Motivos para inquietação
Depois
de lembrar as bases científicas, filosóficas, teológicas e estratégicas para ações em favor do meio ambiente, o Papa
aponta para as áreas de maior relevância e risco a serem privilegiados.
Poluição e mudanças
climáticas.
A
poluição sob todas as suas formas é o maior vilão da degradação ambiental. A Encíclica começa destacando os poluentes
atmosféricos. Eles afetam compulsoriamente a todos pelo simples fato de a vida
depender da respiração. Os danos causados pela inspiração do ar poluído vem a
ser o maior vilão dos males que afetam os pulmões e como tal reduzem
drasticamente a qualidade de vida e terminam por comprometê-la. Quem mais se ressente
de uma atmosfera empestada são as populações menos favorecidas, Muitas se
aglomeram próximas a locais de fontes produtoras
de poluentes atmosféricos. Dia e noite inspiram a fumaça de incêndios em
depósitos de lixo, queimadas da vegetação seca e outros mais. Especialmente
nocivos são as emissões de gases tóxicos, com destaque para o gás carbônico,
liberado na atmosfera por milhões de veículos que entopem as ruas das cidades e
congestionam as estradas. Em casos extremos, que se tornam cada vez mais
frequentes, a população obriga-se a usar máscaras para não comprometer de vez
os pulmões e a qualidade de vida. Quando chega a esse ponto ninguém de sã razão
ousa ficar indiferente. Uma intervenção radical no modelo de produção faz-se então urgente. Acontece que uma decisão
desse porte pressupõe uma mudança também não menos profunda na mentalidade
dos responsáveis pela formulação e
execução das políticas econômicas, industriais e do agronegócio. Mas, esse
assunto já foi objeto de uma reflexão mais acima. A Encíclica está cheia da
razão quando lembra que a “exposição aos poluentes atmosféricos produz uma
vasta gama de efeitos sobre a saúde, particularmente dos mais pobres e provoca
milhões de mortes prematuras”. (Laudto se, 20) Lembramos ainda que os poluentes
atmosféricos, além de afetarem diretamente a saúde das pessoas, são vistos como
os grandes vilões do aquecimento global.
Uma
outra categoria de poluentes são aqueles que afetam a saúde e o equilíbrio dos
solos. Fazem parte deles os resíduos industriais, quantidades gigantescas de lama tóxica sub produto da mineração. O
rompimento da barragem de lama em Mariana, Minas Gerais é uma amostra do que
acontece quando não se tomam a devidas precauções. Mais de 100 quilômetros do
leito e das margens do Rio Doce estão mortos. Para recuperar a água
contaminada, o solo do leito do rio e margens e os ecossistemas do rio serão
necessárias décadas, sem contar aquelas espécies irremediavelmente perdidas.
Esses tipo de agressão somada ao uso generalizado de agrotóxicos, inseticidas,
pesticidas, herbicidas, fertilizantes químicos, fungicidas e outros do gênero,
agridem severamente a micro e nano fauna
e flora dos solos e a exterminam parcialmente
Poucos tem uma noção mais ou menos clara da natureza, composição e fina
calibragem dos ecossistemas que dão vida e fertilidade para os solos. O chão em
que pisamos, aparentemente inerte, fervilha com um número assombroso de
espécies de microrganismos. Esse micro e nano mudo pouco ou nada conta quando se avaliam questões
ambientais e se propõem estratégias e
ações concretas de manejo.
Além
de ignoradas essas formas de vida que fazem do solo um gigantesco e complexo
ecossistema, os cientistas não identificaram até o momento nem 10% delas. São
de pasmar os números registrados por Edward Wilson no seu livro. Custaria acreditar se não partissem de um
especialista da sua envergadura. O
panorama por ele desenhado é resumidamente
esse. O número total de espécies vivas, plantas, animais e micro organismos situa-se entre 1,5
e 1,8 milhões. A estimativa total conforme a “Avaliação da biodiversidade
global” de 1995, oscila entre 3,6 a 112 milhões de espécies. O próprio
conhecimento das categorias de animais e plantas superiores deixa muito a
desejar. A situação complica-se com os peixes. A precariedade no conhecimento
dessa categoria fica clara com a distância entre a avaliação mínima de 15.000
e a máxima de 40.000 espécies.
O
desafio para a identificação e classificação das espécies vivas aumenta na
medida em que se desce ao nível dos microrganismos. Conforme Wilson “as
bactérias e os micróbios semelhantes a bactérias, chamados “archea” são a
matéria obscura do universo vivo da terra”. (Wilson, 2008, p. 135). Ainda,
pelos dados registrados pelo autor, em 2.002 o número de espécies já
catalogadas chegava a 6.288. Tomando como base que em cada grama de solo fértil proliferam 10 bilhões dessas nano
criaturas, conclui-se que o que já foi
identificado é uma parcela mínima desse universo. Estimativas feitas por
especialistas, falam em 4 milhões de espécies que podem ser encontradas numa
tonelada de solo fértil. A respeito disso Wilson observa.
Pelo menos 700 espécies
vivem e se multiplicam como simbiontes na boca dos ser humano. Estão adaptados à vida nesse habitat, nas vastas (para as
bactérias) planícies e cânions dos
nossos dentes e da nossa língua, onde se acredita que contribuam para a nossa
saúde oral ao eliminarem bactérias patogênicas. Pode parecer estranho pensar
que o ser humano está em conluio com esses micro organismos, mas a verdade
vista de outra maneira é ainda mais estranha; cada pessoa abriga mais células
bacterianas em seu corpo do que células humanas. Se a classificação zoológica
se baseasse na preponderância de certas células o ser humano seria classificado
como um ecossistema bacteriano. (Wilson, 2.008, p. 136).
E
para completar o mapa biogeográfico das bactérias não é preciso ir longe. Basta
vasculhar alguns metros quadrados do chão debaixo dos nossos pés, num parque,
numa floresta virgem ou num campo natural. O manto de solo de
aproximadamente 3 quilômetros de
espessura abriga um fantástico número de espécies de micro organismos. Os cientistas
levarão séculos para identifica-los nos seu conjunto, se é que essa façanha
pode ser levada a bom termo num futuro remoto. A quantidade, a variedade e a
complexidade desse nano universo vivo, que faz com que o chão em que pisamos
seja um ecossistema gigantesco, intrincado e de alta resolução. Somando às
singularidades apontadas, falta chamar a atenção ao fato de que a biomassa
total que prolifera nos solos e subsolos, supera em volume toda a biomassa
encontrável na superfície. “Se por algum motivo a superfície terrestre fosse
queimada até torrar, a vida que há por debaixo dela provavelmente subsistiria.
Então, quem sabe, daqui a um bilhão anos,
talvez, dali poderiam evoluir novas formas de vida capazes de repovoar a superfície”. (Wilson, 2008, p. 136).
(Para mais detalhes a respeito recomenda-se especialmente o cap. 13 de (“A
Criação – como salvar a vida na terra)”.