Deitando Raízes #25

B. Os Sacerdotes de Bom Jardim.
Os sacerdotes que atuaram em Bom Jardim bem merecem um lugar na Crônica da comunidade católica. No começo, como já foi assinalado, a cura de almas estava a cargo dos párocos de Sant´Ana e mais tarde de São Leopoldo. O Pe. José Ignácio vinha de tempos em tempos de Sant´Ana para   batizar e de quando em vez para rezar uma missa. Era um senhor simpático e pacífico. Na maioria das vezes cabia a Johannes Finger e ao velho Fey buscá-lo Nestas ocasiões os acompanhantes costumavam ser bem servidos. Um episódio especialmente engraçado ficou até o fim na memória do velho Finger. Na mesa fora servido carne, galinha e os pratos nacionais feijão e arroz além de um prato de batatas. O pároco prevenido puxou-o para si e observou sorrindo para os alemães: "Para vocês dois não vai sobrar nada, sirvam-se à vontade do restante." Ficaram satisfeitos e não tiveram nenhum motivo de arrependimento, por deixarem a rara iguaria para o padre. No retorno o pároco observou que os colonos levavam um cavalo com a marca das cavalariças imperiais. Embora soubesse que o animal fora comprado, permitiu-se a brincadeira de achar que o tinham roubado e os interpelou com rispidez: "Vocês são ladrões de cavalos, não continuo um passo na companhia de vocês." Os alemães fizeram de tudo para provar-lhe que tinham adquirido honestamente o animal, mas ele fingiu não entender e fez como se quisesse voltar, o que não os  aliviou nem um pouco. A este mesmo pároco a paróquia deve o fato de ter São Pedro como patrono. Como em outras questões também nessa  havia no começo desencontro de opiniões. Mas, depois que o vigário deu de presente uma estátua de São Pedro, estava dada a solução para a dificuldade. Todos se deram por satisfeitos com São Pedro como patrono de Bom Jardim. Também o pároco de São Leopoldo visitou a picada a fim de dar andamento às ações de ofício. Um deles chamava-se Pe. Antônio e, mais tarde, um certo Binfart. Ambos demonstraram simpatia para com Bom Jardim.
Os missionários espanhóis vindos da Argentina visitaram também a picada onde pregaram a famosa missão. A partir de 1849 o Pe. Augustin Lipinski, vigário de Dois Irmãos e o Pe. Johann Sedlac de São José, deram seguido a sua colaboração para com a picada. O Pe. Augustin costumava hospedar-se  na asa de Johann Finger ou do velho Lerner. Mais tarde o Pe. Johann escolheu como sede do seu trabalho a casa do professor Schütz.
Em 1859 Bom Jardim recebeu um capelão próprio na pessoa de Joh. Meinulphus Traube. Embora sacerdote alemão não honrou o clero alemão. Não poucas vezes suas atitudes causavam escândalo, o que mais tarde degenerou em oposição aberta contra o bispo diocesano. Não se pode negar nele empenho como pegador, mas sua maneira de atuar não era correta. Como uma comunidade poderia prosperar nas mãos de um cura de almas, que organizava sem cerimônia reuniões dançantes na sua própria casa, participava delas e, em certa ocasião, afirmou que já se encontrava há seis anos no Brasil e ainda não tinha encontrado um confessor. Este comportamento só podia confundir e esfriar os fiéis.
Outras demonstrações de leviandade edificavam pouco. Suspenso pelo bispo procurou manter-se no posto que resultou numa cisão na comunidade. Especialmente censurável foi a controvérsia que manteve com seu superior num jornal eclesiástico. Mesmo, segundo seus adeptos, sua pena era afiada demais. Apear de tudo não apostatou de todo da Igreja. Chegou a chorar quando foi convidado pelos protestantes para ser seu pregador. Mais tarde abandonou o Brasil e retornou à Alemanha onde, afirma-se, ter feito penitência por seus descaminhos. (100) Depois de sua partida Bom Jardim foi, por algum tempo, entregue à sua própria sorte, sendo atendido, ora a partir de Dois Irmãos, ora de São José do Hortêncio. Permaneceu, porém, sob a jurisdição  de São Leopoldo e do seu vigário Wendelin Bock. Com ele Bom Jardim viveu uma situação melhor, porque este sacerdote deixou  generosamente o dinheiro dos batismos para a igreja. Criaram-se assim condições  par reunir um fundo para a ocasião da elevação em igreja paroquial.
