O Pe. Marcus Bach foi um dos
representantes das levas pioneiras de jesuítas da Província Sulbrasileira da
Companhia de Jesus, que tiveram uma formação especializada regular depois de
concluídos os estudos normais exigidos pela ordem. Em 1952 foi mandado pelos
superiores para a Universidade Gregoriana, para um biênio em moral. Como
resultado redigiu uma alentada tese sobre a especialidade e como tal o direito
ao titulo de doutor em moral. Pelo que consta nunca publicou o original e como
a publicação era na época condição para receber o diploma, não gozou do direito
do uso formal do titulo. Esse fato,
porém, não diminuiu em nada a sua estatura como especialista em questões de
ética e moral. Pelo contrário o Pe. Marcus caracterizou-se por uma percepção da
moral, que antes de mais nada, deveria facultar à pessoa humana, o exercício de
uma sadia liberdade responsável. Uma postura ética e moral, portanto, que se
justifica em última análise pelos
direitos e deveres ditados pela natureza humana. Em outras palavras. Uma moral
calcada no direito natural que tem na
consciência o critério último da moralidade, ou a pessoa tem que ter antes de
mais nada uma consciência moral, convicções éticas e morais, e pautar a vida
pessoal e as relações para com os outros em sintonia com princípios coerentes e
assim validar as leis objetivas formuladas nos códigos. Nas preleções com os
alunos de Teologia Moral o Pe. Marcus costumava valer-se de uma comparação
muito plástica para fustigar o exagero do moralismo canônico: “Os que o defendem
e praticam parecem-se com cavaleiros que montam e galopam sobre as leis e
cânones até perderem as ferraduras”. A conclusão não deixa lugar para dúvidas.
Não levam a lugar nenhum ou, inutilizam a cavalgadura.
O caminho que o Pe. Marcus
apontava nas suas preleções de Teologia Moral, nas conversas particulares, nas
aulas na universidade, nas conferências a empresários, juristas, religiosos,
cursos de formação de todo tipo e nível, deveriam ser trilhados com liberdade
de consciência de um lado e do outro com rigorosa responsabilidade social.
Compreende-se que com isso ele tenha conquistado um crescente número de
discípulos e admiradores, ainda mais porque sabia aliar à abertura das idéias e
princípios que pregava a uma comunicação fácil e clara e um humor jovial, traindo uma grande firmeza
de convicções. De outra parte, entretanto, como também é compreensível pois,
estamos na década de 1950, período pré-conciliar, não demorou que colegas de
magistério, irmãos de ordem, superiores religiosos e eclesiásticos se pusessem
em alerta e acompanhassem de perto seus passos. Não é o momento nem o lugar
para vasculharmos nos meandros dessa história em que ambas as partes foram
prejudicadas. A relação e as reações resultantes da sua posição intelectual,
teórica e prática no campo da moral, valeram–lhe restrições na difusão dos seus conceitos. Concluo o inciso com um
dito consagrado pela sabedoria popular: “Wo Menschen sind geht es menschlich
zu” – “onde há homens procede-se de forma humana”.
O Pe. Marcus mostrou-se desde
logo um entusiasta pela linha e estratégia pastoral adotada pelo episcopado
latino americano em Medellín. Em conversas informais de acampamento e
caminhadas pelos campos de São Francisco de Paula, defendia com convicção as
comunidades eclesiais de base como uma das saídas para a pastoral renovada em
sintonia com as determinações do Concílio Vaticano II. Votava uma grande
admiração pelo cardeal arcebispo de São Paulo, D. Evaristo Arns e os
bispos D. Aloísio e D. Ivo Lorscheiter. E pelo menos em relação a D. Ivo
o apreço pelo Pe. Marcus era recíproco. Mas o perfil intelectual e a coerente
ação prática que acabamos de esboçar, ficou na memória de muitos que com ele
conviveram e privaram até além dos seus noventa anos de
idade, reflexões de indiscutível
solidez, rara lucidez e clarividência profética.
