Os pressupostos - 2
A
razão por ter-me prolongado na caracterização da formação media e superior, foi
mostrar sua importância como pressuposto para a produção do conhecimento. Já
que partimos da premissa de que conhecimento é síntese, a lógica sugere que o
resultado final dessa síntese é tanto
mais rico e tanto mais consistente, quanto mais conhecimentos parciais
participaram da sua construção e quanto mais sólida for a sua integração.
Os dois elementos estão presentes tanto na proposta pedagógica quanto no
currículo e nível médio e superior das instituições de que nos ocupamos acima.
Nos “Gymnasia” de nível médio estavam previstas todas as disciplinas indispensáveis
para uma formação básica ampla do tipo generalista. Os diversos blocos afins
formam os pilares que servem de base para a construção do conhecimento. Em
grandes linhas são eles: as línguas clássicas e modernas mais correntes na
comunicação de alto nível, com as
respectivas literaturas. O formado nesses “Gymnasia”, estava em condições de
valer-se do original dos textos em grego, latim, alemão, francês, inglês, e não
raro em outras com destaque para o italiano, o espanhol, português, russo,
sueco, polonês, etc. A História Natural, compreendendo a física, química,
biologia, geologia e demais conhecimentos da natureza, formava o segundo pilar.
O terceiro tinha na história, geografia, antropologia, etnografia, etnologia,
seu foco de interesse. E finalmente a quarta coluna mestra da formação tinha na
matemática, na filosofia e não raro na teologia a sua coroação.
Dessa
forma o estudante estava em condições de ter acesso à matéria prima e as
ferramentas teóricas e metodológicas indispensáveis para a produção do
conhecimento. Assim aparelhado o formado no nível médio ingressava no
superior, em condições para, sob a orientação de mestres experientes,
encontrar o caminho para dar início à
arquitetura de um universo próprio de produção de conhecimento. O processo que
levaria anos dava-se num ambiente que se denominava “Seminário”. Na modalidade
padrão de Seminário, o professor fazia o papel de moderador e coordenador dos
debates, das discussões e não como autoridade que ditava de cima para baixo as
regras e impunha suas idéias. Cabia-lhe conduzir de tal forma o fluxo do
debate, para que dele resultasse um avanço qualitativo sobre o tema em foco. O
importante sempre consistia no fato de que o patamar alcançada servisse
de degrau para um novo avanço, para mais adiante e mais acima.
Preparava-se assim a plataforma para um novo Seminário no qual se aprofundava e
levava para mais adiante o aprofundamento da temática. E assim, professor e
aluno, cúmplices e comprometidos na aventura da apropriação e aprofundamento de
sempre novos conhecimentos, avançavam sobre sempre novas fronteiras do
conhecimento.
Com
esse formato, o Seminário bem conduzido vem a ser um laboratório próximo do
ideal. Habilita o estudante a levantar vôo rumo à produção de conhecimento
autônomo, guiado por um mestre que faz mais o papel de parceiro do que de tutor
ou autoridade do saber. Não por nada o orientador de teses de doutorado ainda
hoje leva o nome sugestivo e quase carinhoso
de “Doktor Vater. Oferece também uma magnífica ocasião para o próprio
professor enriquecer, ampliar, renovar e
atualizar o seu próprio universo do conhecimento.
A
especialização não vem ser a prioridade dos Seminários. Na proposta original
nas universidades alemãs modernas da primeira geração, interessava, antes de mais
nada, o conhecimento como tal e apropriação das ferramentas indispensáveis para
produzi-lo. Pela lógica supunha-se que aquele que estivesse de posse delas,
deveria estar em condições para dedicar-se com sucesso a qualquer campo
específico do saber. Foi exatamente essa característica do Seminário que encantou os jovens
americanos que em massa foram estudar
nas universidades alemãs entre 1850 e 1914. São recorrentes testemunhos
como o do aluno Henry W. Langfellow, estudante em Göttingen em 1829, já
citado.
Ao
tirocínio ao qual o estudante era submetido no Seminário das universidades
alemãs, à formação da personalidade pelo modelo “Oxbridge” e ao acentuado
propósito pedagógico das universidades americanas do norte vem na contra mão a
proposta latino-napoleônica de uma universidade
voltada para profissionalização e tutelada pelo Estado. Dois elementos
complementares são responsáveis pelo seu perfil institucional e acadêmico.
