As comunidades de agricultores foram-se multiplicando e expandindo geograficamente na medida que se abriam sempre novas fronteiras de colonização. No final do século XIX os vales médios dos rios do Sinos, Caí, Taquari, Pardo e Jacuí estavam povoados. A partir de 1870 imigrantes poloneses, italianos e de outras procedências da Europa Central e do Norte fundaram Forqueta, Caxias do Sul, Farroupilha, Garibaldi, Bento Gonçalves, Veranópolis, Noa Prata, Nova Bassano, Nova Araçá, São Marcos, Guaporé e muitas outras. A colonização da Serra, Missões e Alto Uruguai estava sendo começada. Como se pode perceber nas entrelinhas do processo de expansão, o modelo de agricultura familiar em andamento deitara raízes e se consolidava rapidamente. Uma série de senões e problemas de tamanho maior, inerentes à natureza do próprio modelo começaram a se tornar cada vez mais preocupantes. Com o constante crescimento populacional apareceram os primeiros sinais de degradação dos solos, a necessidade de diversificar as culturas, a renovação e aprimoramento genético das raças de bovinos e suínos. A tudo isso somava-se a urgência de um projeto global de educação, um programa de assistência social centrado na saúde e amparo jurídico dos agricultores. Na área econômica urgia criar instituições de poupança e empréstimo, incentivar cooperativas de produção, comercialização e consumo, abrir novas fronteiras de colonização para desafogar o excesso populacional das regiões mais antigas.
No decorrer da década de 1890, as lideranças coloniais lideradas pelos padres jesuítas chegaram a conclusão de que iniciativas tópicas já não eram suficientes para enfrentar os problemas que se vinham acumulando. Faziam-se necessárias ações mais abrangentes e para diagnosticá-las, analisá-las, propor soluções e estratégias, recorreram aos “Katholikentage” (Congressos Católicos) amplamente praticados desde a década de 1850 na Alemanha, Suíça e Áustria, tendo como finalidade a identificação, avaliação das demandas de caráter globais, encontrar as soluções e propor ações. A realização experimental da primeira assembleia geral nesses moldes aconteceu em Bom Jardim – hoje Ivoti em 1897. O resultado foi tão animador que um segundo Congresso foi convocado para 1898 e realizado em Harmonia, então município de Montenegro. Nos 40 anos que se seguiram os “Katholikentage”, no começo realizados a cada ano e mais tarde de dois em dois, serviram de fórum nos quais as lideranças religiosas e leigas, com a participação maciça dos colonos, identificavam e planejavam soluções e estratégias do interesse comum. Assim, o grande tema desse congresso foi a Escola e a Educação. A resposta foi a fundação da “Associação Rio-grandense dos Professores e Educadores Católicos”. A nova agremiação foi encarregada de elaborar e submeter ao Congresso de 1900 uma proposta de educação unificando tanto a duração do período de duração escolar, quanto o currículo e as práticas didático pedagógicas. No congresso em Santa Catarina da Feliz em 1899, aconteceu a fundação da “Associação Rio-grandense dos Agricultores” – o “Bauernverein”, um amplo projeto de desenvolvimento econômico e promoção humana cujos fundamentos foram apresentados pelo Pe. Theodor Amstad. Embora a iniciativa tivesse partido das lideranças católicas, pelos estatutos abria as portas para receber protestantes, italianos, poloneses, luso-brasileiros e quem mais mostrasse interesse Tendo como lema “Virbus Unitis” – “Somando Esforços”, calcada no comprometimento mútuo, todas as iniciativas fundamentavam-se no solidarismo. Estamos, portanto, frente a um proposta interconfessional e interétnica. O inusitado e surpreendente está no fato de ela ter sida apresentada por um jesuíta, 60 anos antes do Concílio vaticano II e num momento em que as comunidade das diversas procedências étnicas prosperavam num relativo isolamento.
Já no Congresso de 1902 a Associação começou a tratar questões de fundo. Foram dados os primeiros passos efetivos para solucionar problemas relacionados com a melhoria e diversificação da produção agrícola, aprimoramento das raças de gado leiteiro e suínos, a instalação de bibliotecas em todos os distritos, um esquema de proteção legal e assistência jurídica aos colonos, o desafogo da superpopulação com a abertura de novas fronteiras de colonização na região das Missões, incentivo a instalação de cooperativas de crédito, melhoria nas estradas e outras mais. Nos nove anos que se seguiram, a Associação Rio-grandense de agricultores promoveu um série de outras iniciativas que interessavam as comunidades como um todo. Entre elas, destacaram-se propostas de reflorestamento, propostas de manejo racional do solo, a recuperação de áreas degradadas, as primeiras iniciativas com arroz irrigado, a implantação do projeto comum de educação adotado em todas as escolas comunitárias, propostas para criar um sistema de previdência privada e, não em último lugar a multiplicação das cooperativas de crédito e as primeiras cooperativas de produtores de leite e suinocultores. No Congresso de Taquara em 1909 a Associação Rio-grandense de Agricultores foi transformada em sindicato. Essa decisão radical privou-a da sua essência e originalidade como associação fundamentada no compromisso da solidariedade. O promissor projeto de desenvolvimento econômico e promoção humana, foi truncado, perdeu seu caráter interétnico e interconfessional. Os italianos criaram seu sucedâneo nos “Comitati”, os protestantes na “Liga União Colonial” e os católicos na “Sociedade União Popular – o Volksverein”. O caráter interétnico e intercultural foi abandonado. A Sociedade União Popular, com o Pe. Amstad, Rick e Max von Lasssberg deram continuidade à proposta de um projeto de desenvolvimento econômico e promoção humana. Entre 1912 e o começo da Segunda Guerra Mundial, intensificou e diversificação de suas iniciativas e ações concretas. Levou ao apogeu o cooperativismo nas suas diversas modalidades, encabeçou a abertura de novas fronteiras de colonização no oeste de Santa Catarina, prestou assistência técnica, cultural, social e religiosa aos colonos. Coordenou o desempenho da rede de escolas comunitárias, construiu hospitais e asilos entre eles o hospital de São Sebastião do Caí e a Colônia de Leprosos de Itapuã e anexo o Amparo Santa Cruz, além de muitas outras iniciativas tópicas que se faziam necessárias. O arquivo da sociedade União Popular, somando redondos 70000 documentos encontra-se guardado no sexto andar da biblioteca, disponível a quem interessar.
A Segunda Guerra Mundial induziu alterações profundas em todo mundo, atingindo em cheio a Sociedade União Popular. Entre elas merece destaque o fato de o Estado Novo com o seu projeto de nacionalização ter assumido um número considerável de atribuições que antes do conflito estiveram nas mãos da iniciativa privada. O ministério da Educação chamou a si tudo que se relacionava com educação. A abertura de novas fronteiras de colonização, a assistência aos agricultores, a saúde, etc. passaram para a responsabilidade da União, dos Estados e ou Municípios. Com a mudança nos estatutos em 1961 a Sociedade União Popular deixou ser étnica e concentrou os esforços na modernização da agricultura com destaque para um programa de treinamento de jovens agricultores na Alemanha, Suíça e Áustria. A atualmente a SUP continua existindo, com sede em Nova Petrópolis, mas limitada a uma agremiação cuja grande razão de ser foi superada pelo andar da história.
NB. Para maiores informações ofereço o livro da minha autoria com o título: “Somando Forças – O Projeto Social dos Jesuítas no sul do Brasil. Edit. Unisinos, 2011).