A nova linguagem interdisciplinar
A
partir do momento em que as Ciência Naturais, as Ciências do Espírito, as
Ciências Humanas as Letras e Artes celebram um pacto para, solidários e
mutuamente comprometidos, entender cada vez melhor o nosso maravilhoso mundo e
seus inquilinos com destaque para o homem, um novo vocabulário conceitual começou a circular nos
meios acadêmicos empenhados em produzir um conhecimento fundado numa
perspectiva interdisciplinar. É fundamental que os especialistas dos mais
variados campos, intercambiem
experiências, se sirvam de conceitos a que as partes atribuam o mesmo sentido.
Em outras palavras, é indispensável que se fale a mesma língua nesse esforço
que visa o entendimento entre os muitos segmentos do saber, um discurso
honesto, desarmado, sincero. Vão nesse sentido, por ex., os dois conceitos,
“Weldbild e Weldauffassung – o retrato, a imagem do mundo e o significado do
mundo ou a cosmovisão” formulados por Erich Wassmann. Cabe ao cientista
desenhar o retrato tangível, visível e material, com os dados fornecidos pelos métodos e técnicas de investigação empírica,
o “Weldbild”. Ao filósofo e ou teólogo compete identificar o “donde, o como e o
porque” do retrato do mundo desenhado pelo cientista. Em outras palavras, o
sentido que lhe confere razão de ser, isto é, os significados que lhe garantem
vida, sentido e identidade, para a
compreensão do mundo, ou a cosmovisão. Se a cosmovisão, a compreensão do
universo e da natureza, a “Weldauffassung”, não for legitimada pelos dados que
a ciência oferece, ela será “cega”. O retrato do mundo, o “Weldbild” é “manco”
se não passar de um volume maior ou menor de informações aleatórias detectadas
pela ciência.
Um
outro conceito que vem fazendo parte cada vez mais frequente da linguagem dos
cientistas que se ocupam com a natureza como um todo, a natureza como síntese
e, de modo especial preocupados com a saúde do planeta, é a Ética. Apelam para
a Ética como como argumento mais convincente. Note-se que o conceito na sua
origem é próprio do linguajar da Filosofia e a Moral,
sua versão religiosa, da Teologia. Como outros conceitos, o Darwinismo, por ex.,
a ética foi incorporada no mundo
conceitual de outros campos do conhecimento. Conquistou um lugar obrigatório nas
mais diversas áreas dos conhecimentos aplicados, com a finalidade de
disciplinar o comportamento dos respectivos profissionais. Fala-se muito em
ética médica, ética no exercício da advocacia, ética na atividade econômica,
ética social e por aí vai.
Com
cada vez maior frequência e mais insistência cientistas de renome como Edward
Wilson, Francis Collins, Dobzhansky, para ficar com três cuja concepção da
natureza foram analisados mais acima, terminam em colocar a ética, a capacidade
de o homem distinguir entre o bem e o mal, o certo e o errado como terreno
comum para a diálogo interdisciplinar. É óbvio que isso não acontece quando se
debatem questões exclusivamente científicas e especializadas. Num encontro entre
botânicos ou zoólogos sistematas, geólogos à procura de minérios ou campos de
petróleo, entre outros, não é o lugar para falar em Ética.
Mas é na compreensão e no convívio do homem
com a natureza que, cada dia que passa, essa relação ganha mais
importância. Toda uma área de conhecimento a “Bioética”, vem se tornando mais
popular e os que a ela se dedicam gozam cada vez de mais respeito e suas
opiniões em questões ambientais são levadas em conta com muita seriedade. E é
no plano das preocupações ecológicas que a Ética, mais especificamente o
conceito de Bioética, assumiu um papel chave, como plataforma comum, sobre a qual cientistas, filósofos,
geógrafos, economistas, juristas, ecologistas sérios, têm condições de se
entender, falando a mesma linguagem. A razão que subjaz aos esforços de qualquer
profissional sério e ativista digno deste nome, consiste em tratar “a natureza
como um bem comum”. Relembramos a máxima que colocamos como motivação para escrever essas reflexões: “A natureza
vive e sobrevive sem o homem, mas o homem não vive nem sobrevive sem a
natureza”. Os motivos, os dados e argumentos que validam essa afirmação já
foram exaustivamente confirmados pelas autoridades científicas que forneceram
as informações que nortearam as reflexões que registramos até aqui. Cabe
repetir mais uma vez chamar a atenção para o significado mais profundo que se
esconde atrás da ideia chave que nos vem orientando até aqui. A espécie humana
está existencialmente inserida na natureza. Sobrevive nela e dela em todos os
níveis da sua identidade. Portanto, a natureza representa um bem comum e como
tal, todo e qualquer ser humano tem o direito de usufruir dos seus benefícios.
