Alemães na Argentina colonial
Da mesma forma como aconteceu no Chile também na Argentina a presença alemã se faz notar desde os primeiros anos depois do descobrimento da América. As evidências mais antigas relativas à contribuição alemã na exploração dos territórios que formariam mais tarde a Argentina, aparecem na expedição de Fernão de Magalhães. Cartógrafos, impressores, náuticos, canhoneiros e outros peritos alemães gozavam de excelente conceito junto à corte portuguesa. Quando o navegador empreendeu a viagem à procura de uma passagem até "as ilhas das especiarias", contornando, a serviço do rei de Espanha, o extremo sul da América, valeu-se das cartas náuticas desenhadas por Martin Bechaim ou Martin de Boemie, como registrou o cronista da viagem. Parte da viagem, num valor de 10.000 ducados, foi financiada pela Casa Fugger através do seu representante na Espanha. Trata-se do óbvio quando se afirma que havia um número considerável de alemães embarcados nos cinco navios da expedição. Um deles mereceu referências especiais dos cronistas da viagem. Trata-se do primeiro sargento canhoneiro Hans Varge de apenas 25 anos. Após muitas peripécias os navegadores chegaram finalmente às ilhas nos mares do sul. Hans Varge sobreviveu à fome e ao escorbuto e conseguiu livrar-se das armadilhas dos moradores das ilhas. Aprisionado pelos portugueses nas ilhas Molucas, passou cinco anos em prisões desumanas e finalmente transportado para Lisboa morreu no calabouço do "Limonero".
Como recompensa pelo suporte financeiro recebido pelos Fugger e Welser, o imperador Carlos V. concedeu às duas casas, em 1525, os mesmos direitos que aos espanhóis, para atuarem nos territórios de interesse dos espanhóis no além-mar. Já em 1526 foi organizada uma expedição para, contornando a América do Sul e passando pelo estreito de Magalhães, alcançar as ilhas dos mares do sul. O comando coube a Sebastião Caboto e nela tomaram parte representantes das duas casas. Caboto, alcançado o rio da Prata, deixou-se convencer por informações de índios brasileiros sobre fabulosas montanhas de prata. Num ato de flagrante desobediência aos superiores mudou o roteiro original da expedição e subiu o rio da Prata em busca das jazidas de prata no Peru. Na expedição viajavam Hans Brunberger, agente dos Fugger e Kasimir Nürnberger da casa Welser. Por força de um acordo entre a casa Fugger e o Conselho das Índias toda a região sudoeste do continente até o estreito de Magalhães passou para a sua influência. Houve várias tentativas de implantar colônias na América do Sul por parte dos Fugger. O que, porém, mais interessou e mais foi realizado por eles e os Welser foram atividades comerciais.
As expedições de 1535 tiveram como finalidade principal o reconhecimento do país. Deixaram como marcos duradouros de sua passagem alguns dos expedicionários que as acompanharam, dispersos em diversos pontos do rio da Prata. A primeira expedição, com o propósito real de estabelecer assentamentos duradouros ao longo do rio, começou com o empreendimento de D. Pedro de Mendonça na a sua viagem à América do Sul em 1535, embarcado em 14 navios e uma tripulação total de 1.500 homens. Um desses navios pertencia ao banqueiro de Augsburg Sebastian Neithart e do comerciante de Nürenberg Jakob Welser. Nas tripulações encontravam-se ainda 80 alemães. Entre esses tripulantes viajava o jovem primeiro sargento Ulrich Schmidl de 25 anos, integrando o contingente de arcabuzeiros. Ele deixou um relato de sua permanência na região de La Plata entre 1534 e 1554, publicado pelos “Straubinger Hefte em 2008 com o título completo: Ulrich Schmide/Ulrico Schmidel – Reise in die La Plata Gegend – 1534-1554. Esse documento foi por mim traduzido para o português e deverá ser publicado no contexto de um projeto que está sendo executado pelo PPGH de Hisrória da Unisinos sob a coordenação da profa. Maria Cristina Bohn Martins.
O projeto de colonização de Mendonça enfrentou duas dificuldades insuperáveis que terminaram por frustrá-lo. Em primeiro lugar foram os marinheiros e os agricultores que levara preferiram proteger-se numa "cidade" de choupanas cobertas de palha cercada por uma paliçada. Deixavam-se abastecer de carne e de peixes pelos índios Querandis. Estes finalmente cansaram e negaram-lhes os suprimentos. Uma expedição foi organizada para castigar os índios, mas estes se aliaram aos vizinhos e sitiaram a "cidade". Depois de um mês os espanhóis partiram reduzidos a apenas 600 homens.
Schmidl participou da expedição de Domingo Irala e participou da fundação de Asunción. Desta maneira transferiu-se de Buenos Aires para Asunción o centro das atividades dos espanhóis na região. Depois de consolidar sua autoridade sobre Asunción e os povos indígenas nas redondezas, Irala empreendeu uma expedição até o Perú sempre acompanhado por Schmidl e um cronista alemão. Depois da aventura ao Perú Schmidl despediu-se de seu "capitão" na América e em companhia de 20 índios abriu caminho até São Vicente em São Paulo onde embarcou para a Europa. De volta à pátria escreveu a obra "Descrição Verdadeira". O general Mitre observou a respeito da importância da obra como fonte histórica:
Ele (Schmidl) é um observador tranquilo e atento da natureza, despreocupado e sem fantasias. Relata os acontecimentos de maneira seca e objetiva, sem enfeites e sem digressões. Só ocasionalmente emite um juízo ou faz uma observação que leva a pensar, uma constatação de natureza etnográfica, geológica, estatística, astronômica o de conhecimentos da natureza. Em poucas pinceladas nos brinda com um retrato, uma paisagem, um animal ou um planta, contribuindo assim com a concepção que temos de povos e raças esquecidos. Oferece também um material útil para entender a história da colonização do Rio da Prata pelos povos da Europa. (citado em Die Deutschen in Lateinamerika, p. 45). (Fröschle, 1979, p. 45)
Depois da conquista seguiu a verdadeira colonização. Sobre o destino dos pioneiros europeus e no caso específico dos alemães que ficaram para sempre na América Latina, em qualquer um dos países, aplica-se o que acima já foi observado.
Na maioria das vezes viviam com uma ou mais índias. Nos seus filhos conquistadores e conquistados amalgamaram-se num único povo. Também os descendentes dos alemães submergiram nessa raça mestiça europeia-índia. Seus nomes foram na maioria dos casos deturpados pelos escrivães holandeses ou então hispanizados pelos próprios portadores.
Depois da renúncia de Carlos V somente alemães esparsos chegaram até a América espanhola. Desta maneira o elemento alemão significa apenas uma gota na mistura de sangue da qual emergiu o "crioulo". (Fröschle, 1979, p. 45)