Antes de mais nada a formação do cidadão em qualquer nível e de modo especial
na universidade, consta no rol dos instrumento de que o Estado se serve para
concretizar seus propósitos. Sendo assim sua destinação primeira consiste em
prestar serviço ao Estado. A lógica é retilínea. Para tocar suas políticas,
iniciativas e projetos públicos, o Estado precisa de mão de obra especializada,
precisa de técnicos. Ora a formação desses recursos humanos acontece em
instituições que vão do fundamental ao ensino superior. Entende-se assim que é do interesse do Estado ditar a
própria razão de ser da universidade, e
consequentemente, a natureza acadêmica e o perfil institucional, administrativo
e burocrático. Estamos assim diante de um modelo viciado na sua própria
essência. A autonomia prevista na Lei
Fundamental ou na Constituição de algum país que optou por esse modelo, não
passa de ficção. Não é para valer como na prática não vale. Presta-se muito bem
para a mistificação em discursos políticos, encobrir propósitos ideológicos,
enfim, para enganar os desavisados, nada mais. Nessa condição a universidade,
como qualquer outra instituição de ensino e em qualquer nível, constitui-se, em primeiro lugar, senão em
único, num instrumento a serviço dos interesses do Estado. Pior. Dar a
impressão de que por meios legítimos ou nem tanto, a formação dos cidadãos está
sendo direcionada em função de interesses pessoais dos donos da nomenclatura no
poder. Nessas condições produzir
conhecimento digno desse nome, só fora ou à margem das instituições formais.
A
instrumentalização da formação do cidadão em qualquer um dos níveis de ensino,
vem acompanhado de outro inconveniente não menos desastroso. Fica atrelada aos
partidos e ideologias políticas que se alternam no poder. Esses fato resulta
ainda mais danoso em períodos em que regimes democráticos, são intercalados com
governos autoritários ou pior, ditatoriais. Nesse contexto costumam suceder-se
em intervalos curtos e sem condições mínimas de avaliação, as “Reformas do Ensino”, tão familiares no
Brasil a partir da década de 1960.
No
caso específico do Brasil as relativamente poucas universidades em
funcionamento até o final da década de 1950, exibiam um perfil muito parecido
com as alemãs, inglesas e norte-americanas. A Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras ocupava o centro polarizador e irradiador, a “Alma Mater” da
universidade. Em volta dela agrupavam-se as faculdades, as escolas
profissionais, os institutos de pesquisa, etc. No âmbito da “Alma Mater”
cultivava-se o clima propício para uma formação de base mais ampla. Nela o
estudante encontrava as condições necessárias para familiarizar-se com o
conhecimento e tudo o que era preciso para dar início a uma carreira de
pesquisa, investigação e produção do conhecimento. Essa estrutura institucional
facilitava em muito o encontro e intercâmbio de informações e experiências.
Professores e alunos de filosofia, história, geografia, biologia, matemática,
física, química, línguas e literatura, circulavam pelos mesmos espaços físicos.
Compartilhavam salas de professores, restaurantes universitários comuns ou
participavam de programações acadêmicas interdisciplinares. Áreas afins como
história e geografia formavam um único departamento. Hoje, por ex., as duas
encontram-se tão distantes no contexto universitário, ao ponto de se ignorarem
e não terem nada para se enriquecerem mutuamente.
