Inovação biológica a partir da
pesquisa.
Depois
de nos ocuparmos da Biotecnologia e de seus aspectos positivos e negativos
quando posta em prática nos seres vivos, incluindo o homem; depois de nos
termos centrado na importância da preservação de ecossistemas, ou pelo menos
porções significativas deles, na forma de parques, áreas de proteção ambiental,
biomas ou outros conceitos mais, falta refletir sobre os benefícios e,
principalmente, malefícios dos assim chamados “defensivos” agrícolas. Esses
produtos largamente utilizados para eliminar pragas que diminuem sensivelmente
a produtividade ou a inviabilizam pura e simplesmente, vêm acompanhados de
efeitos colaterais mais negativos do que se suspeita ou quer admitir. Em se
tratando dos pesticidas apontamos os dois que parecem os mais discutíveis.
Entre eles destacamos aquele que se refere ao combate das larvas e espécies de
insetos em geral que invadem as plantações para alimentar-se comprometendo a
produtividade. Acontece que com a sua eliminação em estágio larval e/ou adulto resulta,
de alguma forma num desequilíbrio maior ou menor na harmonia do acontecer na
natureza. Além das assim chamadas pragas todos os demais insetos, formigas,
vermes nematoides, minhocas, ácaros, além de milhares de espécies de micro
organismos têm na vegetação e nos solos
seu habitat. Uma tonelada de terra e húmus abriga dezenas de milhares de
espécies de micro organismos. Num
punhado de terra vivem cerca de 10 bilhões de bactérias pertencentes a 6000
espécies diferentes. A população de ácaros da família Oribatidae praticamente
invisíveis que se movimentam num toco de árvore em decomposição equivale à de
toda Manhattan. As bactérias que convivem com esses ácaros equivalem à
população do estado de Nova York. Todo esse micro e nano mundo passa
despercebido para o homem e pior, é que poucos têm uma noção mínima da
importância desse mundo de seres vivos microscópicos na manutenção do
equilíbrio e da fertilidade dos solos que tornam possível a existência e a
sustentabilidade da macro fauna e flora. Os parques nas cidades, a árvores
plantadas nas calçadas das rua e avenidas, os canteiros de flores e plantas
ornamentais nos jardins públicos, mesmo a vegetação que consegue desenvolver-se
nas frestas dos muros e calçamentos, os vasos com flores nas sacadas, fervilham
de vida. Seu continente é a floreira, o canteiro de fundo quintal, o húmus e o
chão junto às raízes de uma árvore e as poças de água da chuva seus oceanos. (cf.
Wilson, 2008).
Nossa
intenção com esses dados e informações resume-se em dar uma ideia do que
significa quando se fala em biosfera, isto é, a
finíssima e delicadíssima camada de solo que envolve o nosso planeta e
na qual prospera a vida terrestre. Em
termos relativos forma uma fina película que envolve os continentes e ilhas.
Pelas informações que a ciência está em condições de nos oferecer no momento em
nenhum outro planeta, muito menos estrela ou cometa se comprovou existir algo
semelhante à biosfera. Esses fato não exclui a possibilidade de que possa haver
vida fora da terra, portanto, astros com
biosfera. Mas, essa é um desafio a se enfrentado pelos astrofísicos
valendo-se dos sus métodos e instrumentos de pesquisa. No contexto em que
estamos refletindo, isto é, “salvar a vida na terra”, na definição de Wilson, a
preocupação centra-se em conscientizar as pessoas e chamar atenção daqueles que
detêm algum poder sobre a direção em que vai a atual civilização, que a “nossa
casa” encontra-se seriamente danificada e é preciso tomar decisões rápidas e de
longo alcance para consertar os estragos já feitos. Cabe destacar que
A Terra oferece uma bolha
auto regulada que nos sustenta indefinidamente,
sem nenhum raciocínio ou artifício da nossa parte. Esse escudo de proteção é a
biosfera – a totalidade da vida, criadora de todo ar, purificadora de todas as
águas, administradora de todo solo; mas ela é, em si mesma uma frágil membrana
que mal consegue se agarrara à superfície da terra. De sua delicada saúde nós
dependemos para cada momento da nossa vida.