Mas o afastamento do Pe. Marcus
do quotidiano universitário nos últimos 40 anos, fez com que a sua participação
na colocação das bases da Unisinos, a consolidação de um projeto e finalmente a implantação e os primeiros
anos da existência da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, seja pouco ou nada
conhecida, inclusive pelos que hoje são responsáveis pela instituição. A sua
presença e atuação marcou de modo mais visível o período de gestação da universidade
entre os anos de 1960 e 1971. Antes desse período o Pe. Marcus fora docente
regular tanto da Faculdade de Teologia como da de Filosofia. Logo depois de
concluído o doutorado na Universidade Gregoriana e retornado às Faculdades de
Filosofia e Teologia Cristo Rei em São Leopoldo, já em 1954, nós alunos da
primeira turma da Faculdade de Filosofia oficializada, convidamos o Pe. Marcos
para nos ministrar um curso intensivo de Metodologia Científica. Foi naquele
curso que aprendemos a fazer o registro e guarda em fichas padronizadas
citações e conteúdos bibliográficos. Foram de utilidade inestimável nas futuras
pesquisas bibliográficas de qualquer tipo de conteúdo científico, fosse na área
das Ciências Humanas ou das Ciências Naturais. E mesmo que hoje dificilmente
alguém ainda recorra a fichas padronizadas em papel e realize o seu estudo com
o auxílio de um PC ou Notbock, o essencial em nada mudou: a exatidão, a
honestidade e autenticidade no uso dos conhecimentos alheios, para fazer
avançar os conhecimentos em qualquer direção que seja.
Quero demorar-me um pouco mais em
destacar a importância da contribuição do Pe. Marcos na consolidação da
Faculdade de Economia, na formulação do projeto da Unisinos e na condição de
primeiro vice-reitor acadêmico, na consolidação do perfil acadêmico implantado
em 1970.
O Pe. Marcus entrou para valer na
história da Universidade do Vale do Rio dos Sinos em 1962 para ocupar o posto
de diretor da Faculdade de Ciências Econômicas, em substituição do dr. Armando
Pereira Câmara. Tanto um como outro não procediam formalmente da área das
Ciências Econômicas. O dr. Armando P. Câmara formado em Direito, era jurista,
filósofo, ex-reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ex- senador
da Republica e professor de Filosofia na Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras de São Leopoldo. O Pe. Marcus Bach conquistara o doutorado em Moral pela
Universidade Gregoriana em Roma. Imersos na atmosfera pós-moderna os atuais
gestores da área econômica, compreensivelmente talvez perguntem assombrados:
Que credenciais poderia ter um jurista
professor de direito e um doutor em moral, professor dessa especialidade numa
faculdade de Teologia, para implantar e consolidar uma Faculdade de Ciências
Econômicas? É preciso procurar a resposta na cabeça do Pe. Thiesen, doutor em
Filosofia e Teologia, idealizador dos cursos da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras, já em pleno funcionamento em 1959. A escolha do nome da
Faculdade tinha muito a ver com a sua
natureza. A opção pelo nome “Ciências Econômicas” e não simplesmente “Economia”
teve a ver com a missão da instituição e da atuação na vida profissional dos
que nela se formariam. O substantivo “Ciências” deveria ser a baliza reitora da
formação dos profissionais na área da Economia. Somente a Economia entendida
como Ciência estaria em condições de forjar profissionais aptos para colaborar
como parceiros qualificados nos processos de desenvolvimento humano. Como ponto
de partida deve ficar claro que o “fato econômico” é um dado observado em todos
os níveis da ascensão cultural, histórica e tecnológica. Sua presença deve-se
ao fato de estar relacionado e condicionado pelas necessidades humanas
essenciais à vida e à
sobrevivência. Como tal representa, antes de mais nada um dado histórico-antropológico.