Este
cenário de 50 anos passados começou a tomar o rumo oposto com a Reforma
Universitária e 1961. Desencadeou-se a partir daquele momento o desmonte do
modelo institucional e acadêmico da universidade tradicional. Não pretendemos
negar as aberrações, os desvios e
equívocos que se tinham instalado e que exigiam correções e ajustes de
menor ou maior profundidade. A Reforma, entretanto, significou em última
análise, a opção por um modelo de instituição em bases essencialmente
diferentes. O método sintético dedutivo foi substituído pelo analítico indutivo
na orientação da pesquisa e produção do
conhecimento. Em vez de partir do geral para o particular começa-se pelo
particular para chegar ao universal. Analisando e pesquisando os fatos, fenômenos
e dados particulares, pretende-se descobrir o que entre eles há de comum. Em
outras palavras. Pretende-se entender o todo identificando e analisando as
partes e não entender as partes a partir do todo. Pela Pluralidade chega-se à
compreensão do Todo em vez de entender a Pluralidade partindo do Todo. Não
resta dúvida de que a opção pelo caminho da análise, pelo método
analítico-indutivo oferece vantagens inegáveis sobre o sintético-dedutivo. Mas
não se pode ignorar que vem acompanhado por alguns riscos nada desprezíveis e
por isso mesmo pede algumas cautelas quando da sua aplicação. Teilhard de
Chardin destacou ambos os lados.
Ao contrário dos “primitivos” que dão
personalidade a tudo que se mexe, ou mesmo dos primeiros grupos que
divinizaram todos os aspectos e forças
da natureza, o homem moderno tem a obsessão de despersonalizar ou de
impersolanizar o que mais admira. Duas razões para essa tendência. A primeira é
a análise, esse maravilhoso instrumento de pesquisa científica, ao qual devemos
todos os nossos progressos, mas que, de síntese em síntese desfeita, deixa-nos
frente a uma pilha de engrenagens desmontadas e de partículas que se esvaem.
E a segunda é a descoberta do mundo
sideral, objeto tão vasto que se tem a impressão de que toda a proporção entre
o nosso ser e as dimensões do Cosmos à nossa volta, foi abolida. (Chardin,
Teilhard de. O Fenômeno Humano 1986, p. ?)
De
qualquer forma essa substituição da referência teórico-metodológica, como não
podia deixar de acontecer, veio acompanhada
de uma série de conseqüências tanto positivas quanto negativas.
A primeira obrigou o redimensionamento da
estrutura acadêmica em função da resignificação e conseqüente redimensionamento
dos conteúdos das áreas de conhecimento e respectivas disciplinas. Teve início
então uma departamentalização cada vez mais acirrada que favoreceu a
compartimentalização igualmente levada a extremos. Institucionalizou-se a
independência, o isolamento e a impermeabilidade entre as disciplinas e seus
conteúdos. Esse fenômeno veio acompanhado em não poucos casos, por um outro
igualmente danoso. As áreas de conhecimento sofreram uma revisão, melhor
talvez, uma resignificação da sua própria natureza e sua função reorientada. A
Geografia, por ex., deixou de ser uma ciência humana, para ser considerada
técnica. Fato semelhante aconteceu com as Ciências Econômicas e Jurídicas e a
Arquitetura. De áreas essencialmente humanas ou pelo menos com destino imediato
direcionado para o homem, são na verdade tratadas e ensinadas nas respectivas faculdades,
como se fossem apenas técnicas. Áreas eminentemente técnicas como a Engenharia,
ignoram simplesmente a sua possível relação com outras especialidades. Escapa
ao geógrafo, economista, arquiteto, jurista, etc., que a compartimentação
centrífuga, teve suas raízes num momento histórico, no qual todo o saber
humano, era visto como uma unidade, formado por áreas complementares e
interdependentes. Trabalhava-se então com a “tese”, ou se quisermos, com o
pressuposto de que o conhecimento em todos os seus desdobramentos,
fundamenta-se, em última análise, numa base comum. Em outras palavras, os
conhecimentos parciais não passam de manifestações de um todo, uma unidade, uma
totalidade, que lhe confere sentido e razão de ser. No fundo, no fundo não faz
diferença se esse todo radical ou
original corresponde a uma cosmovisão teocêntrica, antropocêntrica, budista,
hinduísta, shintoista, taoista, shamanista, ou outra qualquer.
Com
as devidas adaptações impostas pelo andar do tempo, a essência estrutural e
acadêmica nas universidades alemãs, inglesas e norte-americanas, manteve-se,
como se mantém até hoje, fiel à “tese” de que os conhecimentos parciais tem uma
origem comum no todo.
