
Em dezembro de 2015, realizou-se em Paris a “Conferência Internacional do Clima”. Reunidos estavam os chefes, dos governos das grandes potências, dos emergentes, além de representações de países do terceiro mundo. O show foi comandado pelas estrelas dos primeiros. Nesse cenário, não deixaram de se fazer ouvir as vozes das organizações que pululam pelo mundo afora, com o propósito sincero ou nem tanto de salvar o que sobrou da natureza, “a casa da humanidade”, o lar no qual nasceu a espécie humana, que a abriga e a sustenta. Desde o momento em que o primeiro dos seus representantes começou a respirar o ar das suas florestas e savanas e a servir-se das suas dádivas, essa “casa” foi seriamente maltratada com o andar dos séculos e milênios. O estrago causado é de tal ordem que, com razão, preocupa grandes e pequenos, pobres e ricos, poderosos e humildes, governantes e o povo em geral. Afinal, essa “casa” abriga a todos e a todos sustenta. Sua degradação termina atingindo indistintamente a todos. Primeiro e o mais cruelmente os menos favorecidos, mas é uma questão de tempo para que cobre seu preço também aos poderosos e aos magnatas. A prova está aí. A cúpula do poder político somada à do poder econômico encontrou-se em Paris para ouvir o grito de socorro da “nossa mãe e pátria” maltratada até o irracional pelo homem “racional”.
Chegou-se ao limite e tornou-se urgente uma tomada de posição, definir políticas globais e partir para ações concretas e sérias, isentas e desinteressadas. O momento é de tomar decisões para valer e firmar compromissos objetivos e sérios para enfrentar o problema. O debate não pode estagnar e esgotar-se no nível de uma cortina de fumaça de belos e sonoros discursos; não se podem esperar as soluções via critérios geopolíticos, geoeconómicos ou geoestratégicos; não se avança na solução dos desafios ambientais turbinadas com iniciativas por toda a sorte de ideologias e ou interesses não confessados ou não confessáveis. Não há mais tempo a perder, pois a questão ambiental é urgente e complexa demais. No livro que aqui apresento com o título “A Natureza como Síntese” não pretendo refletir ou analisar políticas públicas, políticas de natureza geoeconómica ou geoestratégica ou então analisar quais os aspetos concretos em que a natureza corre perigo. O aprofundamento desse lado da questão ambiental encontra-se detalhado, comentado e dimensionado num outro livro da minha autoria e em vias de publicação, intitulado “A Nossa Casa” – reflexões inspiradas na Encíclica “Laudato Si”.
O que de fato interessa aqui é um pressuposto que deveria conferir uma bases sólida que, se não for tomado em consideração, mais, se não for colocado como fundamento, todo e qualquer iniciativa em favor da natureza não passa de um castelo construído sobre areia. É preciso responder à pergunta aparentemente singela e óbvia: “O que é a Natureza, qual a sua essência”. Será que ela se resume num conjunto aleatório e fortuito de elementos químicos, estruturas minerais, variáveis climáticas, a micro e nano fauna, as plantas e os animais superiores e no meio de tudo isso o homem? Quem sabe resume-se numa máquina finamente calibrada e de alta resolução, funcionando à maneira de um robô? Ou a natureza tem algo de tudo isso, mas sua essência ultrapassa o nível da mecânica para situar-se num patamar mais acima e mais além?
O avanço e os resultados das pesquisas científicas levou um número crescente de cientistas a conceber a natureza com o resultado de “engenhosa síntese”. O aprofundamento das pesquisas da química, física, biologia, paleontologia, genética, fisiologia, botânica, zoologia, ecossistemas, astrofísica, os organismos e os sistemas, está a convencer um número sempre maior de cientistas e dos mais conceituados, a conceber a natureza como uma “grandiosa síntese”. Em poucas palavras. Essa síntese não se resume na soma dos elementos que a compõem, senão pela complementariedade funcional.
A compreensão da natureza posta nessa perspetiva, entre muitas, uma conclusão assume um significado todo especial. O esforço das ciências naturais centra-se na compreensão do “como” a natureza foi e se encontra estruturada e como funciona. Falando em síntese, essa é apenas uma face da questão. Falta responder “donde”, “para que” e “para onde”. Qualquer esforço em busca de uma síntese, termina em frustração, no caso de se ignorar, pior desqualificar ou até negar essas três dimensões. Para responder ao “como”, as ciências naturais dispõem de métodos, ferramentas e competência. Quanto à resposta pelo “donde”, o “para que” e “para onde”, os métodos, as ferramentas e a competência cabe às ciências do espírito, das ciências humanas, inclusive das letras e artes. Sendo assim, a construção de uma síntese da natureza digna desse nome só então terá chances de sucesso, quando em seu edifício contribuírem proporcionalmente todas as áreas do conhecimento. É indispensável que as ciências todas, as naturais, as espirituais, as humanas, letras e artes se encontrem e se comprometem para realizar essa tarefa num esforço interdisciplinar honesto e isento. Para tanto pressupõe-se uma linguagem que ambos os lados entendam e partir de questionamentos que em princípio interessam a todos: “Como começou tudo”, “como funciona”, uma “teleologia comando ou não os processos? E qual o “destino final?”; enfim, a razão de ser ou não da natureza como “casa”, “querência” ou “mãe e pátria” da humanidade.
Nas reflexões que seguem depois, depois de um capítulo introdutório e se ocupa com a inserção existencial do homem na natureza, dedicamos o restante do texto à compreensão da natureza de sete cientistas mundialmente respeitados nas respetivas especialidades. Três deles, Erich Wassmann, Teilhard de Chardin, Balduino Rambo, foram jesuítas. Sua compreensão da natureza leva, evidentemente as marcas dessa filiação. Hans Driesch biólogo e filósofo e o também biólogo Ludwig von Bertalanffy, cientista secular. Francis Collins e Theodosius Dobzjansky alinham-se entre os geneticistas mais importantes, o primeiro em genética médica e o segundo como um dos sistematizadores da genética como ciência. Não os limita nenhum compromisso confessional. O último vem a ser Edward Wilson entomólogo dos mais respeitados e autoridade maior no conhecimento dos ecossistemas naturais e humanizados. Autodefine-se como “humanista secular”.