Afinal qual é a diferença entre os procedimentos que regulamentam a troca de um
macaco caçado por um cacho de bananas, entre nativos de uma floresta tropical e
um cidadão que compra – troca – uma Mercedes ou Ferrari por reais, dólares ou
euros ? A diferença situa-se apenas na forma, nos meios e do objeto da troca
(compra, escambo, outras formas). No fundo, no fundo quaisquer modalidades de
troca, aparentemente tão díspares, decorrem da necessidade que leva o homem a
apropriar-se dos bens materiais dos quais precisa ou pensa precisar. O que se
troca – compra ou vende – é determinado por valores ou pseudo-valores
culturais. Em outras palavras, deriva de valores culturais em permanente
alternância, substituição ou adaptação histórica. Foi, sem dúvida, por essa
razão, que na primeira fase da Faculdade de Ciências Econômicas da Unisinos,
figuravam disciplinas de natureza humanística como Antropologia Aplicada,
Sociologia, Lógica e Metodologia, Geografia Econômica, História Econômica,
Ética. E diga-se de passagem os alunos, ao menos daquela época, costumavam
apreciar e valorizar os conteúdos dessas disciplinas. Nem todas eram
obrigatórias mas contavam créditos como qualquer outra. A Antropologia estava
entre as não obrigatórias. Apesar disso houve semestres em que foi preciso
oferecer a formação de turmas aos
sábados ou reunia numa noite até 120
alunos numa sala.
A Faculdade de Ciências
Econômicas pensada nesses termos tinha como objetivo oferecer aos egressos de suas salas de aula uma formação de fato compreensiva
do “fato econômico”. Despertar neles a
consciência de que a economia tem
condições tanto de contribuir para o progresso harmonioso de uma sociedade,
quanto oferecer apoio técnico para o planejamento, gerenciamento e
administração de empreendimentos de qualquer tamanho e natureza.
O Pe. Thiesen convidou o dr.
Armando Câmara para concretizar o projeto da Faculdade de Ciências Econômicas
pensada nesses termos. O corpo docente que consta como fundador nos arquivos da
Universidade reuniu entre os 24 nomes que o compunham, economistas, juristas,
sociólogos, filósofos, contabilistas, moralistas. A impressão que se tem quando
se examina um pouco mais de perto a composição do primeiro corpo docente da
Faculdade, é de que o critério para a seleção dos docentes fundadores foi mais de homens de
prestígio na sociedade, do que propriamente um corpo acadêmico comprometido com
uma proposta acadêmica. Por bem ou por mal foi com esses titulares fundadores
que a nova Faculdade, não tardou em se tornar conhecida e da primeira turma de
meia dúzia de alunos passou-se para uma segunda com mais de duas dezenas. O
fato é que, queira-se admitir ou não, na ocasião o fato de homens prestigiados
e admirados nas camadas cultas da sociedade, foi um fator de grande valia para
a legitimação da nova Faculdade.
Acontece que o dr. Armando Câmara
ficou na direção da Faculdade pouco mais de dois anos. Um boa porcentagem dos
fundadores contribuiu apenas com o empréstimo do nome sem nunca terem
contribuído dando aulas ou participando da administração. A escolha da mantenedora
para substituir o dr. Armando Câmara, recaiu sobre o Pe. Marcus Bach, doutor em
Moral e integrante do corpo docente fundador. Empossado como diretor o Pe.
