A Natureza como Síntese - 49

Duas conclusões.  
Duas conclusões parecem ser  de importância nessa declaração de Collins. A primeira que a compreensão do homem na sua totalidade existencial e, porque não a compreensão do universo e da natureza, situa-se fora e além dos potenciais teóricos e metodológicos da ciência. Este fato leva à conclusão de que a face fora do alcance da ciência exige uma abordagem vinda de outra direção munida com as ferramentas capazes de iluminar a outra vertente de dados indispensáveis para completar a compreensão objetiva da natureza. Em outras palavras. Para entender a natureza como uma totalidade, como um dado objetivo, como uma síntese, não basta a aproximação pela análise e a indução. É preciso associar à investigação a abordagem sintético-dedutiva, e para dar alma e harmonia ao todo dessa síntese, cabe à intuição como conhecimento legítimo um papel mais importante do que muitos gostariam de admitir. Não sem razão o Pe. Balduino Rambo anotou em suas reflexões sobre o conhecimento.

Entre a Ciência e a Fé (entre as Ciências Naturais, a Filosofia e a Teologia, as Ciências Humanas, as Letras e Artes, inciso do autor), estende-se o vasto campo da intuição, que não é outra coisa do que um conhecimento condensado. Não se trata ali tanto do significado e da expressão imediata da palavra, como do som subliminar que emite e da ressonância que desperta. A essa melodia concomitante da linguagem humana até hoje se prestou pouca atenção. Bem considerada ela não é um som secundário, e sim a nota dominante no concerto musical do espírito dinâmico do homem, (Rambo,  1994, p. 265)

A intuição teve em Jean Jacques Rouseau a sua habilitação como forma legitima de conhecimento. A percepção imediata das realidades naturais pelos sentidos resulta na construção informal e espontânea dos corpos de conhecimento que subjazem às mais diversas culturas e civilizações. Com sua autoridade inconteste o grande filósofo da modernidade, deixou claro  que o homem busca a matéria prima do conhecimento no mundo ambiente em que vive e apropria-se dela por meio dos sentidos. A forma peculiar como essas percepções são elaboradas, depende da natureza delas, do entorno cultural em que é recebida e da forma única pela qual é percebida e elaborada pelas mentes individuais. Rousseau contentou-se, filósofo que era, em apresentar ideias sem propor caminhos para pô-las em prática. Talvez não intuísse o tamanho do potencial prático embutido nessa forma peculiar de conceber toda uma face importante do conhecimento. E o valor prático, inovador  e revolucionário encontra-se exatamente no plano mais sensível e mais decisivo da vida dos indivíduos e das sociedades por eles formadas: a Educação. E é exatamente pela educação formal e informal, no ambiente familiar e social e, principalmente de forma sistemática nos currículos  do nível infantil e fundamental, que os conhecimentos via sensorial e intuitivamente elaborados transformam-se no “som subliminar  que emite e da ressonância que desperta”. É a melodia concomitante da linguagem humana” (...) “A nota dominante no concerto musical”, como a classificou o Pe. Rambo na referência acima. 

É até certo ponto surpreendente que a proposta de começar a educação infantil estimulando as crianças a entrar em contato com as realidades naturais que as rodeiam, encontra em Edward Wilson um dos seus defensores mais entusiastas e de maior peso. Com um currículo de biólogo construído durante mais de cinco décadas, tendo a entomologia como foco, impôs seu nome  como uma das  maiores autoridades na especialidade, é de esperar que suas sugestões sobre a educação das crianças tivesse como cenário privilegiado a “História Natural”. Sim, o velho e, por muitos desprezado e rejeitado conceito de “História Natural”, que para Wilson confere razão de ser e consistência a qualquer projeto ou iniciativa na pesquisa científica. Para ele a “Natureza é uma realidade objetiva”, portanto tem uma história, uma “História Natural” também objetiva. A História da Natureza, portanto, não é sucessão fortuita de fatos e acontecimentos sucedendo-se ao acaso ou uma visão momentânea desenhada a partir dos dados fornecidos pelas pesquisas científicas num determinado momento histórico. Visto sob este prisma o conhecimento obtido via sensorial e elaborado pela intuição não pode ser ignorado no momento em que se pretende propor, esboçar e formular uma síntese da Natureza. Não nos queremos alongar aqui numa análise mais detalhada da proposta de Edward Wilson, pois será objeto do capítulo seguinte dessas reflexões.

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