Por isso mesmo, o comprometimento com o equilíbrio da natureza se constitui
num dever ético, que deve ser sobreposto
a qualquer outro interesse, quando a questão ambiental entra em discussão.
“Sistema”
é mais um conceito que faz parte do
dicionário interdisciplinar quando se procura entender a natureza na sua globalidade. Foi
popularizado por Ludwig von Bertalanfy, e amplamente e consistentemente formulado
na sua obra clássica: “Teoria Geral dos Sistemas” (trad. port. Vozes, 2008). Salvo
melhor juízo trata-se da formulação de uma síntese global que contempla todos
os níveis e áreas do conhecimento, a começar pelas Ciências Naturais, passando
pelas Humanas, as Letras, Artes e Filosofia. Como tal oferece, senão o melhor,
certamente uma das fundamentações teóricas mais consistentes, para as
iniciativas sérias de qualquer natureza e procedência, em favor da saúde do
nosso planeta. Se no parágrafo anterior argumentamos com o sentido ético da
natureza, como justificativa para o interesse pela saúde do meio ambiente, a
Teoria Geral dos Sistemas, contribui com a fundamentação científica e até
técnica para justificar o mesmo propósito. O conceito de sistema segundo
Bertalanffy não resume a natureza a uma máquina, um relógio que funciona
perfeita e automaticamente. A montagem do sistema como o defendido pelo autor
citado, tem a sua razão de ser amarrada a uma teleologia, ou se quisermos,
destinado a produzir resultados que não se resumem na soma do desempenho das
partes e funções de cada peça. Há uma tarefa a cumprir um objetivo a alcançar.
Esse fato implica de um lado que a participação de cada peça, cada componente
do sistema tem razão de ser em função em relação ao que lhe compete contribuir
para o bom funcionamento do todo em vista do fim para que existe. Do outro lado
a contribuição de cada um é indispensável na proporção e no nível que lhe compete no sistema como um todo. A
lógica da conclusão não deixa dúvidas.
por mais insignificante que pode parecer um componente ele cumpre uma
tarefa indispensável. No caso de não comprometer o funcionamento essencial
diminui de alguma forma a sua qualidade e os seus resultados.
Um
bom exemplo é um organismo vivo superior como o do homem. Na base da sua
estrutural e funcional estão as células. Organizadas em tecidos, órgãos,
aparelhos e sistemas formam o organismo. A destruição de um número menor de
células por alguma lesão, obviamente não ameaça a viabilidade do todo, mas de alguma forma,
mesmo imperceptível, afeta o todo. O avanço das pesquisas científicas somadas às conquistas da medicina comprovam que a destruição de certos órgãos
não compromete organismo como um todo, mas reduz a qualidade de vida da pessoa
e limita de igual forma seu desempenho na razão direta da função afetada. A
solução para órgãos como o coração, o fígado,
pulmões, rins, etc., quando
comprometidos no seu funcionamento,
soluciona-se até certo ponto com o transplante. Mesmo nesses casos o
risco da rejeição prova que a natureza calibrou as células, órgãos,
sistemas e aparelhos, em função de cada indivíduo.
Da
mesma forma como um organismo vivo funciona como um sistema, ressalvadas as
peculiaridades, a natureza é um “organismo” à sua maneira, um mega sistema. O
conceito compreende, em última análise, o universo e a natureza com todos os
seres vivos que integram a biosfera. É nessa percepção da Natureza que se encontra o argumento que justifica as ações
de qualquer natureza a serviço de qualquer causa. Mas vamos restringir-nos à
Natureza como sistema e a morada imediata de todas as espécies vivas conhecidas
e, ao mesmo tempo, o cenário na qual evoluíram, prosperaram ou se extinguiram.
Perguntamos: o que afinal é a Natureza?.
Edward Wilson assim a define: “A Natureza é
aquela parte do ambiente original e de suas formas de vida que permanece
depois do impacto humano, Natureza é tudo aquilo que no planeta Terra não
necessita de nós e pode existir por si”. (Wilson, 2006, p. 23)
Wilson
pondera que para muitos essa definição não tem valor prático, porque não há
recanto no planeta que não sofreu com a presença do homem. Todos os espaços
disponíveis já foram tão humanizados e, por isso mesmo, descaracterizados ao
ponte de se duvidar da existência de ecossistemas que conservam a sua identidade original.
Subsistem poucos quilômetros quadrados que nunca foram pisados pelo homem.
Somos obrigados a dar parcialmente razão a essa visão pessimista. Poluentes
industriais de tudo que é procedência e natureza, sobrecarregam anualmente a
atmosfera e carregadas pelas correntes aéreas e marítima até além dos círculos
polares, ameaçando inclusive o equilíbrio das calotas perenemente congeladas
dos polos. O efeito estufa agravado por
esse processo fazendo subir gradativamente a temperatura média da terra põe em
xeque a vida em espaços cada vez maiores. O autor observa ainda que