Reflexões Avulsas: Sobre “Turnen” – Educação Física e Identidade

Os imigrantes alemães ao se estabelecerem no Sul do Brasil, implantaram um paradigma social, cultural, econômico e religioso, até então inédito no País. O Governo Imperial destinou-lhes   grandes áreas de terra cobertas com mata virgem no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. A peã pela distribuição dos lotes, as promessas não cumpridas por parte de funcionários destacados pelo governo para supervisionar os assentamentos, a ausência de uma  ajuda governamental efetiva, o total desconhecimento do entorno geográfico, social e  cultural, a natureza hostil, a falta de prática no enfrentamento da mata virgem e na sua transformação em terra arável, fizeram a vida dos pioneiros muito dura nas primeiras décadas. Os imigrantes foram entregues à própria sorte e o sucesso ou o fracasso dependiam exclusivamente deles próprios. Haviam partido da Alemanha com a firme determinação de nunca mais retornar e ao mesmo tempo construir uma nova querência na distante e desconhecida terra chamada Brasil. Entretanto não voltaram as costas  para a tradição cultural alemã. Pelo contrario. Foi exatamente desta fonte que  hauriram as energias e a perseverança para enfrentar todas dificuldades no afã de domar a mata virgem brasileira e legar aos filhos e netos um futuro seguro e despreocupado.

Depois que as primeiras dificuldades haviam sido superadas, os primeiros taliões de mata virgem  transformados em terra arável e a primeira colheita amadurecida, as famílias dos pioneiros reunira-se para lançar os fundamentos de um convívio social. Onde dois alemães se encontram, diz o ditado, aí funda-se uma comunidade, uma associação, uma sociedade ou um clube.

Uma comunidade típica de colonos alemães no Sul do Brasil, está organizada de tal maneira que atenda às preocupações maiores dessa gente. Quer dizer: a preservação do espírito e da pratica religiosa, a formação escolar elementar mínima. A igreja, a  escola, o cemitério, a casa de comercio, o salão comunitário, a ferraria, o moinho, a serraria, a sapataria, etc.,  não podiam faltar em lugar nenhum. Ainda hoje igreja e escola significam nas pequenas e grandes comunidades a condição mínima, para se poder falar em uma comunidade.

Pode-se afirmar que neste sentido os imigrantes alemães não inventaram nada de novo para sobreviverem e prosperarem em meio ao mundo ambiente desconhecido. Também na velha pátria a igreja e a escola constituíam-se nos instrumentos mais importantes para enfrentar a deterioração e degenerescência cultural e religiosa. O ajustamento às circunstâncias peculiares do Sul do Brasil, recorrendo aos mesmos instrumentos pedagógicos, fez com os colonos alemães , católicos e protestantes, fossem todos cristãos praticantes e que entre eles se contassem muito poucos analfabetos.

Uma avaliação semelhante pode ser feita em relação ao esporte, à pratica do “Turnen”, dos exercícios físicos visando a educação do corpo. As décadas de 1850 e 1860 podem ser consideradas como o marco referencial para a consolidação da imigração alemã. No interior floresciam centenas de comunidades, solidamente alicerçadas  sobre suas igrejas, escolas, casas de comércio e artesanatos. Na capital do estado Porto Alegre, e nas florescentes  cidades do interior, comerciantes, artesãos, técnicos, profissionais liberais, professores, religiosas,.....organizaram as comunidades  alemãs urbanas. Também essas comunidades urbanas católicas, protestantes ou liberais, faziam da preservação da identidade uma das preocupações maiores da atividade comunitária. A par da igreja e da escola serviam-se da vida associativa como instrumento permanente para perpetuar a sua maneira de ser alemã, o tempo que fosse possível, mas adaptando-o paulatinamente às circunstâncias peculiares Brasil. E, como um dos meios mais eficientes ao lado do canto, da música, do teatro, etc., multiplicaram-se  por toda a parte instituições destinadas aos exercícios corporais, ao “Turnen”, à ginástica, enfim à educação e ao disciplinamento do corpo.

