A sínteses entre as Ciências. Os pontos de partida para entender a Natureza como uma grande síntese do Dr. Collins e do Pe. Balduino Rambo praticamente coincidem. As diferenças situam-se num plano secundário. Para o segundo a existência de Deus foi um dado objetivo que o acompanhou desde o berço. Pelo menos ao que consta nunca o assaltou uma dúvida séria a esse respeito. Por isso a Natureza é o livro aberto da Revelação Divina. Quem está em condições de lê-lo e interpretá-lo não encontra dificuldade em admitir a existência do Autor acima e além do que se observa, por ex., na botânica que foi seu campo de especialista. As paisagens, as “fisionomias” naturais como ele gostava de definir os múltiplos panoramas que podem ser encontrados, no seu conjunto e nos detalhes aparentemente mais insignificantes, não passam em última análise, de um código, de uma “linguagem” que revela o Supremo Artista que os imaginou e os colocou à disposição do homem para que desenvolva os seus potenciais humanos, a sua “Menschlichkeit”, recordando mais um dos seus conceitos prediletos. Para o Dr. Collins, especialista em Genética Médica, o genoma humano mapeado sob sua direção, forma em última análise um alfabeto de 3 bilhões de caracteres escrito num código enigmático. O decifrar desse código revela, para ele, nada mais nada menos do que “A Linguagem de Deus”. Diferente do Pe. Rambo, o Dr. Collins começou a convencer-se de que o agnosticismo que professara até os 21 anos e o ateísmo até os 27, não lhe ofereciam uma reposta conclusiva para uma interrogação crucial: qual é a causa explicativa satisfatória para entender “o como” a natureza foi capaz de evoluir para uma complexidade tamanha que qualquer superlativo é incapaz de abarcar. Mais. Como se explica a teleologia que faz com que a evolução não se desgarre e não termine num caos total, mas demonstra uma ordem, uma harmonia resultante de leis naturais que permitem acompanhar essa trajetória fantástica e entender com o aprofundamento das investigações, como funcionam as partes dentro e em função do todo. Mais ainda. O Dr. Collins como médico geneticista defrontou-se com outra desafio. Como é que os seus pacientes, submetidos a grandes e intermináveis sofrimentos, buscavam na Fé em Deus a força para seguir em frente, mesmo desenganados pela Medicina? Foi a partir daí que começou a refletir seriamente sobre a possibilidade de aceitar a ideia de Deus e terminou convencendo-se de que não havia nenhuma incompatibilidade em ser uma grande cientista e um dos maiores especialistas em genética e, ao mesmo tempo, crer sinceramente em Deus. Desde então tornou-se um fervoroso divulgador da compreensão do universo e da natureza como uma grandiosa e harmoniosa síntese, que não encontra explicação satisfatória sem abrir uma perspectiva para além dos potenciais da ciência como é normalmente entendida. E o Dr. Collins não vem a ser uma voz isolada que clama no deserto. Vale a pena reproduzir síntese da situação deixada por ele na “Linguagem de Deus”.
Essa síntese potencial das visões do mundo científica e espiritual, nos tempos modernos, é tida por muitos como impossível, quase como a tentativa de obrigar os dois polos de um ímã a permanecer juntos num mesmo ponto. Apesar dessa impressão, várias pessoas nos Estados Unidos permanecem interessadas e assimilar a validade de ambas as visões do mundo em seu quotidiano. Pesquisas recentes confirmam que 93% dos norte-americanos são adeptos de alguma forma de crença em Deus; entretanto, a maioria deles também dirige carros, utiliza eletricidade e presta atenção na previsão do tempo, aparentemente reconhecendo que a ciência que dá respaldo a tais fenômenos é, em geral digna de crédito.
