Deitando Raízes #15

Capítulo oitavo
A Campanha contra o Paraguai
O arresto do vapor brasileiro Marques de Olinda por parte do governo do Paraguai, terminou em  guerra entre os dois países. Pela História são conhecidos os enormes esforços que o ambicioso ditador Carlos Solano Lopes fez, para colocar em campo um numeroso exército. Não obstante a aliança de três países: Uruguai, Argentina e o gigantesco Brasil para atacar o pequeno inimigo, a guerra prolongou-se por cinco anos. Custou um incrível número de vidas humanas - calcula-se que teriam sido muito mais do que 100.000 - para, finalmente, conquistar-se a vitória. Lopes mantinha sua frota de guerra na melhor das condições e, além disto, construíra um bom número de fortalezas inexpugnáveis. E, além do mais, era muito difícil aproximar-se do inimigo. As características do país ofereciam as melhores condições imagináveis para uma guerra defensiva, protegido pelos descampados, pelos rios e os inúmeros pântanos, como que formando um cinturão de fortalezas. Se Solano não tivesse sido morto num assalto em primeiro de março de 1870, a Guerra provavelmente ter-se-ia prolongado  e causado ainda mais miséria ao Brasil. Devido a importância desta campanha para o Brasil, queremos descrevê-la um pouco em seus detalhes.
O motivo da guerra foi o fato de o ditador do Paraguai se ter imiscuído indevidamente na guerra do Brasil com Uruguai. Sem declaração de guerra Lopes invadiu com suas tropas, simultaneamente, o território brasileiro e o argentino. O resultado foi a celebração em maio de 1865, de uma tríplice aliança entre o Brasil, a Argentina e a República Oriental, governada pelo general Flores. Primeiro os paraguaios foram expulsos do território brasileiro, das cidades de São Borja, Itaqui e Uruguaiana, menos de uma faixa do Mato Grosso. Depois, durante o ano de 1866 o cenário da guerra foi transferido para o Paraguai, com a travessia do Uruguai e o Paraná no Passo da Pátria. No começo o comando supremo das forças de combate aliadas coube ao general Mitre, presidente da Argentina. Mais tarde o comando passou para as mãos do fervoroso Duque de Caxias e por fim nas do Conde D´Eu. Sua condução incansável levou ao fim da guerra. Os contingentes brasileiros foram comandados pelos generais Osório e Polidoro.
No ano de 1865 travou-se a gloriosa batalha do Riachuelo, cuja memória é festejada anualmente pelo Brasil no dia 11 de junho. Praticamente todo o ano de 1867 transcorreu sem maiores feitos de armas, porque a cólera paralisou todas as operações. Somente em 19 de fevereiro de 1868, os brasileiros lograram forçar a passagem por Humaitá, uma fortaleza no rio Paraná e, finalmente, tomar este bastião chave, no avanço sobre a capital. No ano seguinte as tropas brasileiras entraram de fato em Assunción. No dia primeiro de março de 1870 o ditador do Paraguai tombava sob os golpes de lança das tropas do general  Câmara, o futuro visconde de Pelotas. É curioso registrar que neste episódio colaboraram três personalidades, que mais tarde se posicionariam como adversários: o então general Visconde de Pelotas, o tenente-general Joca Tavares e o  Major Floriano Peixoto.
As conseqüências para o Brasil resumiram-se numa enorme perda de homens, tão necessários ao país e a ruína total das finanças. Acontece que nos quatro primeiros anos a dívida estatal aumentou em 60 a 100 por cento e foi preciso criar sempre mais impostos novos, a fim de levar a guerra adiante. Com o desfecho feliz da guerra o Brasil lucrou muito pouco em reconhecimento e prestígio externo.
