Até aqui tentamos esboçar em linhas muito gerais como aconteceu a síntese que resultou da busca do homem dos recursos para atender às demandas materiais e espirituais durante o Neolítico. O resultado foi a consolidação da identidade das culturas dos caçadores e coletores. As identidades étnico-culturais consolidadas no decorrer do Paleolítico, resultaram da relação existencial entre o homem e o meio contingenciado pela própria natureza dos fatos. O homem não vive, não sobrevive, muito menos prospera fora dos contextos geográficos que vai encontrando na sua expansão pelos múltiplos territórios que a superfície da terra lhe oferece. Num primeiro momento busca o que lhe é oferecido espontaneamente para sobreviver. A identidade étnica dos primeiros grupos e caçadores, pescadores e ou coletores, exibia as marcas evidentes da batalha travada com o entorno geográfico. Essa situação começou a melhorar na medida em que o homem se equipou com ferramentas e as foi aperfeiçoando e especializando. Aos poucos o “humano” foi-se impondo até aproximar-se do equilíbrio no qual o meio ambiente entrou com as matérias primas, os referenciais simbólicos e a maneira como o homem materializa seu imaginário e torna palpável seu universo mitológico e suas crenças. Orientado pelo instinto de sobrevivência o homem foi buscar na natureza os alimentos de que necessitava. E, desde muito cedo o próprio ato de alimentar-se, essencial par viver, ultrapassaria o simples ato instintivamente compulsório, para fazer-se acompanhar de procedimentos de natureza cultural: hábitos, costumes, proibições, tabus e outros. O ato de alimentar-se assumiu as características de um ritual. E não só o ato de alimentar como também os próprios alimentos passaram a integrar as culturas, revestidos de sacralidade, de poderes mágicos, afrodisíacos, religiosos ou maléficos.
A parceria do homem com a natureza ensinou ao homem caminhos, formas e alternativas de como melhor consolidar uma pareceria com ela, de como sobreviver nela, de como torná-la uma aliada sempre presente na construção das culturas e da própria história. E, nesse esforço, três desafios estimularam a criatividade. Em primeiro lugar, encontrar alimento e abrigo, assegurando a sobrevivência física. E segundo lugar, descobrir e aperfeiçoar tecnologias eficientes tornando mais fácil a obtenção de alimentos, a confecção do vestuário e a instalação de abrigos. O terceiro o mais importante de todos, consistiu no esforço de penetrar nos mistérios da natureza, compreendê-los e, espelhando-se neles, compreender-se a si mesmo para, desta forma, entender e desvendar as incógnitas da própria existência.
O convívio imediato, diuturno, íntimo, existencial com a natureza despertou no homem a percepção de fazer parte dela. Além de depender dela para a vida e a morte, a sua vida desenrolava-se na mesma cadência, nos mesmos ciclos. E, nesse conviver simbiótico, o homem foi construindo a sua cultura, a sua história, o seu imaginário, a sua simbologia, alimentando suas crenças, sua religiosidade, seus rituais, seus sistemas éticos, enfim, a sua cosmovisão. Tudo que o rodeava, por assim dizer, animava-se e se personificava de acordo com seu significado material, mágico ou religioso de que vinha revestido. As realidades naturais e os fenômenos que as acompanhavam assumiam importância pelo que representavam no cotidiano e pelo que sugeriam à imaginação. Aconteceu assim um espelhar-se recíproco entre o homem e as realidades e fenômenos naturais. E, em meio a esse processo de interação, de amálgama e de síntese, as culturas e identidades étnicas foram desenhando seus perfis e a História definindo o seu rumo.