A Associação Rio-Grandense de
a Agricultores
O
terceiro Congresso dos Católicos foi realizado em São José do Hortêncio em 1900.
Este Congresso foi o marco decisivo para o futuro da vida associativa. Conforme
consta nos anais, a tônica dos debates concentrou suas atenções em dois temas
complementares. De um lado estava claro de que a doutrina social cristã
oferecia a saída para enfrentar os desafios gerados pela situação histórica do
começo do século XX. Do outro lado estava claro também para as lideranças
coloniais de que o bem-estar material, quando corretamente entendido, vem a ser
o pressuposto para o bem-estar espiritual. O pavilhão do Congresso estava
completamente lotado para acompanhar os debates que contemplaram principalmente
dois temas de vital importância para o desenvolvimento da colônia: Novas
fronteiras de colonização e o crédito para os colonos.
Mas
o aspecto mais marcante da Associação Rio-Grandense de Agricultores foi a sua
concepção inter-étnica e interconfessional. Embora a ideia tivesse sido proposta pelo padre jesuíta Theodor Amstad e
as lideranças católicas, já na relação dos fundadores em torno da metade eram
protestantes. Os italianos filiaram-se e participaram com entusiasmo nos
projetos patrocinados pela Associação, tanto assim que a “Santa Clara” é uma
das cooperativas de primeira geração, fundada enquanto ela se encontrava em plena atividade. Nas
assembleias gerais, padres católicos e pastores protestantes, envolviam-se nos
debates, lado a lado, com as respectivas lideranças, deixando as querelas
doutrinárias de lado, para solucionar os problemas comuns de maior importância.
Quanto
ao primeiro, tornara-se inadiável partir para novas fronteiras de colonização,
a fim de desafogar o excesso
populacional acumulado na região colonial. Com a não existência de áreas
suficientemente grandes nas regiões coloniais antiga e média, para acomodar os
excedentes, deveriam ser assentados em fronteiras de grandes dimensões, ainda
disponíveis nas Missões, Serra e Alto Uruguai. Antes de definir a área dois
pressupostos para essas novas colonizações foram estabelecidos: insistir na
formação de comunidades étnica e confessionalmente identificadas e de tamanho
suficiente para abrigar uma infraestrutura comunal mínima, como igreja, escola,
cemitério, casa de comércio, artesanatos etc.
Depois
de uma análise cuidadosa das alternativas de locais de colonização, a opção foi
pelas terras oferecidas pela Companhia de Estradas de Ferro Noroeste – Nordwest
Bahn - proprietária das terras de Serro Azul (Cerro Largo) e Santo Cristo. O
projeto foi implantado a partir de 1902.
Quanto
ao segundo, o Pe. Steinhart, que presidia as sessões, pôs na mesa de discussões
a questão da poupança e empréstimo. Depois de avaliar diversas modalidades a
opção foi pelo sistema Raiffeisen, amplamente utilizado na Alemanha e Argentina.
A primeira cooperativa de crédito foi criada em 1902 em Nova Petrópolis. A ela
sucederam-se nas décadas seguintes,
dezenas e outras, tornando-se em grande parte, o suporte financeiro para
empreendimentos de colonização, de asilos, hospitais, sanatórios e outros mais.
Às cooperativas de crédito sucederam-se as cooperativas de produção, consumo e
comercialização. No âmbito da produção rural deu-se ênfase ao uso racional dos
solos, com as primeiras propostas
concretas de preservação e reflorestamento, diversificação das culturas,
melhoria genética das raças de bovinos e suínos, o estímulo à implantação de
pequenas indústrias. Ainda no contexto da Associação Rio-Grandense Agricultores
foram propostas medidas para o amparo social dos colonos como assistência
médica, assistência jurídica, assistência aos idosos, amparo às viúvas e órfãos.
O fomento a todas as formas de expressão cultural também não foi esquecido,
além da promoção de feiras com exposições dos produtos coloniais, dos
artesanatos e das pequenas indústrias.
Como
se pode concluir, a Associação Rio-Grandense de Agricultores foi um amplo
programa de desenvolvimento social, econômico, cultural e religioso de perfil
incomum para aquela época, isto é, interconfessional e inter-étnico.
