Exmos. Senhores
Fui, por assim dizer,
atropelado, pelo telefonema do então
Presidente da Federação das Círculos Culturais Alemães do Brasil, Dr. Jorge
Klobig, de saudosa memória, comunicando-me que
havia sido escolhido para receber a Distinção Imigração Alemã, edição
2013, por indicação do Instituto Histórico de São Leopoldo, presidido pela
profa. Eloísa Capovilla Luz Ramos, pelo Núcleo de Estudos Teuto-Brasleiros,
coordenado pelo prof. Marcos Witt, pelo
Curso de Graduação em História da Unisinos, coordenado pelo prof. Jairo Rogge,
pelo Programa de Pós-Grduação em História da Unisinos, coordenado pelo prof.
Paulo Staudt Moreira, Pela Associação dos Pesquisadores das Comunidades
Teuto-Brasileiras do Litoral Norte, presidida pela profa. Nilza Huyer, pela
Associação dos Pesquisadores das Comunidades Teuto-Brasileiras do Brasil,
coordenada pela profa. Rosane Neumann. Nunca me passou pela cabeça que pudesse
ser contemplado com essa distinção. Não posso deixar de registrar o meu reconhecimento
às três entidades organizadoras deste evento: A Federação dos Círculos de
Cultura Alemã no Brasil, o 25 de Julho e a Comissão Organizadora das
comemorações dos 190 anos da Imigração Alemã no Brasil. Um sincero agradecimento a todos que de
alguma forma foram responsáveis, direta ou indiretamente, por ela. Entre estes
últimos não posso omitir as duas colaboradoras que durante 23 anos foram as fiéis e leais pesenças no esforço
de salvaguardar a memória e a história dos nossos maiores. Refiro-me à Isabel
Cristina Arendt e Janaina Silva. Destaco também o apoio irrestrito do Pe.
Aloísio Bohnen, durante o período em que foi Reitor da Unisinos e depois como
Diretor da Blblioteca e do Memorial Jesuíta. E, por último, quero destacar o
significado difícil de avaliar, mas fundamental, pelo apoio ao meu
envovlvimento com a rotina diária da pesquisa e os compromissos com os
constantes eventos culturais e envolvimentos acadêmicos e de pesquisa na área
da Imigração. À minha esposa Inez e à minha filha Ingrid, ao meu gênro Ernani e
ao meu neto Victor, um reconhecimento todo especial.
Não posso deixar de reconhecer
que a Distinção com que os senhores me honram, faz um bem danado ao ego e como
diria o poeta Rodrigues Brito, lembrou-me que em qualquer idade persiste o
elemento juventude que nos lembra que ainda temos condições de continuar
construindo algo de novo e de útil, ou como diria o poeta alemão, faz-nos
continuar procurando a “flor azul”. Constitui-se também num poderoso estímulo, para continuar em pé e
contribuir para que a História da Saga da Imigração Alemã no Brasil e o que
signifocu para o País, seja corretametne avaliada e reconhecida.
Senhoras e Senhores. Como podem
perceber não sou franco-atirador, um curioso interssado na história da
Imigração alemã. Sou um dos muitos que batalham no contexto da Academia,
organizações regionais e nacionais, de associados a centros de promoção da
cultura alemã e de comissões organizadoras. Estamos todos interessados e
existenciamente comprometidos, de um lado com a preservação da memória e da
história da Imigração Alemã e, principalmente, preservando-a, e procurando
entender a sua natureza, a sua dinâmica e o seu significado na construção da
Nacionalidade Brasileira. É óbio que que numa noite festiva não cabem reflexões
amplas e profundas sobre um tema tão vasto e tão complexo.
A Imigração Alemã, como qualquer
outra vertente emigratória, imigratória ou simplesmente migratória, oferece um
número e uma variedade sem conta de formas e aspectos dignos de serem
considerados e analisados. A comemoração do centésimo nonagésimo aniversário da
imigração alemã no Brasil, a ocorrer no ano que vem, não pode deixar de
surgerir uma reflexão sobre o itenerário que marcou a inserção gradativa na comunidade
nacional brasileira desses imigrantes e dos seus descendentes, ora na nona e
décima geração. Há sessenta anos o Pe.