( ... ) nascemos aqui como espécie, somos intimamente adaptados às sua
condições severas – não a todas, apenas aquelas reinantes em alguns regimes
climáticos em certas partes da área terrestre. (Wilson, 208, p. 36)
Mais
acima já lembramos que os pesticidas
aplicados em grande escala e em em superfícies gigantescas como nas monoculturas
do agronegócio diminuem ou, em casos extremos, reduzem indistintamente a um
nível crítico inúmeras espécies de insetos responsáveis pela polinização dos
fanerógamos ou plantas com flores. Neste particular cabe às muitas espécies de
abelhas melíferas um papel fundamental na polinização de pomares de maçãs,
peras, ameixas, laranjeiras, e inúmeras outras espécies de plantas melíferas
rasteiras, arbustivas e árvores de maior porte. Ha algum tempo assisti a um
documentário que mostrava que na China gastam-se fortunas com a polinização manual dos pomares de maçãs,
simplesmente por que as abelhas foram varridas de regiões inteiras pelo excesso
do emprego de pesticidas de todos os tipos e composições químicas nocivas, tanto
aos insetos quanto ao próprio homem. Em termos de agressão à natureza os
herbicidas, os fungicidas e os próprios adubos químicos não perdem dos
pesticidas em restrições. Os danos causados aos insetos principalmente
polinizadores, a fuga das aves, pequenos roedores, batráquios, repteis, deixam
para trás uma paisagem biologicamente depauperada. A todos esses estragos
soma-se mais um, pouco ou nada lembrado, ao se analisarem as inconveniências
que resultam do recurso indiscriminado e exagerado de produtos químicos na
agricultura. Pouco acima fizemos referência à espantosa quantidade e variedade
de espécies de vermes, minhocas, micro e nano organismos que povoam os solos. Sua
tarefa nessa engenhosa síntese que é natureza, consiste em manter o solo
arejado, processar o material orgânico que
resulta do descarte das folhas,
dos vegetais e animais mortos além dos resíduos orgânicos que vão se acumulando
na superfície. Depois de processado todo esse material e incorporado no solo
combinado com o regime das chuvas, o clima mais frio, mais quente ou mais
moderado formam a plataforma sem a qual os ecossistemas no rigoroso sentido do conceito são inviáveis. As áreas afetadas
com o excesso do recurso indiscriminado de produtos químicos, incluindo
fertilizantes caminham para a esterilidade, fenômeno que exige sempre maior
recurso a meios artificiais, com destaque para os químicos para garantir a
produtividade.
Ao
depauperamento dos solos somam-se outros efeitos colaterais que aos poucos vão
sendo identificados e denunciados com crescente irritação das mega empresas que
controlam a produção e a comercialização desse filão de produtos. Alguns são
comprovadamente cancerígenos e sem as devidas precauções na sua aplicação
afetam os pulmões e põe em risco a saúde e a própria vida dos que os manuseiam.
A cada ano que passa o agronegócio baseado em monoculturas que ocupam centenas
de milhares de hectares, avançam sobre novas fronteiras. Na verdade transformam
as terras planas do planeta em desertos verdes nos quais a não há lugar para a diversidade biológica, fundamental para
o equilíbrio edafológico, climático, botânico e zoológico. A visita a uma
paisagem como a descrita enche de entusiasmo o observador comum e, de modo
especial os donos, com a promessa de uma colheita abundante. Visto, porém, do
lado da ecologia, a agressão ao meio ambiente e o ritmo de depauperamento do
nosso planeta, alongam-se diante do observador desertos verdes de milho, soja,
algodão, trigo, florestas de pinus e eucaliptos, avançando até a linha do
horizonte. Falar em biodiversidade nem pensar. A aparência vistosa
impecavelmente alinhada prospera sobre um solo estéril, tornado fértil artificialmente.
Não se escutam pássaros cantando,
abelhas zumbindo, o cri cri dos grilos,
as mosca dançando ao sol, lagartos
tomando sol, lebres saltando, codornas escondendo-se do visitante, e por ai vai. O observador
flagra-se numa paisagem ecologicamente
estéril. Apenas o ronco de
gigantescas máquinas faz trepidar o chão e
mascara o que sobrou da harmonia dos sons da natureza.
É
preciso conceder que, para dar conta das
demandas mundiais de cereais e outras culturas de grande consumo, não há como
não recorrer as técnicas que permitem
a produção na proporção exigida pelo
aumento da população mundial. Sob esse aspecto justificam-se plenamente. Mas, o entusiasmo do
agronegócio vem acompanhado dos “senões” que acabamos de apontar e outros ainda
não identificados. Até que ponto os herbicidas, pesticidas, adubos químicos
somadas à modificação genética e à transgenia além de outras manipulações
contaminam os produtos, interferem na própria natureza genética das respectivas
plantas minando sem alarde a saúde dos
consumidores. Costumam agir sorrateiramente e seus efeitos cancerígenos ou
outras modalidades de agressão à saúde, não costumam ser imediatos. Manifestam-se
depois de anos, a não ser que a intoxicação seja de tal ordem que comprometa o
organismo a curto prazo. Já que esse modelo de produção de alimentos veio para
ficar, a identificação do lado discutível das técnicas que o viabilizam
requerem uma atenção toda especial das
autoridades sanitárias. Acontece que neste nível entramos num campo minado. Os produtos utilizados para tocar o
agronegócio em grande escala concentra-se nas mãos de gigantescas empresas
donas das patentes. Seu poder de fogo costuma ser de tal ordem que impedem o desenvolvimento de tecnologias alternativas com
menor potencial de agressão à natureza. Como costumam ser empresas
multinacionais, mantêm seus próprios laboratórios de pesquisa, estações
experimentais, produção de sementes geneticamente modificadas e/ou
transgênicas. Com o seu gigantismo sufocam os eventuais concorrentes. A prática
mais eficiente de impedir a competição consiste em comprar as patentes dos mais
fracos, ocultar ao grande público os riscos à saúde dos consumidores, impedir
por ex., a comercialização de sementes não manipuladas, e por aí vai. Não é
aqui o lugar para uma análise científica e técnica mais aprofundada sobre o que
há de positivo e negativo para a qualidade de vida nesse complexo modelo de
produção de alimentos em escala planetária. Deixo para uma reflexão mais
exaustiva dos reflexos a médio e longo prazo sobre a saúde humana quando entram
na alimentação direta ou indireta como componentes básicos da ração que
alimenta bovinos de corte, vacas de leite e derivados, suínos, frangos, os ovos
das galinhas de postura, peixes etc., etc. A Encíclica, ao se ocupar com a
crescente necessidade de recorrer cada vez mais à tecnologia, faz a seguinte
reflexão, dando um destaque para o reflexo da oferta de postos de trabalho.
