Em
“A Linguagem de Deus”, Collins descreve
o caminho “tortuoso” até encontrar uma
solução “intelectualmente satisfatória para essa busca da verdade”.
Depois de perambular pela química, pela física e a medicina encontrou o caminho
na “genética médica” que lhe permitiu aliar o amor pela ciência e a matemática
e o desejo de ajudar as pessoas. O convívio com os pacientes nas enfermarias
dos hospital chamou sua atenção sobre o vasto mundo das alegrias e,
principalmente, dos dramas que fazem parte dos quotidiano das pessoas
comuns. Este é o mundo que não aparece
nem conta nas provetas nas lâminas dos
microscópio, nas reações químicas, nos cálculos estatísticos nem nas
leis da física. Aos poucos foi chegando
à conclusão de que “Deus era muito mais atraente do que o ateísmo que até então
tinha adotado”. Aos poucos foi-se convencendo de que não havia nenhuma contradição de fundo entre as verdades científicas e as espirituais. Entrou na
“American Scientific Affiliation, formada por milhares de cientistas dos Estado
Unidos que creem em Deus. Nos seus encontros, reflexões e publicações, saíram
não poucas propostas que fazem sentido, oferecendo saídas inteligentes para
harmonizar a ciência e a fé. Sobre esses
cientistas , Collins concluiu.
Confesso que durante muitos
anos não prestei muita atenção ao potencial para conflitos entre a Ciência e a fé – não parecia tão importante assim.
Não havia muito a descobrir, na pesquisa cientifica, sobre
a genética humana e havia bastante a descobrir
sobre natureza de Deus lendo e discutido
sobre a natureza de Deus e discutindo a fé
com outros que acreditavam nele. A necessidade de encontrar a harmonia
de minhas visões do mundo veio. definitivamente, com o estudo do genoma –
nosso e o de diversos organismos do
planeta - e começou a decolar,
oferecendo-me um ponto de vista incrivelmente rico e detalhado de como ocorreu
a evolução por modificações a partir de
um ancestral comum. Aquilo para mim, em vez de algo não resolvido era uma
evidência distinta do parentesco entre todos os seres vivos, um momento de admiração. Percebi que se
tratava de um plano em detalhes do mesmo Todo-Poderoso que trouxe o universo e
estabeleceu seus parâmetros físicos de forma precisa, a fim de permitir criação de estrelas, planetas, elementos
pesados e a própria vida. Sem saber seu nome na ocasião, firmei-me,
confortavelmente, numa síntese que em geral é denominada “evolução
teísta”, um a posição que acho
muitíssima satisfatória até hoje (Collins, 2007, p 204-205).
A
proposta de Francis Collins, o cientista que decifrou as últimas vírgulas da “linguagem do genoma” e
com isso mergulhou nos arcanos mais misteriosos da vida, sinaliza que a
natureza, a partir das muitas perspectivas que podem ser observadas e
entendidas, é uma síntese harmoniosa, moldada pelos resultados pelas Ciências Naturais
e as Ciências do Espírito, as Ciências Humanas, as Letras e as Artes. Explica
em seguida o que se entende por “evolução teísta”. Observa que nas grandes
bibliotecas o espaço reservado para o Darwinismo costuma ocupar estantes e mais estantes, assim como o
Criacionismo e o Design Inteligente. O conceito de “Evolução Teísta” é pouco
mencionado mesmo entre os cientistas que creem em Deus. Chama a atenção que
entre os biólogos sérios e que acreditam em Deus, entretanto, a Evolução Teísta conta com defensores
renomados em suas respectivas especialidades. Cita, entre outros; Asa Gray, o
mais importante defensor do darwinismo nos Estados Unidos e Theodosius Dobzhansky, talvez o mais
importante geneticista do século XX e
convicto defensor do pensamento evolucionista. Além desses e outros cientistas,
a ideia da Evolução Teísta encontra-se na base da doutrina do Hinduismo, do
Islamismo, do Sionismo e do
Cristianismo. É aceita por João Paulo II e seu antecessor Pio XII nas duas
Encíclicas, “Divino Aflante Spiritu” e “Humani Generis”, já nossas conhecidas.
Pode ser identificado também no pensamento de Maimonides, judeu do século XII e Santo Agostinho
adotaria sem maiores restrições a Evolução Teísta se dispusesse das conquistas
de que hoje dispomos. Sutilezas e variações à parte, a Evolução Teísta
fundamenta-se nos seguintes pressupostos, sintetizados por Collins.
Primeiro. O universo surgiu
do nada, há aproximadamente 14 bilhões
de anos. Segundo. Apesar das probabilidades incomensuráveis, as propriedades do
universo parecem ter sido ajustadas para a criação da vida. Terceiro. Embora
o mecanismo exato da origem a vida na
terra permaneça desconhecido, uma vez que a vida que a via surgiu, o processo
de evolução e de seleção permitiu o desenvolvimento da diversidade biológica e
da complexidade durante espaços de tempo muito vastos. Quarto. Tão logo a
evolução seguiu seu rumo não foi necessária nenhuma intervenção sobrenatural.