Balduino Rambo, um dos fundadores da FECAB, resumiu essa história
valendo-se da metáfora, que a resume em toda sua extensão e profundidade: “O
carvallho alemão deitou raízes na terra das palmeiras”. Os conceitos “migração,
migrante, imigrante, emigrante” implicam num universo todo que afetam o ser
humano no mais profundo e mais sagrado da sua existência. Três aspectos dessa
realidade merecem atenção. Em primeiro lugar, o migrante da história, não falo
dos aventureiros, viajantes, caçadores de tesouros, mas daqueles que migram por
necessidade e por isso deixam para trás um chão, uma história e uma comunidade
humana. Os antigos romanos, na sua
lendária sabedoria, deixaram entre seus muitos provérbios, este sobre o
“migrar”: “Ubi bene ibi patria”- mal traduzido diz: “A pátria dos homens
encotra-se lá onde se sentem bem, onde são felizes, onde seus anseios e
demandas materiais e espirituais são
atendidas e satisfeitas. Ninguém deixa para trás a pátria, a terra natal,
parentes, amigos, conhecidos, enfim uma história e uma paisagem, senão tangido
pela necessidade. Os motivos imediatos que desencadearam as grandes correntes
migraórias da História e continuam motivando as de hoje, seja de um continente
para o outro, ou as internas de um país ou região para a outra, podem ser de
natureza econômica, social, política, étnica ou outras. Todas exprimem,
entretanto, um fato comum: o migrante vai em busca de algo melhor, real ou
imaginário
Em segundo lugar, o migrar
implica necessariamente em duas dimensões, o que vale de modo especial para as
grandes correntes migratórias que partiram da Europa, para as Américas, à
Austrália, o sul da África, etc., a
partir do século XVIII e que se prolongaram até meados do século XX. De um lado
o migrante que partia da Alemanha, da Itália, da Inglaterra, da Polônia e dos
outros pontos da Europa, deixava para
trás uma história e uma tradição,
construída durante milênios e solidamente enraizada na “pátria” que ficava para
trás para sempre. Em contrapartida via-se forçado a inserir-se num outro
ambiente geográfico, num outro contexto social, numa outra tradição cultural.
Em outras palavras. O desenraizamento compulsório de um lado levava
inevitavelmente a um enraizamento,
também compulsório do outro, acompanhado dos mais diversos desafios e traumas
imagináveis, com caracteristicas peculiares para cada caso.
Em terceiro ugar, os nossos
antepassados enontraram uma floresta pluvial, subtropical quase impenetrável,
composta por uma vegetação desconhecida para um europeu, povoada por animais,
aves e insetos também desconhecidos. Somou-se a isso a adaptação à inversão das
estações do ano, a ausência de invernos rigorosos e verões longos e quentes.
Neste contexto estabeleceram-se os primeiros contatos com os luso-brasileiros e
os próprios nativos. Aprenderam deles a cortar com foice a vegetação baixa para
depois derrubar as árvores maiores com machado. Aprenderam dos índios a prática
da coivara, queimando a vegetação depois de seca. Aprenderam a cultivar
mandioca, milho, batata doce, cana de açúcar, abóboras, morangas e melancias. O
“rebento do carvalho” começava a deitar raízes na terra das palmeiras. A “nova
terra natal, a nova Heimat, a nova querência” tomava formas e contornos.
Emoldurada pela paisagem da “terra das palmeiras”, a dedicação ao trabalho, à
família, à comunidade solidária, à religiosidade, à cultura e prática das
diverasas modalidades de lazer, característicos do “carvalho” da nossa
metáfora, foram moldando uma nova paisagem humana, nos vales médios e
superiores do rio dos Sinos do Caí, do Taquari, do Pardo e Jacuí. A partir de 1880 tomaram conta de
consideráveis áreas da Serrra, Missões e Alto Uruguai, para, já no século XX,
avançar pelo centro oeste de Santa Catarina, adentrar o centro oeste do Paraná
e, sempre mais para o norte: Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Acre,
Rondônia e mais além até Santa Helena na fronteira com a Venezuela, além de
bolsões no Amapá Maranhão e Baia.
E no andar dessa história, que se
aproxima dos 190 anos, o Rebento do Caravalho deitou raízes profundas e
definitivas na Terra das Palmeiras. Cultivando com fervor e entusiasmo
crescente a memória dos antepassados, os imigrantes alemães participaram
ativamente do dessenvolvimento da nova pátria. A memória e a fidelidade
aos velhos valores espírituais, humanos
e materiais, trazidos do outro lado do oceano, temperados pelo clima e a
geografia da nova Heimat
e redesenhados pela realidade humana da nova Querência, fizeram deles cidadãos brasileiros plenos e conscientes. A
maioria deles já náo fala mais o dialeto das terrasde origem das rregiões do
Reno da Baviera, de Hannover, da Pomerânica, da Silésia, da Áustria, da Suiça e
de outros territórios. Encontramos seus representantes, de igual para igual com
os brassileiros de outras procedências étnicas, ocupar posições em todos
escalões da vida pública e em todas as atividades da iniciativa pivada. Em não
poucos casos somente o sobrenome, muitas vezes bem ou mal grafado, denota ainda
sua procedência remota. Parafraseando Thomas Mann, diríamos: Muitas das
características por natureza transitórias ficaram ao longo da estrada durante
esses 190 anos, mas é exatamente nessa transitoriedade que se traçou a linha
mestra da nossa história como herdeiros dos imigrantes alemães, que há exatos
189 anos desembarcaram em Porto Alegre.