Somos chamados ao trabalho
desde a nossa criação. Não se deve procurar que
progresso tecnológico substitua cada vez mais o trabalho humano:
procedendo assim, a humanidade prejudicar-se-ia
a si mesma. O trabalho é uma necessidade, faz parte do sentido da vida nesta
terra, é caminho de maturação, desenvolvimento humano e realização pessoal.
Neste sentido, ajudar os pobres com dinheiro deve ser sempre um remédio
provisório para enfrentar emergências. O verdadeiro objetivo deveria ser sempre
consentir-lhes uma vida mais digna através do trabalho. Mas a orientação da
economia favoreceu um tipo de progresso tecnológico cuja finalidade é reduzir
os custos de produção com base na diminuição dos postos de trabalho, que são
substituídos por máquinas. É mais um exemplo de como a ação do homem se voltar
contra si mesmo. A diminuição dos postos de trabalho ‘tem também um impacto
negativo no plano econômico com a progressiva corrosão do “capital social”,
isto é daquele conjunto de relações de confiança, de credibilidade, de respeito
das regras indispensável em qualquer convivência civil’. (Bento XVI, Enc.
Caritas in veritate, 209). Em suma, os custos humanos são sempre também custos
econômicos, e as disfunções econômicas acarretam também sempre custos humanos. Renunciar
a investir nas pessoas para se obter maior receita imediata é um péssimo
negócio para a sociedade. (Laudato sil, 128).
Ainda
bem que em torno de 70% da alimentação consumida diariamente é produto da
policultura desenvolvida em propriedades menores, em hortas e pomares de
pequenas e médias dimensões. Também nelas recorre-se à tecnologia para aumentar
e qualificar a produção. Em compensação a
agressão ao meio ambiente é muito menos significativa por uma série de
razões. Destaco algumas. Esse modelo produção costuma acontecer em regiões com
topografia acidentada e as áreas cultiváveis com o auxílio de maquinário leve, estão
rodeadas, pelo menos parcialmente com sobras de mata virgem original somadas ao
avanço da mata secundária. Na vegetação nativa em franca recuperação somada à
proibição da caça, principalmente nos cursos médios e superiores dos rios em
regiões montanhosas, os animais nativos encontram refúgios seguros para se
reproduzirem e alimentarem. Remeto para as considerações feitas mais acima ao
comentar o projeto de valorização do Rio dos Sinos, ampliável sem maiores
modificações nos rios que confluem para o Guaíba. Também nessas áreas menores onde se pratica
policultura orientada para o consumo direto, não faltam aqueles que abusam dos
agrotóxicos. Nos hospitais próximos é comum encontrar agricultores tratando-se
das consequências do uso desses produtos sem as devidas precauções. Nas áreas
cultiváveis de pequeno porte prospera a horticultura responsável pelo
abastecimento de legumes e hortaliças destinada a atender a demanda urbana. É
nesse setor que é possível perceber uma guinada significativa para melhor
quando se fala em produção de alimentos. O número de hortas “orgânicas” que
dispensam por completo qualquer produto químico cresce de ano para ano e o
número de fregueses acompanha esse ritmo. Esse modelo de produção diversificada,
principalmente alimentos saudáveis, vem acompanhado de um outro benefício de
significado importante, comparando-o ao agronegócio monocultor em grande
escala. Induz a criação de postos de trabalho em vez de de reduzi-los ao mínimo
como na agricultura mecanizada. A Encíclica sugere o estímulo à produção
diversificada de alimentos e outros insumos como solução parcial mas
indispensável para reter filhos de agricultores na atividade rural.
Para se conseguir dar
emprego é indispensável promover uma economia que favoreça a diversificação
produtiva e a criatividade empresarial. Por exemplo, há uma grande variedade de
sistemas alimentares de pequena escala que continuam a alimentar a maior parte
da população mundial, utilizando uma porção reduzida de terreno e de água e
produzindo menos resíduos, quer em pequenas parcelas agrícolas e hortas, quer
na caça e recolha de produtos silvestres,, quer na pesca artesanal. (Lauato si,
129)