O professor de Göttingen Wappäus expressou-se da seguinte forma sobre a guerra, no seu livro: "Manual de Geografia e Estatística do Império do Brasil": "O livre trânsito nos rios  foi apenas um pretexto para uma verdadeira guerra de conquista. Desde então a experiência mostrou que a famosa e patriótica Tríplice Aliança de primeiro de maio de 1865, baseava-se em pressupostos falsos, supondo-se que os motivos e intenções constantes nos documentos, tivessem sido de fato sinceros.  Após uma luta  de fato heróica  de quatro anos, até agora sem precedente na América, o Paraguai sucumbiu a enorme superioridade em tropas e, de modo especial, em material bélico, que o Brasil estava em condições de adquirir, enquanto o Paraguai totalmente isolado, só podia contar com o que o país podia oferecer. No mínimo a metade da população masculina do Paraguai foi sacrificada." No interior do Brasil evidentemente não se tinha nenhuma noção de semelhante estado de coisas, no momento em que a belicosa juventude das colônias alemãs, foi conclamada a se engajar numa guerra nacional. A imprensa e as autoridades falavam  da guerra como uma questão de honra e defesa da honra nacional. Por isso não nos admiremos, de que em parte os alemães das cidades jogarem-se com entusiasmo na guerra, como o demonstra a história da bateria alemã. Na maioria das colônias, é verdade, a coisa foi recebida com bastante frieza e foi preciso lançar mão da pressão e outros meios discutíveis. Comissões de recrutamento passavam pelas colônias para localizar jovens alemães. Foi-lhes dito que seriam destinados à defesa e somente voluntários cruzariam as fronteiras do País. Mas, como costuma acontecer em tais situações, as autoridades subalternas não costumam observar a palavra ao pé da letra.
Não poucos  imaginavam-se que se repetiria o que acontecera na luta contra Rosas. As tropas auxiliares alemãs só avançaram até Caçapava de onde foram mandados para casa incólumes, depois de executarem por algumas semanas os serviços do acampamento e comerem não poucos churrascos. Desta vez a guerra não foi brincadeira mas algo muito sério, tanto assim que dos mobilizados, no máximo a metade voltou para casa.
Bom Jardim contribuiu com um contingente para a campanha. Da Picada Café entre outros tomou parte da guerra Johann Sebastiani de 18 anos, que perdeu a vida longe da terra natal. A mesma sorte tiveram os filhos de Johann Stein e Jacob Jung, ambos de nome Johann. Schneidersthal e Bohnenthal registraram  perdas iguais. O número de mortos e mobilizados de Bom Jardim foi maior, no mínimo oito homens. Na sangrenta batalha de Curupaiti Morreu Mattes Dilli, cujo irmão Hannes sucumbiu mais tarde de cólera. Entre os que se salvaram e voltaram para casa conta-se Jacob Dilli, que chegou a sargento. Mais tarde ele, em companhia de Heinrich Schneider, cantou a guerra do Paraguai em versos bem humorados e, a seu tempo publicados no "Deutsches Volksblatt". Creio que prestaremos um bom serviço para os nossos leitores, publicando em anexo toda essa produção poética em estilo humorístico e, assim, salvá-la do esquecimento. Da boca do informante ficamos sabendo de outras vivências, para as quais reservamos um espaço modesto. A partir desses breves quadros será possível avaliar melhor essas variadas experiências, do que por longas descrições. O primeiro quadro mostra o vapor de uma companhia, servindo de hospital militar, ancorado no rio. Era uma embarcação enorme que abrigava algumas centenas de brasileiros feridos ou doentes. Aconteceu que, certo dia, não se sabe como, irrompeu fogo no navio. Espalhou-se com tamanha rapidez que, em questão de minutos, as chamas envolveram toda a embarcação. No momento encontravam-se no convés apenas o comandante e um único marinheiro. Mal tiveram tempo para salvar-se pulando na água. Não deu tempo para levar nada dos seus pertences. O capitão segurava uma bengalinha na mão, único objeto que levou nadando até a margem. Das pessoas sob o convés ninguém conseguiu fugir. Deve ter sido um espetáculo assustador, levado ao máximo pelos gemidos e gritos que se elevavam do navio. Todo o mundo reuniu-se na margem e botes foram descidos de outros navios para correr em socorro dos infelizes. Mas todos os esforços foram inúteis e os gritos de desespero dos ameaçados pelo fogo e, em parte, já atingidos, avolumaram-se como uma avalanche. Como qualquer possibilidade  de salvamento estava excluída e, para abrevia o sofrimento dos infelizes, dois disparos de canhão de 12 libras destroçaram o navio. Só quando o navio se fez em pedaços e afundou, silenciaram os pavorosos gritos.
Numa outra ocasião um hospital de campanha, melhor um hospital de acampamento paraguaio, ofereceu aos brasileiros que  entraram nele no seu avanço, um espetáculo não menos desolador. Deve ter-se assemelhado a um verdadeiro inferno. Deitados no chão estavam os paraguaios, os vivos ao lado dos mortos e cadáveres em decomposição, a maioria nua e mutilada. Especialmente chocante e digno de compaixão era o espetáculo dos muitos soldados, mal saídos da idade de meninos, que tão cedo encontraram o desfecho (54) de suas vidas cheias de esperança.
