A Natureza como Síntese - 39

O  conceito de sistema – sua aplicabilidade global.  As pesquisas empíricas no campo da biologia, empregando os métodos e instrumentos usuais para esses casos, levaram Bertalanffy, numa primeira etapa, a formular a concepção organísmica válida, em primeiro lugar, para os seres vivos. Num segundo momento, isto é, no decorrer da década de 1950 e 1960 passou a validar a ideia central do conceito de “organismo”, a todos os fenômenos e realidades passíveis de análise empírica. Valendo-se de modelos matemáticos, dos resultados obtidos pela observação das estruturas tanto mecânicas quanto orgânicas, dos  conhecimentos disponíveis a partir da observação dos processos que ocorrem nos seres vivos, chegou à conclusão de que, à nível particular e a nível global, de alguma forma, todos são aparentados na medida em que são “Sistemas”. Bertalanffy reuniu as conclusões das suas investigações e reflexões no livro “General System Theory” publicado em 1968, com a tradução em português sob o titulo “Teoria Geral dos Sistemas”, publicado pela Vozes em 1977. Nessa obra o autor procura aplicar o conceito de sistema em todas as situações nas quais interagem processos de natureza e origem diversa. O conceito de sistema como destaca o autor na introdução da Teoria Geral dos Sistemas,

( ... ) invadiu todos os campos  da ciência e penetrou no pensamento popular, na gíria e nos meios de comunicação em massa. O pensamento em termos de sistemas desempenha um papel dominante em uma ampla série de campos, que vão das empresas industriais e dos armamentos até tópicos esotéricos da ciência pura, sendo-lhe dedicadas inumeráveis publicações, conferências, simpósios e cursos. Apareceram nos últimos anos  profissões e empregos desconhecidos até pouco tempo atrás, tendo os nomes de projeto de sistemas, análise de sistemas, engenharia de sistemas e outros. São o verdadeiro núcleo  de um nova tecnologia e tecnocracia. Seus executantes são os  “novos utopistas” do nosso tempo. (Bertalanffy, 2009, p. 17)

A noção de sistema vem a ser um das respostas aos desafios postos pelo avanço e a complexificação da tecnologia. A interação, interdependência e a complementariedade de tecnologias e ações exigidas por exemplo nos mísseis balísticos ou veículos espaciais. Requerem-se tecnologias as mais diversas de natureza mecânica, física, eletrônica, química, etc., ajustadas e calibradas para garantir o êxito de uma missão espacial, o perfeito funcionamento da geração e distribuição da energia elétrica, da qualidade  das telecomunicações e assim por diante. A operação de um sistema ultrapassa a capacidade de um único engenheiro para exigir a cooperação de muitos, especializados nas suas áreas de atuação  e treinados para servir um objetivo pelo qual ele é responsável parcial e solidário. 

As relações entre o homem e a máquina passam a ter importância e entram também em jogo inumeráveis problemas financeiros, econômicos, sociais e políticos. Ainda mais,  o tráfego aéreo ou mesmo o de automóvel já não é mais uma questão de número de  veículos em operação, mas formam sistemas que devem ser planejados ou organizados. (Bertalanffy, 2009, p. 18)

O fato de o progresso em todas dimensões da atividade humana vir acompanhada de uma complexificação crescente carrega em seu bojo a necessidade de reorientar a própria postura mental para dar conta dos desafios que se colocam. No terreno meramente técnico do dia a dia, as especialidades e as competências individuais já não são suficientes para enfrentar os problemas de maior complexidade que se multiplicam e são cada vez mais vitais e decisivos na atual civilização. Em inúmeros casos a excelência,  a eficiência, a competência, tanto dos seres humanos quanto das máquinas que operam, para muito pouco ou nada serve, quando isolada de um contexto maior. Em outras palavras. Só faz sentido a partir do momento em que estiver a serviço de um “Sistema”. Esse é, por assim dizer, o termo mágico que Bertalanffy formulou como ferramenta conceitual para lidar com as tecnologias cada vez mais desafiadoras. Os sistemas dominam hoje em todos os campos e em todos os níveis da atividade humana. São sistemas de transporte terrestre, sistemas de transporte aéreo, sistemas de abastecimento de água, sistemas de fornecimento de energia elétrica, sistemas de saúde, sistemas políticos, sistemas sociais, sistemas educacionais, sistemas religiosos e por aí vai. Pelo fato de permear todos os meandros da atual civilização demonstra a utilidade desse conceito. Pela sua funcionalidade e utilidade universal parece pertinente submetê-lo a uma avaliação mais aprofundada.

O próprio Bertalanffy aponta para um desdobramento de alcance digno de reflexão. O conceito de Sistema com sua origem e plena validade em praticamente todos os campos dominados pela tecnologia, resultou em algo muito mais profundo, mais substantivo e muito mais revolucionário. É sua a observação.

Trata-se de uma transformação nas categorias básicas de pensamento da qual as complexidades da moderna tecnologia são apenas  uma - e possivelmente  não a mais importante – manifestação. De uma maneira ou outra, somos forçados a tratar com complexos, com “totalidades” ou “sistemas” em todos os campos do conhecimento. Isto implica numa fundamental reorientação do pensamento científico. (Bertalanfffy, 209, p. 19-20)

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