A 9ntenção do presente texto consiste em avaliar o papel da educação do corpo como instrumento importante na preservação da identidade. Essa questão assume características peculiares em situações históricas determinadas. Por isso mesmo, ao avaliar a importância dos exercícios físicos regulares,  a ginástica, a educação do corpo, ente os imigrantes alemães  e seus descendentes no Sul do Brasil, é forçoso referenciar a análise às condições ambientais, sociais e culturais específicas da região. Os imigrantes alemães que aí se fixaram, formavam um grupo minoritário em meio à população luso-brasileira original, aos imigrantes italianos, aos hispânicos e outros que povoaram a região. Transferiram-se para cá de forma definitiva, sem a intenção, mesmo remota, de algum dia retornarem à terra d origem. Pelas leis do Pais  os filhos e os filhos dos filhos, nasciam como cidadãos brasileiros. O entorno social e cultural, predominantemente luso-brasileiro, soado ao português como língua oficial e a consciência, a cada geração mais nítida, do seu pertencimento à nação brasileira como cidadãos, pós em marcha o processo de inserção dos assim chamados “alemães” no todo da nacionalidade brasileira, não apenas sob o aspecto jurídico como, de modo especial, no plano cultural. Em outras palavras, o “abrasileiramento” no seu sentido  global foi-se impondo progressivamente. Na fase mais característica do processo, entre 1920 e 1940, essa identidade em transição costuma ser definida como “teuto-brasileira” ou “euto-brasileirismo”. Teutos porque continuavam fiéis aos valores , às tradições e, principalmente,  à língua. Brasileiros porque assumiam conscientemente a condição de cidadãos brasileiros com todas as conseqüências inerentes a essa situação legal.

Foi a serviço dessa trajetória de inserção na realidade brasileira que os imigrantes e seus descendentes recorreram  a educação do corpo nas sociedades, nos clubes, nas instituições de ensino, como instrumento com duplo objetivo. De um lado havia o empenho em preservar de alguma forma, a herança cultural transmitida pelos antepassados e, neste contexto, a língua ocupava um lugar privilegiado. De outra parte havia também a consciência nítida que não havia como não encontrar caminhos para uma inserção cada vez mais profunda e mais definitiva na nacionalidade brasileira. Nessa a dinâmica a questão de fundo  resumia-se  em encontrar a via mais normal possível para colocar a serviço da nacionalidade em construção todo o potencial contido na tradição cultural dos imigrantes. Nesse particular os teuto-brasisleiros costumavam pautar a sua ação como cidadãos de acordo com a seguinte  lógica: A pessoa que renega a sua tradição e por isso mesmo a sua identidade, não passa de um mercenário, dum aventureiro, que vende seus préstimos àquele que. lhe oferece o preço mais alto. Como tal jamais será  um cidadão confiável. Portanto a  fidelidade às tradições constitui-se num pressuposto de  cidadania, numa garantia de patriotismo.     Essa lógica  compreensivelmente não foi entendida e, por isso mesmo, não aceita pelo universo luso-brasieliro em geral.    Por um longo período, principalmente durante as quatro primeiras décadas  do século vinte, motivou temores  e suspeitas sobre os reais sentimentos, sobre as verdadeiras intenções e a real posição dos teuto-brasileiros no tocante à cidadania. 

Submetendo a história e a dinâmica do associativismo  entre os teuto-brasileiros   a uma análise um pouco mais profunda, transparece  com mais ou menos evidência o que já foi apontado acima: o cultivo e a preservação dos valores culturais trazidos  como herança, a formação do caráter e  da  personalidade que irão transformá-lo num cidadão existencialmente comprometido como brasileiro. E os fatos não deixam dúvidas sobre o acerto dessa visão histórico-antropológica dos imigrantes e seus descendentes.   