As
mudanças acadêmicas e estruturais
implantadas desde a década de 1960, foram motivadas por duas razões de
fundo. Em primeiro lugar a preocupação pela compreensão da unidade, da
totalidade do saber passou para um segundo plano. O que importa é conhecer até
o fundo as partes. Inverteu-se com isso a perspectiva a partir do qual o conhecimento
é construído. A “análise”, veio a ocupar
o lugar da “síntese”, como norte teórico-metodológico. Começou a vigorar nos
laboratórios de investigação científica e nos gabinetes de produção de
conhecimento a ordem de penetrar sempre mais a fundo nos objetos particulares.
Há, com certeza, uma razão de peso para essa inversão de perspectiva. A segunda
metade do século XX inaugurou uma forte tendência para o desenvolvimento. O
mundo saíra profundamente modificado da guerra. As alianças políticas, os tratados
econômicos, os pactos militares, acomodaram o mundo como uma totalidade, em
blocos hegemônicos, envolvendo de alguma forma todos os povos e nações. Neste
contexto a maneira de conceber a formação e a educação do cidadão, constitui-se
peça fundamental. O apelo pela mobilização de cidadãos com conhecimentos
diretamente utilizáveis, fez com que, principalmente as universidades, fossem
convocadas para suprirem a demanda de
mão de obra especializada. O interesse pelos conhecimentos e investigações de
aplicabilidade imediata e prática cresceu na mesma proporção que o conhecimento e a pesquisa em áreas indiretamente
importantes, passaram para um segundo plano. As “prioridades” fazem com que por
ex., as “Ciências Humanas” ocupem uma posição marginal em muitas Instituições
de ensino superior.
O
lado profissionalizante da produção do conhecimento e das investigações nos
laboratórios científicos, é cada vez mais valorizado e a universidade orienta
seus objetivos prioritariamente para o desenvolvimento. Não há necessidade de
recorrer a profundos malabarismos lógicos, para perceber que essa correção de
rumo fez tremer um dos pilares mestres
da universidade: a “Autonomia”. Parece importante, entretanto lembrar que a
Autonomia pode ser vista como informal, de fato, ou capitulada na Constituição
e amparada na legislação complementar. A primeira versão é encontrada nos
países em que o Estado se interessa pelas universidades porque os resultados
das investigações nelas realizadas, os conhecimentos de alto nível produzidos e
tecnologias de ponta desenvolvidas, interessam aos propósitos do Estado.
Municiam as universidades com os meios e instrumentos de renovação e
atualização, permitindo o progresso em
todos os empreendimentos no plano material e conferem-lhe prestígio pelo
conhecimento de alto nível, orgulho das suas academias. A relativa perda da
autonomia de fato é imposta pelos “clientes” que encomendam “os produtos” que
lhes interessam nas universidades. Esse fenômeno, salvo melhor entendimento,
continua valendo nas universidades alemãs, inglesas e norte-americanas. Sua
estrutura institucional e sua proposta acadêmica matem a excelência como meta,
a pluralidade na unidade como referência metodológica e a destinação do
conhecimento produzido, os resultados das pesquisas efetuadas e a utilidade das
tecnologias desenvolvidas, direcionadas para o desenvolvimento. Vista sob essa
ótica o “mercado” orienta e seleciona o que a universidade tem oferecer. Não
lhe assiste, entretanto, nenhuma autoridade, muito menos amparo legal para
cercear a autonomia.
Uma
situação bem diferente, para não dizer antagônica, está presente nas
universidades públicas e privadas, direta ou indiretamente inspiradas no modelo
napoleônico. Na sua própria concepção original o modelo é profissionalizante.
Como tal o maior valor cultivado na academia é a aplicabilidade prática. Como
tal a universidade transforma-se em mais um instrumento precioso e poderoso
para aparelhar o Estado. Neste caso os homens e os partidos de plantão no
governo, servem-se da universidade como de todos os níveis do ensino, para
perseguir seus propósitos, difundir suas ideologias políticas e implementar
interesses pessoais. Dessa maneira está armado o cenário para o Estado por em
andamento a escalada da tutela sobre a universidade. Nos cinqüenta anos que se
passaram desde que começaram as reformas
até hoje, os governos federal, estadual e municipal, valendo-se de
“bases e diretrizes”, repetidas vezes remodeladas e “aperfeiçoadas”,
implementadas por meio de um aparelhamento burocrático cada vez mais acirrado,
controlam até às minúcias o ensino e a educação, começando pelo infantil até a
pós-graduação. A autonomia prevista na Constituição é letra morta e não passa
de uma ficção.