Infelizmente sua duração efetiva foi efêmera, curta demais para por em andamento e concluir os muitos
projetos setoriais, importantes, muitos indispensáveis, para o sucesso da
colonização nos estados do sul do Brasil. Uma decisão polêmica tomada na
assembleia geral em Taquara, em 1909, transformou a Associação em sindicato, o
que na realidade, despojou-a de suas características originais.
Para
o pleno funcionamento da Associação com suas características de
inter-etnicidade e inter-confessionalidade, havia dificuldades não pequenas,
consideradas as peculiaridades da época. A língua oficial da Associação era o alemão
e, nas assembleias gerais os assuntos constantes na ordem do dia, eram
debatidos neste idioma. Desta forma, a participação dos delegados
ítalo-brasileiros e luso-brasileiros ficava seriamente prejudicada. Apesar
disto, houve uma adesão significativa às propostas, via indireta. Neste
particular o empenho do Pe. Amstad mostrou-se decisivo entre os
ítalo-brasileiros. Nas suas cavalgadas pastorais, costumava visitar
regularmente comunidades como Santa Lúcia do Piai, São José do Sertório, Nossa
Senhora do Pedancino, São Roque, São José de Nova Italiana, São Paulo da Linha
Furna e mais uma dúzia de comunidades nas cabeceiras do rio Caí, sob a
jurisdição da paróquia de São Sebastião do Caí, Nova Petrópolis e Feliz. Ao
lado do atendimento pastoral propriamente dito, soube interessar-se também
pelos problemas de natureza econômica e social dos imigrantes italianos. Entre
eles encontrou chão propício para as suas propostas de organização associativa.
Em não poucos casos, como ele mesmo relatou, a receptividade para as suas
ideias e propostas, foi maior do que entre os teuto-brasileiros.
O
engajamento dos luso-brasileiros, encontrou dificuldades ainda maiores.
Evidentemente a língua foi um obstáculo quase intransponível. A este somou-se o
fato de os luso-brasileiros e os açorianos, lidavam com grandes estâncias de
criação de gado. A natureza dos problemas de produção e as características
sociais, nada tinham em comum com a dos alemães e italianos.
Num
segundo momento, a Associação Rio-Grandense de Agricultores tinha em vista engajar em seus projeto de desenvolvimento
econômico e promoção social, o grande comércio da capital, as instituições
financeiras, as estações experimentais públicas e privadas. Esta intenção ficou
clara com a realização da 5ª assembleia geral em Porto Alegre, em março de
1905. Infelizmente os resultados práticos foram insignificantes, para não dizer
nulos.
O
convívio e a colaboração entre protestantes e católicos manteve-se num patamar
altamente produtivo. Em termos numéricos proporcionais, os protestantes e
católicos somavam cada qual em torno dos 50%. Sentados à mesa dos debates, lado
a lado, padres católicos e pastores protestantes, com suas lideranças,
integrando delegações e coordenando os debates, procuravam, com toda a
honestidade e espírito desarmado, identificar os problemas comuns e encontrar
soluções de consenso. As querelas de natureza doutrinária e disciplinar que
ficassem do lado de fora.
Considerando
bem, a Associação Rio-Grandense de Agricultores adiantara-se em 60 anos ao
Concílio Vaticano II. Falar em Ecumenismo, mais ainda, propor um projeto de
desenvolvimento e promoção humana, em colaboração com outras confissões, em
especial com protestantes, afigurava-se para católicos mais ortodoxos como
também a autoridades da Igreja e representantes do clero, como uma temeridade,
na fase do auge da implantação da Restauração Católica. O lema de ação que
orientava o andamento da Associação, resumia-se no seguinte: “Colaborar em tudo
o que é comum, deixando de lado as diferenças”.
Com
a transformação em sindicato, e a consequente descaracterização da Associação,
as lideranças históricas fundadoras como
o Pe. Amstad, Hugo Metzler, pastores protestantes e lideranças italianas,
retiraram-se. Mais tarde, no Congresso dos Católicos em 1912, em Venâncio
Aires, fundaram a Sociedade União Popular. Na mesma época os protestantes
fundaram a Liga das Uniões Coloniais e os italianos os Comitatti. Dedicaremos à
Sociedade União Popular – o Volksverein – a postagem que segue.
Figuras chave
da Associação Rio-Grandense de Agricultores
Pe. Theodor Amstad Sr.
Hugo Metzler