Conhecimento como síntese 11ª parte

O diálogo interdisciplinar

Um cenário desses favorece o diálogo interdisciplinar. O cientista troca resultados e conclusões com o filósofo e o teólogo e este, por sua vez, procura validar suas teses e doutrinas à luz das descobertas da Ciência. Embora tímida ainda a realidade desse diálogo inter-saberes, cá e lá já se anuncia no horizonte. Já tivemos várias vezes ocasião para trazer exemplos. Permito-me concluir essa parte da reflexão com o apelo  do prof. Edward Wilson, por cinco décadas pesquisador da universidade de Harvard, a um pastor evangélico. Wilson ficou conhecido  na década de 1970 pela posição radical em favor de uma visão materialista do mundo. Em 2006, porém, publicou  o livro “The Creation – an appeal to save life on Earth”. Nesse livro convida um pastor evangélico com quem dialoga, para que Ciência, Filosofia, Religião e Teologia se deem as mãos, a fim de resolver  as intrincadas questões que envolvem o binômio homem-natureza. Pelo visto rendeu-se à evidência de que as abordagens  unilaterais não bastam para superar os impasses criados pela relação equivocada do homem com o ambiente natural, além de outros mais.

O que devemos fazer? Esquecer as diferenças, digo eu. Encontramo-nos no terreno comum. Isso talvez não seja tão difícil como parece à primeira vista. Pensando bem nossas diferenças metafísicas têm um efeito notavelmente pequeno sobre a conduta da sua vida e da minha. Minha suposição é de que somos ambos pessoas éticas, patrióticas, altruístas, mais ou menos no mesmo grau. Somos produtos de uma civilização que surgiu da religião como igualmente  do iluminismo fundamentado na ciência. De boa vontade  nós dois serviríamos no mesmo júri, lutaríamos nas mesmas guerras, tentaríamos com a mesma intensidade, santificar a vida humana, compartilharmos o amor à Criação. (A Criação. E. Wilson. p. 188)


Edward Wilson como entomólogo, descobriu aos poucos que os insetos que estudou a vida toda, vão sugerindo muito mais do que as características taxonômicas revelam à primeira vista. Seu conterrâneo e contemporâneo Francis Collins chegou à mesma conclusão, partindo do estudo e do mapeamento do genoma humano. Identificou-o como um código que nada mais é do a “Linguagem de Deus”, o titulo que deu a seu famoso livro, no qual nos deixou o depoimento:

Apesar de eu, no fim das contas, passar da Ciência Física a Biologia, essa experiência de originar equações universais tão simples e belas, deixou em mim uma impressão profunda, em especial porque o resultado definitivo tinha um grande apelo estético. Isso levantou a primeira das várias perguntas filosóficas acerca da natureza do universo físico. Porque a matéria se comporta dessa maneira? Citando a frase de Eugen Wigner, “qual seria a explicação para a inexplicável eficiência da Matemática?” Não seria nada além de um feliz acidente ou referência a alguma intuição profunda  da natureza da realidade? Para quem deseja aceitar a possibilidade do sobrenatural, seria isso também uma intuição da mente de Deus? Teriam Einstein e Heisenberg e outros encontrado o divino. (A Linguagem de Deus. Fr. Collins. p. 7) 

Para concluir essa parte da nossa reflexão sobre a construção do conhecimento, o dr. Collins acrescentou o testemunho de Stephen Hawkings, com a observação de que este físico não costuma ser muito ligado a considerações metafísicas.

Então poderíamos todos nós, filósofos, cientistas e pessoas comuns, participar da discussão sobre a questão do porque de nós e o universo existirmos. E se encontrarmos uma resposta para isso, será o triunfo definitivo da razão humana – pois, então conheceremos a mente de Deus. Seriam essas descrições matemáticas da realidade indicações de alguma inteligência superior? Seria a matemática junto com o DNA, uma outra linguagem de Deus? (A linguagem de Deus. Fr. Collins. p. 70)

As manifestações dos dois renomados cientistas, Francis Collins e Edward Wilson, não são vozes isoladas no meio científico. A eles somam-se  muitos outros como Stephen Hawkings, Eisntein, Heisenberg, von Braun, von Bertalanffy, A. Portmann, etc., etc. A “Amercan Scientific Affiliation” reúne-os numa associação, aberta a todo aquele que, de alguma forma, aceita discutir a abertura da Ciência para a Filosofia e, porque não, a Teologia.

Há um aspecto nessa questão que merece destaque. Os nomes  que compõem a lista daqueles que, direta ou indiretamente, se dispõem ao diálogo e a troca de resultados entre os diversos  campos do conhecimento, são especialistas com carreiras e fama consolidadas. Chegaram às suas convicções como o resultado, como que a síntese conclusiva, de uma longa caminhada de investigações, pesquisas e reflexões. Não poucos, senão a maioria, desenvolveram o esforço científico num tempo em que reinava um clima de desconfiança, de rejeição e até de guerra declarada contra as Ciências Humanas e as Ciências  do Espírito. Entre eles enumeram-se inclusive Edward Wilson, Francis Collins. Stephen Hawkings. Depois de muito pesquisar, depois de responder pergunta por pergunta que suas investigações sugeriam, depois de se depararem com os limites dos recursos técnicos e científicos, despertaram para a possibilidade de que não estava unicamente em suas mãos, responder a todas as questões. Coerentes e honestos como manda ser um cientista e mais ainda um sábio de verdade, escancararam as janelas em busca de outros horizontes. Encontraram-nos em outras dimensões do conhecimento, na Filosofia, na Teologia, na Tradição, no Conhecimento popular e na Intuição.

Constitui-se, sem dúvida, um fato auspicioso a constatação de que existe clima e disposição para o dialogo “inter-conhecimentos” ou “interdisciplinar”. Acontece, porém, que esse movimento verifica-se  como resultado final das conclusões  de cientistas com carreira consolidada e ou pensadores  amadurecidos nas suas reflexões. Não seria oportuno, quem sabe, inverter a situação? Significa incentivar e reforçar  nas instituições de ensino, ou implantar naquelas que não a praticam,  reintroduzir naquelas que a abandonaram, uma política acadêmica visando desenvolver uma visão interdisciplinar do conhecimento. Neste caso os futuros cientistas, humanistas, teólogos e filósofos, já sairiam das escolas e universidades preparados para desenvolver suas especialidades nessa perspectiva. Poupar-se-ia assim, todo um desvio longo, tortuoso e muitas vezes sofrido, para que cada um chegue lá por conta própria, se é que chega. É impossível avaliar o que uma decisão nesse sentido importa em termos de conhecimento a ser produzido, tanto em quantidade quanto em qualidade.

This entry was posted on quinta-feira, 13 de agosto de 2015. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Responses are currently closed.