Quinto. Os humanos fazem parte desse processo, partilhando um ancestral comum
com os grandes símios. Sexto. Entretanto, os humanos são exclusivos em
características que desafiam a explicação evolucionista e indicam nossa
natureza espiritual isso inclui a existência da Lei Moral (o conhecimento do
certo e do errado) e a busca de Deus que caracterizam todas as culturas
humanas. Collins, 2007, p. 206).
Collins, entrando mais a fundo na questão chama a atenção que a
proposta “teísta” oferece uma “síntese perfeitamente aceitável que satisfaz
intelectualmente e tem consistência lógica. Deus não é limitado pelo espaço e o
tempo e, nessa condição, criou o universo e muniu-o com as leis naturais que o
regem:
Para povoar este universo
antes estéril com criaturas vivas, Deus escolheu o mecanismo distinto da
evolução para criar micróbios, plantas e animais de todos os tipos. O mais
extraordinário é que Ele escolheu, propositadamente, o mesmo mecanismo para
originar criaturas especiais que teriam inteligência, conhecimento do certo e
errado, livre-arbítrio e desejo de afinidade com Ele. Deus também sabia que
esses seres, ao fim, optariam por
desobedecer a Lei Moral. (Collins, 2007, p. 207).
Uma
outra reflexão de não pouco significado e importância prática encontra-se
implícita quando o Papa fala da relação
de Cristo com os mais diversos estímulos que a natureza oferece. Para tanto
cita o São João (4,35): “Levantai os
olhos e vede os campos doirados para a ceifa”. Ou quando lembra o evangelho segundo São Mateus (Mt 13, 31-32):
“O Reino dos Céus é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no campo. É a menor de todas
as sementes; mas, depois de crescer, torna-se a maior planta do horto e
transforma-se numa árvore”. Poderíamos acrescentar muitas outras passagens dos
Evangelhos que demonstram a preferência de Cristo com o contato direto com a
natureza nas suas andanças evangelizadoras pela Terra Santa. Não foi no templo
nem nas sinagogas que anunciou a Boa nova, mas ao ar livre como foi o célebre
“Sermão da Montanha” para anunciar as bem aventuranças. A preparação dos
discípulos para futura missão evangelizadora tinha como cenário as caminhadas
pelas estradas, caminhos e trilhas da Palestina, sempre em íntimo contato e a
presença da paisagem natural com sua vegetação, seus rebanhos e, principalmente
os homens, mulheres e crianças. Inspirado nessas realidades as utilizava como
metáforas pedagógicas para fazer entender o significado dos seus ensinamentos.
Ensinou, na prática ao que já chamamos várias a atenção. A natureza é o mais
autêntico código com que Deus se revela
aos homens e com eles se comunica. Mas para decifrá-lo pressupõe-se um mínimo
de contato com os seus caracteres oferecidos em inúmeras formas, cores, sons,
perfumes, sabores e tatos, que natureza oferece em incontáveis modalidades. E é
nesse nível que a atual civilização vive seu impasse crucial nas relações com a
sua “casa”, com a sua “mãe e pátria”. Confinadas em grande parte
em centros urbanos, metropolitanos e megametropolitanos, as pessoas
estão sendo impedidas de usufruir o
contato diuturno e direto para com as realidades naturais. A esse fenômeno já nos referimos mais acima. Mas, não é
redundante relembrar que com isso o coração está sendo impedido de receber os
estímulos que acionam o inexaurível potencial de emoções, sensações,
manifestações de afeto, solidariedade e amor. Enfim dar vasão à plenitude do
que há de mais humano no homem entendido
por “Menschlichkeit”, conceito de difícil tradução literal. Mas, essa
problemática já foi analisada em outro momento das nossas reflexões. De
qualquer modo creio que não está fora de propósito arriscar uma interpretação
sobre a discussão que está rendendo tanta polêmica nos meios de comunicação e
municiando as conversas informais das
pessoas de todos os níveis de formação.
Refiro-me às manifestações e obras de “arte urbana” em todas suas modalidades.
Trava-se uma verdadeira guerra entre
seus defensores e seus críticos. Os
critério para catalogar esse tipo de manifestações como peças artísticas são
obviamente muito relativos como, aliás, em tudo no modelo da civilização
pós-moderna. Concedamos que a pichação de muros e paredes, a exibição da nudez
em praça pública diante de crianças e manifestações que beiram o grotesco e o
ofensivo, sejam demonstrações de arte. Mas, falta-lhes o elemento fundamental
que sublima as obras executadas pelo homem e desenhadas e esculpidas pela
natureza: “não irradiam o Belo”. E não
irradiando de alguma forma o Belo, são no mínimo discutíveis como manifestações
de arte porque a essência de uma obra de arte consiste em por em ebulição as
reações que tocam o que há de mais humano no homem: a capacidade de transcender
a materialidade e a racionalidade e simplesmente admirar, saborear, degustar e
deixar-se levar pelo coração e não pelo cérebro.