Planisinos
O bem sucedido projeto de Valorização do Rio dos Sinos, iniciativa da Faculdade de Ciências Econômicas e executado em parceria com a equipe de especialistas na área e bancada pela RFA, entre outras iniciativas inspirou a ideia de criar uma empresa de planejamento e assessoria junto à universidade. O formato escolhido foi de uma Sociedade Anônima, autônoma e independente da estrutura administrativa da universidade. Os sócios fundadores quanto me lembro foram todos docentes da Faculdades de Ciências Econômicas como também da de Filosofia e Ciências Humanas. Orgulho-me de ter integrado essa equipe fundadora e participado efetivamente na montagem do projeto em parceria com os diretores das duas faculdades, Pe. Oscar Nedel e Olívio Koliver, os professores Pe. Marcus Bach, Alcides Guiehl, Alexandre Vertes, Eliseu Mascarello e outros mais. O projeto previa todo o tipo de planejamento como áreas urbanas, planejamento regional, infra estrutura, assessoria a empresas, municípios, etc. O corpo docente das Faculdades dispunha de recursos humanos devidamente habilitados para coordenar os projetos de todos os tamanhos e formatos: economistas, contabilistas, administradores de empresa, arquitetos, engenheiros, médicos, enfermeiros, sociólogos, historiadores, geógrafos, biólogos, botânicos, ambientalistas e por aí vai.
Para começar foi preciso apresentar e oferecer aos mais diversos possíveis clientes a marca da Planisinos e seu potencial de planejamento e assessoria. Como eu tinha percorrido o Vale do Sinos de alto a baixo com a equipe alemã em visita às prefeituras, entidades de classe e formado uma visão de conjunto da geomorfologia, edafologia, cobertura vegetal e as potencialidades de desenvolvimento econômico e promoção humana, fui encarregado para apresentar o que de útil para ações concretas que a Planisinos tinha a oferecer. Foi nesses termos que, no período das férias acadêmicas de 1969 e começos de 1970 planejamos percorrer o vale do Sinos e parte do Caí a fim de oferecer os préstimos da empresa. Não me recordo em detalhes de todos os lugares e instituições visitadas. Cito apenas as prefeituras de Santo Antônio da Patrulha, São Francisco de Paula, Três Coroas, Montenegro além de algumas empresas. Em Santo Antônio da Patrulha acertamos praticamente a urbanização de uma grande área devoluta na margem da BR101. Em companhia do Pe. Nedel, então Reitor da universidade recém instalada fomos oferecer nossos préstimos à Secretaria de Obras do Estado, a agência responsável pela implantação de projetos habitacionais, o Banco Regional de Desenvolvimento e outros mais. Por razões que pretendo apresentar mais abaixo, em meados de 1971 pedi exoneração do cargo de Diretor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e demais cargos sob minha responsabilidade até aquele momento, também da Planisinos. A justiça manda registrar que seu presidente o prof. Alexandre Vertes garantiu um futuro promissor para a empresa, até que em 1978 o novo Reitor da Unisinos, ordenou o encerramento da mesma. Aliás aquele reitorado - 1978 a 1982 foi marcado por uma série de decisões discutíveis que, por assim dizer, estagnaram a instituição, com muita competência superadas em parte pelo Pe. Evaldo Wetzel empossado para o quadriênio de 1982 a 1986.
Extensão da Filosofia para Taquara.
Como se pode deduzir pelos quatro projetos que acabamos de lembrar, as Faculdades de São Leopoldo em meados da década de 1960 encontravam-se em pleno processo de evolução e aperfeiçoamento tanto no plano acadêmico quanto no da inserção na realidade regional. A recomendação do Pe. Thiesen ao anunciar na Câmara de Vereadores em 1957 que as Faculdades abertas ao público em geral a partir de 1958 pretendiam evoluir para uma “Casa de Sabedoria” e, ao mesmo tempo servir de instrumento para o desenvolvimento regional, contaria com mais uma iniciativa nesse sentido. As quatro ações acima lembradas visavam, pela sua natureza colaborar com o desenvolvimento regional. Faltava uma iniciativa que servisse de impulso para ampliar e facilitar a oferta de Ensino Superior para os egressos do segundo grau do médio e alto Rio dos Sinos e regiões vizinhas. Se os projetos anteriores devem ser creditados à Faculdade de Ciências Econômicas, a oferta de formação acadêmica superior partiu da direção da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras. Para encurtar a história o Conselho Técnico Administrativo, do qual eu fazia parte como chefe do Departamento de História e Ciências Sociais, em reunião no segundo semestre de 1966, decidiu abrir uma extensão do Curso de Filosofia em Taquara. Não houve consenso entre os conselheiros. Eu próprio votei contra por duas razões. Em primeiro lugar porque entendi que a decisão era prematura e, segundo lugar, ficara claro nos arrazoados apresentados que caberia a mim assumir na prática todo o ônus do empreendimento. A extensão evidentemente ficaria sob à autoridade da Faculdade de São Leopoldo. Na prática, porém, tanto a coordenação acadêmica quanto a administrativa ficaria sob minha responsabilidade. O compromisso com a preleções na UFRGS, nos cursos de Ciências Sociais, História, Pedagogia, Ciências Econômicas, além da chefia de dois departamentos, somados ao comprometimento com o Projeto de Valorização do Rio dos Sinos, estava no limite das minhas possibilidades de tempo e tarefas a dar conta. De qualquer forma o Projeto de Extensão foi aprovado e implantado no ano seguinte. Para sede provisória foram cedidas as dependências do Colégio Sta. Teresinha. Os alunos da primeira turma obviamente residiam em Taquara ou procediam das localidade vizinhas como Igrejinha, Rolante, Três Coroas, Parobé e um número significativo desciam de São Francisco de Paula. A noite da solenidade da instalação da extensão e, ao mesmo tempo, o início do primeiro semestre no começo de março de 1968, com a presença do Pe. Oscar Nedel, diretor da Faculdade da matriz em São Leopoldo, autoridades e lideranças locais, ficou gravada em detalhes na minha memória. A solenidade aconteceu na sala em que seriam dadas as aulas. Depois da fala do Diretor declarando instalada a extensão do curso de Filosofia, ficamos até altas horas da noite confraternizando com os alunos e as alunas. Na mesma semana tive o privilégio de ministrar a primeira aula, isto é, há 56 anos passados, naquele embrião que mais tarde deixaria de ser uma extensão da Unisinos para ser tornar autônoma e evoluir para a hoje FACAT.
