Erich
Wassmann -2
Wassmann chama atenção no artigo citado
que explicar a evolução, a transformação da natureza viva, pressupõe a
compreensão dos mecanismos que subjazem ao potencial de adaptação ativa, em
outras palavras o “Anpassungsverwögengen” dos organismos vivos. Lamarck já em
1809 se dera conta dessa necessidade, mas a formulação do seu pensamento não
foi feliz. Mas é a partir do século XX que “o princípio da ação ativa,” - “Prinzip der activen Bewirkung” de Oskar Hertwig foi influenciando numerosos
cientistas, para valer-se deste conceito como instrumento metodológico.
“Chega-se cada vez mais à convicção acertada de que, sem a adaptação ativa,
isto é, sem a capacidade de o organismo reagir teleologicamente aos estímulos
do meio, tanto a evolução filética
quanto a individual, é uma impossibilidade. (St. Der Zeit. Vol 100, 1921, p.
135).
Outro que defendeu com êxito nos círculos
científicos a necessidade de uma teleologia nos processos evolutivos, foi Karl
von Baer. Erich Wassmann formulou em
resumo a sua concepção nos seguintes termos:
“A mesma finalidade de gerar
formas aptas para a vida, é válida também para a evolução filética. Neste particular torna-se tanto mais necessária a interdependência
entre os processes evolutivos e as influências do ambiente externo pois, se
trata da formação de novas modalidades de vida sob a influência de condições
externas alteradas. Portanto, abstraindo de uma adaptação ativa a evolução
filética dos organismos vivos é impensável. A capacidade de os organismos vivos
reagirem finalisticamente às influências do meio externo, isto é, preservando a
vida ou gerando vida, só pode ter a suja explicação mais profunda no potencial evolutivo
disponível no próprio organismo. O potencial evolutivo não teria nenhuma
utilidade se não estivesse em sintonia com os diversos fatores ambientais,
exercendo seus estímulos evolutivos sobre o organismo. De outra forma o ser
vivo não teria como “adaptar-se” às
novas condições de vida por meio das
modificações correspondentes à sua evolução. Caso contrário resta-lhe a
extinção. Isto vale tanto para a primeira célula como vale para todos os outros
fenômenos de adaptação presentes na
evolução filética global do mundo
orgânico.” (St. Der Zeit. Vol 100,
1921, p. 135-136)
Desde que Wassmann publicou as
considerações acima há 95 anos, em
essência o foco da questão em nada se modificou. Entretanto as ciências
físicas e naturais fizeram avanços gigantescos.
A física desvendou o micromundo da estrutura da matéria até os seus últimos
componentes. Identificou as leis que regem o átomo e seus componentes. Criou
tecnologias pelas quais seus potenciais energéticos podem ser controlados e
utilizados como poderosas fontes de energia, tanto para fins pacíficos quanto
bélicos. Uma imersão não menos profunda na trama e na própria mecânica dos
processos vitais, levou os cientistas a desenvolverem tecnologias que
desvendaram os segredos da estrutura e do funcionamento do genoma humano e de
outros seres vivos. E, de posse desses
conhecimentos, o desenvolvimento de tecnologias para canalizar os potenciais
dos mesmos para as mais diversas finalidades, é apenas uma questão de tempo. Os
caminhos para a manipulação genética das plantas, animais e do próprio homem,
estão abertos, acompanhados pelos riscos, desvios e benefícios inerentes aos
mesmos. Foram desenvolvidos medicamentos e técnicas de tratamento, capazes de
combater inúmeros males hereditários ou de pré-disposição hereditária, que
afetam a saúde humana ou afetam a qualidade de animais e plantas.
E o que trouxeram realmente de novo essas
conquistas do último século? Em termos de concepção da natureza, de
“Cosmovisão,” de “Weltauffassung”, a rigor nada de fundamentalmente novo.
Aqueles cientistas que apostam todas as fichas na convicção de que o progresso,
o avanço e o aperfeiçoamento dos métodos e das técnicas de investigação,
terminarão desvendando e explicando as últimas incógnitas que envolvem a
natureza e a própria vida, não passam de herdeiros do século XX e XXI, do
mecanicismo monista de Haeckel, Huxley e outros do século XIX.
Um outro segmento de cientistas e, de modo
especial, pesquisadores na linha interdisciplinar, formulam as mesmas perguntas
e colocam as mesmas objeções dos seus colegas de cem anos atrás: Que mecanismos
geraram as primeiras realidades materiais, as energias, os processos e a
matéria prima de que é formado o universo; qual é a causalidade suficiente que
gerou as primeiras formas de vida e as potencializou para se transformarem e
evoluírem para a infinidade de formas e estágios, incluindo o homem, que
povoaram e ainda povoam a terra? Também
neste caso as respostas mais ou menos
cautelosas, mais ou menos diretas, não sofreram modificações substantivas.
