 o prof. Victor
Schrinner analisando as mudanças ocorridas a partir da Primeira Guerra Mundial, deixou sua conclusão no
Jornal do Professor Lehrerzeiting): “Os
acontecimentos mostram-nos, a nós
professores, que, antes de mais nada somos cidadãos brasileiros. Questões que
já antes da Guerra esperavam solução, acentuaram-se rapidamente sob a pressão
das circunstâncias. Antes de mais nada constatamos claramente a urgência de
dispensar um cuidado todo especial à língua portuguesa” - Na
14ª assembleia geral dos professores em 1929, a resolução de nº 5
recomendava: “A Assembleia recomenda aos
senhores professores que estimulem com insistência o ensino da língua do País,
inspirando-se nos livros didáticos do prof. Rudi Schaefer”. - Uma
recomendação final da mesma 14ª Assembleia Geral reforçava a urgência do
cuidado pela língua portuguesa: “A assembleia
recomenda que nas futuras assembleias regionais da Associação se dê uma atenção
especial ao ensino da língua portuguesa”.
- A 15ª Assembleia realizada em
Porto Alegre em 1930, tomou entre outras, a seguinte resolução: “A Assembleia resolveu recomendar às
Conferências que façam do português o
tema principal de suas discussões”.
- Como conclusão da mesma 15ª
Assembleia os professores presentes tiraram a conclusão: “Defendemos até aqui o ideal do nosso
trabalho a escola bilíngue. Queremos, portanto, honrar a língua dos nossos
antepassados e, ao mesmo tempo, pretendemos
que a juventude se capacite mais e mais na utilização da língua
portuguesa”
Em
1934, Lehrerzeitung, nº 7 publicou um longo arrazoado do prof. Strecker sobre a
conveniência de ensinar as duas línguas, a alemã e a portuguesa. Entre outras
destacamos a seguinte afirmação: “Mesmo
que aqui no Brasil não existe nenhuma lei que obrigue o aprendizado da língua
do País, contudo a conveniência é de tal modo óbvia que não se deveria perder
uma só palavra a respeito. Aqui no Brasil nossos filhos encontraram a sua pátria;
aqui no Brasil irão viver, trabalhar e morrer e, sem a língua da terra?
Como irão defender-se no trabalho, na relação com as autoridades, na justiça,
no serviço militar, sem dominarem a língua do País? Centenas e mais centenas de
ocasiões os põem em contato no relacionamento diário e no comércio, com pessoas
que só falam português. Caso não queiram sucumbir na luta pela vida, precisam
saber português. Essas necessidades são e tal monta, que não existe uma escola
alemã sequer que não considere o português como uma das suas metas mais
importantes”.
Dos
testemunhos e declarações acima além de muitas outras que poderiam ser lembradas,
conclui-se: Primeiro, que a escola comunitária teuto-brasileira, pelo menos na
mente dos responsáveis por ela, de maneira alguma representava um enclave, um
corpo estranho no contexto da nacionalidade. Pelo contrário. Achava-se
perfeitamente integrada consideradas as circunstâncias da época. -
Segundo, fica clara a tendência cada vez mais explícita de que os
professores preparavam uma nacionalização progressiva, insistindo cada vez mais
no aprendizado da língua portuguesa e do conhecimento das realidades
nacionais. -- Terceiro, a nacionalização estava ocorrendo
sem sobressaltos e sem traumas, dispensando uma Campanha de Nacionalização que,
atropelando a dinâmica da lógica histórica e antropológica que preside esses
processos evolutivos. Os resultados foram desastrosos. Mas não é aqui o espaço
para analisá-los mais a fundo.
Até
aqui mostramos como a Associação dos Professores e Educadores Católicos do Rio
Grande do Sul, promoveram o aprendizado da língua portuguesa pelas páginas
da publicação da classe a
“Lehrerzeitung”. Ainda entre os alemães da metade católica do sul do Brasil
circularam outras três publicações regulares: um jornal diário o “Deutsches
Volksblatt”, um periódico mensal o “Skt. Paulusblatt” e um almanaque anual, o
“Familienfreund Kalender”. Também neles encontram-se dezenas de referências à necessidade e a obrigatoriedade do aprendizado da língua
portuguesa como condição para uma inserção definitiva na sociedade nacional. No
formato da postagem não há espaço para citar mais exemplos. Em todo o caso essa
imprensa, como era acusada, nunca se mostrou simpática ao nacional socialismo.
Pelo contrário. Já em 1931 o “Deutsches Volksblaltt” denunciou os perigos dessa
orientação política, fato que lhe valeu a proibição de circular na Alemanha.