Deitando Raízes #21

Os tempos mais recentes
A condição de colônia encerrou-se  para Bom Jardim no ano de 1846, quando São Leopoldo foi elevado à categoria de município. Com esta mudança recebeu uma administração  própria integrada por cidadãos locais. O direito de participar das eleições foi uma conseqüência deste novo avanço. Essa prerrogativa mostrou-se contudo muito discutível. Deu início à movimentação partidária provocando alvoroço na picada sossegada. No tempo do Império o embate fervia entre os liberais e conservadores.
Com poucas e honrosas exceções os últimos eram tão bons e tão ruins quanto os primeiros. De qualquer forma as eleições  tinham pouco significado para a população da colônia. Quem tirava proveito delas eram os bem falantes brasileiros e raramente, ou nunca, os laboriosos alemães. Dificilmente um alemão era distinguido com um posto rentável, enquanto eram-lhes  concedidos com generosidade postos honoríficos sem remuneração e títulos altissonantes de oficiais da guarda nacional. Encarregavam-se, em última análise, das tarefas do "mouro" como diz o ditado. O êxito dos alemães deve-se  quase que exclusivamente ao seu esforço e não às benevolências dos partidos no governo. Esta situação pouco se alterou com a implantação da República e, por isso, os católicos das colônias fizeram muito bem em organizar um partido próprio: o Partido do Centro. Mas como demonstraram em 1896 as eleições municipais em Lajeado, Estrela, São Leopoldo  Montenegro, numericamente os centristas são fracos demais para conquistar uma influência  decisiva nos municípios. Na hipótese de se preservar a unidade chegar-se-á com o tempo a melhores resultados. De modo especial é preciso orientar as suas tomadas de posição em sintonia com as peculiaridades do momento, de acordo com a tática ensinada pelo grande líder do centro Windthorst. Apoiou o governo em todas as questões  que visavam o bem do Estado. Não recusava alinhar-se com os liberais quando se tratava de batalhar por um lugar de destaque, de acordo com os verdadeiros interesses do povo, na medida em que estes adversários por princípio  do Centro, da sua parte se dispunham a empenhar-se pelos interesses legítimos do Centro.
Permitimo-nos observar  aqui que menos do que uma fraca representação numérica do Partido do Centro, a falta de uma sólida organização e uma disciplina rígida, foi a responsável pelo fato de que o êxito das últimas eleições ficasse aquém das expectativas. Na verdade o Partido do Centro ganhou numericamente as eleições em São João do Montenegro, mas foram escamoteadas em favor do partido no poder por manipulações já conhecidas.  O que falta ao Partido do Centro é disciplina tanto nos filiados quanto nos dirigentes.
Como já foi assinalado mais acima, a implantação da República não trouxe nenhuma alteração mais visível na vida e na maneira de ser  da colônia. Tudo ficou como antes. Os  antigos chefes dos liberais e conservadores perceberam que as coisas andavam tão bem sob o novo  regime quanto sob o imperial. Engajaram-se num dos novos  partidos como aconselhavam seus interesses e pontos de vista. Pode-se afirmar, quem sabe, que a participação nas eleições e na vida pública decresceu em vez de aumentar. As freqüentes mudanças  no governo, como no caso Deodoro (3 de novembro de 1991) e mais tarde  Júlio de Castilhos (23 de novembro de 1891) e, finalmente,  Barros Cassal, de forma alguma atuaram positivamente sobre os colonos. Durante a Revolução  Federalista os ânimos em Bom Jardim eram  pouco favoráveis ao governo do momento. Mas os selvagens ataques dos maragatos a Nova Petrópolis, resultaram numa mudança rápida de posição. Como os alemães, de acordo com seu caráter e tradição são conservadores, não é de se admirar que não demorasse para que todos batalhassem  do lado do governo no poder, em vez de servir de séqüito aos agitadores. Por tradição o alemão não faz grandes exigências ao governo e se mostra satisfeito quando a opressão não é excessivamente grande. Se ao colono é permitido dedicar-se ao trabalho sem ser perturbado, ele tem o que procura. Julga-se um homem de grande sorte quando as estradas estão em condições suportáveis e os impostos não demasiado pesados. Sua índole pacífica faz com que não alimente grande simpatia com os embates partidários. Sua perspicácia natural o faz saber que as vantagens provenientes de uma vitória eleitoral, não lhe trazem vantagens imediatas.