Na obra comemorativa do primeiro centenário da imigração alemã no Rio Grande do Sul, intitulada “ Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul – 1824-1924 (Hundert Jahre DEutschtum in Rio Grande do Sul – 1824-1924), são enumeradas 324 associações , mais de 300 no Rio Grande do Sul. Entre elas enumeram-se  sociedades de canto, de teatro, de orquestra, de fotógrafos, para fins múltiplos e até clubes para fumantes. Mas o que mais cai em vista  é a alta porcentagem de associações de canto e numero ainda maior de associações e de clubes que se destinavam de alguma maneira a exercícios corporais e o bem estar do corpo. São 150 num número total de 352. Diversas. Diversas modalidades de esportes podem ser encontradas: andar a cavalo, bolão, tiro ao alvo, etc., Sobressaem de modo especial associações e clubes de ginastas (Turnvereine e Turnklubs) e entre eles o mais importante a Federação dos Ginastas, o “Turenrbund”, a SOGIPA. A publicação comemorativa citada mostra resumida e objetivamente a importância dessas associações e clubes para a maneira de ser alemão ou melhor para a maneira de ser teuto-brasieliro.

Não é possível fazer justiça à Federação dos ginastas no âmbito dos breves dados sobre a vida associativa alemã no Rio Grande do Sul. Seria necessário escrever uma extensa monografia, mesmo que fosse apenas para dar uma noção do que essa Associação realizou para o aprimoramento corpora e moral da juventude teuto-brasileira de Porto Alegre especialmente na condução exemplar do presidente J. Aloys Friederichs. A atuação da Federação de Ginastas é um hino de louvor ao idealismo alemão, à coerência e à persistência na perseguição dos objetivos que se julgam os acertados. Apoiado pelas simpatias e pela sustentação de praticamente  toda a germanidade da capittal, a Federação pode ser considerada a Associação profana mais popular e mais profundamente ancorada em extensas camadas, comprovado pelo elevado número de associados.[1]


A questão da identidade étnica.

Num pais como o Brasil em cuja formação concorreram e  concorrem ainda hoje, representantes  dos grupos étnicos de alguma fora significativos, a questão da etnicidade ou melhor da identidade étnica assume, a certa altura, um papel  de relevância toda especial. Manifesta-se  de modo especial na fase inicial do encontro de diversas etnias num contexto de imigração. Essa situação encontra-se magistralmente resumida e expressa em moedas norte americanas: “ex pluribus unum – “de muitos povos origina-se um”. A expressão poderia  constar sem retoques e com o sentido exatamente idêntico, em moedas brasileiras, pois o afluxo imigratório nos dois paises foi alimentado por uma heterogeneidade étnica muito parecida.