E o que dizer da crença espiritual entre os cientistas? Na verdade, ela é mais comum do que muitas pessoas imaginam. Em 1916, pesquisadores perguntaram a biólogos, físicos e matemáticos se acreditavam em um Deus que se comunica ativamente com a humanidade e ao qual é possível fazer uma oração, na esperança de receber uma resposta. Cerca de 40% responderam que sim. Em 1997, o mesmo estudo foi repetido literalmente e, para a surpresa dos pesquisadores, a porcentagem permanecia muito próxima da anterior. (Collins, 2007, p. 12)
Em sua obra o Dr. Collins começa as reflexões que o levaram no final a propor a alternativa do “BioLogos” como saída para harmonizar a Ciência e a Fé. “BioLogos” vem a ser o conceito chave para entender a harmonia, na situação atual do conhecimento, entre as Ciências Naturais, as Ciências Humana, as Letras e Artes e, principalmente, as Ciências do Espírito, isto é, a Filosofia e a Teologia. Para introduzir as suas reflexões recorda o que Kant escreveu há mais de 200 anos passados: “Duas coisas me enchem de admiração e estarrecimento crescentes e constantes, quanto mais tempo e mais sinceramente fico refletindo acerca delas: “os céus estrelados lá fora e a Lei Moral aqui dentro”; a declaração de Einstein: “Sem a religião a ciência é manca e sem a ciência a religião é cega; ou ainda a afirmação um tanto improvável na pena de um físico, como observou Collins: “em geral não dado a contemplações metafísicas, Stephen Hawking no seu livro “Uma breve História do Tempo”: “Então, poderíamos todos nós, filósofos, cientistas e pessoas comuns, participar da discussão sobre a questão do porquê de nós e o universo existirem. Se encontrarmos uma resposta a isso, será o triunfo definitivo da razão humana – pois, então, conheceremos a mente de Deus”. Em outra passagem da mesma obra, Hawking afirma: “Seria difícil explicar por que o universo teria começado desta exata maneira, a não ser como o ato de um Deus criador que quisesse criar seres como nós”; ou ainda a afirmação: de Theodosius Dobzhansky: “Ou a metade dos meus colega são muito idiotas, ou então a ciência do darwinismo é inteiramente compatível com as crenças religiosas convencionais – e igualmente com o ateísmo”. Há ainda a resposta à pergunta formulada por Eugen Wiegner: “Qual seria a explicação para a inexplicável eficiência da matemática? A resposta em forma de pergunta: “Não seria nada além de um feliz acidente ou refletiria alguma intuição profunda na natureza da realidade? Para quem deseja aceitar a possibilidade do sobrenatural, seria isso também uma intuição da mente de Deus? Teriam Einstein, Heisenberg e outros encontrado o divino?”. Em sua obra “God and the Astronomers, o astrofísico Robert Jastrow escreveu este parágrafo:
Neste momento parece que a ciência nunca será capaz de erguer a cortina acerca do mistério da criação. Para o cientista que viveu pela sua fé na força da razão, a história encerra como um sonho ruim. Ele escalou as montanhas da ignorância; vê-se prestes a conquistar o pico mais alto; à medida que se puxa para a rocha final, é saudado por um bando de teólogos que estiveram sentados ali durante séculos. (Jastrow, m 1992, p. 107, citado por Collins, 2007, p. 74)
Numa outra passagem do seu livro Jastrow escreveu:
Agora vemos como a evidência astronômica conduziu a uma visão bíblica sobre a origem do mundo. Há diferença nos detalhes, porém os elementos essenciais e as considerações astronômicas e bíblicas sobre a gênese são as mesmas; a cadeia de eventos conduzindo ao homem iniciou de modo repentino e preciso em um momento definido no tempo, em um brilho de luz e energia. (Jastrow, 1992, p. 14. Citado por Collins, 2007, p. 75)
Collins concordando com as afirmações de Jastrow, acrescenta como conclusão:
Tenho de concordar. O “Big Bang” grita por uma explicação divina. Obriga à concluso de que a natureza teve um princípio definido. Não consigo ver como a natureza pôde ter-se criado. Apenas uma força sobrenatural, fora do tempo e do espaço, poderia tê-la originado. Mas e quanto ao resto da criação? O que faremos com o extenso processo pelo qual nosso planeta, a Terra, veio a existir, 10 bilhões de anos após o Big Bang?” (Collins, 2007, p. 74-75)