Um outro espetáculo vem de um campo de batalha. Em volta de um forte, os cadáveres expostos durante dias, enchiam as sepulturas. E no pântano apareciam nas mais diversas posições os corpos dos mortos e feridos. A muito alemão valente sangrou o coração de tristeza, experimentando desta maneira pela primeira vez os horrores da  guerra, fazendo com que de vez perdesse a vontade de participar dela.
Mas olhemos para cenas menos assustadoras. Nosso sargento recebera ordens de fazer chegar canhões e munição na outra margem, com o auxílio de dois escaléres. as tropas receberam ordem para atravessar o rio a vau, bastante raso naquele local. Tiveram que se despir, amarrar roupas e arma numa trouxa, colocá-la  sobre a cabeça e, pela diagonal, levá-las até a outra margem, num travessia de 45 minutos. Para a tropa não foi muito difícil, mas os senhores oficiais não sentiam prazer algum. Quando o sargento apareceu com suas duas canoas, pareceu-lhes o socorro em carne e osso para tirá-los do aperto. Falaram-lhe que lhes cedesse as canoas por algum tempo. Deram ordens, ameaçaram e, por fim, imploraram. Mas o valente sargento ficou irredutível. Argumentou que tinha ordens determinantes de fazer chegar imediatamente  canhões e munições dos quais se tinha urgente necessidade na outra margem e acrescentou que não tinha nenhuma vontade de se fazer culpado de desobediência. Assim não restou outra saída para os oficiais do que seguir o exemplo dos seus camaradas e se submeter ao desagradável banho.
É notório o tamanho do trabalho que não poucos fortes paraguaios exigiam dos brasileiros, devido às suas extensas proteções externas que davam muito trabalho. Mesmo os generais mais valentes viam-se numa situação a tal ponto desesperadora que, ao cabo de muita luta, foram forçados a ordenar a retirada das tropas de assalto. Chegou finalmente um balão fixo procedente da América do Norte. Foi alçado e assim, finalmente, foi possível ter-se do alto uma visão clara sobre as linhas de defesa e, de acordo com ela, organizar o ataque. Graças a este reconhecimento aéreo, o seguinte assalto foi bem sucedido. Foi, ao que se presume, a primeira vez que se utilizou na América do Sul um balão para fins militares. Com que sensação supersticiosa os paraguaios terão olhado para o gavião gigante lá no alto, fora do alcance das suas balas, metendo-se com tamanho atrevimento nas suas cartas.
Dois episódios de caráter hilariante fecham as vivências do nosso sargento. O primeiro refere-se a um almoço festivo no acampamento, havido em homenagem a alguma autoridade maior ou em comemoração a algum acontecimento importante. O informante não se lembra do motivo verdadeiro. Mas recorda-se bem de que ele não participou do almoço como convidado, mas como servente e como chefe de serviços. Com ares de importante o comandante do batalhão passou-lhe as instruções  necessárias para os preparativos. acabavam de chegar novos suprimentos para o exército, não só o indispensável  pão e farinha, mas também guloseimas, que aliás costumavam aparecer somente na mesa dos distintos. Latas de conservas, guloseimas doces, vinho e até champagne em abundância. O sargento, homem de confiança do comandante, desempenhou tão bem a sua função, que este o teve em ainda maior consideração do que antes. Ao encontrá-lo certa vez quando ele próprio limpava a sua roupa, o comandante o interpelou: "O que é isto sargento, por acaso o senhor não dispõe de homens para executar este serviço?" Ao responder que os homens já tinham muito que fazer, o chefe retrucou: "O que, se algum dos soldados se negar a fazer o trabalho para o senhor, manda-o comigo, eu o farei escovar para que não se esqueça para o resto da vida." É óbvio que o sargento continuou lavando a roupa como o fizera até então. Não estava disposto a sobrecarregar ainda mais os camaradas, mas dar-lhes um exemplo de fraternidade. (55) O motivo por termos mencionado este fato, foi para mostrar o bom conceito que o sargento gozava junto ao comandante, um bom conceito que conquistara rapidamente com o empenho em servir, com sua aplicação e com a sua maneira de ser.