A gênese  das nações oriundas de raízes étnicas múltiplas começa com a predominância do aspecto “pluribus”. Por uma ou duas gerações, dependendo das circunstâncias geográficas somadas ao entorno social e cultural em que o imigrante foi colocado, além das leis que regem cada caso e disciplinam a imigração, observa-se a tendência de os diversos grupos étnicos desenvolverem mecanismos de defesa para sobreviverem  às dificuldades iniciais. Entre esses mecanismos de defesa o agrupamento por etnias, a preservação dos valores culturais e, principalmente, da língua desempenham um papel fundamental. Em princípio esse fenômeno não tem nada a ver com um enquistamento intencional e muito menos com a resistência a uma inserção comprometida na nacionalidade  a que os imigrantes passam a pertencer para o futuro. No momento em que esse tipo de fatos se verificarem, devem ser creditados a causas alheias ao fato em si da imigração. Tomando o exemplo dos  imigrantes  alemães  no Sul do Brasil, a relativa demora e  lentidão  que caracterizou a sua inserção definitiva no todo da nacionalidade   brasileira, ou como se costumava dizer, nos eu “abrasileiramento”, tem a sua explicação  em várias razões peculiares dessa imigração no decurso do século dezenove principalmente. As terras a ela designadas eram formadas por um complexo de matas virgens no centro, no noroeste e norte do Estado do Rio Grande do Sul, enfaixadas no centro sul e no nordeste pelos campos naturais, configurava um eficiente isolamento geográfico. O regime da pequena propriedade familiar, votada para a policultura de subsistência implantado na região, distanciava os imigrantes ainda mais dos luso-brasileiros, donos das vastas estâncias de criação extensiva de gado. Não havia  porque trocar experiências entre os dois modelos agrários e se houvesse não tinham como, pois se tratava de  duas tradições muito diferentes que se valiam de línguas  muito distante entre si. O resultado não podia ser outro. Em linhas gerais os imigrantes  organizaram suas comunidades inspiradas no modelo que haviam deixado nas diversas regiões da Alemanha de onde procediam. Fizeram-nas funcionar de acordo com as tradições e costumes que haviam trazido e fizeram do dialeto de cada grupo em particular a sua língua de comunicação quotidiana. A impotência ou o desinteresse do Estado pela educação, fez com eles próprios se encarregassem do ensino e da educação dos filhos, construindo escolas, contratando professores, determinando conteúdos programáticos, implantando uma filosofia pedagógica própria e zelando pelo aprimoramento e a ampliação da oferta. Alem desses fatores a distancia física das instancias do poder, principalmente o imperial nas primeiras décadas e, a partir de 1889, o republicanos no Rio de Janeiro, fez com que as comunidades de imigrantes no extremo Sul do Pais se consolidassem e multiplicassem como que à margem do Brasil oficial. A não existência de leis específicas  que dispusessem sobre o disciplinamento da inserção do imigrante como, por ex., a obrigação de os nascidos aqui aprenderem o português, reforça a explicação da lentidão do processo.

Pode-se afirmar  sem maior risco de errar que o “Turnerbund”, a Federação dos Ginastas foi o protótipo  da educação, da formação do caráter, da maneira ser teuto-brasileira, no sentido mais amplo do termo. Neste sentido quero destacar o seguinte na Federação dos Ginastas.

Em primeiro lugar impõe-se  o fato de que a ginástica, o “Turnen”,  a educação física, o aprimoramento físico do corpo, por meio  dos mais diversos exercícios, perseguia um objetivo b em mais elevado e mais amplo do que a mera saúde  e  b em estar corporal. Tod essa atividade fundamentava-se  na filosoifa de que um corpo sadio e harmonicamente desenvolvido se constitui no pressuposto para o cultivo do idealismo alemão, da coerência e da persistência na perseguição dos objetivos que se julgam acertados.

Em segundo lugar, a resposta  correta do que se entende como objetivo correto, foi dada por Friedrich Ludwig Jahn, o pai da educação do corpo, do “Turnen” no seu  sentido original. O desenvolvimento harmonioso e a saúde corporal, “mens sana in corpore sano”, serve como instrumento na edificação da nação. Esse objetivo é alcançado por meio de um esforço sistemático, permanente, persistente, na busca  de uma formação completa, de um aprendizado sólido, de um esforço permanente, em não se envolver com gente efeminada e de não se deixar desencaminhar por nenhuma tentação e não entregar-se a diversões nocivas à virtude.

Terceiro.  A formação do corpo ao lado dos demais recursos da educação, é colocada como finalidade maior a serviço da formação ética e moral da pessoa, para desta maneira servir de pressuposto para uma sólida  e harmoniosa edificação da nação. Uma pessoa destituída de moral, de ética não é confiável. Assemelha-se a um legionário estrangeiro que vende seus préstimos de aventureiro para aquele que lhe paga o maior preço.

Quarto. “Turnen”, ginástica, exercícios corporais em todos as suas modalidades, perseguem uma compreensão holística da pessoa, isto é, a disciplina corporal, a postura ética e moral sólida e coerente, devem servir como fundamento inabalável e duradouro para o Estado e a Nação.