Todos concordam em afirmar ou, pelo menos sugerem, que os processos, as leis,
as estruturas e a matéria que compõem o universo, não são a causa suficiente
para produzir efeitos como a vida, a sensibilidade, a inteligência reflexa,
assim como a própria existência da matéria e as leis e processos que a regem.
As respostas a essas questões variam na forma e na insistência de acordo
com a época e a filiação filosófica,
confessional ou teológica, do autor.
Erich Wassmann resumiu sua posição nos
seguintes termos:
“Aqui se oculta uma linha de pensamento eminentemente teleológica. Se
for levada até as suas últimas consequências lógicas, termina necessariamente
no reconhecimento de um Criador pessoal responsável pelas leis da natureza;
pois, as leis da evolução devem ter sido concebidas pelo mesmo legislador, que
outorgou as leis para o mundo ambiente como um todo e as aplicou harmonicamente
às leis da evolução dos seres vivos.
Este legislador só pode ser uma sabedoria supramundana que, como causa prima,
regula e engloba a natureza toda e suas leis. Assim as adaptações orgânicas se
constituem num testemunho vivo, numa
prova da moderna concepção teísta do
mundo.” (Stimmen der Zeit. Vol. 100,
1921, p. 136)
E
num tom que reflete bem a atmosfera de confronto entre o Monismo de
Ernest Hackel, falecido em 1919 e a proposta de cientista cristão que era,
Erich Wassamann concluiu a convicção a respeito da questão.
Há, portanto, um único caminho para livrar-se da confusão que se criou
em torno da Ordem Natural e da Filosofia Natural. É forçoso abandonar a
concepção baseada na suposição de uma união substancial de Deus com a Natureza
e retornar às bases de uma cosmovisão Teísta Cristã. É preciso admitir que a
tudo preside e a tudo permeia uma
sabedoria e um poder criador, única forma de explicar a ordem natural, assim
como a conhecemos hoje. As leis que regem os corpos celestes assim como as
menores partículas da matéria, a relação de interesses entre os seres vivos e a
relação de cada átomo para com os processos vitais dos organismos vivos, formam
uma maravilhosa harmonia do acontecer na Natureza, exigem da mente humana uma
concepção unitária para a compreensão da Natureza. É exatamente essa concepção
unitária que é postulada pelo Monismo moderno, sem obter uma resposta
conclusiva. Não é a unidade substancial das realidades naturais, que na
verdade, são múltiplas, que nos dão a resposta, uma “unidade pela causa
primordial” (Ursächliche Einheit), que se encontra no Plano Criador de um Deus Infinito. Este é o verdadeiro
Monismo da concepção cristã da Natureza. ( ... ) E se a Natureza evoluiu
autonomamente conduzida pelas leis a ela inerentes, como o professa a ciência
moderna, o recurso a um todo poderoso
Criador do Céu e da Terra, impõe-se com tanto mais insistência. Não só as leis
que regem o espetáculo da Cosmogonia, quanto as leis que garantem o bom
andamento dos processos orgânico-evolutivos dos organismos vivos. Os Fatores
Hereditários, os Genes do Mendelismo desempenham o papel de “causa segunda” (causa
secunda) que impulsionam o vir a ser da história filética. A Causa Prima é Deus
com sua Sabedoria e Poder infinitos, que se
concretiza nas mais diversas ramificações das formas de organismos e os
Genes correspondem à ideias divinas feitas realidade em a Natureza viva.(
Stimmen der Zeit. Vol 100. 1921. p. 138)
Como se pode ver Erich Wassmann
empenhou-se seriamente para encontrar e formular uma saída de consenso para as
Ciências Naturais e as Ciências do Espírito. Cientista como foi, suas
sociedades ou colônias de formigas e térmitas convenceram-no de que o
transformismo, a evolução fazia parte ou, quem sabe, era o motor principal que
acionava o acontecer na história da vida. O parasitismo, a simbiose que faz
parte da própria natureza dessas
sociedades animais, só pode ter acontecido ao longo de processo demorado. Padre
jesuíta que foi, comprometido com a ortodoxia, cabia-lhe a obrigação de
encontrar uma saída calcada em bases sólidas, tanto na Ciência quanto na
Filosofia e Teologia. E, parece, que deu um passo significativo nesta direção.
Para ele, tanto as evidências do transformismo, quanto o princípio filosófico
da causalidade suficiente e o consequente pressuposto doutrinário da atuação de
um ente criador na Natureza, eram dados inegociáveis. A sua resposta à questão
acha-se claramente formulada na citação acima.
De um lado a Igreja, melhor setores da
Igreja, empenharam-se em bloquear os
avanços das ideias evolucionistas. Do outro lado muitos cientistas
extrapolaram e avançaram para além do
seu campo específico e especializado, valendo-se dos resultados das suas
pesquisas e observações, para implementar suas investidas contra a Igreja, a
Religião ou qualquer concepção que não coubesse na explicação monista
materialista.