Os jesuítas e a imigração alemã – O projeto educacional #1

A escola paroquial comunitária

Em agosto de 1849, desembarcaram em Porto Alegre os primeiros três jesuítas, dois padres e um irmão,  destinados para dar assistência regular aos imigrantes alemães. A metade católica dos imigrantes ficara os primeiros 25 anos sem assistência religiosa . Para, de alguma maneira compensar essa falta, os colonos organizaram comunidades polarizadas em torno de escolas e capelas. Compensavam a falta da missa com o culto dominical leigo, presidido por alguém da comunidade.  Na escola, além do aprendizado da escrita, da leitura, do cálculo, o ensino da religião ocupava um lugar de destaque. Supria de alguma forma a ausência de sacerdotes. Ao aqui chegarem, os padres encontraram, portanto, as comunidades organizadas, tendo como pontos fortes a escola e a capela. Desta maneira  encontraram as condições básicas para começar, sem perder tempo, o trabalho pastoral. O Pe.Lipinski em Dois Irmãos e o Pe. Sedlac em São José do Hortêncio, encontraram o campo preparado com 10 escolas em funcionamento, garantindo o mais essencial para manter um nível cultural e religioso mínimo. E os professores encarregados dessa missão, portanto, as figuras mais importantes nas comunidades,  automaticamente tornaram-se os aliados e parceiros dos padres na sua missão pastoral. Somando à tarefa de ensinar na escola, a função líder da comunidade, sacristão, regente do coral e “diácono leigo”, diríamos hoje, ministrava o batismo em casos de emergência, presidia o culto comunitário e os sepultamentos na ausência do padre. Além disso, socorria os colonos nas mais diversas situações de natureza material, familiar, social e religiosa. Pode-se afirmar que, nas comunidades fora da sedes paroquiais, o professor, sob muitos aspectos, foi mais importante no quotidiano  dos colonos do que o próprio padre.  Como consequência, consolidou-se neste contexto uma estreita colaboração entre a atividade pastoral propriamente dita e os professores nas escolas. Assim o binômio escola-capela, mais tarde escola-igreja, professor-padre, serviram de alicerce na construção do binômio educação-religião, os dois elementos que explicam, em última análise, a consolidação e o sucesso da obra colonizadora, protagonizada pelos imigrantes vindos da Europa do norte e central.
No mesmo ritmo da expansão e consolidação da infraestrutura eclesiástica, deu-se a multiplicação das escolas comunitárias. Entre 1824 e 1850 foram criadas 10 escolas católicas, Até 1875, acresceram mais 40. Ao terminar o século, o número subira para 150. O resultado desse  esforço no plano educacional é facilmente imaginável. Além de significar um poderoso aliado ao incentivo da religiosidade, evitou a instalação do analfabetismo entre os imigrantes alemães e seus descendentes. Paralelamente ao “projeto pastoral”, vai tomando forma  um projeto educacional, que iria marcar definitivamente a presença dos jesuítas no sul do Brasil.
Já na primeira e segunda décadas da sua presença aqui entre os imigrantes alemães e o contato om a realidade social, econômica e política da Província de São Pedro, os jesuítas perceberam que os núcleos  dos imigrantes se multiplicavam e consolidavam rapidamente. A dinâmica apontava para um  forte desenvolvimento quantitativo e qualitativo a curto prazo. A evolução de não  poucos desses núcleos para centros urbanos, oferecendo um comércio crescente, uma indústria incipiente e dotados de grande potencial de progresso, somado a uma sociedade em constante mudança motivada pela urbanização, ocupariam, em questão de uma ou duas gerações, o lugar das comunidades de colonos. E segundo lugar, estava mais do que evidente que, na Província de São Pedro, o poder político e a hegemonia econômica concentravam-se, exclusivamente, nas mãos dos estancieiros de origem lusa ou açoriana. Diante deste quadro, não restava dúvida de que os imigrantes e seus descendentes permaneceriam à margem e à mercê das grandes decisões políticas e econômicas por mais algumas décadas, caso não se tomassem medidas de inclusão social, política e econômica efetivas a longo prazo. Confinar e isolar as comunidades de colonos em suas linhas e picadas equivalia a condená-las à estagnação e ao insucesso. Uma avaliação objetiva mandava que se construíssem, o mais rapidamente possível, pontos capazes de superar a justaposição, no mesmo espaço geográfico e jurídico, de lusos, açorianos, alemães, italianos, poloneses e outros, pontes que permitissem o encontro, o mútuo conhecimento, a mútua aceitação e a colaboração. Só assim se tornaria possível, apesar das diferenças étnicas e culturais, a consciência do pertencimento a uma cidadania comum a serviço de uma mesma nação. Fazia-se inadiável a formação e a educação em instituições de ensino de nível mais adiantado.
Não havia dúvida de que as escolas comunitárias não tinham as necessárias condições de suprir essa demanda. Faziam-se necessárias  instituição de nível médio e superior, em condições de também receber os filhos das oligarquias estancieiras e oferecer-lhes uma formação compatível com o papel que lhes caberia cumprir na sociedade regional e nacional. Ao mesmo tempo, essas escolas deveriam formar as primeiras gerações de líderes civis e religiosos oriundos do meio dos imigrantes.

Capa da primeira cartilha impressa no                                                  Escola-capela construída em 1862 em
Rio Grande do Sul em 1832                                                                  Schneiderstal  -  Ivoti           
  

                               

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