De todos os acontecimentos no acampamento nenhum deixou uma recordação mais alegre em Jacob Dilli, do que a festa da vitória depois da morte de Lopes. "Festa da vitória" não é propriamente  o termo. Foi, antes de mais nada, uma retreta, um concerto improvisado, no qual participaram todos os músicos, na medida em que foi possível reuni-los na pressa. Logo que  se espalhou a notícia que o ditador havia tombado, o quartel general providenciou a requisição de todos os músicos, especialmente trombeteiros e tamboreiros, para anunciar o acontecimento ao acampamento inteiro. E que alegre soprar  nas trombetas e bater de tambores! Centenas deles se esforçaram para, por meio dos instrumentos, dar vazão da maneira mais vibrante, a  sua alegria e sentimentos de vencedores. Apenas no momento em que acabou a primeira onda de embriagues, de empolgação e de júbilo, seguiram as usuais salvas de canhão que, com o seu trovejar deveriam anunciar o fim da guerra. Ainda é digno de nota  descrição do retorno da terra inimiga, a recepção festiva das tropas na cidade de Rio Grande, contado pelo nosso informante do tempo da campanha.
O contingente riograndense voltou à sua Província, via Montividéo. Na cidade portuário de Rio Grande fora preparada uma recepção festiva. Na chegada ao porto foram recebidos no trapiche por moças vestidas de branco, enfeitadas com fitas azuis e vermelhas acompanhadas de  música. Os batalhões vitoriosos, porém, maltrapilhos, marcharam pelas ruas, por debaixo de arcos de triunfo, até o centro da cidade, onde se perfilaram numa grande praça. Em todo o trajeto o povo os ovacionava, jogando flores, um bombardeio que agradou aos soldados mais do que a chuva de balas no Paraguai.
Depois de descansarem um pouco e, depois de bem servidos com queijo, pão e vinho, pelos alemães de Rio Grande, o Pe. Lopes, especialmente vindo de Porto Alegre, rezou uma missa campal em ação de graças, como era usual na época. À tarde houve procissão solene, da qual participou toda a população, também as tropas recém-chegadas. Como alusão às fortalezas conquistadas no Paraguai, fora construída numa praça uma réplica com traves e tábuas. Seguiram-se a tarde inteira jogos, cantos  e manifestações de júbilo. À noite as tropas foram levadas aos quartéis e aí aconteceu um banquete festivo em regra. Comeu-se o que e o quanto apeteceu e bebeu-se de tudo o que vinha à boca. Na falta de copos recorreu-se a garrafas com a parte cima cortada ou quebrada. No dia  seguinte houve uma complementação com salvas de canhão e foguetes. Seguiu-se a ordem de embarcar para Porto Alegre. Os nobres guerreiros e vencedores pensaram: Se tivemos um tratamento tão distinto em Rio Grande, o que não nos espera em Porto Alegre. O povo se acotovelará em nossa volta e nos  cobrirá com balaios de flores, latas de goiaba em calda, cigarros e mil outras coisas boas. Acontece que as esperanças exageradas dos que voltavam para casa, foram uma ilusão. Quem desejar saber mais detalhes  de como as coisas se passaram sóbrias em Porto Alegre, leia as poesias sobre a guerra do Paraguai  de Jacob Dilli nos anexos. 
Muito interessante  (56) é também a história que Nicolau Rech nos conta do seu irmão Johann. Os recrutadores andavam em busca de rapazes da Picada 48 e, sem serem percebidos, aproximaram-se  do moinho de Jorge Reinheimer, onde supunham estarem escondidos os 13 rapazes. Enganaram-se feio. Encontravam-se aí de fato 11 rapazes  (oito filhos de Reinheimer e três do Reichert), ocupados com o ensacamento de farinha, isto é, carregando a farinha pronta até o sótão. Estavam no momento no sótão e apenas dois em baixo no moinho, onde trabalhavam também três moças. Ouviu-se então: "Os recrutadores estão chegando!" Os de cima mantiveram-se em absoluto silêncio. Os dois rapazes em baixo se mandaram. Um desceu pela roda da água. E as valentes moças não ficaram de braços cruzados. Quando os recrutadores entraram cada uma agarrou a arma mais à mão. Uma pegou a grande concha com a qual se tira a farinha da torradeira. Desencadeou-se então  uma batalha na qual os recrutadores foram forçados à retirada, saltando pela janela e  Loureiro, o chefe, terminou dentro da torradeira. Plantado na porta da casa, o velho Reinheimer montava guarda, armado com um rabo-de-tatu, revoltado com a invasão noturna da sua propriedade.
Estava disposto a fazer uso dos direitos de dono da casa e separar a cabeça do tronco ao primeiro que ousasse entrar. "Entrem se quiserem", gritou em tom de deboche. Eles, porém, não fizeram uso do convite.