O primeiro pároco foi o Pe. Fr. Schleipen que, entretanto, não permaneceu muito tempo no posto. Contrariamente à sua atividade posterior como construtor, dedicou-se à decoração interna da igreja, construindo altares e mandando buscar estátuas.
Depois que August Lohmann e Blees exerceram a função de substitutos, Bom Jardim recebeu em março de 1870 o Pe. Eugen Steinhart como pároco. Na sua gestão aconteceu o episódio Mucker. Empenhou-se muito para manter o povo longe dos encontros dos Mucker. Para alertar e proteger  contra os malefícios de tais propostas, lia para o povo na História Unversal de  Amegarn  os teatros dos anabatistas de Münster e salvou muitos que, movidos por uma curiosidade reprovável, quiseram observar os fato e as pessoas. Já destacamos convenientemente no capítulo décimo da primeira parte, seus méritos por ocasião da varíola.
Em 1875 veio o Pe. Trappe que ficou como sucessor até  fins de 1883. Em primeiro de janeiro de 1874 foi substituído pelo Pe. Andreas Eultgen. Já que não se encontra mais entre os vivos, queremos demorar-nos na sua atuação. O Pe. Eultgen era um homem pequeno mas de grande atividade e zelo. Confirmamos por inteiro o que o Pe. Ambrosius Schupp escreveu no "Deutsches Volksblatt", por ocasião dos eu falecimento.
Não há necessidade de destacar o que ele fez por Bom Jardim. Materializado em pedra é visível para a comunidade paroquial: a ampliação por duas janelas do prédio da igreja e, de modo especial, a bela torre. Gozava de alto prestígio entre os paroquianos apesar de estatura pequena. A ele deve-se muito de modo  especial no que toca à vida de piedade e das virtudes.
Desde o dia 25 de janeiro de 1891 o Pe. Petrus Gasper, algum tempo antes coadjutor do Pe. Eultgen, é o pároco de Bom Jardim. Conforme é sabido pelos nossos conterrâneos, continuou a estimular  o entusiasmo por meio do interesse por diversas formas de associações, especialmente pelas associações de homens.
Ao lado do pároco atuaram em Bom Jardim diversos padres jesuítas como coadjutores. Na seqüência foram Carl Strobe, Joh. Ruland, An.  Queri, Wilh. Holgreve. Vários deles já estão  na eternidade.
O Pe. Carl Strobel faleceu em Dois Irmãos, onde a comunidade agradecida ergueu-lhe um belo monumento no cemitério. Aguardemos mais informações sobre ele na Crônica que esperamos seja publicada sobre Dois Irmãos.
Não podemos  deixar de lembrar-nos de um homem que não apenas foi capelão em Bom Jardim, como tomou parte na missão de 1887. Referimo-nos ao Pe. Robert Hofherr. Em sua homenagem podemos afirmar que ele foi um autêntico missionário, (101) assim como no passado temos outros muitos exemplos.
