Deitando Raízes #29

Capítulo segundo
A Escola
Logo depois da igreja  a escola (114)   merece a atenção. Pela própria natureza ela faz parte da igreja e da sua evolução, além de que, desde sempre, ter sido criação e colaboradora da igreja. Por essa razão é confessional pela sua própria natureza, porque lhe cabe instruir as crianças na fé dos pais e educá-las conforme os princípios da religião. Em Bom Jardim a escola manteve-se, desde o começo, fiel a esta sua destinação, antes mesmo da presença meritosa do professor Schütz, infelizmente falecido antes do seu jubileu. Por isso essa Crônica, que pretende ser uma coletânea das memórias mais valiosas do passado, vê-se na obrigação de reservar um lugar de honra para a atividade desse professor cheio de méritos.
Antes de Mathias Schütz outros professores atuaram em Bom Jardim, mas o homem a quem nos referimos supera a todos tanto no empenho quanto no tempo de permanência de 50 anos.
O primeiro professor foi o pai de Johann Adam Noschang. Reuniu oito crianças numa cabana, entre elas citamos, ao lado do filho dele próprio, Peter Noll, Magdalena Noll, Dorothea Eckert e Maria Franzen. O segundo professor um certo Rosenthal, um soldado e vadio, que não demorou para afastar-se. A escola teve seu terceiro professor na pessoa de Allgayer. Ela deve muito a ele, apesar de lhe faltar preparo profissional. Ocupemo-nos, por isso, sem mais com Mathias Schütz.