Marcus, cônscio da sua situação de especialista em Moral e pouco familiarizado
com propriamente relacionados com a Economia em si, convidou para ser seu
colaborador e coordenador da Faculdade,
o Pe. Alcides Giehl, formado na Faculdade de Ciências Econômicas da
Universidade do Rio Grande do Sul e seu aluno na disciplina de Moral na
Faculdade de
Teologia. Estava formada uma
dupla perfeitamente afinada com os objetivos a serem alcançados e os meios a
serem empregados. O e. Marcus reservou-se o papel de, como Diretor, traçar as
linhas mestras a serem seguidas e delegou ao Pe. Alcides a tarefa de reunir um corpo docente de bom nível direta e indiretamente comprometido com a
formação de economistas de uma visão ampla das questões economias, sociais e
culturais do meio em que lhes caberia exercer a profissão. Como estudante de economia na UFRGS, consolidara uma rede de
relações preciosas com colegas e com
professores e profissionais da área. Convidou e aceitaram integrar o corpo
docente os professores Antenor Brum, engenheiro e economistas para lecionar
estatística, José Bordini Cinal da Associação Comercial de Porto Alegre, para
lecionar Administração, Ari Burger, Diretor do Banco Regional de
Desenvolvimento Econômico, Olívio Koliver, Eloy Venâncio, Joaquim e João
Blessmann, Antônio Camboim, Edgar Írio Simm, Heinz Kliemann, Lenine Nequete,
Hipólito Campos, Guilherme Socias Vilella,
Edison Batista Chaves. Alguns dos veteranos permaneceram no corpo
docente. Entre eles o prof. Alexandre Vertes, Gabriel Keglevitch, Guilherme
Moojen.
Paralelamente ao corpo docente o
Pe. Marcus coordenou a formulação de um currículo com um claro propósito
centrado na excelência acadêmica e
voltado para formar agentes de promoção humana valendo-se do desenvolvimento econômico como instrumento.
O Pe. Marcus assumiu a direção da
Faculdade de Ciências Econômicas num momento de aguda crise financeira que
ameaçava matar no nascedouro a instituição assim como sua coirmã a Faculdade
Filosofia Ciências e Letras. A situação da Faculdade de Ciências Econômicas,
porém, foi mais dramática pois a quase totalidade dos professores eram leigos e
as mensalidades do alunos cobriam apenas uma parte dos recursos. A situação
chegou a um ponto em que os salários começaram
a atrasar por meses. Felizmente, situação hoje inimaginável, excetuando
um que outro dos professores, todos continuaram a ministrar as aulas como se
nada estivesse acontecendo. Era preciso encontrar uma solução a curto prazo,
ainda mais que ordens emanadas do comando geral dos jesuítas de Roma,
determinavam:
Primeiro - que nenhuma nova Faculdade nem curso novo
algum fosse abeto na Faculdade de Filosofia, sem homens aptos e sem que estejam
à disposição os meios financeiros necessários, e para a criação de qualquer
nova faculdade deve ser obtida licença explícita do Padre Geral. Segundo – que
os cursos já existentes na Faculdade de
Filosofia podem ser mantidos até a definitiva aprovação pelo Governo. Obtida
esta, sejam suspensos pelos meios legais aqueles que são demasiado onerosos.
Tendo em vista a grave penúria
financeira o presidente de Mantenedora, Pe. João Sehnem, ordenara na prática o encerramento das atividades da
Faculdade de Ciências Econômicas. O diretor Pe. Marcos e o coordenador Pe.
Alcides, resolveram contemporizar e ganhar tempo até encontrar uma solução para
superar a crise. Recorreram a empréstimos ente os colonos das redondezas, em
Bom Princípio, São Vendelino, Tupandi , Salvador do Sul, Harmonia, Nova
Petrópolis,etc., oferecendo juros anuais de mercado. Com muito esforço foi
possível reunir um bom fundo com os empréstimos, o que permitiu que aos poucos,
o fantasma da inviabilidade econômico financeira da Faculdade fosse afastado. O
dinheiro com os juros foi devolvido logo que as contas ficaram sob controle.
Saneadas as finanças e os compromissos com os salários
dos professores e fornecedores saldados, o diretor Pe. Marcus começou com
iniciativas para abrir a Faculdade de Ciências Econômicas para a comunidade.
Entre elas destaco as seguintes.
Esse trabalho de abertura para a
comunidade teve como um dos alvos o Sindicato dos Metalúrgicos de São Leopoldo.