Quando se fala em educação do corpo como precondição para a educação holística e harmônica do caráter e do espírito, lembramo-nos imediatamente  da figura de Friedrich Jahn e do seu sistema proposto como instrumento pedagógico a serviço da nação alemã. Entretanto foram elaborados outros sistemas ou filosofias de vida, destinados  a alcançar pobjetivos específicos. Entre outros destacam-se “Meu Sistema” de  J. P. Müller na Europa e  e o “Daly Dozen” de Walter Kamp na América. E para não prolongar-me demais vou ater-me um pouco  mais à proposta do jesuíta norte americano William Lockington. Na apresentação da edição alemã de  sua proposta lê-se:

O sistema  de Lockington exibe o formato inaciano. Clarea nos objetivos, liberdade na escolha dos meios, enquanto é permitido e se trata de meios aceitáveis e persistência no emprego nos meios escolhidos, foi sempre o espírito do herói de Pamplona. É exatamente este o espírito  que perpassa  esse sistema. Mas também é este o espírito que conduz ao sucesso em todos os campos. Fica evidente que, exercícios do corpo de 15 a 20 minutos todos os dias, não podem deixar de penetrar em nossa carne e sangue, não transformam apenas o nosso corpo como também o caráter e não demorará que, sem o percebermos, agiremos também em outras situações conforme os mesmos princípios, que neste particular nos conduziram a um inegável sucesso. Este sistema foi, portanto, concebido pela sua natureza para elevar e temperar as energias do espírito. A relação não permanece apenas no plano externo na medida em que todo e qualquer aprimoramento do corpo implica também no aperfeiçoamento do espírito, mas o direcionamento para a perfeição do espírito é a alma do negocio.[2]

Mais adiante cotinúa.

Aquele que e capaz de executar exercícios com certa facilidade e elegância dá prova irrefutável que se rata de uma personalidade igualmente bem formada e forte. Os  instrumentos são indispensáveis. Requer-se um espírito equilibrado e vontade. Onde há vontade abre-se um caminho. Não é tarefa para autômatos.

Para o verdadeiro homem importa em primeiro lugar o objetivo, só depois a estética.

Diariamente passam para o compo inimigo exatamente jovens talhados para ser magníficos soldados de Cristo. Ao irem em busca  de suas potencialidades naturais são simplesmente levado por uma tendência sadia da natureza. Se lhes oferecemos o que de direito procuram, não serão levados a desertar e a perder-se. No processo de educar a formação do corpo e da alma não podem ser claramente diferenciados. Quem possui o  corpo da juventude terá facilmente a sua alma... Onde reina o verdadeiro espírito impõe-se por si próprio a justa medida.[3]

Na mesma direção vão as considerações de Tonl Sander em sua obra A Educação do Corpo entre a Juventude masculina.

Exercitar o corpo não significa simplesmente a “arte de movimentar o corpo”. Foi nesta concepção  que Jahn já condenou os exercícios livres. Eram-lhe tão pouco conhecidos como também a Guts-Muths. Aqueles que criaram a educação do corpo na Alemanha e lhe formularam os fundamentos, basearam a sua doutrina tendo como pressuposto o cenário natural como primeiro e principal instrumentos de ginástica. Somente a orientação posterior (Spiess), que sistematizou a arte de exercitar o corpo,julgava que o corpo pudesse ser educado por meio de exercícios livres. Como elementos dos exercícios  sem alma  constavam o abrir as pernas, rodear, flexionar, alongar, etc. alienados de todo e qualquer objetivo dotado de sentido. Não passavam de movimentos sem vida e não como exercícios em função de um todo integrado. A orientação de Spiess foi a responsável que, durante meio século, a ginástica, o Rurnen em escolas e sociedades, fosse sufocado por exercícios áridos, sem vida e artificiais.[4]  

Os professores de Educação Física  Bensch e Fox observaram em seu livro: Como fazer Ginástica (Was wollen wir Turnen?)

É preciso refletir  mais uma vês sobre o conceito de “Exercício do Corpo”. O exercício do corpo acompanhado de sua educação e eficiência, significa a educação do homem como um todo, pois corpo e alma formam uma só realidade e um não é capaz de realiza5 algo sem a colaboração do outro.