O professor Schütz nasceu no dia 21 de agosto de 1821 em Thelay, comarca de Ottweiler, região de Trier. Depois de concluir a escola elementar, transferiu-se com três companheiros da mesma idade, para a casa do professor  Gross em Tholei, para receber deste uma formação sólida e a introdução na prática da vocação de professor. O professor Gross foi um hábil  professor e um cristão convicto e fiel. Na sua casa reinava ordem e trabalhava-se duro. De manhã  cedo até altas horas da noite davam-se e recebiam-se aulas. O forte do professor era o cálculo mental. Certa ocasião deu 100 tarefas para os candidatos, entre elas uma tão complicada que, no primeiro momento, o próprio mestre não conseguiu resolvê-la. Os quatro candidatos a professor levaram o problema para a cama no sótão. O problema, entretanto, não deixou descanso para o nosso Mathias Schütz. Em vez de dormir continuou trabalhando nele e, de fato, após muito esforço, encontrou a solução. Já que a questão interessava a todos, também o professor, antes mesmo da oração da manhã seguinte, fez a pergunta: Conseguiu solucionar o problema? O professor deus-e por satisfeito. Só não concordou com o método que levara Mathis Schütz  até a solução. Só depois de resolvida a questão pronunciou-se a oração da manhã. Este episódio significou uma grande alteração da ordem usual da casa, na qual nunca se permitia uma exceção. A primeira coisa depois de levantar era a oração. Antes dela não se falava uma única palavra. Os candidatos a professor aprenderam do professor Gross o que mais tarde foi de tanta importância para o professor Mathias Schütz: ensinar bem e cantar com entusiasmo. O professor Gross gozava de grande respeito perante seus superiores e colegas. Os jovens professores eram obrigados a assistir à conferência por ele presidida. O professor era um excelente músico. Tocava violino, piano e órgão. Era um prazer escutá-lo. (115) Interpretava qualquer partitura que lhe caísse nas mãos, fossem notas simples ou de coral. Que um homem destes formasse professores com domínio sobre as notas, não é nenhum milagre.
O pároco e decano Thilmany teve uma grande influência na trajetória de formação do professor Schütz. O exemplo do zeloso sacerdote que administrava conscientemente uma vasta paróquia, despertava nos candidatos o entusiasmo pela vocação de educar e ensinar. Entende-se que a atividade de um tal sacerdote deixasse uma profunda impressão na comunidade. Tholey conservou-se brilhantemente durante anos. Durante o Kulturkampf, durante anos, não contou com nenhum sacerdote, mesmo assim permaneceu piedosa e fiel como antes. Apesar das carências manteve um nível melhor do que outras comunidades, que contaram sempre com um pastor de almas.
A Viagem ao Brasil.
No começo Mathias Schütz  não pensara em emigrar. Certo dia um amigo de juventude Jacob Bard de Porto Alegre, disse-lhe: "Que achas, vamos também para o Brasil, para aí tentar a sorte?" Na ocasião a pergunta não foi séria, mas viria a tornar-se séria. Os dois não viajaram juntos mas ambos terminaram no Brasil.
Schütz e sua primeira esposa partiram de Antuérpia em 1846. O navio que os levou até o Rio de Janeiro chamava-se "Industriell", um bimastro. Foi uma viagem tranqüila, sem tempestades e sem riscos. Os perigos começaram apenas no Rio de Janeiro, onde os imigrantes, cerca de 40, todos alemães, foram obrigados a permanecer. Durante a estadia na capital nasceu a princesa Isabel. Por causa deste acontecimento reinou um grande júbilo na cidade. As casas estavam embandeiradas, troavam os tiros de canhão e os carros andavam o dia inteiro pelas ruas. Os imigrantes, por sua vez, não mostravam disposição tão festiva. Como já acontecera antes e como aconteceria mais vezes no futuro, tentou-se negociar os recém-chegados  com os plantadores de café. Não foram desembarcados mas deixados nos navios para quebrar-lhe o ânimo. Mas a intriga não deu resultado. Sem perder tempo o nosso Schütz dirigiu-se ao cônsul prussiano que, ao que parece, estava mancomunado com a trama. Schütz foi direto ao assunto: "Foi-nos dito na partida: dirijam-se tranqüilos ao cônsul. Ele os ajudará e assistirá em todas as dificuldades. E o que estamos vendo? tentam trair-nos e vender-nos!"
A reclamação deu efeito. As coisas começaram a acontecer. Saiu a ordem que as pessoas fossem  encaminhadas, às custas do governo, para o destino original no Rio Grande do Sul. Mathias Schütz lembra-se desse momento com alegria e emoção e do internúncio que visitou seguidas vezes os imigrantes abrigados no Rio de Janeiro e com eles manteve conversas de uma simpatia extrema. Admoestou-os paternalmente  que se mantivessem fiéis  a nossa fé católica e não contraíssem matrimônios na presença de um pregador protestante. Com a maior das  boas vontades ajudaria  pessoalmente a pagar a viagem.
O falecido conta como finalmente seguiram viagem, partindo do Rio de Janeiro. Nessa viagem, porém, não nos foi possível dispor as coisas de acordo com a nossa vontade, como fora na travessia do oceano. “Naquela nos reuníamos para a oração diária e a ninguém era permitido ficar no tombadilho durante a oração. Agora já não foi tão fácil repetir a prática”.
Desembarcamos em Porto Alegre no dia 21 de setembro de 1846. Por uma dessas felizes coincidências andava-se à procura de um professor em Bom Jardim. (116) Espalhara-se a notícia do desembarque de imigrantes alemães. As sondagens à procura de um professor apontaram para o professor Schütz, que ministrara aulas para as crianças durante a viagem. Um certo comerciante Kerber, que morava na  casa onde hoje reside o senhor Lamb (na ponte do Buraco do Diabo) buscou Schütz em São Leopoldo para contratá-lo como professor para seus filhos. Um carroceiro que morava perto de Herzer, foi encarregado de transportar Schütz. Mas como era costume dos carroceiros da época, parava em tudo que era lugar. Neste meio tempo anoiteceu antes de alcançar Herzer, lá no alto, perto da igreja protestante. Decidiram pernoitar aí mesmo e, foi neste local, que Schütz experimentou a primeira impressão favorável de Bom Jardim. Foi servido na mesa um assado que, com certeza, media um palmo de espessura o qual  foi atacado com coragem.
 A situação escolar em Bom Jardim era a seguinte Os evangélicos tinham como professor o velho Herzer com quem as crianças aprendiam bastante bem. Não era bem o caso do professor católico Allgayer. Não se empenhava muito pela escola, de um lado porque gostava demais da caça e, do outro, porque o salário não o satisfazia. Recebia oito vinténs por criança por mês e nem essa bagatela era pontualmente paga. O novo professor ocupou-se até o final daquele com os filhos de Kerber na sua própria casa.
Em 1847 foi destinada uma cabana para servir de escola no Buraco do Diabo, onde agora mora Peter Kuhn Filho. E que espetáculo! Não havia assoalho de tábuas, apenas chão batido. Tábuas colocadas sobre cepos firmados no chão serviam de mesas. Com 18 crianças, algumas delas ainda vivas,  começaram com alegria e satisfação as atividades. Ente elas conta-se uma Engerof, a mulher do Wüst e uma filha do velho Gehring. Em junho do mesmo ano o número de alunos subira para 40. O salário do professor teve um incremento significativo. Pagavam-se agora 24 vinténs por mês por criança.
O primeiro mês daquele ano foi marcado por um rude golpe. No dia 27 de janeiro faleceu a primeira esposa do professor, depois de lhe ter dado uma filha no dia 14.
Além da cabana mencionada outras casas  serviam de escola nos três primeiros anos. Durante um inverno o professor lecionou perto do arroio no Buraco na Quarenta e Oito. Mais tarde a escola funcionou nas dependências  do velho Lerner lá no alto, onde se usou um bela sala para essa finalidade. Em certa ocasião o Pe. Augustin Lipinski submeteu naquele local as crianças a um exame. Entre outras coisas propôs a solução de contas. Mais tarde observou: "Pareceu-me impossível  levar as crianças na mata virgem a um tal nível na realização de cálculos.
Em 1850 Mathias Schütz que casara de novo comprou uma terra para si e ministrava as aulas na sua residência. Desde então este seria o local da escola, um local belo, retirado, muito apropriado para a atividade de um professor.


Por essa época o Pe. Augsutin Lipinski empenhava-se em conquistar o professor Schütz para a sua paróquia. Trabalhou neste sentido conforme o depoimento do próprio professor Schütz, mas em vão. O povo estava sumamente satisfeito com seu jovem e dinâmico professor, apesar de não utilizar sutilezas com as pessoas. A que ponto foi a afeição ficou claro na manifestação inusitada  atribuida ao velho Kerber: "Se o padre nos tira o professor, quebramos-lhe as pernas." De mais a mais não demorou que Dois Irmãos fosse bem servido. Recebeu o velho Adams, um professor de extremo empenho, atuando aí por anos coberto de grandes bênçãos.

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