O Pe. Hofherr reunia em si todas as qualidades necessárias para uma missão de tamanha importancia. Em primeiro lugar era de estatura alta e robusta, o que sempre impressiona o povo e por si só impõe respeito. Além disto era dono de uma voz forte, nem fina demais nem grave demais. Para a voz vale o que se espera do sino. Pode ser que dois sinos emitam o mesmo som e, contudo, nota-se uma diferença significativa entre eles. Assim acontecia com o Pe. Hofherr. Sua voz soava como o metal do sino e a sonoridade era pura e cheia de alma. Além disto valia-se de uma retórica adequada ao povo. A forma, o estilo e a apresentação tinham o objetivo de  agradar o povo. As imagens, as comparações, as narrações, os provérbios e, não em último lugar, expressões nas quais comunicava seus pensamentos e desejos, perpassavam o seu discurso. Além disto demonstrava um caráter íntegro e aberto, avesso a qualquer tipo de dissimulação, expressando a sua opinião de forma clara e sem sutilezas. Exatamente por isso, era com freqüência alvo de brincadeiras inocentes e bem humoradas. Seu espírito  simples como o de uma criança demonstrava uma disposição sincera  para com todos e, por isso, muitos confiavam nele. Mas o que sobretudo o caracterizava era a sua profunda e sincera piedade. A oração era para ele uma questão existencial. Quantas vezes empunhava o terço e outras tantas a oração não parecia ter fim. O que mais o distinguia era o seu ardente zelo pelas almas, que para muitos podia parecer exagerado e até imprudente. Os que o acusavam de imprudência esquecem-se  das intenções que o moviam. Com seus aparentes exageros fez um grande bem para muitos. Foi um bom lutador pela causa da Igreja. Se pudéssemos contar com um número maior igual a ele, os benefícios para ela e o Brasil  seriam tanto maiores.  Por isso o saudamos com a invocação que os primeiros cristãos mandavam escrever sobre a sepultura dos seus amados. "Ave, pia anima."- "Saudamos-te, alma piedosa. "Nós te saudamos! Para nós não estás morto nem longe. Ouves-nos e nos dirigimos a ti como a um vivo. Lembramo-nos de ti e  agradecemos-te por todo o bem que fizeste ao longo da tua vida.  Bendita sejas, alma piedosa! Não ao teu corpo dirigimos a nossa saudação, não a uma sombra como os pagãos. Saudamos-te alma cheia de vida, plena de pensamentos e sentimentos. Bendita sejas, alma piedosa. Sim, eras piedosa e morreste santa. Permaneces conosso irmão e, como irmão, te lembrarás de nós, quando estiveres na glória. "Ave, pia anima" – “Bendita sejas, alma piedosa”.
Na aparência o Pe. Hofherr era saudável e forte. Mas, como acontece tantas vezes na terra, eram apenas aparências. Nascido na Badênia, como estudante já tomava parte nos congressos católicos. Depois entrou na Companhia de Jesus. Pelo seu talento de orador prometia, já naquela época, uma grande e abençoada atividade como missionário na Alemanha. As coisas, entretanto, se deram de outra maneira. Já durante  os estudos foi mandado  para a Algéria na África por motivos de saúde. De lá os superiores o chamaram para a teologia em Innsbruck no Tirol. Seguiu depois para a Hungria como missionário entre os alemães. Em 1887 foi-lhe  indicado o Brasil como campo de trabalho, porque sua saúde continuava a preocupar. Supunha-se que o clima ameno do Rio Grande do Sul lhe restauraria as energias. Na aparência parecia-se a uma torre sólida, mas sua morte prematura demonstrou que os fundamentos eram  frágeis. Apesar disto trabalhou com vigor. Atraiu uma bênção toda especial sobre o trabalho realizado com a congregação de moços de Dois Irmãos. (102) Muitos  lembram-se ainda com gratidão. Como pescador apostólico incansável lançava  a rede por meio dos seus sermões. Sem arrefecer punha-se em busca de cada um particular até conseguiu fisgar a alma para o Salvador.
Quem sabe mais tarde não poucos pais e também filhos se penitenciaram por não terem dado ouvidos às suas advertências. Conhecido é o ataque brutal contra ele da parte de um morador de Dois Irmãos, provocando um vendaval de indignação por toda a colônia. Especialmente edificante foi sua morte  por ocasião do natal de 1896. 

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