Por isso temos que afirmar claramente: Tudo aquilo que não visa um formação maior e o que não torna mais vigoroso ou prejudica, não faz parte dos nossos exercícios corporais! Portanto, fora com os espetáculos, ( ... ), com os aparelhos unilaterais! Adotemos uma aprimoramento abrangente do homem, que contempla tudo: movimentar-se, praticar esportes, jogar, banhar-se, nadar, lutar, competir, caminhar. Não queremos tornar  o homem mais forte, mais veloz, mais resistente, mais versátil, mais sadio, mas mais livre, mais nobre, mais belo. Afinal o que lucramos quando esgotamos as potencialidades no exercício do corpo e nem sequer tocamos na alma?[5]

A mesma opinião sobre os exercícios físicos e a educação do corpo, expressou Arhtur Latterner, na sua obra “Exercícios Físicos para Moças e Mulheres alemãs”. (Deutsches Mädchen=und Frauenturnen).

A educação do corpo, o “Turnen” constitui-se numa tarefa a serviço da educação do homem como indivíduo e do povo como um todo. Num breve resumo é possível  expressar o que queremos alcançar com a educação do corpo, com o “Turnen”.

Queremos estimular a resistência e a tenacidade.
No que diz respeito ao corpo:
1. Preservar  a alegria natural que homem experimenta pelo exercício do corpo.
2. Influir positivamente no desenvolvimento do homem, por meio do robustecimento dos órgãos internos mais importantes para a vida (coração e pulmões) – por meio da massa principal do corpo (músculos e ossos) – por meio do disciplinamento dos nervos (capacidade de coordenação).

No que diz respeito à alma: A confiança em si mesmo e a força de vontade, a disposição e a destreza, o discernimento e a tenacidade.

No que diz respeito ao caráter: Favorecer a clareza do espírito e a alegre disposição da alma.

No que diz respeito ao social e nacional: Desenvolver a consciência de grupo e a camaradagem – habituar-se à organização, à subordinação, à pontualidade e à obediência – cultivar e amadurecer o amor à terra natal e à pátria.

Trata-se de uma convicção totalmente equivocada achar que a  educação do corpo, o “Turnen”, visa somente o robustecimento do corpo. O objetivo do “Turnen” vai alem . As características da alma, o cultivo do espírito também fazem parte da educação do corpo. Em outras palavras: com a educação do corpo, com o “Turnen” pretende-se  atingir o homem como um todo, a fim de educa-lo para se tornar um ser humano sadio, capaz, capaz, com disposição e  alegria para viver e desta forma incorporá-lo como membro útil e de valor na sociedade como um todo.[6]

Das opiniões acima mencionadas podem-se tirar as seguintes conclusões.

Primeiro. Os exercícios do corpo (Turnen, ginástica, exercícios...), fazem parte de um amplo conceito que compreende todo e qualquer tipo de exercícios e movimentos do corpo. Tanto faz se  se  trata de exercícios em aparelhos, dum trivial andar pela natureza, duma respiração profunda, da participação num acampamento para escoteiros, de nadar, andar de bicicleta. O importante não é o que se faz, onde acontece, que aparelhos são utilizados ou se encontram disponíveis numa academia. Tudo deve acontecer num clima espontâneo, não em meio a uma rotina neorotizante, no qual os exercícios em si, a estética, a competição, o numero de quilômetros percorridos, a altura e a distância do salto, a resistência ou a velocidade são colocados como objetivo último.