O Dr. Collins mostra depois o caminho percorrido pela ciência e os cientistas para concluir que o Big Bang vem a ser o começo do universo. E como foram os primeiros momentos da formação do universo assim como o conhecemos. Imediatamente após a “grande explosão” matéria e anti- matéria foram geradas em proporções quase iguais. Em frações de milionésimo de segundo o resfriamento foi suficiente para que os “quark” e “antiquark” fossem gerados. O encontro dos quarks e antiquarks resultou na sua destruição, com a liberação de um fóton de energia. Acontece que a simetria entre a matéria e ant-imatéria não era perfeita. Em cada bilhão de pares de quarks e antiquarks, havia um quark a mais. Essa aparentemente insignificante fração, lá no começo compõe a massa do universo conhecido. Se não tivesse havido essa assimetria o universo em pouco tempo ter-se-ia esvaído em radiação pura. e, como consequência as estrelas, planetas, plantas, animais e mesmo homens não teriam como existir. Depois do Big Bang a história da evolução do universo dependeu da quantidade total da sua massa e energia e da força da gravidade. Stephen Hawkin observou admirado diante dessa mecânica constante:
Porque o universo iniciou com uma taxa crítica tão próxima da expansão que separa os modelos que voltam a entrar em colapso daqueles que se mantem expandindo eternamente, que, ainda hoje, 10 mil milhões de anos mais tarde, continuam se expandindo próximo à taxa crítica? Se a taxa de expansão um segundo após o Big Bang tivesse sido menor, mesmo em cada parte única de 100 mil milhões de milhões, o universo ter-se-ia destruído outra vez antes mesmo de atingir seu tamanho atual. (Hawking, citado por Collins, 2007, p. 138)
O Dr. Collins continua nas suas reflexões mostrando que, se a taxa de expansão tivesse sido maior para cada fração de um milhão, a formação de planetas e estrelas simplesmente não teria sido possível. Este estado de coisas faz com que “a existência de um universo como o conhecemos repousa no fio de navalha das improbabilidades” (A Linguagem de Deus, p. 80). Igualmente extraordinária é a circunstância em que se formaram os elementos pesados. No caso de a força nuclear que mantem unidos prótons e nêutrons tivesse sido minimamente mais fraca, somente o hidrogênio se teria formado no universo. Se levemente mais forte, todo o hidrogênio ter-se-ia transformado em hélio, em vez dos 25% quando do Big Bang lá no começo. Como consequência as fornalhas de fusão das estrelas e a capacidade de gerar elementos mais pesados jamais teria ocorrido. Ainda segundo Collins, somando à situação que acabamos de caracterizar, a energia nuclear parece estar ajustada apenas o suficiente para a formação de carbono, elemento imprescindível às formas de vida. No caso de essa energia tivesse exercido uma atração muito menor, todo o carbono ter-se-ia convertido em oxigênio. As observações e as respectivas conclusões resumem-se na existência ao todo de ...
quinze constantes físicas cujos valores a atual teoria não consegue predizer. São dadas: simplesmente têm o valor que têm. A lista inclui a velocidade da luz, a potencia das forças nucleares forte e fraca, diversos parâmetros associados ao eletromagnetismo e a força da gravidade. A probabilidade de todas essas constantes terem os valores necessários para resultar num universo estável, capaz de sustentar formas de vida complexas, quase tende ao ínfimo. E, no entanto, elas apresentam exatamente os parâmetros que observamos. em resumo, nosso universo é extremamente improvável.
Neste ponto talvez você diga, com razão, que esse argumento é um tanto cíclico: o universo precisa de parâmetros associados a esse tipo de estabilidade, ou não estaríamos aqui para comentar a questão. Em geral, essa conclusão é chamada de “Princípio Antrópico”: a ideia de que o nosso universo está exclusivamente ajustado para gerar humanos. Esse princípio tem sido uma fonte de muito assombro e especulação desde que foi avaliado em sua totalidade, poucas décadas atrás. (Collins, 2007, p. 81)