Da mesma forma como procederam com a escola e a educação, assim os imigrantes alemães organizaram a sua vida religiosa. No âmbito do espaço comunal providenciaram por tudo que fosse necessário para que a religiosidade tivesse condições de desenvolver-se e florescer. Como ponto de partida organizava-se a comunidade da igreja (Kirchengemeinde). A ela pertenciam em princípio todos os moradores. Dentre os membros da comunidade da igreja elegia-se a diretoria da igreja (Kirchenvorstand). A ela cabia a tarefa da construção da igreja ou capela e a instalação de um cemitério. Nas sedes paróquias acrescia mais um compromisso: adquirir para a comunidade um lote de terra vizinha à igreja (Kirchenland). A função mais específica da diretoria consistia na edificação e na instalação de uma moradia para o pároco ou o pastor que iria assumir a cura de almas da paróquia com suas capelas. Nas suas visitas periódicas às capelas o pároco ou seu auxiliar costumava hospedar-se na casa do professor ou de algum morador próximo à capela.
A diretoria da igreja, uma vez concluída a infra-estrutura inicial, ficava com a responsabilidade de, daí em diante, providenciar tudo o que era preciso para o bom funcionamento da prática da religiosidade. Entre essas obrigações constava o agenciamento junto às autoridades eclesiásticas a presença permanente de um padre ou pastor; cuidar da limpeza e ornamentação da igreja; aquisição e manutenção das alfaias usadas nas missas, cultos e administração dos sacramentos; organização das festas do ano litúrgico. Um dos seus membros costumava ser destacado para vigiar o comportamento de adolescentes e jovens durante os ofícios do culto. Nessas ocasiões sua autoridade não sofria contestação.
Nas capelas que só periodicamente contavam com a presença do sacerdote, a organização e a condução do culto ficava sob a responsabilidade da diretoria local. O professor costumava presidir o culto. Além disto era ele que dava catequese na escola, ensaiava os cantos e detinha uma autoridade por todos acatada. Em situações de emergência, ministrava o batismo, presidia os matrimônios e encomendava os defuntos. Com esses pré-requisitos a vida religiosa das comunidades costumava funcionar a contento. O fervor religioso mantinha-se desta forma intacto em novas fronteiras de colonização onde a presença de um sacerdote às vezes levava meses para se repetir.
As missas e cultos dominicais tinham um outro significado de não pouca importância naquelas circunstâncias. Ofereciam a única ocasião para o encontro da comunidade. Antes e depois do ato religioso as pessoas conversavam sobre os assuntos mais diversos, veiculavam notícias, trocavam informações e experiências, acertavam encontros, desfaziam mal-entendidos e até realizavam negócios.
Mais do que a escola a igreja atuava como polarizadora da vida comunal como um todo. Batalhando duramente durante a semana, em companhia apenas da família, no isolamento de sua propriedade, o encontro dominical na igreja, impedia que os colonos se transformassem em vitimas de uma isolamento prolongado. Confluindo de todos os lados e de todos os recantos, o encontro dominical guardava viva a consciência da unidade comunal. Fazia com que no encontro as pessoas encontrassem apoio e compreensão para as durezas e infortúnios da vida. Renovavam a convicção de que ninguém estava só, que a solidariedade dos vizinhos e, mais do que tudo, só a união de todos é capaz de construir algo de bom e de duradouro para o futuro.
As comunidades teutas no sul do Brasil formavam unidades humanas auto-suficientes em quase tudo que dizia respeito às exigências normais do dia a dia. Pouca coisa era preciso trazer de mais longe. Somente gêneros não produzidos na região, como açúcar, sal, certos condimentos, tecidos e ferramentas um pouco mais sofisticadas, eram adquiridos no comércio.
Em nenhuma comunidade um pouco maior faltava um moinho. O milho colhido nas propriedades costumava ser levado até ele no lombo de cavalos, mulas ou carroças, moído a um preço módico, e a farinha consumida em forma de pão, confeitos domésticos. Foi um hábito generalizado que o preço da moagem fosse convertido proporcionalmente em alguns quilos de farinha e no farelo que resultava como subproduto da moagem. O lucro maior que o moleiro costumava auferir pelo seu trabalho, provinha da comercialização da farinha e da engorda de porcos com o farelo. A farinha de trigo utilizada em festas maiores e em outras ocasiões especiais costumava ser importada. Conclui-se daí que o pão-nosso-de-cada-dia chegava por um preço até modesto na mesa do colono. Tudo acontecia sem intermediação, sem burocracia e com a qualidade garantida.