Este espírito pacífico e leal dos moradores de Bom Jardim, além de suas reivindicações modestas, tiveram a sua digna expressão, por ocasião da visita do Presidente. Na segunda semana do mês de março de 1897, Júlio de Castilhos empreendeu a viagem, há tempo planejada, por uma parte da colônia. Desembarcou em São Leopoldo às oito horas e pernoitou no hotel Koch. Na manhã do dia nove reservou um bom tempo para uma visita aos dois colégios para, em seguida, seguir de trem até a residência do sr. Tenente Coronel Jacob Kroeff. À tarde dirigiu-se a cavalo até Dois Irmãos. tomou um refresco na casa de Carlos Hennemann para, em seguida, assistir as costumeiras festividades de boas vindas.
Na quarta feira, 10 de março, visitou Bom Jardim. Apeou na residência do sr. Peter Cassel pelas nove horas da manhã. As duas sociedades "Eintracht" e "União São Pedro" encontraram-se no local para a saudação  em companhia do restante da população. Sobre o acontecimento lê-se no Deutsches Volksblatt: “Logo que o Presidente entrou no salão, o sr. Vigário tomou a palavra  para saudar a autoridade maior do Estado”. (DV, 30.4.1897).
Não reproduzimos a íntegra do discurso pronunciado pelo sr. Vigário, nem a resposta do sr. Presidente, pois o leitor os encontrou há pouco no Deutsches Volksblatt e ainda deve estar lembrado. Uma crônica em forma de livro naturalmente os reproduzirá na sua  íntegra. Tanto mais que na ocasião vieram à tona todas as questões que interessam Bom Jardim  e a colônia em geral: a livre prática da religião católica, a conservação das estradas na colônia e a questão florestal. No que diz respeito à última  questão a Sociedade União São Pedro encarregou  seu presidente Jäger e seu vice presidente Peter Meyrer, a propor a Júlio de Castilhos a promulgação de uma lei visando a proteção à mata. O sr. Presidente interessou-se claramente pelo assunto e observou que, pela experiência  pessoal, era preciso prevenir este mal e  tinha como meta a publicação de uma lei  relativa à problemática florestal ainda para aquele ano.
Com certeza o sr. Presidente só levou boas impressões  para o palácio do governo e, com sua notória energia e dinamismo, irá por mãos à obra e cumprir as promessas feitas. Por menor e mais curta que tenha sido a viagem, foi contudo o mais que suficiente para que, por observação pessoal, o Presidente formasse uma opinião clara dos resultados da  imigração sobre o progresso do nosso Estado. Em Dois Irmãos, Bom Jardim, Holanda e Picada Café, teve ocasião de observar, a que ponto evoluiu a agricultura entre nós. Em Caxias, pelo contrário, o progresso da indústria mostrou-lhe uma realidade promissora. É possível que o panorama de Caxias pelo seu brilho tenha impressionado mais o Presidente, do que a visão das picadas coloniais. Mas ele é suficientemente estadista para não fazer comparações entre os resultados das duas realidades situadas tão diferentes. Caxias será por ele elevada à categoria de comarca, o que não passa de um direito para uma cidade tão populosa. Conforme promessa sua promulgará, com certeza, uma lei sobre o reflorestamento, a fim de disciplinar a questão florestal em benefício da agricultura. E, acrescentamos, para resolver em definitivo os problemas de todo o estado do Rio Grande do Sul. Agricultura e indústria tem o direito de serem estimulados  pelo governo estadual, pois representam os esteios principais de todos os negócios do Estado. E, quando se pergunta o que é de maior importância para o bem do povo, a indústria ou a agricultura, qualquer pessoa lúcida, decidirá pela última. A agricultura é o fundamental pelo simples fato de os frutos do campo serem indispensáveis para a alimentação. Somente uma vez garantida a vida entra em questão a indústria propriamente dita. Neste sentido ela é de importância menor.  De outra parte a indústria é obrigada a se alinhar com a agricultura, isto é, colocar-se em sintonia com ela. Na velha Europa, de modo especial na Alemanha, a indústria colocou de lado a agricultura o resultou numa situação desconfortável da sociedade, bem conhecida por todos nós. Por essa razão o governo deveria, antes de mais nada, estar atento para as necessidades da agricultura. Para que o Rio Grande do Sul conquiste o mais rapidamente possível a sua independência econômica e, ao lado da criação de gado, se dedique a desenvolver uma vigorosa agricultura, é muito mais importante do que a instalação e o privilegiamento unilateral de estabelecimentos industriais, embora estes últimos não devam ser negligenciados.