Admirado e respeitado pela categoria o Pe. Marcus costumava reunir-se com a diretoria do Sindicato, e mais por
conversas informais do que propriamente palestras programadas, atraiu a
entidade para dentro da Faculdade. E um detalhe chamava a atenção. O presidente
do Sindicato, o sr. Dantas, aposentado por invalidez por ter perdido um braço,
era comunista declarado. Esse fato e o de o Pe. Marcus ser padre jesuíta em
nada perturbou que os dois a procurassem juntos caminhos e formas para promover
o operariado.
Mas o projeto patrocinado pela
Faculdade de Ciências Econômicas, dirigida pelo Pe. Marcus, de maior impacto e
de efeitos de longo prazo, foi o “Projeto de Valorização do Vale do Rio dos
Sinos”. Ainda no segundo semestre de 1963, foi constituído um grupo de trabalho
com a finalidade de elaborar um “Projeto
de Valorização do Vale do Rio dos Sinos”. Compuseram o grupo o diretor da
Faculdade de Ciências Econômicas, Pe. Marcus Bach, o coordenador da Faculdade
Pe. Alcides Giehl, o chefe do Departamento de Economia, Pe. Arthur Rambo, o
prof. Lenine Nequete e o aluno Reinaldo Adams. O grupo contou com a
assessoria do sr. Georg Berensen, na
época chefe do escritório da Ferrostaal do Brasil em Porto Alegre, firma alemã
de planejamento e instalação industrial, empenhada na instalação da planta
industrial da Aços Finos Piratini. A colaboração de Berensen foi de fundamental
importância na fase de apresentação do
Projeto para o governo da República Federal da Alemanha, em vistas de apoio
técnico e financeiro.
O Projeto foi concluído ainda no
ano de 1963. A versão final assinada pelo pelos padres Marcus Bach, Alcides
Giehl, Arthur Rambo, o prof. Lenine Nequete e o aluno Reinaldo Adams,
objetivava a “Valorização da Bacia do Rio dos Sinos como um todo e não apenas o
controle das enchentes, como também o abastecimento de água, saneamento básico,
planejamento urbano, localização de distritos industriais, malha rodoviária,
reflorestamento das encostas, navegação fluvial, modernização e racionalização
da atividade agro-pecuária, etc.
Resumindo. O Projeto tramitou com
surpreendente rapidez no Itamarati e com a mesma rapidez foi apreciado e
aprovado pelo governo alemão, que financiou uma equipe de técnicos que entre
julho de 1967 e final de 1968, apresentaram o Relatório final. Desse Projeto de
valorização e desenvolvimento regional foi executada no decorrer da década de
1970 a obra dos diques de contenção das enchentes. Em momentos comemorativos o
mérito da proteção de São Leopoldo contra as enchentes costuma ser contabilizado
por políticos e administradores da época como marcos da sua passagem pelo
município. Acontece que não se tem conhecimento ou se ignora o fato de que a
idéia, o projeto e sua concretização saíram dos gabinetes da Faculdade de
Ciências Econômicas de São Leopoldo, coordenado pelo Pe. Marcus Bach, diretor
da instituição.
O currículo como jesuíta de então
absolvido com excelência: humanidades, filosofia, teologia, doutorado em moral
na Universidade Gregoriana em Roma, o contato com o mundo acadêmico europeu,
sua trajetória como professor de moral, as conferências feitas a profissionais
liberais dos mais diversos níveis, e principalmente, sua atuação como diretor
da Faculdade de Ciências Econômicas, fizeram do Pe. Marcus presença
indispensável quando
da elaboração do projeto da Universidade do Vale do Rio dos
Sinos. Em conversas e discussões preparatórias entre os jesuítas que
trabalhavam nas Faculdades definiram-se dois grupos. O primeiro deles defendia
o projeto de uma instituição mais modesta, menos ambiciosa, mais fácil de ser
administrada, com exigências para menor volume de recursos, confiada
basicamente a membros da Ordem. Não parece oportuno citar os nomes que
defendiam esse perfil de universidade. O outro grupo liderado pelo Pe. João
Oscar Nedel, o Pe. Marcus Bach, o Pe. Alcides Giehl, Pe Arthur Rambo, os professores Alexandre Vertes, Olívio
Koliver, José Bordini Cinel além de outros apostavam todas as fichas numa
projeto de universidade aberta tanto para o crescimento quantitativo do número
de alunos por curso, quanto numa abertura para a incorporação de novas áreas de
conhecimento que o andar do tempo certamente aconselharia.