No dia seguinte Loureiro mandou que Reinheimer se apresentasse  e o povo já achava que ele seria enforcado. Mas o cônsul prussiano Ter Brüggen  chamou a coisa a si. Durante a intermediação soube que os recrutadores agiam durante a noite. Tratava-se de uma violação da lei e Reinheimer foi posto em liberdade embora ninguém pudesse evitar a surra que levou na ocasião. Da casa de Reinheimer os recrutadores foram até a casa de Nicolau Rech. Cercaram a casa. De fato encontraram nela  Johann Rech de 17 anos e Friedrich Rauber. De susto os rapazes perderam a cabeça, mas tanto mais coragem demonstraram as moças. Rapidamente decidiram pelos rapazes e os ajudaram a saltar pela janela. Mas o Hannes e companheiros foram agarrados perto da cerca. Neste meio tempo Nicolaus Rech, sem saber de nada, esperava na sua janela da casa por Ely Peter e Mathes e Math. Marx, que vinham do Vigia. O relógio bateu oito horas da noite e Nicolaus  pôs-se em pé e disse: "Deve ter acontecido alguma coisa porque ainda não chegaram." (Ely Peter, na condição de inspetor, estava a procura de um preto de nome Mariano.) "Se tivesse um cavalo iria ao encontro deles." Não acabara de falar quando apareceu uma das suas irmãs e gritou: "Niclolaus, Nicolaus, pegaram o Hannes." Nicolaus precipitou-se porta afora em direção à casa dos pais. E o que viu? O Hannes manietado diante da porta e viu também como o Loureiro deu um soco no peito da sua mãe, derrubando-a na lama. O Nicolaus foi tomado de uma raiva incontrolável. Havia um monte de lenha na beira do caminho. Precipitou-se até ele e tentou agarrar uma vara. Não o conseguiu. Os recrutadores ao o perceberem  pularam nos cavalos e seguiram pela estrada parra Bom Jardim. O Hannes que levaram com eles berrava como um terneiro quando apartado da vaca. A mãe chorando seguiu os 40 homens  que, sem dar-lhe atenção pararam no Bauermann. Nicolaus atalhou pelo potreiro para ver a direção que os recrutadores tomariam. Depois de tomar café  saíram para continuar o recrutamento. Antes disto já haviam passado ao largo da casa de Adams, embora lá se encontrassem dois rapazes. Deixaram o Hannes na casa do Bauermann. O Nicolaus não os seguiu mas ruminava um único pensamento: Informar-se onde se encontrava o seu Hannes e libertá-lo, mesmo que lhe custasse a vida. Entrou na sala da frente que estava vazia. Na segunda sala encontrou o seu Hannes sentado numa cama de campanha e, num lado, um brasileiro e um alemão no outro. Sentou-se perto do Hannes. Em atenção às súplicas da mãe e os gritos dele próprio - as mãos estava pretas como graxa de sapato - as amarras foram afrouxadas um pouco. (57) Cochichou-lhe ao ouvido: "Hannes quando te pisar nos do pé, trata de correr!" Durante algum tempo todos se mantiveram quietos. O alemão, um bem conhecido, saiu deixando a porta aberta. Depois de mais ou menos um minuto o Nicolaus pisou nos dedos do pé do Hannes como combinado. Este se pôs rapidamente em pé e, veloz como um veado e silencioso como uma sombra, deslizou porta afora. Sentado aí o brasileiro parecia não perceber nada. Mas o Nicolaus estava preparado. No momento em que o brasileiro se mexesse, fecharia a porta com o pé, agarraria a tranca de madeira e o tornaria  inofensivo. Este não se mexeu. Passados mais dois minutos o Nicolaus também saiu. Topou com o Hannes, duro como um cepo e firme como um muro. "Hannes", interpelou-o, "o que fazes parado aí ?" Deu um empurrão no Hannes e 15 braças mais adiante cortou as amarras, um magnífico "maneado", que ainda hoje lhe dá pena, valendo de seis a sete mil réis. Entraram no mato, subiram até em cima do morro e o Hannes ficou lá. O Nicolaus buscou algumas roupas em casa, além de roupa de cama e deixou-se ficar na casa do  irmão. Na primeira vez que voltou para casa, pensou: "Se alguém vier para me buscar, este pode considerar-se um homem morto!" O fato é que guardava muitas armas em casa para os treinos. Mas ninguém atravessou-lhe o caminho. Na manhã seguinte apareceu o Loureiro para pegá-lo e, depois dele, vários capangas, que de tempos em tempos andavam à procura do Hannes. As outras pessoas alertaram o Nicolaus dizendo-lhe que o Loureiro tinha a intenção de   mandá-lo para um navio de guerra. Estas ameaças causaram pouco medo ao nosso Nicolaus. Estava livre e contratara um substituto por 1.800 mil réis. Além disto estava firmemente decidido a defender a própria pele. "Quem forçar a entrada na minha casa, morre", era o seu lema. Mas sua mãe e a mulher não paravam de se lamentar e insistiam que se escondesse por três semanas no mato. Mais tarde, passando pela Linha Nova, foi até o Vigia, onde moravam um irmão e um cunhado. Sustentaram a ele a ao Hannes  enquanto eram fugitivos. Neste meio tempo o pai de Nicolaus Rech viajou para Porto Alegre, onde, por 600 mil réis, apresentou um substituto para o Hannes. O próprio inspetor encarregado de olhar duas vezes ao dia pelos fugitivos, lhes deu o conselho: "Enfie-se num bom esconderijo, para que não o vejamos quando nos aproximamos."