A
tutela do Estado sobre o ensino, de forma especial sobre a universidade, trouxe
consigo problemas de fundo, que afetaram as investigações científicas e a
produção do conhecimento. O lado talvez mais discutível dessa situação relaciona-se com as áreas de conhecimento
privilegiadas na escolha das prioridades acadêmicas além da opção pela base
teórico-metodológica preferencial. As demandas do mercado público e privado
ditam a formação profissional preferencial. Somado ao engajamento
político-ideológico a situação que se criou, relegou para um segundo plano as Ciências
Humanas, Letras, Artes ...
Os
fatores que determinam a escolha da área ou objeto específico “digno” de
atenção especial obedece em primeiro lugar ao critério das oportunidades
profissionais que oferece. Ora essas oportunidades estão intimamente relacionadas
com os instrumentos necessários para implementar as políticas públicas de
desenvolvimento. Compreende-se que a lógica determine a canalização dos
estímulos e recursos em favor das áreas prioritárias. Ninguém de são juízo
colocará em dúvida a validade dessa forma de proceder. Trata-se de uma
tendência universal que faz parte do
momento histórico. A razão de ser dos problemas e das dúvidas que se fazem
sentir, não se situam na natureza do processo mas na forma como é administrado.
No
caso específico do Brasil, os órgãos públicos, ministérios, secretarias, etc.,
direta ou indiretamente responsáveis pela formação acadêmica e profissional,
impuseram, com o andar dos anos, um aparelhamento burocrático hermético. O
Ministério da Educação dita, por meio da CAPES e secretarias setoriais, até as
últimas minúcias, tanto da estrutura burocrática das instituições de ensino,
quanto a natureza, a importância e a destinação das propostas curriculares.
Pouco espaço, melhor, nenhum sobra para
propostas que não cabem nessa camisa de força. Para usufruírem da legitimação
oficial as instituições de ensino em geral e as universidades em particular,
são coagidas a se burocratizarem até os últimos detalhes. O processo começa
pela opção por prioridades, estrutura
curricular, privilegiamento de conteúdos, escolha e execução de projetos de
pesquisa e por aí vai. Uma pesquisa científica ou a produção de conhecimento,
só goza de reconhecimento quando
executada rigorosamente de acordo com as regras ditadas pelas coordenações,
comitês, colegiados, etc. ou pior, pela ideologia ou simples humor dos
gestores. Não sobra espaço para a liberdade ou autonomia de vôo de uma
investigação científica ou produção do conhecimento sem compromisso. Estamos diante do cenário perfeito que favorece o
espírito de rebanho na mesma proporção em que obstrui o caminho em busca da
produção de um conhecimento livre. A situação torna-se dramática quando se
instala a tirania partidária e ideológica no meio acadêmico. Os poucos
professores que ousam discordar são sumariamente silenciados e boicotados pelos
colegas. No momento em que se decidem currículos e disciplinas suas opiniões
são ignoradas. Cabe ao oportunismo ideológico a última palavra. Em sala de aula
os conteúdos são escolhidos, apresentados e tratados sob medida, para agradar
alunos e exigir deles o mínimo de esforço. Professor bom é aquele que fala sobre temas, e
principalmente, sob o enfoque que os alunos esperam, melhor, exigem ouvir.
E
os resultados? Egressos do ensino fundamental semi-analfabetos, formados no
ensino médio candidatos ao superior, incapazes de formular um raciocínio
coerente, dominando precariamente a língua do país, sem condições de redigir
uma frase correta. Nessas condições falar em produzir conhecimento, só com muita
boa vontade. Faltam as condições prévias mais elementares. Em primeiro lugar os
estudantes ressentem-se da falta das
ferramentas básicas para ousarem trilhar
o caminho da produção do conhecimento. Entre elas são fundamentais as línguas
clássicas e modernas mais correntes, uma formação geral mínima, a posse dos
indispensáveis instrumentos teóricos e metodológicos. Com a falta desse
pressuposto as perspectivas infelizmente permanecem limitadas.