O momento da partida do projeto
da nova universidade foi uma reunião liderada pelos padres Nedel, Marcus Bach e
Alcides Giehl e os professores leigos Alexandre Vertes e Olívio Koliver. O resultado
foi partir para um projeto de universidade grande e de longo alcance, atenta
para a direção em que sopram os ventos da História, aberta para acolher as mais
diversas correntes de idéias, empenhada
em acompanhar, participar e interagir com os avanços culturais, sociais e
tecnológicos. Essa pauta básica foi apresentada ao Pe. Friederichs e por ele
aprovada numa reunião logo em seguida.
Com a bênção do superior
provincial, a comissão constituída pelos padres Nedel, Marcus e Alcides e os
professores Koliver, Vertes, Cinel, Nequete e Rui Ruschel começou a elaborar o
projeto, que seria encaminhado para as instâncias oficiais para a aprovação. E
para encurtar a história, depois do decreto de criação da Universidade do Vale
do Rio dos Sinos, uma das primeiras providências fdo superior provincial foi
compor a cúpula da nova universidade. O Pe. João Oscar Nedel foi designado
reitor, o Pe. Marcus Bach vice-reitor acadêmico e o prof. José Bordnini Cinel
vice-reitor administrativo. – maiores
detalhes encontram-se no livro “Um sonho e uma realidade” – A Unisinos
1953-1969 –
Como vice-reitor o Pe. Marcus
constituiu uma equipe para dar forma à forma à estrutura acadêmica da
universidade. Como linhas mestras reitoras da concepção acadêmica da nova
universidade, foram retomadas e reforçadas aquelas que já vinham norteando o
ensino e a pesquisa e atividade social das faculdades isoladas. Primeiro. A
Unisinos deveria ser uma “Casa de Sabedoria” como o Pe. Thiesen a tinha
definido há mais de uma década em 1957 – Segundo. O saber, o conhecimento
produzido e os avanços avanços técnicos conquistados nos mais diversos setores
da universidade deveriam destinar-se de alguma forma a um objetivo social, isto
é, reverter sob os mais diversos aspectos, em benefício do público direta ou
indiretamente influenciado pela instituição. – Terceiro. A universidade deveria
ser uma caixa de ressonância sensível
aos apelos dos diversos momentos históricos. Na sua proposta organizacional,
institucional e acadêmica, o projeto deveria prever caminhos para atender às demandas que fossem
surgindo no andar do tempo. E uma visão do futuro prenunciava muitos, variados
e grandes desafios. – Quarto. A Unisinos estava sendo organizada e implantada simultaneamente com
obrigatoriedade de as instituições de ensino superior particulares adaptar-se às novas regras da Reforma
Universitária
O Pe. Marcos como vice-reitor
acadêmico reuniu uma equipe de sua
confiança e com experiência comprovada em assuntos universitários e no decorrer
da segunda metade de 1969, coordenando o trabalho em sessões quase diárias que
não raro entravam madrugada
adentro, conseguiu que em fins de
outubro de 1969 o perfil acadêmico da Unisinos estivesse concluído. Na base encontrava-se o Ciclo
Básico, obrigatório para todos os alunos e pré-requisito para ingressar em
qualquer curso profissional; Os Institutos Centrais de Ciências Humanas, Letras
e Artes e Ciências Positivas.
