A visão sintética da natureza de Dobzhansky a partir da genética. O que é legítimo concluir do que se acaba de comenta? Dobzhansky apresenta uma resposta a partir de sua especialidades de geneticista, válida na sua essência para cientistas em qualquer uma das áreas da Ciências Naturais. Ao apresentar o livro “A Herança e a Natureza Humana” a bases que nos servirá de guia para as reflexões que seguem, chama a atenção ao fato de que a obra é fruto da série “Holiday Science Lectures”, patrocinada pela Sociedade Americana para o Progresso da Ciência em 1963 e 1964. O objetivo da série de estudos e reflexões foi assim resumido: “ampliar os horizontes científicos do público, e compartilhar com ele uma parte da emoção e inspiração do esforço científico.
Dos numerosos avanços da ciência, a ciência da hereditariedade, é um dos mais impressionantes. Evidentemente a genética não inventou uma nova superbomba, nem consegue competir com a sensação romântica oferecida pelas viagens interplanetárias. O interesse e a importância da genética são definidos por outras razões. Há mais de dois milênios os sábios gregos descobriram que “o conhecer-se a si mesmo”, é base de toda a sabedoria. Talvez a principal finalidade da genética, da biologia e da ciência em geral – ou pelo menos um deles - consiste em ajudar o homem a compreender-se a si mesmo e tomar consciência do seu lugar no universo.
Por meio deste livro não se pretende cobrir o campo todo da genética. Nosso objetivo principal serão os aspetos humanísticos da genética, que vale dizer enfocar os dados, as ideias e as concussões básicas mais significativas para o homem, sua origem e seu futuro. (Dobzhansky, 1969, p. 11)
O corpo da obra “Herança e a Natureza humana” é dedicado à análise das conquistas da genética até 1975, ano do falecimento do cientista. Introduz o capítulo primeiro intitulado “A Natureza da Hereditariedade” apresentando um panorama do crescimento exponencial da humanidade, numa taxa média anual de 1,8%. De 2.015.000.000 em 1930, pulou para 2.509.000.000 em 1950 e em 1961 já subira para 3.069.000.000. Hoje, 2015 constatamos a impressionante cifra de ------------ Essa situação mostra que a densidade populacional vai se intensificando, na razão direta do aumento populacional. Os homens agrupam-se mais e mais e confluem para centros urbanos, metrópoles e megalópoles cada vez mais gigantescas. Viver como eremita no deserto, afirma o autor é geograficamente impossível pois, até os desertos transformaram-se em lugares de lazer, em campos de exploração de petróleo, em complexos tecnológicos, como por ex., o Vale do Silício nos Estados Unidos. As florestas tropicas e subárticas assim como as ilhas mais distantes nos oceanos, as proximidades dos polos recebem ininterruptamente cientistas, exploradores e complexos de instalação para explorar recursos naturais. “O homem é obrigado assumir-se cada vez mais, de acordo com a definição de Aristóteles - como politikón zoon, como animal social, como animal da cidade, como animal “político”. (Dobzhansky, 1969, p. 13.
Os seres humanos além de formar uma espécie taxonômica com as características comuns que permitem sua classificação nessa categoria zoológica, como as demais, apresenta, ao mesmo tempo, uma variedade individual que vai ao extremo. Não há duas pessoas perfeitamente idênticas. Desde que foi constatado que as impressões digitais são prova de identificação, até hoje, não há notícia da existência de coincidência no desenho das papilas entre duas pessoas, tanto assim que continuam como prova conclusiva da identidade ou não, em casos de dúvida. Nem mesmo os gêmeos idênticos são realmente idênticos, são isso sim, menos diferentes. Dobzansky chama à atenção ao fato de que por mais parecidos entre si pareçam os indivíduos de uma espécie, uma observação mais atenta mostra que também entre os animais e as plantas, há traços que os identificam como individualidades. A resposta a essa constatação deve ser procurada na combinação dos efeitos da herança genética e a influência do meio ambiente em que as pessoas se encontram. “Uma pessoa qualquer, com todas as suas características físicas, mentais e culturais é produto da interação entre natureza e alimentação, hereditariedade e ambiente” (Dobzhansky, p. 14). Sendo assim tanto o determinismo genético, quanto o determinismo ambiental, levados ao exagero, distorcem o que de fato ocorre com o homem e, por extensão com os animais e plantas. No caso do homem somam-se à base genética e à influência do meio geográfico, as características culturais com todos os seus desdobramentos. Conclui-se daí que, as incontáveis modalidades das condições geográficas e as condições culturais, colaboram com outras tantas modificações nos indivíduos, ressalvado o potencial genético de cada pessoa ou indivíduo de uma determinada espécie.
O código genético como fundamento da identidade biológica de todos os seres vivos, das arqueobactérias ao elefante e o homem, das algas diatomácias até uma araucária várias vezes secular, apresenta os mesmos elementos químicos básicos, o mesmo DNA, o mesmo plano estrutural e os mesmos reflexos nos indivíduos. Representa assim um poderoso argumento, talvez o mais consistente, em favor da “síntese” da natureza. Vale lembrar que Francis Collins encontrou esse argumento em favor da natureza como síntese, também no campo da genética, enquanto Wilson o foi buscar nas observação dos insetos e ecossistemas naturais e humanizados que a natureza é um “Fato objetivo”. Theilard de Chardin chegou à mesma conclusão partindo da paleoantropologia, Bertalanffy da biologia. Os caminhos e as abordagens são diferentes mas todas convergem “para Roma”, isto é, todos sinalizam para uma grande síntese.
No capítulo I, Dobzansky explica exaustivamente o papel das células sexuais; como os cromossomas e genes conduzem a herança genética; qual a composição química dos cromossomas e os mecanismos de auto multiplicação relacionam-se com origem da vida. Dedica o capítulo II à “Multifacética Natureza Humana”. Nele aprofunda a questão da individualidade do homem na unidade da humanidade; genótipo e fenótipo; estudo dos gêmeos; as modificações induzidas pelo meio ambiente. No capítulo III discute a questão da raça, as diferenças individuais e da coletividade, a raça como fenômeno biológico, as frequências genéticas humanas, uma possível classificação das raças humanas, raça, inteligência e personalidade, um elogio à diversidade. O capítulo IV leva como título: “A Tara Genética e o Perigo das Radiações”, com os subtítulos: Evolução, mutação, as mutações no homem, tipos de mutação e suas causas, a maioria das mutações é prejudicial, seleção natural, tara genética, condições genéticas ambivalentes, genética e o perigo das radiações. Esses quatro capítulos, como se perceber pelos assuntos enfocados neles, ocupam-se com a fundamentação da natureza humana, bases genéticas e interação do meio ambiente com essas bases. Não é o lugar aqui para profundar os aspectos científicos e técnicos desse fundamento, pois, o interesse nas presente reflexões é aprofundar a tese da “Natureza como Síntese”.