Além das aulas regulares que me cabiam ministrar deslocava-me uma ou duas vezes por semana de São Leopoldo a Taquara. Na época o asfalto terminava em Sapiranga. De lá em diante chão batido sujeito às circunstâncias e o humor do tempo: poeira e pedras soltas quando seco e uma sequência de lodaçais quando chovia. Para enfrentar o trajeto de 50 quilômetros de São Leopoldo a Taquara dispunha de um fusquinha de terceira mão, modelo 1951, três marchas para frente, motor de 25 HP, caixa seca, importado quando no Brasil ainda não havia montadora da VW. Ao dono ou motorista desses modelos antigos aconselhava-se levar um alicate e um rolinho de fio. Com eles resolvia-se qualquer problema mecânico numa viagem. Nas idas e vindas a Taquara enfrentei três contratempos que me poderiam ter causado problemas sérios. O primeiro deles aconteceu no topo da subida na saída de Sapiranga. Deparei-me com uma manada de vacas cruzando a estrada. Freei e desviei para a esquerda. Nessa manobra um tanto brusca caiu a barra de direção e fui parar no valo na beira da estrada. Felizmente no bati no barranco. Em vez de culpar as vacas agradeci a sua providencial travessia naquele momento pois, se falhasse a direção numa outra circunstância poderia ter acontecido um acidente bem mais sério. Só para explicar. A barra de direção soltou-se porque, antes de viajar a Taquara busquei meu fusca na oficina de revisão e o mecânico distraído tinha esquecido colocar o pino que prendia a barra no eixo. O socorro veio de uma oficina lá perto. Colocaram o pino e como já passava das 20h. resolvi voltar a São Leopoldo. Numa outra ocasião, voltando de Taquara pelas 22,30h, na reta na altura de Nova Hartz, despovoada na época, percebi de longe dois indivíduos um à direita, outro à esquerda da estrada. Como na época tinha registro e porte de arma levava no porta luva um Smith Weson 38. Ao me aproximar dos dois indivíduos um pulou no meio da pista fazendo sinal para parar. Resolvi no momento deixar a arma onde estava e acelerei o carro. O indivíduo na estrada jogou- se no acostamento e pelo retrovisor vi os dois sumir na vegetação na beira da estrada. Cheguei São Leopoldo são e salvo mas com a decisão de não viajar mais sozinho para Taquara. Combinei com meu amigo o irmão Anselmo Engel para me levar de Combi. Pagava para ele uma cerveja enquanto esperava para dar aula e depois voltarmos. Lembro que naquele remoto ano de 1968 leis regulamentando bebidas alcoólicas para motoristas eram muito mais permissivas. Pois, foi numa dessas voltas, também pelas 22,30 h. que sofri com o irmão Engel o terceiro acidente quepoderia ter sido fatal para ambos. Na descida para a “ponte sem nome” em Sapiranga, final do trajeto não asfaltado. Nos deparamos com um caminhão parado no meio da pista. Ele tinha sido roubado e interceptado pelos policiais que estavam fazendo a sinalização para advertir a quem se aproximava. Policiais correndo para cá e para lá e o obstáculo inesperado ocupando praticamente toda a largura da estrada de chão coberta de saibro seco e escorregadio fez com que o motorista freasse bruscamente guinando a combi para o lado. O resultado não podia ser diferente. O veículo tombou terminando com o lado direito no valo ao lado da estrada. No lado do carona e com o vidro aberto terminei com o braço direito mergulhado no valo cheio de água. O motorista segurou- se no volante. De pronto dois policiais acorreram e ouvi um deles dizendo: estes estão mortos! Um deles abriu a porta esquerda da combi e sem maiores problemas colocaram-na sobre as quatro rodas. Nós dois tripulantes sofremos apenas alguns arranhões sem maior importância. O carro um pouco amassado no lado direito estava em condições para seguirmos viagem até São Leopoldo e os policiais nos liberaram para continuar a viagem.
Lá pelo final do segundo semestre os alunos promoveram um encontro de confraternização na propriedade do pai de uma aluna em São Francisco de Paula. Foi um domingo memorável com as mesas do churrasco preparadas num galpão rústico sob a copa de araucárias centenárias na sombra do mato branco característico da borda do planalto. Participei de mais um desses encontros, dessa vez na propriedade de um aluno a meio caminho entre Taquara e Parobé. Mais tarde tive ocasião de visitar algumas das alunas na cidade de São Francisco de Paula quando recordamos aqueles semestres tranquilos e marcados pela nostalgia de termos participado de uma iniciativa pioneira de significado duradouro para aquela região. A FACAT tem naquele remoto ano de 1968 o seu embrião. Na formatura daquela primeira turma em 1970, no pátio interno dos antigos prédios da Unisinos em São Leopoldo o Pe. Nedel, então Reitor da nova universidade, delegou-me a função de lhes conferir o grau de licenciados em Filosofia. Não participei da posterior emancipação da extensão da Unisinos em Taquara dando origem a FACAT.