Paralelamente aos Institutos Centrais foram criadas as escolas profissionais e
Educação, Economia, Direito, Escola Superior de Música e a Faculdade de
Teologia. A universidade foi instalada oficialmente no dia 12 de dezembro de
1969. De então em diante, durante todo o ano de 1970 o Pe. Marcos comandou com
firmeza a implantação do Ciclo Básico exigindo o máximo de seriedade na
condução e avaliação das diversas disciplinas, com avaliações, senão semanais,
ao menos a cada duas semanas. Com essa orientação e a presença diuturna do
Vice-Reitor os professores formaram um corpo coeso, disciplinado e de modo
especial comprometido com a causa. Em julho de 1970 reuniu o corpo de
professores do ciclo Básico na Vila Betânia em Porto Alegre com a finalidade de
proceder a uma avaliação do primeiro semestre do ano a nível do Ciclo Básico.
Identificadas as falhas e os acertos foram definidas as ações e estratégias
para o segundo semestre. Assim os 20 créditos obrigatórios do Ciclo Básico
transformaram-no num porta de entrada para a universidade pela qual os alunos
tiveram ocasião de avaliar as dúvidas a respeito de sua opção profissional,
preencher lacunas na formação do ensino médio e inclusive viver com colegas de
múltiplas opções profissionais. De cobro o Ciclo Básico como etapa
pré-requisito obrigatória para qualquer opção de curso profissional, contribuía
com uma parcela nada desprezível para o orçamento da universidade.
Mas a preocupação maior do Pe.
Marcus, ao lado de um formação acadêmica geral de alto nível, foi a assimilação
de uma consciência ética convicta nos alunos e no corpo docente. Para alcançar
essa meta não deixava passar nenhuma ocasião para dar o seu recado nesse
sentido nas reuniões rotineiras da administração universitária ou em
conferências formais para as quais era convidado obrigatório, também fora do
contexto universitário. Mas o instrumento que teve a mão do Pe. Marcos como
marca foi a introdução de duas disciplinas obrigatórias para todos os cursos
profissionais: Humanismo e Tecnologia e Deontologia, sendo a primeira
pré-requisito da segunda. A pretensão do Pe. Marcos e da sua equipe de
planejamento acadêmico pretendia com o Ciclo Básico e as disciplinas de
conteúdo ético e moral no decorrer dos cursos
profissionais, era de uma munir os egressos da universidade com uma
visão humanística mais ampla, de uma consciência ética arraigada e uma
conseqüente postura no exercício da profissão.
Por essas eventualidades que
costumam entrar em choque com personalidades acima do comum como era o Pe.
Marcus e a sua contribuição valiosa e bem sucedida com a consolidação da
Unisinos, ele foi substituído pelos superiores no cargo de vice-reitor, pelos superiores
no começo de 1972, pelo Pe. Theobaldo Franz, que diga-se de passagem, nada teve
a ver com a retirada do Pe. Marcos do cenário acadêmico. As razões nunca foram
divulgadas claramente. Nas entrelinhas do episódio, entretanto, percebe-se a
mão de coirmãos que viam com nenhuma simpatia a influência do Pe. Marcos em
meio a professores e alunos e nas camadas cultas fora dos muros da
universidade. E a grande aceitação de conferencias e palestras a que era
convidado proferir residia na visão ético-moral que pregava. Visto como
heterodoxo por algumas autoridades eclesiásticas, por outras era tido como um
abridor de novos caminhos e novas perspectivas para o comportamento ético-moral
numa fase de transição, sinalizando para uma verdadeira revolução do comportamento
humano. Em outras palavras o Pe. Marcus intuía já naquela época o que a entrada definitiva da pós-modernidade
prenunciava. E sem romper com o passado empenhou-se em mostrar caminhos
aceitáveis para enfrentar os desafios que vinham pela frente. Compreende-se
que o seu caminho fosse cruzar com o dos
defensores e saudosistas da rigidez da ortodoxia ético-moral pré-conciliar. Mas
deixemos o julgamento nas mãos de Deus.