Segundo. Todos os autores mencionados condenam o recurso à educação do corpo e os respectivos exercícios, com ou sem aparelhos, com a finalidade única de adestrar o físico na pessoa humana, ignorado ou até negando as implicações existenciais entre corpo e espírito. Para eles a orientação de Spies, responsável pela exagerada tecnificação, pela supervalorização dos resultados musculares dos exercícios, pela programação matemática dos exercícios, pelo exibicionismo que acompanham não poucas competições, pelo sentido político emprestado a muitas delas, quando métodos  e exercícios levam o corpo aos limites extremos de suas potencialidades físicas pondo em risco a sua própria integridade e, pior ainda, quando se lança mão de artificialismos químicos que forçam os ossos  e músculos a dar resultados não previstos no seu potencial natural. Trata-se de uma concepção oposta aos grandes  teóricos  da ginástica, do “Turnen”, como foram Fiedrich Jahn, Guts Muths, Lockington e muitos outros. Contraria também, para não falar em aberração, da compreensão holística do ser humano, que motiva a prática dos exercícios corporais, o “Turnen”, como instrumento pedagógico a serviço da formação da personalidade, do caráter dos praticantes, em função de objetivos mais maiores e mais nobres.

Terceiro. Os exercícios do corpo, a educação do corpo deve acontecer de acordo com a concepção holística do ser humano, a concepção que o ser humano forma uma realidade existencial una composta pelos dois coprincípios  do corpo e do espírito. Seu corpo, seu caráter, suas manifestações sociais, culturais e religiosas, constituem um “unum” harmônico, conforme o propõe Ludwig von  Bertalanffy na sua obra “Teoria geral dos Sistemas”. De acordo com essa concepção o corpo constitui-se no pressuposto de uma sadia vida do espírito, de um caráter equilibrado, de um relacionamento frutífero com os demais seres humanos e com a natureza em geral e de uma disposição alegre em todas as manifestações da vida. O mesmo já não é possível afirmar de um espírito perturbado, de um ânimo enfermo, de um  convívio social mal sucedido, de uma postura religiosa sombria.

Quarto. A educação do corpo não pode estacionar ao nível dos diversos métodos e exercícios. Em outras palavras. Em nenhuma hipótese é aceitável que o método e os exercícios se transformem na finalidade última da educação do corpo. Devem obrigatoriamente servir  um ideal superior, isto é, a formação do caráter, o desenvolvimento de uma personalidade harmoniosa a serviço da nação como o propõe Friedrich Jahn, a serviço da identidade étnica, como foi proposto em muitas sociedades no Sul do Brasil e a serviço da formação do caráter como o pede o sistema do jesuíta americano William Lockington.


Bibliografia.

BENSCH, G – FOX v. W. Was sollen wir Turnen?. A. W. Zwickfeld Verlag, Osterwieck, Harz, 1930

BUSCH, P, Z. Eine Anleitung zum Betriebe der Leibesù bungen in Turn=und  Jugendvereinen. Galdbach, Volksvereins=VErlag Gmbh, 1920

LATERNER, ARTHUR. Deutsches Mädchen und Frauenturnen, Wilhelm Limpert=Verlag, Dresen, 1925.

AMSTAD, THEODOR. Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul -1824-1924. Trad. de Arthur Bl. Rambo, Edit. Unisinos, 1999.

LOCKINGTON – KÜBLE. Durch Körperbildung zur Geisteskraft. Verlalgsanstalt  Tyrolia, Innsbruck, Wien, München, 1925

SANDER,TONL. Die Leibeserziehung der Mannesjugend, Verlag: Karl H. Frank, Karlsbad, 1934.



[1] AMSTAD, Theodor. Cem anos de Germanidade no Rio Grande do sul-1824-1924,, Trad. de Arthur Bl. Rambo, Edito. Unisinos, São Leopoldo, 1999, P. ?

[2] LOCKINGTON-KÜBLE. Durch Körperbilddung zur Geisteskraft. Verlagsanstalt Tirolia, Innsbruck, Wien, Munchen, 1925, P. 17-18
[3] LOCKINGYON-KÜBLEe. Op. Cit. . P. 23.
[4] SANDER, TONL. Die Leibeserziehung de Mannesjugend. Verlag Karl H. Frank, Karlsbad, P. 10.
[5] BENSCH, G – FOX, V.W. Was Wollen wir Turnen. A. W. Zwieckfeld Verlag, Osterwieck Harz, 1930, P. 1
[6] BENSCH G. – FOX. Op. Cit. P. 8.

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