Foi certamente um conselho bem intencionado da parte do nosso funcionário, mas Nicolaus Rech não tinha plena confiança nele. Preferiu gastar mais algumas onças de ouro, para garantir-se em todas as eventualidades, o que finalmente resolveu a situação.
Os depoimentos acima demonstram que o entusiasmo pela Guerra do Paraguai em geral não era dos maiores nas colônias alemãs. O que menos agradava era a maneira como os obrigados e os não obrigados ao serviço militar eram recrutados. Os colonos conformavam-se quando não conseguiam esquivar-se. E não faltaram também aqueles que se apresentaram como voluntários.
São de Pedro Fritsch das 48 Colônias os seguintes detalhes. Participara como voluntário e servira durante cinco anos na cavalaria. Participou de 23 ataques em companhia de outros  companheiros de armas, como o tenente Riess, o velho tabelião de São Leopoldo e Franz Herzog de Porto Alegre. Um destacamento saiu do Pesqueiro no Rio dos Sinos, via Capela de Sant´Ana, até Porto Alegre. Viajaram de navio a Rio Grande, Montevidéu e de lá até Salto. Depois subiram a cavalo até o Rio Paraná, onde participaram na travessia do Passo da Pátria, sob o comando do general Borio. Encontrou Jacob Dilli em Povinho, Sto Tomé, na província de Corrientes. Em sua companhia regressaram felizmente  Jacob Mombach, Alfons Petry, Frederico Rodrigues Ferreira. Outros de seus companheiros ficaram, entre eles Peter e Mathias Marmit. Da sua parte não soubemos detalhes da guerra. De alguma importância é apenas aquilo que nos contou sobre o tratamento dado aos prisioneiros paraguaios. É notório que os paraguaios  não raro maltratavam os prisioneiros brasileiros, os mutilavam e, não poucas vezes, os matavam.  Tal coisa não podia acontecer entre nós. Logo que um inimigo depunha as armas, não lhe podia acontecer mais nada. Se alguém tivesse ferido ou simplesmente  batido num indefeso, seu destino era a frente e uma bala a recompensa.
Digno de nota é o que conta a respeito da cachaça como remédio contra a cólera. Com ela a doença não se manifestava e quem tivesse cachaça à mão não morria. Outros veteranos afirmam por sua vez, que a casca de laranja era um bom remédio contra a epidemia. Nós da nossa parte damos preferência a cachaça. Fritsch partiu do Paraguai com seu contingente no dia 18 de março e chegou em Porto Alegre no dia 24  de setembro.
A participação dos alemães nas guerras do Brasil contra Rosas e Lopes, estabeleceu um novo vínculo entre as duas nacionalidades. É permitido acrescentar que por meio delas subiu o conceito dos imigrantes perante os nativos. Da mesma forma  o conhecimento da língua pelos que regressavam, conquistou   seu espaço na região da mata virgem, mesmo que ela nem sempre fosse falada sem erros e de forma impecável. Uma outra conseqüência foi a aproximação com usos e costumes dos filhos da terra, fato que parece não merecer louvor nem aceitação, visto que as guerras não representavam um modelo a ser seguido pelos colonos. 

This entry was posted on segunda-feira, 23 de maio de 2016. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Responses are currently closed.