Conclui-se dessas considerações que os colonos façam tudo e a qualquer preço, para conseguir do governo vantagens para a agricultura, como estradas, uma lei florestal e outras mais. De mais a mais deveriam lembrar-se da máxima: Não deveriam procurar vantagens para si e suas famílias, infelizmente coisa comum entre pessoas alérgicas ao trabalho. Estas recorrem a todos os meios disponíveis para conseguir um “carguinho” que lhes facilite a vida às custas do Estado. Abstraindo de que os alemães não gozam  tão facilmente deste "privilégio" e nem deveriam procurá-lo, mas  esforçar-se por construir, mediante empenho próprio, uma existência digna e segura. O fato é que os colonos alcançarão com maior rapidez este objetivo. Obviamente fica em pé que nas colônias não podem faltar profissionais com alfaiates, ferreiros, moleiros, sapateiros, etc. Essas profissões ocupam  contudo uma porcentagem muito pequena da população. Pela própria natureza o peso das atividades nas colônias fica com a agricultura. Por essa razão é necessário que seja preservada, aperfeiçoada e multiplicada. E, considerando bem, existe uma atividade mais rentável do que a do colono, de modo especial no Brasil? Mesmo que o  colono não disponha de outros bens além da sua terra, cultivando-a com diligência, é dono de um capital que rende de 20 a 50 por cento e não raro ainda mais, em frutos do campo. E, por fim, perguna-se não se trata  também da profissão mais saudável? Não há dúvida de que a vida na liberdade da natureza de Deus é de longe preferível às cidades e fábricas abafadas. Sem dúvida é preciso suportar o calor, mas o colono tem a certeza para que serve o trabalho e preserva a saúde, como o atestam a sua aparência e a experiência. Às vezes a vida na cidade oferece maiores ganhos e mais diversões, mas as pessoas atentas sabem que na cidade, a maior bênção de uma vida conforme a natureza e a vida de família, não poucas vezes naufragam e a situação aparentemente brilhante não passa de um engano. Pergunta-se, qual o estado de vida mais condizente com o cristianismo  do que o do homem do campo? É um homem livre, não é dependente dos seus concidadãos como o operário e o artesão. E, neste sentido, como é que se passam as coisas com os operários das fábricas? De manhã o apito da máquina a vapor os convoca para uma rotina mortífera para o espírito! Sem dúvida o agricultor encontra-se numa situação muito melhor. Pode-se permitir um dia de descanso o que não acontece com o  operário, se não quiser perder o emprego. E que vocação está mais de acordo com uma autêntica vida cristã, do que a do homem do campo? Abstraindo do fato de estar  a salvo de muitos riscos de natureza moral, seu olhar e seu coração são por assim dizer, orientados para as coisas do alto. Seu bem estar depende, a par do seu empenho, também da bênção de Deus, merecida durante o tempo todo, por meio da oração e da vida cristã. Por esta razão o colono  leva uma vida muito mais feliz e satisfeita do que o operário da cidade e muito mais tranqüila e muito mais resignada do que aquele. No que se refere à educação dos filhos e à estabilidade da família, a sorte lhe é muito mais favorável. Há ainda a mencionar a influência que a população do campo exerce  sobre os negócios do Estado. Traz mais bênçãos do que os operários da indústria. Entre os agricultores não há desemprego, falta ao trabalho, pobreza extrema, como acontece com tanta freqüência entre os operários. A população rural ama a ordem, o sossego e a lealdade e, por isso, representa a base sólida do Estado. Para o Brasil em particular a ampliação da agricultura, significa uma questão de sobrevivência nacional e, por esta razão, um governo inteligente não promove esforços demais quando garante e desenvolve, mesmo que, em caso de emergência, exija seu próprio sacrifício.

This entry was posted on segunda-feira, 13 de junho de 2016. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Responses are currently closed.