Uma prática parecida resolvia o fornecimento das ferramentas básicas para a atividade agrícola, sobretudo em frentes pioneiras de colonização. Nas ferrarias forjavam-se enxadas, facas, facões, foices, pás de arado e ferragens para os mais diversos usos. Ao ferreiro cabia outrossim a importante tarefa de ferrar os cavalos, o principal meio de locomoção das pessoas e o transporte de cargas leves. As regiões pedregosas da maioria das picadas e linhas em que moravam os colonos, exigiam um cuidado constante com os cascos e ferraduras. Na fabricação das carroças o ferreiro encarregava-se das partes de ferro e o carpinteiro das parte de madeira. A aquisição de ferramentas um pouco mais sofisticadas e elaboradas, como serras, machados, enxós, plainas, verrumas, limas, puas, martelos e formões, dependia da importação.
As serrarias, carpintarias e marcenarias encarregavam-se de atender outro conjunto de primeira necessidade. A abundância de madeira de boa qualidade extraída nas propriedades dos colonos, fez com que estivesse presente em todas as situações da vida quotidiana. As moradias, os celeiros, as estrebarias, as pocilgas e demais benfeitorias, tinham na madeira a matéria prima por excelência. No começo as construções inteiras costumavam ser feitas de madeira, dede os fundamentos até a cobertura com tabuinhas. As serrarias desdobravam as toras em tábuas, madeiras de canto, barrotes, caibros e sarrafos. As serrarias não costumavam dispor de estoques próprios de madeira. Serravam sob encomenda as toras que os colonos levavam. Não se conheciam intermediários e com isso o custo de uma benfeitoria qualquer ficava nos limites das possibilidades dos colonos. Formando um complexo integrado com as serrarias ou funcionando em instalações separadas, as carpintarias e as marcenarias aprontavam móveis, esquadrias, portas, janelas, a parte da madeira das carroças e dos arados, etc. Móveis mais elaborados e até com alguma sofisticação vinham das casas de importação em Porto Alegre.
Como o deslocamento de pessoas e cargas leves era feita quase que exclusivamente com cavalos, havia necessidade constante de arreios, selas e de outros artefatos de couro. Da mesma forma usavam-se na colônia, chinelos, botas, tamancos, sapatos. As sapatarias e as selarias se encarregavam de suprir essas necessidades. Os couros podiam ser adquiridos com facilidades nos matadouros locais ou comprados na região da campanha, que afinal não ficava tão distante. Para curtir o couro surgiram, desde cedo, os pequenos curtumes no vale do Rio dos Sinos, do Caí e demais áreas da colonização. As sapatarias e selarias foram aumentando o volume da produção ao mesmo tempo em que sofisticaram as instalações à medida em que a população crescia e a demanda aumentava. O fato é que, a partir das pequenas sapatarias e dos primitivos curtumes artesanais, desenvolveu-se a pujante indústria coureiro-calçadista que, até o final do século XX, foi responsável pela principal atividade econômico-industrial do vale do Sinos. Seus calçados e seus artefatos de couro eram exportados para os cinco continentes e renderam para os cofres do Pais centenas de milhões de dólares. A região tornou-se nacionalmente famosa pelo nome quase carinhoso de “Vale do Sapateiro”.
Um fato semelhante se deu com as ferrarias artesanais. Muitas evoluíram para indústrias metalúrgicas de respeitável porte. Esse setor industrial alcançou um nível bem mais significativo entre os colonizadores italianos. Entre eles instalações que forjavam enxadas e pás de arado, transformaram-se em complexos metalúrgicos modernos e de grande porte, empregando milhares de operários, utilizando a mais avançada tecnologia e entregando no mercado nacional e internacional produtos de alta qualidade. São exemplares neste caso a Indústrias Metalúrgicas Eberle, em Caxias do Sul, a Metalúrgica Rossi em São Leopoldo, a Gerdau, a Tramontina e outras mais.
Uma vez garantida a escola, a igreja e os meios de apoio à vida de uma comunidade, acrescia todo um conjunto de providências para garantir o lazer, as atividades culturais e associações destinadas à promoção humana. Foi assim que, a partir da década de 1850, surgiram primeiro em Porto Alegre, depois nos incipientes centros urbanos de São Leopoldo, Pelotas, Rio Grande, Santa Maria e outros mais, centenas de associações, sociedades e clubes, destinados ao cultiva da sociabilidade, do lazer, da música, do canto, do teatro, dos mais diversos esportes, da ginástica, de beneficência, etc. Nas comunidades do interior colonial multiplicaram-se as sociedades de canto junto às igrejas e capelas.