Reflexões sugeridas pela Encíclica Laudato si - 16 -

Motivos para inquietação
Depois de lembrar as bases científicas, filosóficas, teológicas e estratégicas  para ações em favor do meio ambiente, o Papa aponta para as áreas de maior relevância e risco a serem privilegiados.

Poluição e mudanças climáticas.
A poluição sob todas as suas formas é o maior vilão da degradação ambiental.  A Encíclica começa destacando os poluentes atmosféricos. Eles afetam compulsoriamente a todos pelo simples fato de a vida depender da respiração. Os danos causados pela inspiração do ar poluído vem a ser o maior vilão dos males que afetam os pulmões e como tal reduzem drasticamente a qualidade de vida e terminam por comprometê-la. Quem mais se ressente de uma atmosfera empestada são as populações menos favorecidas, Muitas se aglomeram próximas a locais  de fontes produtoras de poluentes atmosféricos. Dia e noite inspiram a fumaça de incêndios em depósitos de lixo, queimadas da vegetação seca e outros mais. Especialmente nocivos são as emissões de gases tóxicos, com destaque para o gás carbônico, liberado na atmosfera por milhões de veículos que entopem as ruas das cidades e congestionam as estradas. Em casos extremos, que se tornam cada vez mais frequentes, a população obriga-se a usar máscaras para não comprometer de vez os pulmões e a qualidade de vida. Quando chega a esse ponto ninguém de sã razão ousa ficar indiferente. Uma intervenção radical no modelo de produção  faz-se então urgente. Acontece que uma decisão desse porte pressupõe uma mudança também não menos profunda na mentalidade dos  responsáveis pela formulação e execução das políticas econômicas, industriais e do agronegócio. Mas, esse assunto já foi objeto de uma reflexão mais acima. A Encíclica está cheia da razão quando lembra que a “exposição aos poluentes atmosféricos produz uma vasta gama de efeitos sobre a saúde, particularmente dos mais pobres e provoca milhões de mortes prematuras”. (Laudto se, 20) Lembramos ainda que os poluentes atmosféricos, além de afetarem diretamente a saúde das pessoas, são vistos como os grandes vilões do aquecimento global.

Uma outra categoria de poluentes são aqueles que afetam a saúde e o equilíbrio dos solos. Fazem parte deles os resíduos industriais, quantidades gigantescas  de lama tóxica sub produto da mineração. O rompimento da barragem de lama em Mariana, Minas Gerais é uma amostra do que acontece quando não se tomam a devidas precauções. Mais de 100 quilômetros do leito e das margens do Rio Doce estão mortos. Para recuperar a água contaminada, o solo do leito do rio e margens e os ecossistemas do rio serão necessárias décadas, sem contar aquelas espécies irremediavelmente perdidas. Esses tipo de agressão somada ao uso generalizado de agrotóxicos, inseticidas, pesticidas, herbicidas, fertilizantes químicos, fungicidas e outros do gênero, agridem severamente  a micro e nano fauna e flora dos solos e a exterminam parcialmente  Poucos tem uma noção mais ou menos clara da natureza, composição e fina calibragem dos ecossistemas que dão vida e fertilidade para os solos. O chão em que pisamos, aparentemente inerte, fervilha com um número assombroso de espécies de microrganismos. Esse micro e nano mudo  pouco ou nada conta quando se avaliam questões ambientais  e se propõem estratégias e ações concretas de manejo.

Além de ignoradas essas formas de vida que fazem do solo um gigantesco e complexo ecossistema, os cientistas não identificaram até o momento nem 10% delas. São de pasmar os números registrados por Edward Wilson no seu livro. Custaria  acreditar se não partissem de um especialista  da sua envergadura. O panorama por ele desenhado é resumidamente  esse. O número total de espécies vivas, plantas,  animais e micro organismos situa-se entre 1,5 e 1,8 milhões. A estimativa total conforme a “Avaliação da biodiversidade global” de 1995, oscila entre 3,6 a 112 milhões de espécies. O próprio conhecimento das categorias de animais e plantas superiores deixa muito a desejar. A situação complica-se com os peixes. A precariedade no conhecimento dessa categoria fica clara com a distância entre a avaliação mínima de 15.000 e  a máxima de 40.000 espécies.

O desafio para a identificação e classificação das espécies vivas aumenta na medida em que se desce ao nível dos microrganismos. Conforme Wilson “as bactérias e os micróbios semelhantes a bactérias, chamados “archea” são a matéria obscura do universo vivo da terra”. (Wilson, 2008, p. 135). Ainda, pelos dados registrados pelo autor, em 2.002 o número de espécies já catalogadas chegava a 6.288. Tomando como base que em cada grama de  solo fértil proliferam 10 bilhões dessas nano criaturas, conclui-se que o  que já foi identificado é uma parcela mínima desse universo. Estimativas feitas por especialistas, falam em 4 milhões de espécies que podem ser encontradas numa tonelada de solo fértil. A respeito disso Wilson observa.

Pelo menos 700 espécies vivem e se multiplicam como simbiontes na boca dos ser humano. Estão adaptados  à vida nesse habitat, nas vastas (para as bactérias) planícies e cânions  dos nossos dentes e da nossa língua, onde se acredita que contribuam para a nossa saúde oral ao eliminarem bactérias patogênicas. Pode parecer estranho pensar que o ser humano está em conluio com esses micro organismos, mas a verdade vista de outra maneira é ainda mais estranha; cada pessoa abriga mais células bacterianas em seu corpo do que células humanas. Se a classificação zoológica se baseasse na preponderância de certas células o ser humano seria classificado como um ecossistema bacteriano. (Wilson, 2.008, p. 136).

E para completar o mapa biogeográfico das bactérias não é preciso ir longe. Basta vasculhar alguns metros quadrados do chão debaixo dos nossos pés, num parque, numa floresta virgem ou num campo natural. O manto de solo de aproximadamente  3 quilômetros de espessura abriga um fantástico número de espécies de micro organismos. Os cientistas levarão séculos para identifica-los nos seu conjunto, se é que essa façanha pode ser levada a bom termo num futuro remoto. A quantidade, a variedade e a complexidade desse nano universo vivo, que faz com que o chão em que pisamos seja um ecossistema gigantesco, intrincado e de alta resolução. Somando às singularidades apontadas, falta chamar a atenção ao fato de que a biomassa total que prolifera nos solos e subsolos, supera em volume toda a biomassa encontrável na superfície. “Se por algum motivo a superfície terrestre fosse queimada até torrar, a vida que há por debaixo dela provavelmente subsistiria. Então, quem sabe, daqui a um bilhão anos,  talvez, dali poderiam evoluir novas formas de vida capazes de  repovoar a superfície”. (Wilson, 2008, p. 136). (Para mais detalhes a respeito recomenda-se especialmente o cap. 13 de (“A Criação – como salvar a vida na terra)”.


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